A Marca Água De Cheiro Como Representação Cultural



 

Centro Universitário de Belo Horizonte

Pró-reitoria de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão

Especialização "lato sensu" em Marketing e Comunicação

A marca Água de Cheiro como representação cultural[1]

Mônica Valeska Aleixo Benetti[2]

Ângela Abi-Sáber[3]

Resumo

Este artigo traz no seu cerne a análise da marca Água de Cheiro dentro da tríade, representação cultural, memória e imaginário, através de seu posicionamento como a marca que vende sonhos. Dentro desta tríade, a imagem está carregada de significados, que nos remetem à apreensão de sentidos construídos, a partir de valores de uma dada realidade sócio-cultural. Baseando-se no fator cultural, pretendeu-se ampliar a visão do marketing/comunicação no que se refere à construção de novas ferramentas estratégicas de pesquisa e planejamento, demonstrando, desta forma a importância do diálogo entre estas áreas com a história e a antropologia. Este trabalho foi desenvolvido tendo como alicerce metodológico o conceito de representação, categoria central da História Cultural.

Palavras-chave

Água de Cheiro; Marketing; Cultura; História; Marca e Representação


1 Introdução

Estamos inseridos em um contexto globalizado e extremamente competitivo no que se refere ao mercado de consumo. As marcas tornaram-se um diferencial dentro desta realidade. As estratégias desenvolvidas por elas na busca de se posicionarem de maneira eficaz no inconsciente do consumidor é que irá definir a preponderância de uma em relação à outra, na mente desse. Estas estratégias, no que concerne à competitividade acirrada, se bem fundamentadas por uma compreensão cultural do seu público-alvo, delineia um processo de interação e de identificação entre a marca e este: a apreensão cultural possibilita a marca suscitar o imaginário e construir uma relação hibrida entre a própria e o seu nicho de mercado, propiciando que ambos se tornem um só.

Compreender os valores ritualizados pelo público almejado proporcionará a marca incorporar estes valores em sua linha de produtos e se tornar uma representação cultural.

A história cultural concebe a cultura como um conjunto de significados partilhados e construídos pelos homens para explicar o mundo. O produto estando agregado de atributos simbólicos é uma representação cultural, pois liga à memória as imagens do inconsciente.

Apreender a marca como uma representação cultural é possibilitar a construção de um caminho inteligente no que tange à criação de ferramentas estratégicas de marketing. Demonstrar a importância da interação entre o Marketing/Comunicação, e a História e a Antropologia, não se restringindo a satisfazer e a atender as necessidades do cliente, mas, acima de tudo, se inserir no inconsciente cultural desse cliente.

Partindo destes pressupostos básicos, é que neste artigo foi possível analisar primeiramente o perfume como uma representação cultural, no decorrer de sua história, perpassando pela Antiguidade, Europa e pelo Brasil. No segundo momento, a marca Água de Cheiro é analisada através de sua linha de perfumes feminino (amadeirado, floral frutal e cítrico) como uma representação cultural: ela representa os valores presentes no inconsciente (imaginário) feminino, como a sensualidade, o prazer, a vaidade, a sedução, a jovialidade, o bem estar e o glamour, ou seja, associa estes valores ao seu produto. A conclusão a que se chega é a de que a Água de Cheiro se torna um marco, no que tange aos aspectos culturais.

2HISTÓRIA DO PERFUME

2.1Na Antiguidade

Delinear sobre a história do perfume é poder demonstrar como ele está intimamente ligado às nuances culturais, simbolizando valores e legitimando práticas sociais. O perfume é inerente aos sentidos, inspira o desejo, alimenta o narcisismo, suscita o imaginário e legitima valores. È a vontade de auto-expressão, a construção do sonho e do desejo, que caminham juntos no que tange ao olfato.

No histórico da perfumaria, podemos observar que desde a Antiguidade até os dias atuais, as combinações aromáticas no que se refere ao olfato, as criações e lançamentos de novos perfumes, estão em consonância com os valores culturais. Mudam-se estes e elaboram-se novas perfumarias com cores e designers que incorporem estas mudanças. É dentro desta premissa básica que os perfumes se inserem na tríade: ícone, índice e símbolo, ou seja, uma representação cultural que alimenta o imaginário e legaliza valores e comportamentos sociais.

Desde a antiguidade, havia uma crença de que o nariz é o órgão dos sentidos que está mais próximo do cérebro, daí a origem do sentimento. O olfato é a fonte de ligação ao psíquico (imaginário) e ao sentimento, remete a lugares, momentos e fatos, propiciando rituais que ensejam e justificam novas concepções.

Para Rosseau (filosofo francês, séc. XVIII) o olfato imprime sentido na imaginação e fomenta o desejo, ele atinge com mais profundidade a mente dos homens, do que a audição ou a visão (CORBIN, 1987).

A palavra "perfume" tem sua origem nos cheiros exalados pela queima de plantas, per (através) fumum (fumaça). Acreditava-se na antiguidade que por meio da fumaça exalada pela queima de incensos se atingiria o mundo divino. Inicialmente, os aromas eram usados em rituais religiosos, ligados ao sagrado, depois eles se inseriram no contexto profano, mas não perderam a conotação sagrada. No decorrer da história da perfumaria, associado ao aroma das flores, simboliza a ação divina no contexto humano, ou seja, inalar um perfume é estar em congruência com a natureza e o cosmos.

A história da perfumaria remonta primeiramente na parte oriental da Antiguidade, especificamente no Egito. A partir do ano 3000 a.C, com a unificação sócio política e religiosa (a fusão do Alto e do Baixo Egito) a era dos clãs perde a sua vitalidade cedendo lugar para uma nova realidade: um poder centralizado na figura do faraó, que passa a ser a personificação do Divino, a representação dos Deuses egípcios na terra. A crença destes, na vida, após a morte, delineava os rituais religiosos, proporcionando aos aromas um papel de extrema importância na ligação do humano com o cosmos. Os templos egípcios estão repletos de ervas, incensos e especiarias. Estes eram queimados, acreditando-se que, através da fumaça aromática, as orações chegariam mais rápido aos deuses. Toda a sociedade egípcia era permeada pela crença religiosa, o Divino regia o humano, o que possibilitou estabelecer um elo entre a natureza e este, para se atingir o cosmos. O próprio ritual de mumificação estava impregnado de fragrâncias, incorporando os valores presentes nesta sociedade. No ano de 2900 a.C o processo de embalsamamento precedia da seguinte forma: enfaixava-se o cadáver com ataduras de linho impregnadas com resina. Por volta de 2600 a.C a prática da mumificação atingiu o seu auge, através de uma técnica, na qual, se fazia um corte no abdome do faraó, retirando seus órgãos internos e colocando-os num vaso com uma solução salina de natrão. Ao secar-se a cavidade corporal, ela era preenchida com linho embebido em resina (HISTÓRIA em revista, 1991). Segundo Aschar (2001, p.21):

Para os egípcios, o perfume era o néctar dos deuses, e com ele a alma dos mortos podia ser tocada. Acreditando na eternidade reservavam as fragrâncias não só ao seu variado panteão, mas também aos mortos. Os incríveis resultados dos procedimentos de mumificação, visando eternidade, são admirados em pleno século XXI.

Cleópatra (69-30 a.C) fomentava rituais próprios ligados à perfumaria, com o intuito de embelezar-se e seduzir. Ela esperava Marco Antônio numa cama coberta de pétalas de rosas. Até as velas de seu barco estavam impregnadas com o aroma de rosas. Ela também ficava admirando sua beleza recostada no trono de seu barco

que era envolto em nuvens de incenso. Antes de cometer o suicídio, ela se banhou com diversas ervas. Cleópatra tornou-se símbolo da cultura egípcia da antiguidade no que tange à arte da perfumaria, tanto no contexto religioso, quanto no político e social.

Os egípcios expandiram os seus conhecimentos de perfumaria para os assírios, babilônios, caldeus, hebreus, persas, fenícios e gregos. Cada uma dessas culturas absorveu estes conhecimentos adaptando-os a sua realidade local, desenvolvendo fragrâncias próprias. Nestas sociedades, como no Egito, através dos ritos sagrados, plantas, resinas aromáticas como a mirra, o incenso, o benjoim, a casca de canela e o cedro do Líbano, além do sândalo, do calamo e do vertiver, esses elementos eram queimados nos altares dos templos.

A mitologia grega está repleta de perfumarias, dentro da qual, as deusas recorriam aos perfumes para atrair os deuses e os homens. De forma peculiar, a Deusa mitológica Afrodite simbolizava a importância da perfumaria na cultura grega: era representada seminua de maneira sensual dentro de enorme concha, com os braços sobre a cabeça, banhada por óleos. Esta representação visava ascender o desejo sexual na sociedade grega. Segundo Ashcar (2001, p.33):"Assim, aquela que ama o sexo representa o amor – não o sublimado, mas o carnal. Daí a denominação afrodisíacos imputada a poções capazes de acender o desejo".

Os gregos eram tão fascinados com os aromas que os usavam até nas comidas, pétalas de rosas moídas e vinhos aromatizados com mirra, essências de flores e mel (ASHCAR, 2001).

A conquista da Grécia pelos romanos fez com que eles se deparassem com uma rica cultura e a incorporassem ao seu contexto sócio-cultural, muitos valores presentes na sociedade grega, incluindo aqueles associados à perfumaria. Este fator foi primordial para que no século III a.C Roma torna-se a capital mundial do banho, um ritual extremamente luxuoso e peculiar, inerente à cultura romana.

Os romanos eram grandes consumidores de aromas, o próprio imperador Nero durante o enterro de sua mulher Pompéia ordena a ornamentação deste com uma quantidade exorbitante de incenso. O uso do perfume no império romano vai além dos rituais sagrados inerentes aos templos e aos funerais: convidados, escravos, amantes, cavalos, cachorros e navios eram borrifados com águas aromáticas: rosas, musgo de carvalho, canela, aloe e nardo. A deusa romana Vênus simbolizava a inerência entre o profano e o divino com a perfumaria, a sua lenda faz referências ao uso de fragrâncias por ela com o intuito de atrair o seu amado Eros e também o amor (ASHCAR, 2001). Os próprios romanos desenvolveram o cachimbo de sopro.

O cheiro e os aromas estão profundamente ligados ao sagrado e ao profano, são elos entre o humano e o divino, o real e o imaginário, reforçando valores através dos ritos e legitima comportamentos, se posicionando como representação cultural.

2.2Na Europa

Durante a Alta Idade Média caracterizada por um período longo de invasões e novas organizações sociais, a perfumaria esteve adormecida, somente resquícios do auge da medicina e farmácia da Antiguidade permaneceram. Esta dormência encontra explicação na perseguição desenfreada da Igreja cristã aos perfumes e aos incensos, pois ela associava a maioria destes à idolatria, à feitiçaria e à luxuria. Os governantes, em vários momentos, se uniram à Igreja para inviabilizar o uso de aromas. Uma lei proferida pelo rei castelhano D. Afonso X, o sábio, reforça esta associação:

[...] Proibimos que se tenha a ousadia de fazer imagens de cera, de metal, de outros feitiços para enamorar os homens com as mulheres, nem para separar o amor que houver entre eles. Proibimos também que se tenha a ousadia de dar ervas ou poções a algum homem ou mulher, por motivo de enamoramento, porque acontece muitas vezes que essas poções causam a morte dos homens que a bebem, provocam grandes enfermidades, de que ficam cegos para sempre. PAIS (1992, p.30).

Entre os séculos XI e XV determinados acontecimentos trouxeram mudanças significativas no quadro estrutural da sociedade feudal. A partir destes eventos, o ocidente retorna a sua conexão com o oriente. A parte ocidental até então, adormecida, começa a se reascender no que tange à medicina, perfumaria, artes e filosofia. Os árabes dominavam o comércio oriental e suas respectivas rotas, preservaram conhecimentos oriundos das diversas culturas da antiguidade e se fundiram a elas: egípcios, gregos, bizantinos, hebreus, hindus, sírios, béricos e romanos. A água de rosas surgiu com a invenção do primeiro alambique pelo mouro Avicena, possibilitando isolar o perfume de pétalas de rosas em óleo. Produzindo a água de rosas. O domínio exercido pelos árabes em relação às especiarias e às fragrâncias, influenciará em muito o ocidente, tanto que a incursão das cruzadas possibilita aos mercadores venezianos (que cobiçavam as rotas comercias nas mãos dos árabes), instalarem-se em Constantinopla. Os seus navios trazem sedas, especiarias aromáticas, ungüentos fragrantes e essências variadas (ASHCAR, 2001).

No decorrer da peste que assolava a Europa, surge à necessidade de substâncias que pudessem combater a epidemia, levando aos italianos a aperfeiçoarem a destilação do álcool, o que viabilizou a criação de águas espirituosas, primeiramente visando o uso higiênico e terapêutico. De acordo com Aschar (2001, p.41)

Acrescido de alecrim e resinas, o extrato alcoólico era administrado por via oral com propósitos medicinais. Com o desenvolvimento científico, o extrato reinoso foi retirado, resultando no alecrim destilado. Surgia então em 1370, aquela que seria a precursora da água-de-colônia, inspirada na beleza da rainha da Hungria: a Água da Rainha da Hungria, o primeiro perfume batizado e o primeiro preparado em base alcoólica. O segundo perfume nomeado, criado na mesma década num convento de carmelitas na França, Água das carmelitas, levava Angélica, melissa e outros óleos herbáceos. O terceiro recebeu o nome de Água de lavanda.

Em 1533, a florentina Catarina de Médicis muda para a corte francesa e leva o seu perfumista Renato Bravio, influência de peso que possibilitará o desenvolvimento de muitas receitas e a fundação da primeira butique de perfumes em Paris (1612) o que impulsionou a produção e a comercialização de itens aromáticos. A cidade Grasse na Provance (França) se tornou um próspero centro de produção de matérias-primas naturais, devido ao alto consumo de perfumes pela corte francesa, este diferencial propiciou a arte dos mestres perfumistas. Estes desenvolveram luvas que exalavam néroli, conhecido como óleo de flor de laranjeira.

Em meados de 1700 o italiano Jean-Marie Farina registrou um produto com o nome Água de colônia (Kolnisch Wasser), produzido por essências italianas como: néroli, bergamota, lavanda e alecrim, diluídos em álcool neutro. Esta colônia mais tarde irá se tornar a favorita de Napoleão. Josefina, sua amante, adorava aromas marcantes, como o almíscar e o patchoulli e ele os refrescantes. Enquanto ela impregnava os sue quarto de almíscar Napoleão se despejava um frasco de Água de colônia sobre a cabeça.

No ano de 1790, Mulhens cria a Kolnisch Wasser 4711. No decorrer da guerra de sete anos, quando Napoleão se hospeda na cidade alemã de Colônia ele passa a ser o divulgador e usuário fiel deste perfume.

Os apertadíssimos espartilhos usados na época geralmente levavam as mulheres ao desmaio, para acordá-las, fazia-se uso do método de inalação de sais. Visando amenizar esse sofrimento de aperto e calor, a maioria recorria às românticas colônias florais.

A partir da segunda metade do século XVIII, o emprego de perfumes como o almíscar, o âmbar e a zibeta sofrem uma queda no conceito de alguns perfumistas franceses e pela medicina da época. Estes perfumes passam a ser associados aos órgãos genitais, recebendo denominações como, perfumes animais. Inicia-se então a exaltação de odores mais delicados, que são inseridos nos rituais de higiene corporal, como as Águas de Cheiro tiradas de flores primaveris e os óleos essenciais. Segundo Corbin (1987, p.101):

Na corte de Luís XV, a etiqueta prescreve o uso de um perfume diferente a cada dia. Ao grande sucesso da Água de rosas, acrescentam-se os da violeta, do tomilho e, sobretudo, da lavanda e do alecrim. O odor da lavanda é, entre todos os odores aquele a que melhor se acomodam todas as pessoas, em geral. Por volta de 1760, lançam-se as chamadas águas de marechalas e da duquesa, moda que sanciona a nova sensibilidade.

È importante ressaltar que a preferência pelos óleos essenciais e pelas águas de cheiro em detrimento do almíscar, do âmbar e da zibeta, são formas da aristocracia tentar se diferenciar do restante da população. Estes três perfumes são associados à primitividade, à pobreza e aos instintos, tornam-se uma representação cultural da sociedade francesa da segunda metade do século XVIII.

A história do perfume está em consonância com as nuances culturais, tornando-se uma representação destas. No caso da França, no reinado de Luis XVI os doces florais como o Coty e o Trend são consumidos pela corte. Durante a revolução francesa, usar perfumes que não fossem os consumidos pela aristocracia, ligada à monarquia, significava ser um patriota, um revolucionário. O uso da pomada de samson estava ligado com o sentimento de patriotismo, já o uso da essência de lírio ou da Água da rainha no corpo ou no lenço era correr o risco de ir para a guilhotina.

Após a revolução, no período da reação, o perfume penetrante do moscadin passa a ser o aroma associado ao contexto sócio-político e econômico francês. Já na revolução de 1830, o sabão constitucional e o sabão dos três dias, passam a ser os símbolos olfativos.

O diretório, o consulado e o Império resgatam socialmente o uso dos perfumes fortes de origem animal, como o almíscar e o âmbar. A aristocracia imperial reascende a perfumaria francesa, as unções e os banhos perfumados de morangos, framboesas embebidos em leite e perfumes estavam em voga. Napoleão e Josefina eram consumidores desenfreados de perfumes, as sua correspondências amorosas demonstram a importância para eles dos odores nas suas relações sexuais.

Em 1853 na corte de Napoleão III os perfumes recebem uma conotação diferente dos períodos anteriores devido à indústria da perfumaria, ou seja, eles triunfam mas são consumidos não só pela aristocracia. A introdução da química, a descoberta do vaporizador e depois do hidrófero, possibilita a dissolução dos preparados na água de banho. Para Corbin (1987, p.256):

Ao longo dos decênios, a estética do olfato se banaliza; os preços módicos dos sabões perfumados, a fabricação industrial das águas de colônias, a extensão da rede de armarinhos e as distribuidoras de produtos de perfumaria aumentam o campo para a clientela. Os frascos começam a enfeitar a mesinha dos médicos e dos pequenos notários de província. Antes mesmo que o sabão de banho se democratize, a decadência social da água de colônia atestará que até mesmo o pobre entrara em guerra com o dor pútrido de suas secreções.

A primeira exposição de perfumes aconteceu em Paris no ano de 1900, o que tornou possível a industrialização. Surgiram então os pós perfumados que davam um tom de palidez nas mulheres, em congruência com valores como o romantismo presentes nessa época: inicia-se o processo de associação dos perfumes com as celebridades, como a atriz Sarah Bernardt.

A partir de 1910, moda e perfume se conectam e se interagem (permanecendo este entrelaçamento até os dias atuais), proporcionado ao perfume ser representado no cinema. Este casamento entre ambos leva ao lançamento do Chanel nº5 (1920) por Grabielle Chanel.

Na década de 30, a Europa se encontra em crise, o luxo é apresentado como solução: o estilista Jean Patou lança o Joy, um perfume envasado a mão em frasco selado com flor de ouro. Mais dois perfumes são lançados em seguida, se inserindo num processo de concorrência: o Tabu de Dana e o Scoking de elsa Schiaparelli. A Lâncome acaba lançando o Kypre e o Tropiques, com fragrâncias que remetem aos prazeres e as delicias dos trópicos. Atrizes como Marlene Dietrich, Michele Morgan, Katharine Hepburn e Carole Lombard direcionam a moda no mundo todo. Dez anos mais tarde, com a Europa e os EUA mergulhados na segunda guerra mundial, a busca pela elegância num contexto conturbado e complexo torna-se imprescindível. Perfumes como Femme, de Marcel Rocha, costureiro de estrelas de Holywood, possui um designer inspirado nas curvas de Mae West e com uma marcante fragrância. É a moda associada ao perfume, produzindo ícones, estruturando símbolos e sedimentando no inconsciente coletivo representações culturais.

Perfumes como Bandit, Vent Verd e Ma Griffe, reportam à sensibilidade e o clássico Miss Dior ao luxo e ao romantismo. Um lançamento de grande sucesso que também se insere na lista de perfumes de requinte deste período é o L'Air du Temps de Nina Ricci, um autêntico floral. A criação desses perfumes num contexto de guerra representa a busca por valores antigos, como forma de reascender o imaginário transportando-se para uma outra realidade contrária a que vigorava naquele momento.

Nos anos 50, os valores da cultura americana despontam para o mundo, como o rock' n' roll, que tem como representantes, James Dean e Elvis Presley, ou seja, a música e a rebeldia contradizendo os valores clássicos europeus, fortemente presentes. O lançamento do primeiro perfume americano representa esta mudança cultural, o Gouth Dew de Estee Lauder, que se posiciona como mais sexy do mundo. Enquanto que na Europa o romantismo e o luxo ainda estão em voga, representados na criação de perfumes românticos como o Chipre Cabochard e os florais em Diorissimo, sem contar o sofisticado e inocente L' Interdit de Andrey Hepburn.

A influência cultural americana no mundo encontra o seu auge representativo na associação da famosa atriz Marilyn Monroe com o famoso Chanel nº 5: suscita o imaginário coletivo no culto do luxo, do prazer e do sexo (ASCHAR, 2001).

Os anos 60 são marcados pelas grandes mudanças que evocam a liberdade e têm nos florais marcantes a representação destas nuances culturais: o Mme. Rochas e Calége, além do perfume Y que exala suavidade e frescor, associado com a musa Catherine Deneuve. O lançamento da minissaia, o surgimento de ídolos pop como os Beatles e os Rollings Stones e a valorização de técnicas orientais (resgata o uso de incensos no ocidente) denotam a vontade e valores da juventude.

A busca pela liberdade e individualidade feminina, marca os anos 70. Celebridades como a atriz Jane Fonda, Lauren Hu Hon, Marisa Berenson e Bo Derek, são associadas aos lançamentos de perfumes que representassem as mudanças de valores no que tange ao universo feminino. O olfato estava norteado pelos florais verdes como o Alliage, o Channel 19, O Private Cllection e o Diorella. Os perfumes Charlie e o Anais Anais foram coligados com a nova imagem feminina em voga: a mulher moderna, liberal, magra, jovem, ativa e romântica.

No início dos anos 80, o capitalismo exacerbado demonstra o seu lado negro, a ameaça do desequilíbrio ecológico passa a ser o assunto relevante no contexto mundial (ASCHAR, 2001).

O culto do corpo sarado através de exercícios e da musculação faz parte da ritualística desta década, muito bem explorada pela mídia e que tem como modelo a cantora Madonna. A busca pela individualidade, pelo consumo desenfreado, pelo sucesso profissional e pelo conforto são valores preponderantes neste período. Perfumes orientais como o Poison, o Giorgio, o Loulou e o Paris que remete à tradição, eram bastante consumidos.

Os Chipres como o Paloma Picasso, diva, Ysatys e os orientais da marca Bacheron, o Coco, o Obsession e o Sansara representam os valores culturais deste período.

A década de 90 tem como fator sócio-politico e cultural preponderante a globalização, que tem na perfumaria duas representações culturais: o unissex Ckone e o Angel (ASCHAR, 2001).

Os perfumes do novo milênio (2000) são representados por uma pluralidade de nomes associados a uma diversidade de celebridades. É a perspectiva de uma nova era que se delineia.

2.3No Brasil

A História da perfumaria no Brasil está atrelada a peculiaridades, principalmente à sua riqueza natural. Antes da chegada dos portugueses (1500), os índios já estavam bastante familiarizados com os aromas: flores, ervas e resinas faziam parte do contexto cultural das diversas tribos indígenas, presentes nas guerras, nas crenças e no amor. Toda a ritualística indígena do período do descobrimento até os dias atuais é permeada pelo olfato, tanto no que se refere à esfera divina quanta a esfera profana, ambas estão interligadas.

A água para os índios, ao contrário dos colonizadores, estava associada à garantia da saúde, enquanto que para os europeus ela estava associada à moléstia. Segundo Aschar (2001, p.93):

Muitas plantas e ervas usadas pelos indígenas como medicamentos apresentam resultados surpreendentes – o que tem motivado intensa procura dessas matérias-primas. Os índios também recorriam a "venenos" naturais para caçar, pescar e guerrear, mas é na área da saúde que seu conhecimento ancestral se destaca: chás, banhos e incensos de ervas aromáticas perfumam o Brasil de hoje, curando não só males do corpo, mas também da alma.

Os negros trazidos para o Brasil pelos portugueses, trouxeram consigo uma cultura rica que tinha no seu cerne toda uma particularidade aromática. As resinas, as ervas estavam fortemente presentes na cultura dos povos africanos: como fontes de ligação entre o humano e o cosmos, eram representações do contexto sócio-cultural das várias etnias africanas. Os hábitos de se banharem com ervas e flores associados as suas crenças (para livrar-se da influencia de espíritos negativos) influenciou profundamente a nossa cultura olfativa.

As práticas e os valores dos indígenas e dos negros estão imbricados nas nossas raízes culturais e em consonâncias com as nossas riquezas naturais.

O uso dos aromas no Brasil colonial estava impregnado de práticas e crenças religiosas, singularidade brasileira fortemente presente nos dias atuais no nosso cotidiano: recorre-se ao uso de chá, de ervas e de banhos aromáticos para a cura de males, o seu resultado positivo esta associado à fé. Essas peculiaridades hibridas delinearam a nossa cultura brasileira são representações dela. Visão reforçada por Furtado (2000, p.63): "Os remédios deviam ser aplicados com fé, pois muitas das doenças eram originadas de feitiços e da descrença". Furtado (2000, p.63)

A arte da perfumaria no Brasil veio com a corte de D.João VI, que ao fugir das tropas de Napoleão , refugia-se na colônia brasileira. A bagagem da corte portuguesa belos frascos de fragrâncias.

O costume do banho introduzido pelos escravos na Casa-grande levou os portugueses que não suportaram o calor dos trópicos com suas pesadas roupas à moda européia a se renderem ao banho, transformando-o em hábito.

A instalação da corte portuguesa no Brasil (1808) engendrou uma nova dinâmica na colônia, primeiro transformando-a em sede do governo monárquico e segundo abolindo o monopólio luso em prol dos interesses comerciais ingleses. Antes o que era proibido torna-se viável, como fábricas de vidro, moinhos de trigo, instalação de tecelagens e a produção local de artigos de luxo incluindo o franquear da manipulação de perfumes e remédios.

Em 1844, com a alta taxa aplicada aos produtos importados, instala-se fabricas no Brasil e em 1875 já havia 175 delas. Este fator e a permissão da entrada de mão-de-obra assalariada e imigrante, impulsionam a perfumaria no país.

No período imperial, durante a regência de D. Pedro II o Brasil era um dos maiores importadores de perfumes franceses (1867).

O português Antônio Coxito Granado dono de uma Botica que ostentava o título de "Imperial Drogaria e Pharmacia de Granado & Cia", desenvolveu toaletes similares aos europeus, seus frascos tinham o brasão do Império. A Granado, no decorrer do século XX, passa a fabricar produtos que se tornaram ícones da perfumaria brasileira como a Água inglesa, o Polvilho anti-séptico e o sabonete de glicerina (fabricados até hoje).

O italiano José Milani que marca a história da perfumaria brasileira, este chega ao Brasil em 1897 e desenvolve um produto que receberia em 1913 a patente de sabonete Gessy, que passa a ser o nome da empresa José Milani & Cia.

No ano de 1889, o Brasil torna-se uma república sem a participação do povo, mas da aristocracia do café e do exército. O crescimento das fábricas locais e os imigrantes presentes no Brasil incrementam dinheiro no comércio e passam a desenvolver novos costumes locais. É importante salientar que principalmente no final do séc.XIX e no decorrer da primeira metade do séc.XX a elite brasileira cultua os valores europeus, brancos em detrimento aos valores herdados de negros e índios. É o período em que grande parte da intelectualidade no Brasil se alia as teorias cientificas européias que enaltecem a raça branca como superior associando a miscigenação e as outras raças ao primitivo, ao selvagem e muitas vezes ao animalesco. É dentro desse contexto que a fabricação local de perfumarias no Brasil se desenvolve, através do culto de valores europeus, introduzindo o uso de águas de colônias pós de arroz, dentifrícios, talcos e loções capilares. Isso Possibilitou a fundação no Brasil de empresas como a Myrta e a Gessy que a partir da década de 20 liderariam a produção de sabonetes (ASCHAR, 2001).

Os alemães Stern e Ricardo instalaram uma fábrica de perfumaria (1916) no Rio de Janeiro com o nome de Perfumaria Myrta. Além de fabricarem sabonete, talco, pasta de dente, creme de barbear, pó de arroz, brilhantina e quina-petróleo (para assentar cabelos masculinos), produziam também a Água-de-Colônia e o brasileiro sabonete de eucalipto, o Eucalol. Este era o único concorrente do Gessy no decorrer do anos 20. Numa jogada de marketing estratégica a Myrta com intuito de passar à frente da Gessy, na mente do consumidor introduz nas embalagens do Eucalol estampas com imagens agregadas às embalagens de sabonetes: cartões com temas diversos como fauna brasileira, bandeiras e lendas indígenas, aumentando a venda de toda linha Eucalol na América Latina. Sedimentando o produto no inconsciente do público consumidor na década de 30. Cinqüenta anos depois, a fabrica é vendida para um laboratório que opta por cessar a linha de produtos Myrta (ASCHAR, 2001).

A história da Phebo também se inicia na década de 20 com a instalação dos portugueses Mario e Antônio Santiago em Belém. Eles produziram um sabonete que pudesse concorrer com o famoso e caro Pear's Soap (inglês). Lançaram o Phebo com o slogan : o sabonete de charme inglês. A partir desse lançamento, a fábrica Luzitana passa a se chamar Phebo em 1924 e o sabonete passa a ser a expressão do requinte brasileiro, ou seja, uma representação da cultura brasileira no que se refere ao culto aos valores europeus. Associado ao Pear's Soap ele é composto de óleo pau-de-rosa com outros 145 ingredientes como o sândalo, o cravo e a canela. O nome Phebo vem do Deus sol na mitologia grega, Febo, a divindade da luz que fertiliza. O sabonete passa a fazer parte do cotidiano dos consumidores brasileiros mais abastados (devido ao preço alto), teve outras versões também, mas o odor de rosas é o carro chefe da empresa até hoje (ASCHAR, 2001).

Outro lançamento de sucesso dos Santiago foi a Lavanda Phebo (1943), renomeada de Seiva de Alfazema, liderou a perfumaria brasileira durante anos. A lavanda inspirada nos Alpes suíços agradou o consumidor brasileiro. As linhas Mônica infantil e Sandalus pertenciam também à linha de produtos da Phebo. No final da década de 80, a Procter & Gamble adquiriu a marca. Negociou as marcas com a empresa Sara Lee e a fábrica com a Granado.

A Colgate instala-se no Brasil em 1927, depois de um breve estudo do mercado brasileiro lança o sabonete palmolive e o creme dental colgate.

Em 1929 outro grande marco da perfumaria brasileira no Brasil é lançado pela L. R. companhia Brasileira de Toucados no Rio de Janeiro: o Leite de Rosas de suave fragrância floral. Visando se tornar uma liderança em marca contou com a genialidade de Francisco Olympio de Oliveira que estrategicamente associou a marca a artistas radiofônicos e famosos, ou seja, a celebridades tanto brasileiras quanto internacionais. Essa estratégia fez com que Francisco se tornasse um dos precursores da propaganda e do marketing brasileiro. O Leite de Rosas torna-se um sucesso de vendas no Brasil, ele é vinculado nas revistas, em programas de rádio e passa a ser usado pelo público feminino em todas as classes sociais como desodorante, leite de limpeza, loção protetora e perfume, e pelo público masculino como loção após a barba. Um produto que incorpora valores sociais brasileiros e torna-se uma representação cultural destes no que tange à sua associação com os meios de comunicação da década de 30 e 40 (ASCHAR, 2001).

Com o advento da televisão, na década de 50, Francisco Olympio o criador da marca Leite de Rosas inova novamente e investe na mídia televisiva, ligando o Leite de Rosas à propaganda: patrocinou o Miss Brasil na extinta TV Tupi no final da década.

Em 1967, o frasco de vidro é substituído pelo de plástico de cor branca e depois pelo rosa. Com a globalização nos anos 90, ele é reposicionado, tendo como foco as regiões norte e nordeste.

Na cidade de Porto Alegre, o perfumista Carlos Lutz funda em 1949 a Memphis. A empresa prospera na década de 50 com o creme facial Memphis e o sabonete e loção Alma de flores. Em 1973 lança o sabonete Senador e em 2001 a empresa parte para uma parceria com a espanhola Puig.

No ano de 1976 é fundada no estado de Minas Gerais a Água de Cheiro.

Em 1977, o farmacêutico Miguel Krigsner juntamente com a sua colega Eliane Nadalin e os dermatologistas Wilhelm Baumeier e José Schweidson fundaram o Boticário em Curitiba, lançando em 1979 a primeira colônia Acqua Fresca.

A marca L'acqua di Fiori é lançada em Minas Gerais por uma mineira Marlene e seu marido Leopoldo Mesquita em 1980, comercializando 15 colônias.Em 1983, com a profissionalização das operações, abre concessão para as franquias. Nos anos 90 a marca se projeta nacionalmente com o lançamento do HIT. Em 2001, a marca contabiliza 870 lojas (ASCHAR, 2001).

É importante salientar que a História da perfumaria brasileira está em profunda consonância com o processo que delineou a nossa cultura. Inicialmente, com a forte influencia negra e indígena, já no século XIX, com a presença da corte portuguesa inicia-se um contexto em que o culto aos valores europeus tomam uma proporção maior até serem exacerbados com a negação de nossas raízes: Europa e depois EUA passam a ser o modelo de vitrine no inconsciente brasileiro. No novo milênio, o Brasil se valoriza no que se refere a sua capacidade de inovação e produção de fragrâncias e começa a demonstrar a compreensão do mercado brasileiro de perfumaria como o país do futuro do perfume: pela sua riqueza natural, pela sua biodiversidade e singularidade cultural. Visão reforçada por Aschar (2001, p.140):

O país que durante tantos anos se rendeu às influências européias e americanas finalmente mostra a sua verdadeira personalidade – forte exuberante, como todos os frutos da terra – com uma indústria sadia e um mercado consumidor de potencial invejável. A classe empresarial, mestra em lidar com adversidades, informou-se, equipou-se, equiparou-se ao padrão internacional. A população apreciadora de bons cheiros desde as suas mais antigas origens, tem agora condições de alcançar artigos especiais nas prateleiras. A geografia oferece uma biodiversidade única, cobiçada no mundo inteiro, repleta de matérias-primas a serem trabalhadas. A capacidade de lançar novos conceitos promete ser um extraordinário diferencial na desenfreada globalização.

3.0 A MARCA ÁGUA DE CHEIRO: UMA REPRESENTAÇÃO CULTURAL

A História cultural vai até o social buscando compreender as estratégias criadas, que, através das imagens procuram estabelecer hierarquias e consequentemente a construção de relações sociais (CHARTIER, 1998). Ela deve ser compreendida como o estudo dos processos com os quais se constroem um sentido: quais são as estratégias por trás da representação, o significado da imagem, os valores que ela produz, ou seja, as práticas que irão modelar e dar sentido ao mundo. Buscando entendê-las dentro do contexto em que foram criadas.

A identificação híbrida entre marca/produto e o consumidor estabelece uma conexão que perpassa pela tríade: memória, imaginário e representação cultural. Primeiramente, suscita a memória que produz o imaginário, tornando-se uma representação cultural, pois estabelece um foco de ligação híbrida com o consumidor no que tange aos valores culturais: esta é a força da marca, quando ela fomenta um processo de interação híbrido com o consumidor, a partir daí eles tornam-se um só.

Não é somente o consumidor que se apropria da marca e atribui valor intangível a ela, estrategicamente, a marca já possui os seus atributos, ela é um símbolo, uma representação cultural, ou seja, quando ela é criada e desenvolve sua linha de produtos incorpora valores presentes no contexto em que está inserida.

A fidelização ou o consumo ritualístico de determinada marca é possibilitado pela identificação de valores do nicho consumidor com os valores intrínsecos na marca. Segundo Strunk (2007, p.28), "O consumidor não consome coisas, mas símbolos".

Estes símbolos pertencem à mesma cultura em que estamos inseridos, possuem valores presentes no nosso contexto: como status, sensualidade, sedução, sensibilidade, prazer, bem estar, personalidade marcante e felicidade. Não é desta forma que se processa o Brand Equity de uma marca? A memória ligada à marca e as associações feitas na mente à imagem desta marca. "Nunca é demais lembrar que as associações que estabelecemos com a marca são criadas em nosso repertório cultural" Strunk (2007, p.32).

A marca ao suscitar a memória, desenvolvendo o imaginário, estabelece uma relação com o seu público alvo, pois incorpora e representa valores intrínsecos e ritualizados de uma determinada cultura. Para Strunk (2007,p.35): "As pessoas não compram um Cartier para saber as horas, isso pode ser feito em um relógio de dez reais. Elas compram para que todo mundo possa ver que elas têm um Cartier". O próprio consumo é um processo cultural.

Através da história do perfume, compreendemos como este, tanto na antiguidade, quanto na Europa e no Brasil, tornou-se uma representação cultural.

Nós criamos, fomentamos e produzimos cultura, ao mesmo tempo em que nos tornamos também seres culturais. A marca é pensada e criada por um grupo de determinadas pessoas que pertencem a uma cultura, incorporam os valores presentes nela, vivenciando-os através das articulações e práticas sociais. Ao desenvolverem uma marca (nome, símbolo ou figura) agrega aos seus produtos os seus valores sociais. Mesmo que seja uma marca global, estudam a cultura de mercado local e associam os valores deste na sua marca, para gerar visibilidade. Tanto quanto os idealizadores de uma marca quanto à empresa são um produto cultural. As estruturas do mundo social, as categorias intelectuais são produzidas pelas práticas articuladas que constroem a sua figura. "Os objetos de consumo são sempre culturalmente significativos e foram usados em todas as épocas para reproduzir culturalmente identidades sociais". SLATER (2002, p.15).

Os perfumes estão ligados a rituais de passagem que envolvem valores como: aceitação, inserção, identificação e realização. Tornam-se símbolos que identificam valores e comportamentos normativos, ou seja, uma representação cultural dentro de uma relação híbrida, associativa e de identidade.

A representação parte do concreto, do real, ela é o símbolo que produz e fomenta o imaginário. Este é constituído por imagens, elas estabelecem um elo de identificação com o cliente em potencial, produzindo sensações e emoções nele. As emoções traduzidas em sensibilidades são expressas em cada sociedade através dos ritos, atos, conceitos e imagens associadas à marca e sua linha de produtos. Para Aschar (2001, p.59): "[...] do ponto de vista cultural e certo que os odores são codificados em valores capazes de definir nosso papel na sociedade".

É dentro deste contexto que estrategicamente a marca Água de Cheiro com sua linha de perfumes feminino se posiciona no inconsciente coletivo de seu público alvo, através do conceito: "Vender produtos que traduzam o sonho do consumidor" (www.aguadecheiro.com.br). Este é o diferencial da marca Água de Cheiro, de forma inteligível ela está em consonância com os valores híbridos do universo feminino brasileiro: sensualidade, sedução, sensibilidade, bem estar, vaidade, personalidade marcante, prazer e realização. Ao incorporar este universo cultural feminino, ela produz e alimenta o imaginário de seu nicho de mercado. A linha de perfumes feminino desta marca brasileira está agregada de atributos simbólicos, possibilitando um elo entre produto, memória e imagem. O perfume neste caso se posiciona como uma representação dos sonhos da consumidora: ao adquiri-lo a consumidora está comprando o seu sonho, alimentando-o e legitimando-o. Ao usá-lo ela estará vivenciando o rito de passagem, ou seja, o seu passaporte para a sua inserção no grupo social almejado. "Como o cheiro pode provocar em nós fortes reações emocionais e nos identificar como integrantes de um grupo social, podemos concluir: o olfato é realmente poderoso". ASCHAR (2001, P.59).

3.1 Linha de perfumes feminino da marca brasileira Água de cheiro: amadeirado, floral frutal e cítrico.

O branco transmite clareza e o vermelho esta associado à sensualidade, a sedução, ao prazer e ao instinto. Este perfume possui fragrância oriental, as notas orientais nos remetem as "Mil e uma noites" (Obra clássica da literatura oriental) estão ligadas as milenares especiarias do oriente, aos bálsamos e as resinas.

Notas quentes como o cedro, originário do oriente e o âmbar, produzem uma harmonização com um toque de bergamota, jasmim e o geranium originários também do oriente.

O designer do perfume Incantara (Anexo A) e suas notas suscitam o imaginário da mulher brasileira, interagindo com o seu universo cultural: sensualidade, sedução e prazer, produzindo uma associação híbrida. Esta interação se torna possível pela alteridade praticada pela marca Água de Cheiro, que se posiciona como uma representação cultural no inconsciente da mulher brasileira.

O designer do perfume Sofist (Anexo B) remete à delicadeza das rosas, a sofisticação, a cor branca esta associada à clareza, ou melhor, a luz do sol absorvida pelas flores.

É um perfume floral com saída frutal, possui notas de flores brancas como o jasmim originário da Europa e do Oriente, do lírio do vale e da tuberosa, ambos também de origem européia e oriental (Egito). É uma fragrância para mulheres que valorizam a elegância, a sofisticação, o charme, o glamour e a suavidade. Este perfume representa estes valores intrínsecos da mulher brasileira, simboliza o imaginário feminino. As flores estão ligadas à beleza,elegância e à suavidade, além de estarem associadas ao universo feminino.

Esta riqueza de detalhes, presentes neste peculiar perfume, demonstra o olhar cultural da marca Água de Cheiro no que tange ao seu público alvo.

O perfume Day by day Energy (Anexo C),é apresentado na cor azul de seu invólucro destaca-se o amarelo que simboliza a energia, o sol, a coexistência de ambas as cores no designer. Isso representa valores como a jovialidade, a alegria e a vaidade. O sentir-se bonita e jovem são valores do público feminino, estão em congruência com o alto astral e o bem estar. A fragrância deste perfume possui :

(...) notas cítricas de bergamota, de grapefruit, tamarina e limão. Além de notas herbais de dihidro mircenol, lavandim, alecrim, menta e especiarias como noz moscada e cardamomo na saída. O corpo floral muguet e o toque amadeirado do cedro e do sândalo. O fundo é composto de notas ambaradas, almiscaradas e valínicas. (www.aguadecheiro.com.br).

São aromas que têm origem no Brasil e no Oriente, são fortes e marcantes, representam mulheres que procuram impressionar pela jovialidade, pela energia constante, pela vitalidade e pelo alto astral. Valores ligados ao contexto da mulher brasileira, indicando que este perfume se posiciona também como uma representação cultural no inconsciente de seu público feminino.

A marca Água de Cheiro está em congruência com a cultura do publico feminino em potencial, demonstrando ser uma marca brasileira: no que se refere ao intangível incorpora valores sociais, estando intimamente ligada e ao mesmo tempo antenada com o seu nicho de mercado. Isso Possibilita a existência da identificação (memória), da associação (imaginário) e propicia o ritual de passagem.

3.0Conclusão

A Água de Cheiro, através da linha de perfumes, analisada neste artigo a partir da sua classificação olfativa (amadeirado, floral frutal e cítrico), se posiciona como uma representação cultural. É partindo desta premissa que ela estrategicamente delineia um caminho inteligível no que tange ao marketing, dialogando com a história e a antropologia, áreas que buscam compreender e apreender as práticas e as articulações culturais que constroem símbolos e a partir deles legitimam valores.

A marca Água de Cheiro compreende a si mesma e o seu público alvo como um produto cultural, praticando uma alteridade no que se refere à criação e ao fomento de ferramentas estratégicas de marketing. Pode-se dizer que a marca Água de Cheiro se diferencia e concebe a si mesma como uma marca brasileira.

Referências

ÁGUA DECHEIRO. Site da empresa disponível em: www.aguadecheiro.com.br

ASCHAR, Renata. Brasilessência: a cultura do perfume. São Paulo: Nova Cultural, 2001. 201p.

HISTÓRIA em revista. A era dos reis divinos. Rio de Janeiro: Abril livros Ltda, 1991. 176p.

CHARTIER, Roger. A história cultural entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990. 244p. (Memória e sociedade).

CORBIN, Alain. Saberes e Odores: o olfato e o imaginário social nos séculos XVIII e XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. 367p.

PAIS, Marco Antônio de Oliveira. O despertar da Europa: a Baixa Idade Média. São Paulo: Atual, 1992. 86p.

PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & história cultural. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. 130p. (História & reflexões; 5).

STRUNCK, Gilberto Luiz Teixeira Leite. Como criar identidades visuais para marcas de sucesso: um guia sobre o marketing das marcas e como representar graficamente seus valores. 3. ed. Rio de Janeiro: Rio Books, 2007. 160p.

BIBLIOGRAFIA

AAKER, David A. Marcas: Brand Equity: gerenciando o valor da marca. São Paulo: Negócio, 1998. 309 p.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico.11. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996. 116. (Coleção Antropologia Social).

PANOFSKY, Erwin. O significado das artes visuais. 3. ed. São Paulo: editora Perspectiva S.A., 1955. 439p.

ANEXO







Autor: Monica Aleixo Benetti


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