Resenha. Memórias do futebol em tese de doutorado da Universidade Estadual de Campinas.



Resenha. Memórias do futebol em tese de doutorado da Universidade Estadual de Campinas.
Review. Memories of football on a doctoral thesis at the University of Campinas.

Rogério Duarte Fernandes dos Passos

Resumo. Resenha da tese de doutorado "Memórias de um futebol de fronteira", de Luiz Carlos Rigo, abordando história e trajetória do futebol no interior do Estado do Rio Grande do Sul.

Abstract. Review of the PhD thesis "Memórias de um futebol de fronteira", by Luiz Carlos Rigo, describing the history and trajectory of the football within the state of Rio Grande do Sul.

Palavras-chaves: Luiz Carlos Rigo. Futebol do interior. Futebol: prática histórica e educativa.

Keywords: Luiz Carlos Rigo. Football in Brazil?s interior. Football: historical and educational practice.

RIGO, Luiz Carlos (2001). Memórias de um futebol de fronteira. Campinas: UNICAMP (Faculdade de Educação). Orientadora: Olga Rodrigues de Moraes von Simson, 307 fl.

1. O contexto do trabalho.

Em princípio, é importante mencionar a enorme dimensão de um trabalho que se dedica a estudar a história do futebol ? tendo como recorte histórico a prática desse esporte no interior do Estado do Rio Grande do Sul ? tendo-o como manifestação de práticas educativas junto ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

E, atentando-se ao currículo Lattes de seu autor, professor Luiz Carlos Rigo, temos nesse trabalho ? orientado pela professora Dra. Olga Rodrigues de Moraes von Simson ? um propósito totalmente condizente com a sua formação, visto ser ele graduado em Educação Física pela Universidade Federal de Santa Maria (1987), mestre em Ciência do Movimento Humano pela mesma Universidade (1993), sendo, atualmente, professor adjunto da Universidade Federal de Pelotas, vinculado aos cursos de graduação, especialização e mestrado, tendo interesses no campo das Ciências Humanas e suas relações com a Educação Física, bem como ao esporte (futebol), à memória, cultura, saúde, epistemologia, e, claro, à própria educação.

Diante disso, podemos concluir que a escolha do tema foi de grande pertinência para o estudo de práticas educativas e históricas, abordando um tema correlato com elas ? in casu, o futebol ?, reconhecendo-o enquanto elemento integrante aos indivíduos e sua coletividade no interior do Estado do Rio Grande do Sul.

2. Opções metodológicas.

A partir da leitura e análise da tese, concluímos que a mesma apresenta ? enquanto opções metodológicas ?, uma possível vertente fenomenológica-hermenêutica, visto privilegiar as técnicas não-quantitativas ? a exemplo de entrevistas não-estruturadas, depoimentos, relatos de vida, estudos de caso e relato de experiências (Gamboa, 2008:64-65).

Como antes dito, trata-se de um trabalho ligado à história, cultura, memória e educação, como ressaltado pelo próprio autor no ínterim de suas opções metodológicas. A isso, inclusive, se menciona declaração do cineasta Ugo Giorgetti, com relação à dificuldade de se crer que, por exemplo, há até mesmo a dificuldade de se realizar filmes sobre o futebol, pois, "já na primeira esquina", se tem o receio de ser rotulado como ignorante no assunto (Rigo, 2001:2).

Da mesma forma não há uma filiação epistêmica exclusiva, pois não se quiseram adotar discursos antagônicos entre si e tê-los como descendentes de uma única linhagem metodológica, não obstante os caminhos e descaminhos ? com dificuldades, inclusive operacionais ? percorridos ao longo da pesquisa.

Segue-se, ainda uma opção "foucaultiana" de distanciar-se da metodologia tradicional da história em busca de se obter uma origem última das coisas ? desvelando uma identidade original, que se deve, tanto ao trabalho de Foucault quanto de Nietzsche, que se afastaram das bases da epistemologia moderna existencialista. Ainda na base foucaultiana, busca-se o caminho mais difícil que ressalta o saber produzido, o sentido histórico, sem cair na "tentação" de se propor um metamétodo para a história.

Praticamente, a partir da observação que o autor realizou dos fenômenos, não houve separação do pesquisador do objeto cognoscente, pois as práticas do futebol foram tomadas como práticas culturais do cotidiano, complexas e ambíguas, desconsiderando uma suposta divisão da cultura como erudita ou popular. Tomando-se a história oral ? e a "rede de depoentes" ? utilizou-se dos depoimentos ? e de diversas outras fontes ? como os referenciais para reconstruir o futebol do Estado do Rio Grande do Sul como brasileiro, mas, igualmente, parte integrante de um futebol gaúcho brasileiro, argentino e uruguaio. Há, nesse esteio, um sentido individual e também coletivo nesses depoimentos, trazendo à baila uma pesquisa muito mais qualitativa que quantitativa, apesar do específico recorte feito nessa área geográfica de fronteira, "distante" do poderoso eixo Rio-São Paulo do futebol canarinho.

O trabalho de Luiz Carlos Rigo, portanto, nessa perspectiva qualitativa, constrói um referencial epistemológico bastante particular, recuperando a dimensão do esporte como instrumento de memória, saber, cultura, apoderamento e educação, contribuindo para a clarificação da dimensão do esporte em todas as esferas de manifestação humana.

3. Sobre o trabalho.

O autor recupera parte da história de importantes clubes do futebol profissional do Interior do Estado do Rio Grande do Sul, a exemplo do Sport Club Rio Grande (o "vovô"), tido como o clube de futebol mais antigo do Brasil (fundado 23 dias antes da Associação Atlética Ponte Preta, de Campinas) e que faz os clássicos "Rio-Rita" com o Sport Club São Paulo ? lembre-se do clássico entre o São Paulo e o Rio-Grandense que tem o mesmo nome ?, e o "Rio-Rio", disputado entre o Rio Grande e o Foot-Ball Rio-Grandense, todos de Rio Grande-RS.

O futebol de Pelotas é igualmente representado, onde há a narrativa atinente à trajetória histórica de seus clubes, especialmente o Grêmio Esportivo Brasil, que faz o clássico "Bra-Pel" diante do Esporte Clube Pelotas e o "Bra-Far", diante do Grêmio Atlético Farroupilha.

A cena do futebol amador não é esquecida, sendo que a rivalidade entre a Sociedade Recreativa Arealense e o Esporte Clube Sul-América (ambos do bairro Areal) refere-se à outra importante página do futebol pelotense.

Para retratar essas práticas de futebol em um contexto de pouca visibilidade na mídia o autor utilizou a expressão "futebol infame", resgatando as dimensões de um futebol inicialmente ligado aos trabalhadores, que caminhou à profissionalização através de um "profissionalismo marrom" (um profissionalismo disfarçado por empregos com dispensa para jogos, prêmios, benesses e incentivos), que viu a incorporação do negro e sublinhado e cercado por lendas, como no caso de uma partida dos anos 1940, ocasião que se enfrentaram S. C. São Paulo e S. C. Rio Grande, onde em peleja que valia taça, persistiu por tanto tempo o empate entre as equipes na mesma partida, que o troféu acabou, por consenso, sendo rachado ao meio.

As lendas e narrativas de vitórias perpassam atletas como Joaquinzinho, jogador pelotense que quase foi trocado por Pelé; Cardeal, o gaúcho de Santa Vitória do Palmar, que chegou a atuar no Fluminense-RJ em 1938; Fruto ? o primeiro jogador negro do S. C. Rio Grande ? que chegou a atuar em partida decisiva do clube com a cabeça sangrando, e dentre outros, mais recentemente, Alexandre Gaúcho (o "Xoxó" ou "BMW", como carinhosamente também era chamado), que da cena futebolística amadora de Pelotas projetou-se para defender Botafogo de Ribeirão Preto, Grêmio-RS e Flamengo-RJ.

Outras "místicas" nos são reveladas, como o "título mundial" do Brasil de Pelotas, que, sem lenda alguma, no mês de maio de 1950, em partida amistosa disputada no Estádio Centenário, em Montevidéu, derrotou a Seleção Uruguaia ? que meses depois sagrar-se-ia campeã do mundo em cima da Seleção Brasileira no "Maracanazzo"(como os uruguaios lembram-se da data) ? por 2 x 1, com gols de Darci e Mortosa. Isso mesmo: o Brasil de Pelotas fez em Montevidéu meses antes o que o Brasil não conseguiu fazer no Maracanã na Copa de 1950, em que a Seleção Canarinho foi derrotada na partida final em casa.

O futebol pelotense, em particular o Grêmio Esportivo Brasil, não tem em suas memórias apenas as alegrias, como a disputa das semifinais da Taça de Ouro de 1985 ? quando caiu em face do Bangu-RJ ?, mas também a tristeza da tragédia de 15 de janeiro de 2009, quando o ônibus que transportava a delegação que retornava de um jogo-treino capotou na Rodovia BR-392 ? altura do município de Canguçu ?, ferindo atletas e comissão técnica, e vitimando faltamente o atacante uruguaio Cláudio Millar, o zagueiro Régis Gouveia Alves e o preparador de goleiros Giovane Guimarães.

É certo, porém, que o trabalho de Luiz Carlos Rigo resgata a dimensão educativa e histórica da prática futebolística, registrando com grande entusiasmo e sabedoria uma relevante parte da trajetória do futebol "infame", praticado à margem do eixo Rio-São Paulo.

4. Referências.

GAMBOA, Sílvio Ancízar Sánchez. Pesquisa em educação: métodos e epistemologias. Chapecó: Argos, 1ª reimp., 2008, 193 p.

MENDES, Márcio Almeida; FORTES, Milena de Oliveira; RIGO, Luiz Carlos. Memórias de uma façanha: o Grêmio Esportivo Brasil na Taça de Ouro de 1985 (s/d). Disponível na rede mundial de computadores (Internet) no endereço eletrônico . Acesso em 08-03-2011.

PASSOS, Rogério Duarte Fernandes dos. Comentando as "Memórias de um futebol de fronteira", de Luiz Carlos Rigo. 2010. In: Dia-a-Dia Luzes, arquivo de áudio da Rádio Luzes da Ribalta (AM 1360 Khz, Rede Jovem Pan Sat), de Santa Bárbara D?Oeste-SP, exibido em 10-11-2010.

RIGO, Luiz Carlos. Memórias de um futebol de fronteira. 2001. 307 f. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Orientadora: Olga Rodrigues de Moraes von Simson, 307 fl.

_____ . Amizade, pertencimento e relações de poder no futebol de bairro. 2006. In: Pensar a prática, vol. 10, nº 01, disponível na rede mundial de computadores (Internet) no endereço eletrônico . Acesso em 03-03-2011.

Autor: Rogério Duarte Fernandes Dos Passos


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