DOS CRITÉRIOS SUBJETIVOS E OBJETIVOS DO ITR



DOS CRITÉRIOS SUBJETIVOS E OBJETIVOS DO ITR

1.1 Aspectos Teóricos do ITR

O presente capítulo, neste tópico inicial, tratará dos aspectos teóricos do ITR, demonstrando e diferenciando os conceitos e as modalidades de competência pertinentes ao tratamento tributário estabelecido pela legislação, dando-se ênfase ao final, ao duplo aspecto de fiscalidade e extrafiscalidade adquirido pelo referido tributo.
Trará os principais pontos inerentes ao tributo, em sua conotação hodierna, bem como tecerá de acordo com análise doutrinária sobre o tema as conceituações do Tributo da Terra e seus espeques sob a ordem tributária e agrária.
Porém, antes de tecer os comentários pertinentes acerca do ITR, faz-se necessário conceituar a competência e a capacidade de tributar dos entes federativos. Ambos os conceitos não se confundem devido à série de diferenciações que serão demonstradas a seguir.
Francysco Pablo Feitosa Gonçalves preleciona que:

A capacidade tributária não se confunde com a competência, pois aquela é representada pelo poder atribuído pela Constituição, ou por leis infraconstitucionais, a ente estatal para exercer atos administrativos de arrecadação, fiscalização e administração tributária. Logo, mister se faz compreender que a competência é a de instituir tributos, ao passo que a capacidade é de arrecadar, fiscalizar e administrar tributos previamente instituídos. Em suma, é de se ver que a regra jurídica tributária, pode determinar como sujeito ativo um ente diverso daquele competente para instituí-la .

E conclui o supracitado autor:

Logo quando estiver percorrendo a seara da disciplina jurídica dos tributos, há que se ter em mente que a competência não é sinônimo de capacidade. Apesar de tal distinção ser acatada pela maioria dos doutrinadores e apresentada aos neófitos nas lições mais elementares de Direito Tributário, alguns autores renomados ainda confundem os dois institutos, vide Petrônio Braz (2006, p. 71): "Capacidade tributária é, dentro desse conceito, a aptidão, deferida pela Constituição, para instituir, lançar e cobrar, através de lei ordinária ou complementar. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, como entes federativos, têm, nos termos do art. 45, da CF/1988, capacidade tributária para instituir impostos, taxas e contribuições de melhoria, decorrente de obras públicas .

A competência de tributar só poderá ser instituída pela outorga constitucional respeitando as devidas formalidades. A competência é exclusiva dos entes federativos e dessa forma não poderá ser delegada. Outra característica diz respeito a irrenunciabilidade, haja vista que, não é possível uma vez instituída a competência renunciar da mesma. O ente poderá escolher o momento adequado para exercer a competência, pois lhe assiste o direito facultativo do exercício. Enquanto a Constituição Federal de 1988 estiver vigente a competência não irá caducar no tempo.
Novamente adverte Francysco Pablo Feitosa Gonçalves que:

Detalhe importante é que, uma vez que a competência tributária é delineada pela Constituição; os entes a quem tal competência foi outorgada não podem delegá-la. Isto é decorrência da hierarquia fática e lógica das normas jurídicas, que mereceram, inclusive, advertência explicita do legislador, determinado que "a competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra (...)", nos termos do art. 7º, do CTN. Admitir a delegação de competência para instituir tributo e admitir seja a Constituição alterada por norma infraconstitucional, adverte Hugo de Brito Machado (2007, p. 293) .

A indelegabilidade da competência pode ser entendida como uma limitação da atuação dos entes, como ensina Kiyoshi Harada:

Ao mesmo tempo em que procedeu a partilha de competência tributária que, por si só, já é uma limitação ao poder de tributação, na medida em que a outorga de competência privativa a uma entidade política implica, ipso fato, a vedação do exercício dessa competência por outra entidade política não contempla, a Constituição Federal prescreveu inúmeros princípios tributários, visando à preservação do regime político adotado, à saúde da economia, ao respeito aos direitos fundamentais e à proteção de valores espirituais .

A competência tributária é dividida em seis modalidades: privativa, comum, cumulativa, especial, residual e extraordinária. Presta-se no presente fazer um apanhado geral e demonstrar a forma como a competência se perfaz diante de tais modalidades.
No que versa sobre a competência privativa, no texto constitucional são enumerados os impostos que devem ser instituídos apenas por determinados entes políticos. Muitos doutrinadores distinguem a competência privativa da exclusiva, uma vez que a primeira é passível de delegação. A discussão, todavia, é feita apenas no campo terminológico empregado ao Direito Tributário, vez que se encerra com o tratamento dado pela Lei Maior, considerando-a privativa. Eduardo Sabbag trata do tema abaixo:

Trata-se, pois, de competência privativa, terminologicamente, no sentido de que a própria Constituição já determina o rol dos impostos relativos a cada ente tributante. Observe: o art. 153 da CF enumera os impostos federais, de competência privativa da União: o art. 155 da CF enumera os impostos estaduais, de competência privativa dos Estados e do Distrito Federal: e os artigos 156 e 147, parte final, ambos da CF, enumeram os impostos municipais, de competência privativa dos Municípios e Distrito Federal. Isso porque "a Constituição não cria tributos; ela outorga competência tributária, ou seja, atribui aptidão para criar tributos .

A competência comum é atribuída a cada ente político para impor os mesmos tributos, ou seja, a União, Estados, Municípios e o Distrito Federal, devem tributar as taxas e as contribuições de melhoria do mesmo modo. Novamente, Eduardo Sabbag, citando Ricardo Lobo Torres salienta que:

Para Ricardo Lobo Torres, "competência comum é a atribuída a cada ente político para impor os mesmos tributos, guardado, entretanto, o vinculo entre o tributo e o serviço prestado ou a atividade exercida. A competência comum se restringe aos tributos contraprestacionais (taxas, contribuições de melhoria e contribuições previdenciárias dos servidores públicos), donde se segue que é devido ao ente que houver entregue a prestação. Aparece nos arts. 145, II e III e 149, parágrafo único .

É previsto no artigo 147 da CRF/88 a competência cumulativa onde a União tem o poder de legislar tanto no âmbito federal como estadual. Deve ser analisada a incidência da bitributação nesse tipo de caso, que consiste em dos entes políticos tributando a mesma situação fática.
A chamada competência especial faz referência à instituição de empréstimos compulsórios e as contribuições especiais. Já a competência residual está regulamentada nos artigos 154, I e 195, §4º, da CRF/88, dispondo sobre a possibilidade de instituir tributos diversos dos que já existem. No que pese a competência extraordinária poderá a União, por meio de Lei ordinária federal instituir imposto extraordinário de guerra, conforme o artigo 154, II, da CRF/88 cominado com o artigo 76 do CTN.
Já se sabe ao que se referencia a sigla, designando o nome da espécie tributária, como Imposto Territorial Rural. O agrarista Antonino Moura Borges assim define o tributo:

O imposto da terra é o Territorial Rural, lançado e cobrado na responsabilidade do Governo Federal através do INCRA, o qual, através dos cadastramentos das propriedades, fazem a classificação e os lançamentos, levando-se em conta o grau de aproveitamento de cada área lançada .

O tributarista Eduardo de Moraes Sabbag, em sua conceituação, demonstra claramente o aspecto da função social e o fito de cumprir as premissas da Reforma Agrária, abaixo, in verbis:

O ITR é o imposto vocacionado a se revestir da condição de veículo auxiliar do disciplinamento estatal da propriedade rural. É considerado um importante instrumento de política agrária, portanto, de combate aos latifúndios improdutivos, apto a fomentar a reforma agrária, com a conseqüente redistribuição de terras no País .

A definição de Sabbag sobre o Imposto da Terra alcança a alcunha requisitada pelas indigitadas alíquotas progressivas, ao que mais a frente tratar-se-á-las sob a análise de prospecção entre ser ou não ser uma penalidade imposta pelo Estado.
Antes de se lançar mão da conceituação sobre o tributo compreendida nesta monografia, cumpre-se levantar outros fatores intrínsecos acerca do ITR, em sua dicção teórica.
O ITR, como se observou no capítulo I, já foi de competência exclusiva dos Estados ? Membros. Após o advento do Estatuto da Terra, a competência passou a ser federativa, da União, que repassou aos municípios interessados a capacidade tributária para fiscalizar e cobrar o imposto.
De toda forma, a regra geral contida na Carta Política de 1988, designa ao INCRA, que é uma autarquia federal, a competência fiscalizatória e de cobrança do ITR. Todavia, segundo dados do próprio Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária , cerca de 91% dos municípios brasileiros aceitaram a delegação e estão capacitados a fiscalizar e cobrar o imposto, sendo que, em muitos destes, o ITR se coloca como a principal fonte de rendimentos tributários.
O entendimento neste aspecto, qual seja o da cobrança e fiscalização do ITR, somente é compreendido pela cognição dos institutos da competência e da capacidade, específicos ao caso.
Neste sedimento valer-se-á das lições de Maristela Miglioli Sabbag, abaixo:

Competência é uma forma de poder jurídico, isto é, de exercício impositivo de comportamentos e relação de autoridade regulada por normas. Enquanto poder jurídico, competência pode ser entendida, especificamente, como capacidade juridicamente estabelecida de criar normas jurídicas (ou efeitos jurídicos) por meio e de acordo com certos enunciados .

E conclui:

Diferente, pois, se mostra a competência tributária da capacidade tributária. A primeira já sabemos o que seja; a capacidade tributária, por sua vez, é exatamente esta possibilidade de se conferir a terceira pessoa, que não aquela dotada da competência tributária, a mera arrecadação administrativa do tributo. A pessoa que se encontra nessa qualidade não criou o tributo, porquanto não expediu a lei respectiva, mas foi colocado por ela nessa condição. É apenas, uma delegação da função arrecadatória e fiscalizatória, não influindo, pois, na titularidade da competência para instituir o tributo .

Observa-se então que porquanto a competência tributária sobre o ITR seja exclusiva da União, sendo este ente federativo o único a poder legislar, instituir ou alterar a forma de tributação sobre a terra, foi delegada aos municípios a competência tributária para fiscalizar e arrecadar o Imposto.
Outro ponto de destaque do ITR, para que se chegue aos capítulos posteriores ao entendimento do problema levantado na parte introdutória da presente monografia, é o caráter de extrafiscalidade do tributo. Para o entendimento do conceito de extrafiscalidade, aplicável ao ITR, há que se entender primeiro o caráter de fiscalidade, como nos ensinamentos de Luciana Tomiko Fujimoto Pelegrini, abaixo:

Para a exata compreensão do conceito de extrafiscalidade, é necessária, primeiramente, a compreensão primária da fiscalidade. A fiscalidade é o uso de instrumentos jurídicos que permitem que o tributo seja cobrado com finalidade meramente arrecadatória, acobertando grande parte dos tributos brasileiros. É natural que os tributos sejam fiscais na medida em que leva recursos para o patrimônio estatal. Entretanto, é possível que tributos saiam de nosso patrimônio e penetrem no patrimônio estatal e tenha uma finalidade extra, regulatória. Assim aproxima-se ao conceito de extrafiscalidade. Desta feita, a extrafiscalidade é o uso de instrumentos jurídicos com a finalidade diversa da arrecadatória, com o objetivo de corrigir situações anômalas no mercado, na economia. A extrafiscalidade vai além do fenômeno meramente arrecadatório e passa a ter a roupagem de regulação do mercado e da mercadoria. À primeira vista talvez isto não nos chame atenção. Mas este tema possui grande força e importância. A extrafiscalidade pode trazer a justiça fiscal. A carga tributária, de fato, é excessiva e retórica. Mas às vezes o fenômeno extrafiscal pode trazer uma nova conceituação .

E salienta:

Por todo o exposto, pode-se concluir, previamente, que há possibilidade de ser aplicado o princípio da extrafiscalidade sobre o ITR. com isso, efeitos proveitosos serão produzidos aos sujeitos passivos (aquele que detém qualquer direito de gozo, relativamente ao bem imóvel rural, seja pleno ou limitado), ao passo que as alíquotas serão baseadas conforme a improdutividade / produtividade da terra e também, preservação ou não do meio ambiente. Ao contrário, não se aplicando este princípio sobre o imposto em questão, estes efeitos positivos não seriam suscitados, pois o tributo teria função meramente arrecadatória .

É salutar a compreensão pela visão da renomada autora, que sem o caráter extrafiscal empregado sobre o ITR, isto é, caso o tributo tivesse função meramente arrecadatória, não haveriam sido esculpidas no imposto as hoje vigentes alíquotas progressivas, porquanto, não se cumprindo com o principio constitucional da função social da propriedade territorial rural, tampouco com os fins destinados à Reforma Agrária e a Política Agrícola.
Assim, neste ponto já se faz por ora delimitar a conceituação teórica do ITR, após toda cognição buscada na melhor doutrina sobre o tema. Logo, define-se o Imposto Territorial Rural como sendo um Imposto Federal, de competência legislativa exclusiva da União, aplicado sobre a utilização e gozo parcial ou total da terra, cuja capacidade fiscalizatória e arrecadatória é legalmente corroborada a uma Autarquia Federal.
O INCRA, mas que, por fatores de incentivo à municipalidade foi delegado constitucionalmente aos municípios, observando ainda, o caráter de extrafiscalidade do imposto, não sendo este, portanto, de caráter meramente arrecadatório, influenciando assim, não só nos fitos de Reforma Agrária e Política Agrícola, mas contribuindo para que haja um meio ambiente que atinja o fulcro de equilíbrio econômico e social, vedando através da imposição de alíquotas progressivas a observância de minifúndios e latifúndios, ou, em outras palavras, de terras improdutivas e ociosas.

1.2 Aspectos Práticos do ITR

Passando para os aspectos pertinentes ao estudo prático do ITR, tratar-se-á das atribuições de arrecadação do tributo com o fito prático da incidência das chamadas alíquotas progressivas, assim como a demonstração de quanto é o valor estabelecido pelas alíquotas de acordo com parâmetros diferenciais entre a área do imóvel e sua utilização, através do cálculo baseado no VTN (Valor da Terra Nua).

No que pese a conceituação de ITR, disserta Francysco Pablo Feitosa Gonçalves:

Com base neste e em outros dispositivos legais podemos conceituar ITR como o imposto sobre a propriedade territorial e rural, de competência privativa da União, de incidência anual, específica sobre a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem, imóvel por natureza, localizado na zona rural; está tal imposto sujeito aos princípios constitucionais tributários e às limitações impostas ao poder de tributar. Analisaremos, pois, tal conceito: a) Se é imposto; é "tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte", nos termos do art. 16 do CTN. b) De competência privativa da União; vale dizer que apenas a União Federal pode instituí-lo mediante lei (isto será melhor detalhado a posteriori). c) De incidência anual; a incidência anual do ITR se dá no primeiro dia de janeiro de cada ano; d) Incidência específica sobre a propriedade, o domínio útil ou a posse; significa que embora seja denominado Imposto "sobre a propriedade rural" (art. 153, VI, da CF/1988; art. 29 do CTN; art. 1° da Lei 9.393/1996) este tributo na verdade incide também sobre a posse ou o domínio útil, assim, em regra, deverá pagar ITR quem em 1° de janeiro for proprietário, possuidor ou detiver o domínio útil de imóvel localizado na zona rural. e) Incidência específica sobre a propriedade localizada na zona rural; obviamente tal imposto não poderia incidir sobre imóvel localizado na zona urbana, sob pena de invasão da Competência Tributária Municipal, o que acarretaria bitributação e inconstitucionalidade da cobrança. f) O ITR submete-se aos princípios e limitações constitucionais do poder de tributar; Aqui, valendo todos os princípios gerais e ainda aqueles que o constituinte fez questão de frisar como norteadores do ITR .

A competência e a capacidade de tributar o ITR são feitas por entes distintos, uma vez que este ocorre no âmbito federal, já aquele é destinado ao município fazer a arrecadação. Existe uma discussão acerca da reforma tributária, onde os municípios passariam a ter a competência e capacidade para arrecadar, tendo em vista que a maioria dos municípios tem como base econômica a agricultura e a pecuária, ou seja, o fator rural é essencial para manutenção da economia dos municípios.
Dessa forma, como a competência de tributar é delegada pela Constituição Federal de 1988, qualquer modificação poderá ser feita apenas mediante emenda constitucional, mas é perfeitamente possível e plausível tal alteração, cada município instituindo o ITR conforme a situação econômica da região.

Quase sempre (note-se: não sempre nem necessariamente), tal regra jurídica tributaria será inválida por antinomia, principalmente no Estado organizado sob regime federativo, pois, quer no primeiro exemplo (União Federal, criando regra jurídica que impõe ao Município a posição de sujeito ativo), quer no segundo exemplo (Município, criando regra jurídica tributária quem impõe à União Federal a posição de sujeito ativo), haverá uma possível inversão na concatenação lógico-jurídica que presidiu o movimento de expansão do Estado-Realidade-Natural." Convém notar que é exatamente o que se dá com o ITR ? nos termos do art. 153, §4°, III ? já que foi atribuído às municipalidades pátrias que assim optarem a Capacidade fiscalizá-lo e cobrá-lo, com a ressalva de que isto não poderá implicar redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal. Assim foi facultado aos municípios a aptidão de exercer a Capacidade tributária do ITR, e como incentivo, os Municípios que optarem por fazê-lo fazem jus à totalidade do que for arrecadado sobre as propriedades rurais em seu território, nos termos do art. 158, II, da CF/1988 .

E ainda salienta Francysco Pablo Feitosa Gonçalves:

O mesmo autor ainda observa "Como o sistema tributário concede aos Municípios impostos cuja base de tributação mais expressiva é urbana, este fato faz com que haja uma elevada concentração das receitas tributárias nos Municípios de maior porte demográfico, que são os que apresentam a maior parcela de população urbana do País. Isto faz com que os Municípios de pequeno porte até mesmo os menores dentre aqueles de médio porte demográfico tenham uma baixa participação quanto à receita tributária, ou seja, que em aproximadamente 71,8% dos Municípios do País a participação deste conjunto de Municípios não ultrapasse os 4,9% da sua receita orçamentária. Concordamos em parte com o autor, seus argumentos seriam insofismáveis se não fosse o fato de que as municipalidades pátrias têm a sua disposição a capacidade de fiscalizar e arrecadar o ITR, podendo assim auferir 100% da renda do mesmo. Logo, o argumento de que a Competência Tributária Municipal seria falha ? apenas ? porque os Municípios detêm a competência para a instituição de tributos essencialmente urbanos revela-se falho justamente por conta do ITR. Mas estaríamos distorcendo o entendimento do doutrinador se não deixássemos claro que o mesmo não aponta este como o único problema da tributação municipal, em verdade, ele o enfatiza ? e com razão ? mas faz ? questão de demonstrar que outros problemas, como a má distribuição de renda são igualmente, ou mais responsáveis pela má arrecadação municipal .

Mesmo que se tenha levantado a hipótese de alterar a competência do ente político sobre o ITR, os doutrinadores são pacíficos em relação à permanência da competência em favor da União, sobretudo na visão de Feitosa Gonçalves, abaixo:

Sobre a competência para a instituição do ITR, o ideal, no fim das contas, é a permanência do ITR na esfera dos tributos da União, como também entende Fábio Fanucchi (apud Campos, 1993, p.38); "é possível que atual competência impositiva do ITR é muito mais lógica que a das anteriores Constituições. Exercendo a imposição, a União conseguiu vários resultados positivos: o aumento da arrecadação proporcionada pelo tributo; a uniformidade nacional do tratamento tributário das propriedades rurais; o auxilio do imposto no desenvolvimento de uma política agrária global, desde que os demais itens da legislação tributária já pertenciam à União; anulação das pressões regionais e locais contra as elevações dos impostos, quase sempre estruturadas sobre bases eleitoreiras potentes, representada pela influência dos grandes proprietários de terras; combate efetivo aos economicamente contraproducentes latifúndios e minifúndios; desenvolvimento de uma política de incentivos tributários interligados com outros impostos, etc. .

E ainda acerca da capacidade de arrecadar o ITR, nos ensinamentos de J. E. Alvim:
Tem-se mostrado bastante controvertida a legitimação para promover a cobrança do Imposto Territorial Rural (ITR), sustentando uns que essa competência é do INCRA, enquanto outros sustentam ser da Procuradoria da Fazenda Nacional, havendo arestros prol e contra esses entendimentos. Até o advento da atual Constituição, o INCRA detinha poderes para promover a apuração, lançamento e a inscrição, na dívida ativa União, do Imposto Territorial Rural (ITR), tudo com base nas Leis 4.504/64 (Estatuto da Terra) e 6.746/79 .

Superando a discussão de quem teria a atribuição de arrecadar o ITR se faz necessário compreender os conceitos de extrafiscalidade e fiscalidade. O primeiro não possui apenas uma atribuição com fins arrecadatório, o que não ocorre com a fiscalidade, que está limitada em apenas arrecadar.
A extrafiscalidade do ITR cumpre na íntegra sua função que é influenciar no comportamento dos entes econômicos, ao ponto que incentiva o que vem a ser bom para a economia em contraprestação para o contribuinte, ao mesmo tempo desestimulando futuros prejuízos a fator econômico. Assim sendo, o caráter extrafiscal do ITR faz com que de forma direta ou indireta seja cumprida a função social da terra no meio rural.
Eduardo Sabbag, mais uma vez, brinda com seus comentários, abaixo:

Em virtude de sua nítida função extrafiscal, o ITR sempre foi imposto vocacionado a se revestir da condição de veículo auxiliar do disciplinamento estatal da propriedade rural. É considerado um importante instrumento de política agrária, nessa medida, de combate aos latifúndios improdutivos, fomentando, assim, a reforma agrária e a conseqüente redistribuição de terras no país. O que se quer com tal exação não são proprietários, mas proprietários assíduos e produtivos, em prol da nação .

E concretiza o autor:

Assim no que tange ao ITR, os objetivos extrafiscais almejados são: desestimular os que exercem o direito de propriedade sem observância da função social e econômica da terra; estimular a racionalização da atividade agropecuária dentro dos princípios de conservação dos recursos naturais renováveis; proporcionar recursos à União, aos Estados e Municípios para financiar os projetos de reforma agrária; aperfeiçoar os sistemas de controle de arrecadação dos impostos, enfim, finalidade estas que procura o princípio da extrafiscalidade acoplar ao ITR .

Não obstante o raciocínio da extrafiscalidade no ITR, são as alíquotas progressivas que visam desestimular a incidência de propriedades rurais que estão em situação de improdutividade. Sob este esteio, Sabbag assevera com o respaldo legal:

A emenda Constitucional n. 42/2003 trouxe a lume a progressividade do ITR. O art. 153, § 4°, I, II e III, da CF, preconiza que será o ITR um imposto progressivo, variando suas alíquotas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas. Ademais, não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel. Por fim, ressalte-se que será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal (art. 153, § 4°, III, CF). Nesse caso, poderão os Municípios, a título de repartição de receitas tributárias, conforme o art. 158, II, CF, arrebanharem o percentual de 100% (cem por cento) do produto de arrecadação do ITR .

Deve ser feito um paralelo entre o art. 153, § 4°, I, que estabelece que será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas, e o art. 5°, XXIII, ambos da Constituição Federal que dispõe que a propriedade atenderá sua função social.
A terra e por conseqüência a propriedade, que antes era tida como absoluta, garantia pétrea constitucional, entretanto em um caráter extremamente privado, outrora se coloca sob a observância do Estado Intervencionista, devendo, contudo, atender seus anseios e a função social.
A IN de nº. 256 de 11 de dezembro de 2002, do INCRA, em seu artigo 34 prevê as denominadas alíquotas progressivas, que incidirá sobre a propriedade que não está atendendo a função social, ou seja, é considerada improdutiva para a sociedade. Antonino Moura Borges assevera neste sentido que:

A tributação é uma forma de onerar a propriedade improdutiva, desestimulando os latifúndios ou a propriedade ociosa. Geralmente isto é feito através do controle cadastral existente no INCRA e através dele o lançamento do Imposto Territorial Rural. O tributo é um instrumento eficaz de desestímulo da propriedade ociosa, como também, da especulação imobiliária no setor rural brasileiro. Hoje a propriedade tem uma função constitucional imposta em duplo aspecto, os quais são: a) o aspecto econômico da produtividade; b) o aspecto social de preservar os recursos naturais. Ambos considerados na ótica da Lei, significam cumprir a função social da terra .

A tabela abaixo apresenta a incidência do tributo conforme o grau de utilização da área:

Área total do imóvel
(em hectares) Grau de Utilização - GU (EM %)
Maior que
80 Maior que
65 até 80 Maior que
50 até 65 Maior que
30 até 50 Até 30
Até 50 0,03 0,20 0,40 0,70 1,00
Maior que 50 até 200 0,07 0,40 0,80 1,40 2,00
Maior que 200 até 500 0,10 0,60 1,30 2,30 3,30
Maior que 500 até 1.000 0,15 0,85 1,90 3,30 4,70
Maior que 1.000 até 5.000 0,30 1,60 3,40 6,00 8,60
Acima de 5.000 0,45 3,00 6,40 12,00 20,00

A interpretação da tabela progressiva das alíquotas funciona da seguinte forma: é delimitada a área em hectares onde varia de 50 (cinqüenta) até 5.000 (cinco mil) hectares, sendo que o grau de utilização (GU) estabelece uma utilização de 30% (trinta por cento) a 80% (oitenta por cento), e o valor a ser cobrado em moeda corrente está entre R$ 0,03 (três centavos) a R$ 20,00 (vinte reais). Eduardo Sabbag faz a dissertação pertinente abaixo:

As alíquotas do ITR são proporcionais e progressivas, segundo o grau de utilização da área rural (caráter extrafiscal ? art.153, §4°, CF). A fixação da alíquota é feita segundo critérios do art.34 do Decreto n. 4.382/2002. É importante notar, consoante a demonstração inserta no quadro anterior, que há possibilidade de nítido confisco caso o imóvel acima de 5.000 hectares não alcance o limite de 30% de utilização. Conclui-se que, inexoravelmente, o imóvel será confiscado no prazo de cinco anos (5 x 20% = 100%). Ressalte-se, todavia, que, mesmo considerando o desestímulo à manutenção de propriedades improdutivas, a tributação elevada da propriedade rural não poderá ter caráter confiscatório, sob pena de violar o princípio constitucional que veda o tributo com efeito de confisco (art. 150, IV, CF). No concernente à progressividade do ITR, repise-se que tal gravame conter alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas, pois é imposto com finalidade regulatória da economia .

Nas áreas de até 50 (cinqüenta) hectares utilizando uma área maior que 80% (oitenta por cento) a cobrança de ITR será de R$0,03 (três centavos), no caso da utilização mínima que incide na utilização de até 30% (trinta por cento) da área a cobrança será R$1,00 (um real).
Quando a área compreendida estiver entre 50 (cinqüenta) até 200 (duzentos) hectares a utilização de até 30% (trinta por cento) será cobrado o valor máximo de R$2,00 (dois reais), em sentido contrário caso a utilização seja maior como de 80% (oitenta por cento) a cobrança do ITR será de R$ 0,07 (sete centavos).
A área que estiver entre 200 (duzentos) até 500 (quinhentos) hectares será cobrado o maior valor que corresponde a R$ 3,30 (três reais e trinta centavos) quando a área utilizada for de até 30% (trinta por cento), sendo que o menor valor de R$ 0,10 (dez centavos) equivale a maior utilização que é de 80% (oitenta por cento).
No caso da área total do imóvel corresponder de 500 (quinhentos) até 1.000 (mil) hectares e a utilização for de até 30% (trinta por cento) a cobrança será de R$4,70 (quatro reais e setenta centavos), e quando a utilização for maior que 80% (oitenta por cento) será cobrado R$ 0,15 (quinze centavos).
Sendo a área total do imóvel de 1.000 (mil) até 5.000 (cinco mil) hectares e sua utilização de até 30% (trinta por cento) o valor do ITR será de R$ 8,60 (oito reais e sessenta centavos) quando a utilização for maior do que 80% (oitenta por cento) o tributo a ser cobrado corresponde a R$ 0,30 (trinta centavos).
Por último nas áreas superiores a 5.000 (cinco mil) hectares sendo utilizada até 30% (trinta por cento) da área a tributação será de R$ 20,00 (vinte reais), por outro norte, utilizando mais do que 80% (oitenta por cento) da área incidirá o valor de R$ 0,45 (quarenta e cinco centavos).
Neste aspecto, quanto maior for à utilização da área menor será a cobrança do ITR, isso se deve ao fato de estimular a utilização da propriedade rural tendo como conseqüência o aumento da economia.
A base de cálculo do ITR é através do VTN (Valor da Terra Nua), tendo em vista não considera as benfeitorias realizadas na propriedade, ou seja, é vislumbrado o valor real da terra sem levar em consideração o que foi realizado.
Conforme estabelece a IN de nº. 256, em seu art. 10, § 1°, em seus incisos, que para efeitos de apuração do ITR, considerar-se-à, o VTN, excluindo os valores relativos a construções, instalações e benfeitorias; culturas permanentes e temporárias; pastagens cultivadas e melhoradas; florestas plantadas.
Ademais, segundo o art. 33 da supracitada instrução normativa, o Valor da Terra Nua Tributável, é obtido mediante a multiplicação do VTN pelo quociente entre a área tributável, definida no art. 9° da mesma instrução normativa, e a área total do imóvel rural.

Segundoo CTN, em seu artigo 30, a base de cálculo do imposto é o valor fundiário,que por sua vez é o valor da Terra Nua.Para fins de compreensão do conceito de Terra Nua, que, pela falta de definição específica do atual art. 79 do Código Civil brasileiro, bem comodiante da permissão dada pelo CTN, se utiliza da combinação esculpida no art.43 do antigo Código Civil de 1916 de conceito de imóveis "por natureza",sendo considerado, portanto, como imóvel por si próprio o bem por naturezaou acessão natural, compreendendo o solo com sua superfície e a respectiva mata nativa, floresta natural e pastagem natural .

E ainda é obrigação do contribuinte informar o Valor da Terra Nua, pois é o que depreende abaixo:

Ainda permanece o entendimento de que quem deve informar o VTN é o próprio contribuinte, por força do art. o art.8º, da Lei do ITR. Estedispositivo dá a determinação para que o contribuinte entregueobrigatoriamente, em cada ano, o Documento de Informação e Apuração do ITR ? DIAT, correspondente a cada imóvel, observadas data e condições fixadas pela Secretaria da Receita Federal, declarando no DIAT, o Valor da Terra Nua ? VTN, correspondente ao imóvel. Portanto, é ônus do contribuinte informar ao fiscoo valor da TerraNua, que normalmente é feito por meio de um laudo pericial por profissional habilitado. Essa prática além de ser legal, é também adotada pela Receita Federal do Brasil, que faz a apuração para lançamento da dívida ativa e a confrontação de dados que esta possui por meio do Sistema de Preços de Terras ? SPT, introduzido pela MP 2.166-67/2001 com as informações prestadas do contribuinte do imposto. Por este motivo é preciso alimentar este sistema com base no valor de mercado mais preciso encontrado em cada território do Brasil, que atualmente será informado pelos Municípios, pelo menos para aqueles que realizaram o convênio, por meio de valores aproximados apurados pelo ente público municipal em seu Município. Neste sentido, surge a necessidade de informar a Receita Federal dos valores referentes ao VTN .

Assim sendo, o ITR tem como base de calculo o Valor da Terra Nua, sendo que as alíquotas de progressão são aplicadas de forma a beneficiar aqueles que fazem o uso da terra, ou seja, quanto mais se utiliza a terra menos se paga imposto em contrapartida incide um aumento significativo na economia.
Dessa forma, o presente capítulo demonstrou os aspectos práticos da cobrança do ITR, bem como suas alíquotas de progressão. No próximo capítulo será abordada a real finalidade de se cobrar menos imposto daqueles que utilizam mais a terra.

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Autor: Danilo Peixoto Moncaio


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