DO CONCEITO JURÍDICO DE CASAMENTO PUTATIVO



À luz do quanto preceitua o artigo 1561 do Código Civil, tem-se que o casamento putativo, ainda que anulável ou nulo, fora realizado de boa-fé; é dizer, a boa-fé, in casu, é a própria ignorância acerca da existência de alguns impedimentos concernentes ao matrimônio.
Pois bem.
Nos dizeres de Alípio Silveira:
"[?] casamento putativo é aquele nulo ou anulável, mas que, em atenção à boa-fé com que foi contraído por um ou ambos os cônjuges, produz, para o de boa-fé e os filhos, todos os efeitos civis até passar em julgado a sentença anulatória ".
E mais, neste sentido, vale trazer entendimento de Pontes de Miranda:
"Essa ficção de casamento nulo ou anulável, mas válido quanto a seus efeitos civis, encerra, filosoficamente, segunda a doutrina tradicional: a) indulgência para o cônjuge ou os cônjuges de boa-fé; b) piedade para a prole que deles tenha nascido ".
Em que pese ter sido originado no direito romano, de rigor trazer à colação que fora no direito canônico que sua teoria foi desenvolvida, sendo, inclusive, corolário da mitigação daqueles desastres havidos por força das nulidades, existentes, aliás, por conta dos diversos impedimentos matrimoniais e tinha como ponto principal a proteção da prole inocente; vale dizer, esta proteção se deu porquanto, sem o instituto sub examinem, não haveria que se falar em filiação legítima.
O raciocínio surge a partir do fato de não se levar em conta todas as (rigorosas) consequências advindas de eventual anulação do casamento, notadamente aquelas concernentes aos filhos. Assim, o desenvolvimento fora por parte do direito canônico e a manutenção pelo direito moderno, do que chamamos do estatuto do casamento putativo. Vale dizer, PUTATIVO surge do latim putare, que, traduzindo para o português, temos REPUTAR, que, a seu turno, tem-se como estar convencido da verdade de um fato, que, presumivelmente, não o é, ainda que seja imaginário, fictício ou irreal. Destarte, tem-se que o casamento putativo é aquele em que as partes reputam ter sido celebrado à luz da legalidade.
Conforme entendimento da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, externado por intermédio da prolação do Acórdão que apreciou a Apelação Cível nº 5.333:
O momento em que se apura a existência da boa-fé é o da celebração do casamento, sendo irrelevante eventual conhecimento da causa de invalidade posterior a ela, pois a má-fé ulterior não a prejudica (mala fides superveniens non nocet). Como a boa fé em geral se presume, cabe o ônus da prova da má-fé à parte que alega.

Para fins de informação, sob o mesmo prisma, vale trazer redação do artigo 1648º, 3, do Código Civil Português, que, estatui, expressamente, que "a boa-fé dos cônjuges presume-me". Em que pese não conter, junto ao Código Civil brasileiro, determinação semelhante acerca da matéria sub studio, insta salientar que não há qualquer empecilho a fim de que tal interpretação seja dada no mesmo sentido, mormente porque extraída do princípio de recíproca confiança entre os cônjuges e, mais amplo ainda, de respeito à dignidade humana.
Apesar de alguns autores advogarem a tese de que são necessários dois requisitos para caracterizar a putatividade (a boa-fé - requisito subjetivo ? e a circunstância de o casamento ser declarado nulo ou anulado ? requisito de ordem objetiva), fato é que prevalece a corrente que entende como sendo o único requisito a boa-fé, admito, aliás, como requisito autônomo para caracterização da putatividade.
Insta salientar, demais, que a ignorância acerca dos impedimentos havidos em face do matrimônio decorre de erro, que assim divide-se:
a) erro de fato; e
b) erro de direito.
Acerca do erro de direito, cumpre fazer um comentário pertinente, que é fato de que, por regra, consiste em erro inescusável, por força do artigo 3º da Lei de Introdução ao Código Civil, porém, nada impede que possa ser utilizado para configuração da boa-fé.
Partindo para o campo processual, de rigor trazer à baila que a sentença prolatada nos autos da ação anulatória, declara putativo o casamento em relação a ambos os cônjuges ou somete um, dependendo, claro, em relação a quem consiste a boa-fé argüida; vale dizer, em havendo omissão por parte do magistrado, tal declaração poderá ser obtida por intermédio de embargos de declaração, nos termos do artigo 535, inciso II, do Diploma Processual Civil.
Para arrematar, no que tange à coação, junto ao ordenamento jurídico brasileiro não há falar-se em reconhecimento de putatividade, por falta de amparo legal, vez que não há como equiparar o cônjuge coacto àquele que esteja de boa-fé; vale dizer, o coacto não ignora a existência da coação, mas sofre a coação e, manifestamente, conhece.
Somente para fins de informação, existe um Projeto de Lei (P.L. nº 6960/2002), apresentado junto ao Congresso Nacional pelo Deputado Ricardo Fiuza, cuja proposta é estender os efeitos da putatividade ao cônjuge coacto, o que, porém, ainda não se encontra em vigor.

Autor: Marcia A.


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