Serviços Públicos Essenciais





A busca pelo conceito de serviço público essencial não é tarefa fácil, de maneira que muito tem se discutido o que vem a ser um serviço de natureza essencial.
Quando o artigo 21 da Constituição Federal expressa que "compete à União explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água", ela está prevendo uma atividade que, dada sua importância na oportunidade da elaboração da Constituição, foi tida como uma atividade primordial, necessária ao desenvolvimento da sociedade, imprescindível à manutenção da dignidade da pessoa humana e, por isso, foi retirada do domínio dos particulares e foi entregue ao Estado, estando, o mesmo, obrigado a desempenhar esta atividade.
Nesta senda, o único suporte normativo reside na lei de greve, n° 7.783/89, Art. 10, a qual complementa o que preceitua a Carta Constitucional em se u art. 9°, §1°, a saber, "São necessidades inadiáveis, da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população."
Portanto, o art. 10 da lei de greve preleciona categoricamente o que são serviços considerados essenciais, de modo que tal dispositivo normativo ilustra um rol dos serviços cuja necessidade tornou-se imprescindível a normal vivencia da sociedade. É o que se depreende do Art. 10 da Lei 7783/89:

"São considerados serviços ou atividades essenciais:
I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia
elétrica, gás e combustíveis;
II - assistência médica e hospitalar;
III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
IV - funerários;
V - transporte coletivo;
VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;
VII - telecomunicações;
VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e
materiais nucleares;
IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;
X - controle de tráfego aéreo;
XI - compensação bancária."

Ressalta-se, por oportuno, que o rol supramencionado é taxativo, significando assim dizer que, não comporta outras circunstâncias estranhas às já expostas no art. 10 da Lei de greve, n° 7.783/89.
Desta forma, Rizzatto Nunes (2007, p.128) apontando acerca dos serviços públicos essenciais, entende que todo serviço público, simplesmente por ser público, possui natureza essencial. Nesse cenário, Entende a corrente capitaneada pelo autor supramencionado que a sociedade não conseguiria subsistir sem o fornecimento mínimo desses serviços, "[...] então é que se diz que todo serviço público é essencial [...]".
Grinover (2002, p.322) prelecionando acerca dos serviços públicos, estabelece que:

É sempre muito complicado investigar a natureza do serviço público, para tentar surpreender, neste ou naquele, o traço da sua essencialidade. Com efeito, cotejados, em seus aspectos multifários, os serviços de comunicação telefônica, de fornecimento de energia elétrica, água, coleta de esgoto ou de lixo domiciliar, todos passam por uma gradação de essencialidade, que se exacerba justamente quando estão em causa os serviços públicos difusos (ut universi) relativos à segurança, saúde e educação.

Com efeito, os serviços públicos essenciais estão diretamente ligados às necessidades básicas da coletividade, os quais são fornecidos pelo Estado ou concessionárias de forma continua.
Deveras, não há que se vislumbrar uma sociedade sem abastecimento de água, fornecimento de energia elétrica, transporte coletivo, ou seja, todos os serviços públicos essenciais, à luz no modelo globalizado contemporâneo. Portanto, os serviços essenciais estão para a coletividade e para o Ordenamento Jurídico como serviços indispensáveis à manutenção da vida e dos direitos, conceito que vivifica a impossibilidade de sua interrupção. Além do mais, por serem indispensáveis à normalidade das relações sociais ocupam natureza pública, onde não se evidencia proprietários destes serviços, mas apenas gestores que devem atuar para a preservação de sua utilização pela sociedade fazendo as vezes do Estado.
Di Pietro (2006, p.84), por sua vez, leciona que o serviço público está compreendido na atividade exercida diretamente pelo Estado ou "[...] por meio de seus delegados, como objetivo de satisfazer concretamente as necessidades coletivas, sob regime jurídico ou parcialmente público [...]". Nesse entender, os serviços públicos fornecidos diretamente por particulares possuem natureza jurídica híbrida, ao passo que são concedidos pelo poder público e fornecidos por uma pessoa jurídica de direito privado, a saber, a concessionária.
O serviço público é demasiadamente distinto dos serviços comuns prestados pelas empresas privadas ou pelos prestadores autônomos, vez que estão voltados à coletividade. Portanto, prevalece, nessa órbita, a supremacia do interesse público sobre o privado. Assim, o Estado, por conveniência técnica, jurídica e econômica, define e estabelece quais os serviços deverão ser exercidos efetivamente pela Administração Pública ou exercidos por um delegatário público. Obviamente alguns serviços não poderão ser delegados a terceiros pela sua complexidade ou estreita ligação com a própria administração pública. Entretanto, outros tipos de serviços não devem ser prestados diretamente e, por conseqüência, sempre são transferidos à iniciativa privada, porém, devendo sempre ser observadas certas condições e normas.
Os serviços públicos, propriamente ditos, consistem naqueles prestados diretamente à coletividade pela Administração, depois de definida a sua premência e necessidade. Assim são privativos do Poder Público, ou seja, só a Administração Pública deve prestá-los. À guisa de exemplo, a preservação da saúde pública e os serviços de segurança pública (polícia). Já os serviços de utilidade pública consistem nos serviços que a Administração pública poderá delegar a um particular exercer mediante sua regulamentação e controle (MEIRELLES, 2006).
Acerca do conceito de serviço público, Justen Filho (2006, p.475) define-o como "[...] uma atividade pública administrativa de satisfação concreta de necessidades individuais ou transindividuais, materiais, destinada a pessoas indeterminadas e executada sob o regime de direito público."
Meirelles (2006, p.332) abordando acerca da essencialidade dos serviços públicos e o alcance dos mesmos, classifica-os em:

[...] serviços uti universi ou gerais: são que a administração presta sem ter usuários determinados, para atender à coletividade no seu todo, como os de polícia, iluminação pública, calçamento e outros dessa espécie. Esses serviços satisfazem indiscriminadamente a população, sem que se erijam em direito subjetivo de qualquer administrado à sua obtenção para seu domicilio (...) estes serviços são indivisíveis, isto é não mensuráveis na sua utilização (...). Serviços uti singuli ou individuais ? são os que têm usuários determinados e utilização particular e mensurável para cada destinatário, como ocorre com o telefone, água e energia elétrica domiciliares. Esse serviços, desde que implantados, geram direito subjetivo à sua obtenção para todos os administrados que se encontrem na área de sua prestação ou fornecimento e satisfaçam as exigências regulamentares [...]

A distinção entre serviços públicos gerais, uti universi, e serviços individuais, uti singuli, são imprescindíveis para determinar a remuneração por taxas ou tarifas, nos casos dos uti singuli, por se tratarem de serviços com usuários determinados ou se serão remunerados por impostos, em regra, nos casos dos uti universi, ao passo que neste serviço a Administração impõe coercitivamente a remuneração para a fruição do mesmo. Assim, estabelece o Código Tributário Nacional a respeito das taxas em seu Art. 77 , uma vez que exprimem uma fruição divisível, onde a utilização é efetiva e mensurável.
Noutro naipe, consoante aos impostos, o mesmo diploma tributário os conceitua no Art.16, verbis: "Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte". Como já mencionado, significa dizer que os impostos não prescindem de atividade determinada ou individualidade de usuários para serem devidos.
Por seu turno, Almeida (2008, p. 21) elucidando acerca dos princípios que lastreiam a proteção do consumo, assevera que:

Não apenas a área privada está obrigada a prestar serviços eficientes e seguros ao seu usuário. Também a área pública, oficial, deve ter o compromisso de prestar serviços públicos igualmente seguros e eficientes. (...) Ante o reconhecimento da alta precariedade com que são prestados os séricos públicos, notadamente os de transporte e saúde, é feita recomendação ao governantes no sentido de racionalizá-los e melhorá-los, o que se enquadra no objetivo maior de proteger o consumidor e melhorar-lhe a qualidade de vida.

Portanto, Serviço público é uma utilidade ou comodidade material fruível singularmente, mas que satisfaz necessidades coletivas que o Estado assume como tarefa sua, podendo prestar de forma direta ou indireta, seguindo regime jurídico de direito público total ou parcial (BADEIRA DE MELLO, 2009).
Para Justen Filho (2006, p.128) os serviços públicos essenciais compreendem nas atividades fundamentais à subsistência humana, cuja prestação e continuidade é exercida pela Administração Pública. Ademais, assevera que alguns serviços possuem utilidade obrigatória em razão, por exemplo, da saúde pública, a qual o Estado possuí a obrigação de promover de forma indiscriminada, para a integralidade da sociedade, serviços como: "[...] ligação ao sistema de água encanada, rede pública de esgoto [...]".
Percebe-se, à luz dos entendimento mencionados, que a noção de serviço público em todos os seus aspectos deve ser encontrada na Carta Magna, eis que a mesma apresenta todos os caracteres necessários a esta definição. Assim, para qualquer forma de aplicação do direito no campo dos serviços públicos deve ser considerado um conceito constitucional tentando-se dissipar noções que estejam fora do âmbito jurídico com vistas a se evitar discrepâncias.
Lecionando acerca dos serviços públicos, Segala (2001, p.130) prescreve que, inobstante a prestação do serviço público ser por um particular, não ilide sua natureza estatal, vez que todos aqueles serviços prestados pelo poder público "[...] quer diretamente, quer por intermédio de seus delegados [...]" se submetem às regras e controles do Estado.
Nessa senda, prescreve Azevedo (2007, p. 88) que os serviços públicos, meramente em razão de possuírem titularidade estatal com vistas a suprir o interesse público, devem ser entendidos como serviços essenciais. "[...] Se o serviço é essencial significa que sua existência, sua ocorrência, é imprescindível, sob pena de se agredir algum direito e, por isso mesmo, algum bem jurídico protegido por esse direito [...]". Deveras, afirma este autor, no entanto, que no âmbito do sistema jurídico pátrio, a essencialidade conferida ao serviço não está relacionada a natureza da atividade, mas sim por determinação legal.
Os serviços públicos, em razão de possuírem titularidade estatal, enquadram-se na seara dos serviços essenciais à coletividade. Assim, "[...] pode-se perceber claramente que a sede dos serviços públicos no sistema jurídico pátrio é a Constituição Federal, cujo texto nos apresenta, quanto à titularidade pública dos serviços, uma repartição de competências entre as três esferas federativas [...]" (AZEVEDO, 2008, p. 88)
Rizzato Nunes (2004, p. 104), no entanto, caminha na trilha da linha restritiva, pois adverte que "[...] a essencialidade dos serviços públicos deve corresponder, antes de mais nada, à uma situação de urgência que o serviço traz, isto é, uma necessidade concreta de sua prestação. Logo, percebe-se que esse entendimento afirma que os serviços públicos são classificados como essenciais e não essenciais, de modo que os serviços urgentes e de necessidade extrema à sociedade estão na órbita dos serviços essenciais, ao passo que os serviços não essenciais subsumem nos serviços básicos da Administração, tais como os serviços de ordem burocrática.
Na seara dos serviços essenciais e urgentes na prestação, destacam-se os capitulados na Lei n. 7.783/ 89 (Lei de greve) "[...] que em seu art. 10, estabeleceu as atividades essenciais cuja prestação não pode sofrer interrupção total por força do exercício do direito de greve no setor privado." (AZEVEDO, 2007, p. 88).
Na visão de Neto (2005, p.06) a concepção de serviços públicos deve ser vislumbrada sob dois víeis, quais sejam:

Em sentido amplo, pode-se entender como serviço público toda a prestação estatal, incluindo desde as atividades econômicas, a jurisdição, a segurança pública, o poder de polícia, a ordenação urbanística e mesmo a própria regulamentação estatal. Em sentido estrito, pode-se conceber serviço público como as atividades dotadas de conteúdo econômico, revestidas de especial relevância social, cuja exploração a Constituição ou a Lei cometem a titularidade de uma das esferas da federação como forma de assegurar o seu acesso a toda gente, permanentemente.

Diante da idéia do autor supramencionado, o instituto do serviço público deve ser analisado sob dois pólos, quais sejam, o mais abrangente, isto é, toda a prestação estatal genericamente, visando o interesse coletivo, quer este seja urgente ou não. No segundo pólo, há a figura dos serviços públicos sob a ótica restritiva, é dizer, cuja exploração a Lei Maior destinou a titularidade expressamente, como meio de garantia à coletividade de forma permanente, ou seja, serviço de essencialidade incontestável.
Observa-se, por fim, que não há um conceito petrificado entre os doutrinadores o que seja considerado um serviço público essencial. Assim, diante da inércia do código de defesa do consumidor restou tais doutrinadores recorrerem a Lei de Greve, n. 7.783/89, art. 10 e seguintes. Outrossim, conforme já mencionado, restaram claramente insculpidos naquele rol os serviços de fornecimento de energia elétrica, fornecimento de água e esgoto, assistência médica hospitalar e outros, por serem de extrema relevância e necessidade para a sobrevivência digna da coletividade.

REFERÊNCIAS

NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de Direito do Consumidor: com exercícios. São Paulo: Saraiva, 2004.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Curso de Direito Administrativo 19ª Ed. São Paulo: Atlas, 2006

ALMEIDA, João Batista de. A proteção Jurídica do Consumidor, 6ª edição, São Paulo: Saraiva, 2008

AZEVEDO, Fernando Costa de. A Suspensão do fornecimento de serviço público essencial por inadimplemento do consumidor-usuário. Argumentos doutrinários e entendimento jurisprudencial Revista de Direito do Consumidor 2007 ? RDC 62. Doutrina Nacional, 2007.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro 32º Ed. São Paulo: Malheiros, 2007.


Autor: Breno Nazareno Costa Felipe


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