Segregação cultural: festas de poucos, raizes de muitos



Segregação cultural: festas de poucos, raizes de muitos

Alexsandro Cristine Soares Ribeiro
Acadêmico do curso de Direito ? UNICEUMA
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"Ó, minha cidade, Deixa-me viver, que eu quero aprender tua poesia:
sol e maresia, lendas e mistérios, luar das serestas e o azul de teus dias
Quero ouvir à noite tambores do Congo gemendo e cantando dores e saudades
A evocar martírios lágrimas, açoites que floriram claros sóis da liberdade... "(Hino de São Luís)
São Luís, Atenas brasileira, patrimônio histórico da humanidade, esses são alguns dos títulos ostentados pela nossa cidade querida.
Conhecida mundialmente por nossa manifestação cultural e artística, São Luís entra em festas por todo mês de junho, quando se realiza o são joão ? acontecimento folclórico que resgata a tradição da cultura nordestina ? ou melhor dizendo, festa junina.
Em tal ocasião, recebemos visitantes de todos os lugares, sulistas, estrangeiros e até mesmo ludovicenses que da cidade somente conhecem suas festas e folclore. É mister ressaltar que não só recebemos, mas também nos colocamos na função de servos, subalternos, perdendo, desta forma, nossa própria dignidade, leia-se nossa equidade de valores.
Diante o exposto sentimo-nos na posição e obrigação de vos fazer a seguinte indagação: As primeiras estrofes do Hino de São Luís que alardeia "Ó, minha cidade, deixa-me viver, que eu quero aprender tua poesia:..." trata-se de um pedido para que nós, cidadãos ludovicenses, tenhamos a devida anuência para viver os encantos de nossa cidade?
Sinceramente, representando a visão da grande maioria da população, diga-se de passagem, os excluidos, cremos que sim.
A Prefeitura de São Luís na organização da festa junina, em um de seus arraiais, o da Praça Maria Aragão, criou um espaço destinado para nossos visitantes turistas, servindo-os a "pão de ló", ou seja, com todos os privilégios que nos faltam à mesa. Espaço este que obsta a inserção de seus próprios filhos ou pelo menos aos que a própria cidade trata de marginalizar.
A bem da verdade, essa conduta é veementemente contrária ao Direito vigente em nossa sociedade. Nossa Carta da República, fundamento de validade de toda ação realizada no Estado, assevera que todos são iguais, a saber:
"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:"

Desse dispositivo extraimos o princípio da igualdade, o qual, baseado na melhor doutrina, podemos obter de suas minúcias que é a capacidade de dar tratamento diferente aos desiguais na proporção de suas desigualdade.
A Prefeitura de São Luís consegue, avessamente o que trata o princípio supra, incluindo ainda mais os incluidos e excluindo ainda mais os excluidos, maximizar a discriminação e o preconceito social.
Será que assim estaremos em busca do escopo precípuo da Admistração Pública, o bem comum?
Rodolpho Pedde, disserta:
"Os Fins da Administração Pública resumem-se num único objetivo: o bem comum da coletividade administrativa; toda atividade deve ser orientada para esse objetivo; sendo que todo ato administrativo que não for praticado no interesse da coletividade será ilícito e imoral."
Não obstamente os argumentos até então usados para condenar aquela prática da Prefeitura, o princípio da impessoalidade ? um dos princípios constitucionais da Administração Pública ? traz em seu bojo a proibição de privilegiar uns em detrimento de outros, ou seja, a impossibilidade de corporativização de uma função estatal.
Segundo Leandro Cadenas:
"Qualquer agente público, seja ele eleito, concursado, indicado etc, está ocupando seu posto para servir aos interesses do povo. Assim, seus atos obrigatoriamente deverão ter como finalidade o interesse público, e não próprio ou de um conjunto pequeno de pessoas amigas. Ou seja, deve ser impessoal."

Pois bem, como foi posto, há uma impossibilidade óbvia pelo Direito na criação de um espaço destinado a turistas e a cúpula da sociedade ludovicense. Mas o argumento que verdadeiramente queremos defender é baseado na Moral e não no Direito.
Immanuel Kant ensinava que o Direito deve sustentar-se na Moral, pois antes mesmo de criarmos regras para o convívio social devemos conduzirmo-nos por uma Moral social.
Aquele fato de vê alguns festejando e celebrando uma tradição bancada com o dinheiro público, ou melhor, alimentando suas vaidades com a marginalização e exclusão de outros, reportá-nos ao passado não muito distante, no qual negros sustentavam os "Barões"e sequer podiam sentar-se a mesa destes para comer.
Por fim, digo-vos que imoral é tal ostracismo imputado aos pobres, pois em situação análoga é como se estivéssemos oferecendo uma festa em nossa casa e não pudéssemos entrar na sala de estar, pois esta jaz destinada aos convidados.

Autor: Alexsandro Cristine Soares Ribeiro


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