Disposições Gerais da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo - AIME



Nos primórdios das eleições diretas no Brasil, os pleitos eram regulamentados por legislações frágeis e instáveis, é dizer, as leis eleitorais eram editadas na oportunidade de cada eleição, o que, dessa forma, acarretava insegurança jurídica aos candidatos, partidos e ao próprio representado, ou seja, o eleitor.
Desta feita, quatro são os procedimentos que permitem que sejam argüidas as inelegibilidades, a saber: Impugnação ao Registro das Candidaturas (Art. 3° da LC n° 64/90); Investigação Judicial Eleitoral, nos termos do Art. 22 e 24 da LC n° 64/90; Recurso contra Diplomação (Art. 262 CE) e a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, prevista no Art. 14 §§ 10 e 11 da Constituição Federal de 1988 (TOZZI, 2006, p.39).
Assim, a Carta Constitucional de 1988 em seu artigo 14, §§10 e 11 plasmou a pretensão de impugnar o diploma daquele candidato vencedor por meios sórdidos visando persuadir o eleitor, a denominada Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. É o que se depreende desse dispositivo:

[...]
§10 - O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.
§ 11 - A ação de impugnação de mandato tramitará em segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se temerária ou de manifesta má-fé.

No entender de Ramayana (2007, p.420), a natureza jurídica dessa Ação é constitucional, uma vez que se está diante de dispositivos constitucionais que norteiam toda sua propositura, "sua fonte primária e seus genéricos balizamentos legais, tais como prazo, termo a quo de ajuizamento e hipóteses de cabimento."
Por outro lado, Cândido (2006, p. 266) assevera que a AIME não foi inovação dos Constituintes, haja vista que a Lei nº 7.493, de 17.6.1986 foi a legislação que deu os primeiros contornos daquele instituto impugnatório do Diploma Eletivo. A Lei nº 7.664 de 29.6.1988, reiterou, de maneira mais clara a possibilidade jurídica de impugnar do diploma do candidato que se utilizou de meios espúrios para atingir seu escopo. Assim, entende o autor supramencionado que não é correto afirmar que a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo constitui inovação da Constituição de 1988.
O § 11 do Art. 14 alhures demonstrado, deu ensejo a Lei Complementar n° 064/90, com o escopo de debelar a atuação inescrupulosa de pessoas, na maioria adversários políticos, a promoverem a aludida ação de impugnação de mandato eletivo com o único fim de prejudicar o adversário.
A finalidade precípua da AIME é suprimir o diploma do candidato que lançou mão de meios espúrios para atingir seu fim, viciando a vontade do eleitor, quer seja corrupção, fraudes ou abuso do poder econômico. Consoante a propositura da ação, não se faz necessária a produção de prova pré constituída, haja vista que a ação de impugnação de mandado eletivo goza de período próprio de instrução, onde as provas serão produzidas no decorrer do andamento processual. Bastando, assim, o razoável indício do alegado e o fomus boni iuris do documento capaz de viabilizar a ação. (CÂNDIDO, 2006).
Nas palavras de Tozzi (2006, p.41) a representação por meio da AIME visa a "[...] lisura em si do pleito e este fica comprometido com a simples prática desses atos reprovados, pouco importando o reflexo que tenha no resultado da eleição."
A fraude, por exemplo, configura-se no momento em que o candidato se utiliza de simulações para incorrer o eleitor em erro. Vislumbra-se também a fraude, quando o candidato produz documentos ou imagens falsas para denegrir a imagem do candidato adversário com a finalidade desnivelar a concorrência eletiva.
Já o abuso de poder econômico, no entender de Mendes (1988, p. 24) consiste no:
[...] financiamento direto ou indireto, dos partidos políticos e candidatos, antes ou durante a campanha eleitoral, com ofensa à lei e as instruções da Justiça Eleitoral, com o objetivo de anular a igualdade jurídica (igualdade de chances) dos partidos, afetando a normalidade e a legitimidade das eleições.

Como visto, o abuso do poder econômico visa tolher a isonomia entre os candidatos, ao passo que o candidato infrator usará de seu poderio econômico, da máquina pública, ou de um financiador, para atingir patamares de receita de campanha acima do permitido em lei, o que, assim, tornará a eleição desigual. O abuso de poder econômico é visível, por exemplo, quando o candidato utiliza-se de propaganda pessoal extemporânea, ou seja, fora do período permitido por lei. Outra ocasião do abuso econômico resta configurada quando o candidato a reeleição se utiliza dos transportes públicos para transportar eleitores para votarem no dia do pleito.
Releva destacar que o abuso de poder econômico não se confunde com o abuso político, de maneira que este ultimo:

Ocorre quando o detentor do Poder, o mandatário, vale-se de sua posição para agir de modo a influenciar o eleitor, prejudicando a liberdade de voto. Define-se dessa forma, como ato de autoridade exercido em detrimento do voto. (MENDES, 1998, p.24)

Outrossim, não figura como legitimado passivo na ação de impugnação de mandato eletivo o candidato que comete abuso político, ressalvadas as situações em que o abuso político for paralelo ao abuso econômico cometido. É o que se depreende da ementa parcialmente transcrita a seguir (TER/GO - RE 5983 GO Relator(a): MARCO ANTÔNIO CALDA Publicação:DJ - Diário de justiça, Volume 186, Tomo 1, Data 01/10/2010, Página 5/6):

RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. CONDUTA VEDADA. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE RECURSOS. ABUSO DE PODER ECONÔMICO E POLÍTICO. PRELIMINAR. LITISPENDÊNCIA. AIME E REPRESENTAÇÃO ELEITORAL PELOS MESMOS FATOS. CAUSA DE PEDIRE CONSEQUENCIAS JURÍDICAS DIVERSAS. REJEIÇÃO. [...]
2. "O abuso de poder econômico entrelaçado com o abuso de poder político pode ser objeto de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), porquanto abusa do poder econômico o candidato que despende recursos patrimoniais, públicos ou privados, dos quais detém o controle ou a gestão em contexto revelador de desbordamento ou excesso no emprego desses recursos em seu favorecimento eleitoral" (TSE, AgRAI nº 11078, in DJe de 15/04/2010); grifou-se.
[...]

Superadas as análises introdutórias acerca da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, passa-se a discorrer sobre seus aspectos processuais.

2 LEGITIMIDADE

Figurará como legitimado ativo na Ação da Impugnação de Mandado Eletivo, os candidatos, partidos, coligações e o Ministério Publico Eleitoral. Nota-se, portanto, que o eleitor não poderá figurar no pólo ativo da AIME. No entanto, "os terceiros interessados ou, simplesmente, o eleitor pode noticiar o fato de que já tenha conhecimento e que caracterize o abuso do poder econômico, corrupção ou fraude, ao representante do Ministério Público". (TOZZI, 2006, p. 40)
. Demais disso, "Cumpre notar que se tratando de ação de interesse público relevante, o ministério público quando não for agente ativo do feito, funcionará com custos legis". (TOZZI, 2006, p. 39)
Noutro Vértice, figurará no pólo passivo, por óbvio, o candidato diplomado que praticou qualquer conduta insculpida nos incisos 10 e 11 do Art. 14 da CF/88, quais sejam: abuso de poder econômico, corrupção ou fraude.
Faz-se mister ressaltar que a diplomação é condição sine qua non para a propositura da AIME, é dizer, a ação de impugnação de mandato eletivo só será cabível ao candidato diplomado ? "Ato através do qual a Justiça Eleitoral credencia os eleitos e suplentes, habilitando-os a assumir e exercer os respectivos mandatos eletivos. (BE-TSE 196/237 e BE-TSE 2/15).

3 PRAZOS

Conforme estabelece o Art. 14, §10 da CF/88 o prazo para se ingressar com a AIME será de 15 dias contados da data da diplomação. Acerca do prazo para a propositura dessa ação, releva frisar o entendimento de TOZZI (2006, p.41-42), veja-se:

[...] além de observar a regra segundo a qual os prazos devem ser computados excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento, faz-se necessário aplicar o § 2° do art. 184 do CPC, que dispõe que os prazos começam em dia útil, devendo este ser entendido como aquele em que houve expediente forense.


Noutro giro, quanto ao prazo recursal da Ação de Impugnação de Mandado Eletivo, é entendimento dominante, na Corte Superior Eleitoral, que à AIME se imprime o Rito da LC 64/90, mas este procedimento se esgota na instância ordinária não atingindo a matéria recursal. Vale dizer que o código eleitoral tem previsão própria para os recursos, com detalhamento do procedimento a ser seguido, porque, na hipótese recursal, não índice as normas do CPC que se reservam à aplicação subsidiária do direito eleitoral. (TOZZI, 2006, p. 42).
Desse modo, não havendo disposição acerca do prazo recursal em sede da AIME, a preferência caminha na linha do Art. 258 do Código Eleitoral, a saber: "Sempre que a lei não fixar prazo especial, o recurso deverá ser interposto em três dias da publicação do ato, resolução ou despacho". O que, assim, entendeu o TSE por meio do acórdão nº 12578/95, pontuando que na Ação de Impugnação de Mandado Eletivo, o prazo de recurso da decisão de 1º grau é de três dias (DJU, 23/06/95, p. 19645).
Portanto, "a regra contida no art. 258 do C.E. obstaculiza a aplicação subsidiaria do CPC, uma vez que esta aplicação somente tem lugar no vazio da lei eleitoral" (TOZZI, 2006, p. 42).

4 COMPETÊNCIA

Acerca da competência para apreciar a Ação de Impugnação de Mandado Eletivo aplicar-se-á o Art. 2º, parágrafo único, incisos I, II e III da Lei Complementar nº 64/90 e Arts. 40, IV, e 215 do Código Eleitoral.
Desse modo, se o candidato faltoso for diplomado prefeito, Vereador ou Vice-Prefeito, a ação deverá ser interposta perante o Juiz da Junta Eleitoral que presidiu a diplomação. No entanto, em havendo mais de uma Junta Eleitoral competirá ao Juiz mais antigo o julgamento da aludida AIME (Parágrafo único do Art. 40 do Código Eleitoral).
Na ocasião da diplomação de Governador, Vice Governador, Senador, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Distritais, competirá ao respectivo Tribunal Regional Eleitoral da Circunscrição apreciar a AIME.
Por fim, na hipótese da diplomação do Chefe do poder Executivo da União (Presidente da República) e seu Vice que, em tese, cometeram abusos econômicos, fraudes ou corrupção, caberá ao Tribunal Superior Eleitoral apreciar e julgar a possível AIME.
"Em suma, costuma-se dizer que a competência para conhecer, processar e julgar a Ação de Impugnação de Mandato é do juízo competente para a diplomação" (TOZZI, 2006, p. 40).

5 EFEITOS
Julgada definitivamente procedente a ação de impugnação de mandato eletivo, entende Cândido (2006, p.272-273) que:

[...] além, é evidente, do efeito principal de perda do mandado eletivo, em expectativa de exercício ou em execução.
Entendemos que sim, seja qual for o fundamento de sua propositura ? abuso do poder econômico, corrupção ou fraude ? eis que não se entenderia quisesse o legislador o apenamento por um motivo e não o tolerasse por outro, já que todos esses pressupostos contém a mesma lesividade social. Logo, a sanção terá que ser sempre igual.

Portanto, além de perder o mandato, o candidato ficará inelegível pelo prazo de 3 anos, a contar da data do trânsito em julgado da decisão judicial.
É de se asseverar, ainda, que os candidatos alvos de possíveis Ações de impugnações de Mandatos Eletivos, poderão exercer seus mandatos até decisão final do TSE, pois "a intenção precípua dessa determinação visa proteger e salvaguardar o mandato legislativo, prestigiando a vontade do eleitor, até o pronunciamento final da justiça eleitoral". (TOZZI, 2006, p. 44)

6 RITO PROCESSUAL

Com vistas a trazer celeridade ao trâmite processual da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, o TSE entendeu ser o rito da AIME o mesmo insculpido na Lei de Inelegibilidades (Lei Complementar nº 64/90) , tendo como aplicação subsidiária da ação de impugnação ao registro de candidaturas, processo tipicamente eleitoral previsto na resolução nº 21.634/04 do TSE (RAMAYANA, 2007). Outrora, era aplicado o rito ordinário previsto na legislação processual civil à Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, procedimento demasiadamente moroso, que ia na contramão do principio da celeridade e da garantia do contraditório e da ampla defesa albergados pelo Processo Eleitoral.
Por fim, cumpre asseverar que o constituinte estabeleceu à AIME o caráter de segredo de justiça, o que suscita notáveis discussões entre doutrinadores. Aduz Ramayana (2007, p. 444) que " o homem público não possui o privilégio de esconder segredos, que sejam atinentes aos vícios do abuso do poder político, econômico, relativos a corrupção ou fraude [...]."

RESOLUÇÃO Nº 21.283, DE 5/11/2002. PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 18961/TO. RELATORA: MINISTRA ELLEN GRACE. EMENTA: Consulta TRE: Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. Segredo de Justiça. O trâmite da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo deve ser realizado em segredo de justiça, mas seu julgamento deve ser público. Precedentes. DJ de 7/2/2003. (grifou-se)

Portanto, depreende-se da ementa parcialmente transcrita alhures que a tramitação da AIME deverá transcorrer em segredo de Justiça, tão somente. Já o seu julgamento deverá ser público.

REFERÊNCIAS


CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral Brasileiro 12ª Ed. revista atualizada e ampliada ? Bauru, SP: Edipro, 2006.

MENDES, Antonio Carlos. Apontamentos Sobre o Abuso de Poder Econômico em Matéria Eleitoral. Cadernos de Direito Eleitoral. São Paulo, v.1, nº3, maio 1998.

TOZZI, Leonel. Direito Eleitoral: aspectos práticos ? Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2006.

RAMAYANA. Marcos. Direito Eleitoral ? 7º Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

Autor: Breno Nazareno Costa Felipe


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