Contabilidade Criativa



Contabilidade Criativa
Ana Paula Gomes Cristia Maria Antonovicz Julliend Amorim Barbosa Letícia Yamane Alunas pós-graduadas no curso de MBA Auditoria Integral Universidade Federal do Paraná - UFPR

Resumo
A contabilidade enquanto ferramenta tem por objetivo principal de permitir, a cada grupo de usuário, interno e externo, quer sejam acionista, sócios, proprietários, credores, financiadores, investidores, fornecedores, governos, empregados quer seja a sociedade, a avaliação da situação econômica e financeira da entidade, num sentido estático, bem como fazer projeções sobre suas tendências futuras auxiliando o processo de tomada de decisão. A busca pela valorização da imagem da empresa frente ao mercado de capitais nos leva ao uso contínuo da "Contabilidade Criativa", donde as empresas se aproveitam da flexibilidade e subjetividade presente nas normas contábeis e ajustam suas demonstrações contábeis diante suas conveniências a fim de representarem a imagem almejada.

Palavras-Chaves: Contabilidade Criativa, Flexibilidade, Conveniências.

ABSTRACT
Accountancy's main objective is to allow a user group, internal or external be them shareholders, proprietors, creditors, investors, lenders, suppliers, government, and employees to assess the institution's economic and financial situation as well as forecast trends. The search for the enhancement of the company's image based on the capital market leads to the continuous use of the "Earnings Managemet", where companies take advantage of its flexibility and subjectivity in accounting standards and ajust their financial statements accordining to their conveniences in order to deliver the desire image.

1. INTRODUÇÃO
Uma seqüência de fraudes contábeis, denúncias e especulações protagonizadas por empresas de grande representatividade na Economia Mundial abalam o Mercado de Capitais gerando um clima de insegurança entre os investidores.
Por meio de manipulação de dados contábeis, é criado um processo arquitetônico para maquiar desfalques de grande porte. A utilização de critérios contábeis distintos e a falta de regulamentação rígida foram os principais fatores sustentadores de tais práticas. Este forte esquema, na maioria dos casos, fora utilizado em favorecimento de uma minoria que concentrava grandes quantias de dinheiro, ocasionando a falência da empresa.
Estas práticas, conhecidas pela denominação de Contabilidade Criativa apresentam-se como reflexo da flexibilidade das normas contábeis, subjetividade de alguns elementos contábeis e da vaga regulamentação de alguns aspectos contábeis. Os contabilistas assumem papel fundamental nestes esquemas, podendo utilizar-se de conhecimentos e experiências a fim de apresentar as Demonstrações Financeiras de maneira oportuna à empresa, suprimindo a ética exigida pelo seu processo de formação profissional.

1.1 Situação Problema

A Contabilidade Criativa pode ser atenuada pela padronização de normas, maior regulamentação de critérios contábeis e formação ética dos profissionais de contabilidade e auditoria?

1.2 Hipótese

A fim de garantir o caráter científico do artigo, a pesquisa iniciou-se da hipótese que se forem utilizadas as Normas Internacionais de Contabilidade como padronizadoras de critérios contábeis, os riscos de fraude no Mercado de Capitais, poderão ser minimizados.

1.3 Objetivo Principal
O objetivo principal deste artigo é de divulgar o conceito de contabilidade criativa com a análise de casos práticos para conscientizar o profissional contabilista da importância da Ética na aplicação de critérios contábeis para divulgação de informações aos usuários internos e externos, bem como ao profissional de Auditoria no apontamento destas práticas em seus pareceres.

1.4 Justificativa
A necessidade de transparência nas demonstrações contábeis se torna ainda maior ao passo que a globalização da Economia atrai maior número de investidores ao Mercado de Capitais. A análise de risco nos investimentos teria uma forte aliada considerando a padronização de critérios e normas internacionais de contabilidade no intuito de fornecer informações consistentes e claras aos investidores. A ética dos profissionais das áreas de contabilidade e auditoria se torna um foco a ser questionado.

1.5 Delimitação da pesquisa empírica
As conclusões do artigo foram baseadas em pesquisa empírica por meio de informações obtidas em artigos, material bibliográfico e análise de casos práticos envolvendo
"Contabilidade Criativa".

2. CONTABILIDADE CRIATIVA
O termo contabilidade criativa é originalmente americano earnings management, todavia as correntes de estudo traduzem de forma distinta tal termo, a européia, por exemplo, traduz earnings management como contabilidad creativa e a norte-americana como gerenciamento de resultados.
As traduções, além de serem distintas, possuem conotações diferentes, os que a consideram uma manipulação propriamente dita, com a finalidade exclusiva de alteração da real situação patrimonial, financeira e/ou econômica da entidade, utilizam o termo contabilidade criativa. Enquanto os que acreditam que a sua aplicabilidade consiste em uma estratégia contábil, decorrente de um conhecimento considerável da matéria em questão, e não um manejo das contas adota o termo gerenciamento de resultados.
A contabilidade criativa consiste em aproveitar as possibilidades oferecidas pelas normas (oportunidades, subjetividades, opções de escolha, vazios jurídicos, entre outros) para apresentar demonstrações contábeis que reflitam a imagem desejada e não necessariamente aquela que seria na realidade. Logo, ela se encontra em um caminho entre as práticas verdadeiramente corretas e éticas e a ilegalidade ou a fraude, se bem que é difícil delimitar onde acaba a ética e inicia a criatividade e onde termina esta e começa a fraude.

3. AGENTES INFLUENTES NA UTILIZAÇÃO DA CONTABILIDADE CRIATIVA A Contabilidade Criativa apresenta-se como reflexo da falta de normatizações mais claras e objetivas apresentando:
· Flexibilidade das normas contábeis;
· Subjetividade de alguns elementos contábeis;
· Vaga regulamentação de alguns aspectos contábeis.
A subjetividade é por força da sua natureza pouco clara, difícil de medir, classificar e reconhecer nos mapas financeiros. A flexibilidade possibilita aos contadores, múltiplas alternativas e critérios variados que poderão seguir no processo de elaboração e publicação da informação contábil. Nesse sentido, a maleabilidade da informação contábil permite a maquiagem dos valores contábeis, originando a contabilidade criativa.
As razões para esta prática são muitas, nas quais podemos destacar as que estão relacionadas com o objetivo de pagar menos impostos, a necessidade de mostrar um grau mais elevado de solvência frente aos fornecedores e entidades financeiras, e ainda o intuito de aumentar ou manter o preço das ações. Outros motivos podem ser apontados, dentre os quais se destacam os seguintes:
 Manutenção de um fluxo constante de receitas;
Partindo do principio de que as receitas é uma das mais visíveis contas que demonstram o seu crescimento, as empresas buscam mantê-la estável e não evidenciar oscilações bruscas, o que podem ser interpretados como risco pelo mercado.
 Manutenção da alta o preço das ações;
Utiliza-se de mecanismos que reduzam aparentemente o endividamento ou aumentem as receitas e os resultados.
 Atrasar a chegada de informações ao mercado financeiro;
A fim de beneficiar alguns investidores que tenham acesso privilegiado a tais informações, até mesmo nas remunerações em ações aos próprios diretores das empresas, operando nas bolsas em benefício próprio.
 Incrementar ou estabilizar o valor patrimonial da empresa;
De modo que a avaliação da gestão dos dirigentes seja positiva, inibindo contrariedades diante de aquisições agressivas.
 Diminuir as receitas ou aumentar as despesas e custos;
De forma a reduzir os lucros para sinalizar uma pior situação ao mercado, apresenta uma situação crítica da empresa para tirar proveito no pagamento de impostos e favorecimento na negociação de dívidas no longo prazo.
 Mostrar bons indicadores de rentabilidade, liquidez, solvência e endividamento;
De maneira tal que contemple as diretrizes de gestão responsável cumprimento das imposições legais e atendendo as exigências sociais.
 Mostrar maus indicadores de rentabilidade, liquidez, solvência e endividamento;
Mostra uma situação crítica da empresa visando tirar proveito dos recursos públicos.
Outro aspecto é minimizar as suspeitas de que a companhia pratica o monopólio ou oligopólio no mercado. Reduzir as dívidas fiscal-tributárias.
As implicações na utilização da contabilidade criativa são distintas conforme o tipo de usuário. A situação mais alarmante é no processo de tomada de decisão, onde os dados que favorecem o processo de tomada de decisão, foi objeto de práticas criativas, refletiram em decisões inadequadas e até mesmo inválidas se comparadas com as que se produziram baseadas em dados reais. O processo criativo é assim uma ameaça à integridade da informação contábil capaz de distorcer o objetivo dessa mesma informação, que é demonstrar o espelho atual de uma organização. A situação mais agravante é que as pessoas que mais necessitam dessas informações contábeis fieis, são as que contribuem para a generalização da sua prática, os gestores, caindo no conceito de gerenciamento de resultados.

4. ANÁLISE DE CASOS PRÁTICOS ENVOLVENDO CONTABILIDADE CRIATIVA 4.1 Caso Enron Um dos maiores escândalos corporativos já vistos na história do Mercado Financeiro Mundial foi protagonizado pela ENRON, que era uma das maiores empresas de gás natural e eletricidade dos Estados Unidos. Sua evolução de 1985 a 2000 foi significativa, passando de uma simples distribuidora regional de gás para a 16ª maior empresa do mundo e a 7ª dos Estados Unidos.
Ao longo de sete anos (1993-2000) a empresa as receitas da ENRON superaram o PIB dos EUA. No entanto, o aumento de receitas não evidenciava a certeza de lucros. Algumas empresas que faziam parte do Grupo apresentavam prejuízos mesmo possuindo altas receitas.
Por meio de análises financeiras foram avaliados riscos, no entanto, eram considerados insignificantes ao passo que as ações eram valorizadas na Bolsa.
O declínio da ENRON se dá a partir de 2000. Em menos de um ano a empresa já estaria decretando falência. Após suas ações atingirem o valor máximo, muitos contratos de fornecimento passam a se rescindidos por credores. É levantada a suspeita por parte da Auditoria da Arthur Andersen que alega manipulação de informações privilegiadas. Em pouco tempo Jeff Skilling pede demissão da presidência alegando razões pessoais.
Com a utilização de critérios contábeis confusos a empresa manipulou seus resultados para mascarar perdas significativas com alguns de seus segmentos. Seus gestores utilizam tais informações privilegiadas em benefício próprio auferindo rendimentos vultosos no mercado financeiro, ao contrário de seus funcionários de baixo escalão, que eram incentivados à investir em ações da empresa em um plano de aposentadoria denominado "Stock Option Plans", auferindo grandes prejuízos com a desvalorização das ações.
Outro motivo que mascarou este declínio foi a forma de gerenciamento dos lucros, Andrew Fastow, diretor financeiro da ENRON, utilizou-se das ambigüidades existentes nas regras da contabilidade norte-americana que permitia a contabilização de grandes contratos de derivativos de energia ao seu valor bruto, e não líquido, como comumente deveria ser feito.
Esta adoção de critério fez com que a empresa demonstrasse enormes receita porém pequenos lucros. Também utilizou-se da contabilização de receitas obtidas por "market maker", intermediação de contratos, que até então não estava bem definida pelo FASB (Financial Accounting Standards Boards).
A omissão destes fatos em pareceres de Auditoria leva a crer que a Arthur Andersen, responsável pela Auditoria na época, também estaria se beneficiando com a omissão de dados essenciais aos usuários externos, agindo de forma antiética no que tange às atribuições designadas ao Auditor Independente.
Vários fatores contribuíram para que a empresa conseguisse fraudar seus demonstrativos e enganar toda a sociedade americana, dentre eles estão: a falta de regulamentação adequada dos diversos setores em que a empresa atuava, considerados até mesmo "obscuros", a ganância dos administradores que tinham sua remuneração atrelada ao desempenho da companhia, a própria cultura americana da utilização de ícones considerados de confiança que devem ser seguidos irrestritamente, e a Enron foi um exemplo disso, pois seus investidores tinham plena confiança nas ações da companhia, motivados pelo desempenho dessas no mercado. A Enron admitiu ter inflado artificialmente seus lucros e ocultado seu endividamento mediante a manipulação de uma complexa teia de parcerias não explícitas em seu balanço.

4.2 Caso Parmalat A Parmalat, que começou como uma pequena empresa familiar em Parma na Itália, graças ao seu fundador Calisto Tanzi, se internacionaliza abrindo filiais em alguns países como Brasil, Venezuela, bem como em países considerados paraísos fiscais como Ilhas Caiman, Antilhas Holandesas, entre outros. Ocupando o 1º lugar do mercado de leita de longa conservação, a empresa dispõe suas ações na Bolsa de valores por meados de 1990.
Ao questionarem um investimento de 500 milhões de Euros no Fundo Epicurum nas Ilhas Caiman, os auditores despertam a desconfiança da Comissão de Operações da Bolsa que solicita esclarecimentos quanto à liquidez de títulos, uma vez que as ações despencam. A Parmalat então apresenta um documento emitido pelo Bank of America das Ilhas Caiman, comprovando a autenticidade e liquidez dos títulos, com o intuito de tranqüilizar os acionistas para que as ações voltassem a subir.
O Bank of Amercia então se pronuncia afirmando a falsidade do documento apresentado pela Parmalat. A denúncia da fraude faz com que as ações despenquem ainda mais, lesando seus investidores. Após a denúncia é revelado um esquema de desvios contábeis, orçamentos falsos, lucros fictícios, pirâmides de empresas offshore. Algumas empresas como Citigroup e Deloitte & Touche Tomatsu foram acusadas de cumplicidade no esquema fraudulento. Mesmo posterior ao caso Enron, a fraude indica que muitas empresas de auditoria ainda fazem vista grossa aos indícios de fraude.

4.3 Caso Madoff Mais uma figura que protagonizou um esquema de fraude nos Estados Unidos foi o figurão de Wall Street Berndard Madoff. Com um esquema montado em forma de pirâmide, o que consiste em remunerar os clientes mais antigos com o dinheiro dos novos investidores, sem produzir rendimentos reais, o empresário desviou nada mais que 50 bilhões de dólares. O esquema desmorona quando os clientes de "caixa baixa" devido à crise decidem retirar 7 bilhões de dólares. Muitas empresas gigantescas como HSBC, Santander e BNP Paribas, bem como investidores famosos como Steven Spielberg, perderam grandes quantias com estes investimentos. Uma máscara lapidada entre instituições de caridade judaica e fundos que eram oferecidos à uma seleta parte de investidores de prestígio que com isso auferiam maior status, foi a grande sacada de Bernard Madoff para elaborar o esquema fraudulento sem ocasionar maiores suspeitas. Até mesmo investidores brasileiros, que mantém sua identidade oculta devido à proveniência muitas vezes ilícita de tais valores investidos, entraram na dança.
O presidente Barack Obama responsabiliza a supervisão do Mercado de Capitais dos EUA, exigindo maior regulação. No entanto a SEC (órgão que fiscaliza o mercado financeiro americano) já havia alertado as fraudes por afinidade que ocorrem em comunidades armênias, testemunhas de Jeová e batistas, onde os membros eram lesados por seus pares. O círculo de confiança existente acaba atraindo os investidores, no caso de Bernard, como judeu, atraiu investimentos vultosos da comunidade judaica.

5. CONSCIÊNCIA ÉTICA
De acordo com Alberto (1996, pg.70) essa conditio sine qua non de consciência ética prende-se, em perícia, mas não exclusivamente nela. A questão de responsabilidade social liga-se diretamente, ao exercício da cidadania, pois a esta correspondem necessariamente direitos e deveres umbilicamente relacionados à própria responsabilidade, ou seja, a responsabilidade e cidadania estão relacionadas à postura moral e ética dos agentes sociais.

6. CONCLUSÃO
Diante de tais definições sobre a contabilidade criativa resume-se essencialmente, um problema de uso de normas, em que a flexibilidade das mesmas e as omissões dentro delas podem fazer que as demonstrações financeiras pareçam algo diferente, comparadas com as que se baseiam no que é estabelecido por essas normas. A coleta de informação nos leva a deduzir a importância da Ética do profissional contabilista e auditor no fornecimento de informações consistentes e transparentes aos usuários internos e externos para a redução dos riscos de fraude. No entanto, a ética deve ser primordialmente praticada na alta administração das empresas, pois as decisões tomadas para desencadear esquemas de fraude geralmente partem deste nível hierárquico. O envolvimento de grandes empresas de Auditoria, as chamadas "Big Four" nestes escândalos nos leva a crer que a união destes grupos dificulta ainda mais na detecção da prática de Contabilidade Criativa. Quanto à padronização de normas internacionais, poderão sim, minimizar os riscos de fraude, no entanto, a ética profissional na utilização de critérios contábeis é considerada a melhor arma na prevenção de fraudes.

6. REFERÊNCIAS

DUARTE, Maria Manuela Rebelo; RIBEIRO, Manuel da Silva - Contabilidade Criativa:
Algumas Abordagens - TOC 93 Dezembro 2007 - ;
FARIA, Maria José da Silva - Contabilidade criativa navega de acordo com as Conveniências - Jornal de Contabilidade n° 364, Julho 2007 APOTEC;
CONCEITO DE CONTABILIDADE CRIATIVA
;
SILVA, César Augusto Tibúrcio; CUPERTINO, César Medeiros; OGLIARI; Paulo Rodolfo - Avaliando a queda de um gigante: o caso Enron;
CARVALHO, Willian Eustáquio de Carvalho - Caso Enron: breve análise da empresa em crise, 2004;
FRANK, Tom - Mil e uma trapaças;
GUTERMAN, Marcos - Os judeus, a confiança e o "mercado frouxo": o caso Madoff, seção Estados Unidos, Religião, 19/12/2008;
FAVARO, Thomas - Golpe de 50 milhões de dólares - Internacional, Revista VEJA, Edição 2092, 24/12/2008;
RAMONET, Ignácio - O escândalo da Parmalat ALBERTO, Valter Luiz Palombo - Perícia Contábil, Ed. Atlas, São Paulo, 1996;
Autor: Cristia Maria Antonovicz


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