INSTRUMENTAL OU INTELECTUAL?



A escola e os educadores Sem dúvida alguma a escola cumpre um papel social importantíssimo na manutenção e desenvolvimento da democracia e os professores tem em suas mãos o poder de transformar simples estudantes em cidadãos críticos. Assim, "[...] educadores radicais precisam construir uma linguagem que considere os professores como intelectuais transformadores (GIROUX, 1987. p.8)" No entanto, os movimentos de reforma da educação promoveram mudanças nesse conceito com o passar dos anos, causando assim, a crise que podemos ver hoje em dia. Sem dúvida alguma, a desvalorização e proletarização do trabalho docente têm raízes históricas e políticas muito marcantes. Segundo Saviani, citado por Fernandes (2011), a escola foi construída visando atender os interesses da classe dominante. Assim, nas escolas particulares, feitas para a elite da sociedade, tem-se o saber. E na grande escola pública aberta a toda população se tem a preparação para o mercado de trabalho, que servirá a essa elite. Embora pareça radical, acredito que essa afirmação é a causa maior a instrumentalização da educação. Desde seu treinamento, os professores aprendem a tratar o aprendizado de forma, onde o professor é a apenas um "receptor passivo" de conhecimento onde: "Em vez de aprenderem a levantar questões acerca dos princípios que subjazem os diferentes métodos didáticos, técnicas de pesquisa e teorias de educação, os estudantes com frequência se preocupam em aprender como fazer, o que funciona ou o domínio da melhor maneira de ensinar um dado corpo de conhecimento" (GIROUX, 2011) O ensino dos professores em formação tem sido dominado pela racionalidade e pela técnica e perdeu a visão de educar alunos, afim de que eles se tornem cidadãos críticos. A função de promover o debate sobre qual o papel do aluno enquanto cidadã foi substituída pelo treinamento de alunos para dominar uma área do conhecimento ou uma disciplina, tirando do aluno percepção sociais e críticas que o mesmo deve desenvolver. Professor Instrumental ou Intelectual? Segundo Giroux, a função do professor é fornecer condições de desenvolver o conhecimento e as habilidades que garantam ao aluno as ferramentas que ele precisará para se tornar um líder, assim: [...] os docentes não serão vistos como ?meros executores profissionalmente equipados para realizar qualquer objetivo que lhes seja colocado. Ao invés disso, devem ser definidos como homens e mulheres livres, com dedicação especial a valores do intelecto e o desenvolvimento do poder critico dos jovens? (GIROUX, 1987. apud SCHEFFLER, 1968. p. 21) No entanto, o papel de intelectual antes atribuído ao professor foi substituído por um papel instrumental. Segundo as concepções do mesmo, o professor intelectual é aquele que prepara o aprendiz para ser cidadão ativo e critico na sociedade. Segundo Demo, o professor é aquele que ensina o aluno a pensar, sendo esta sua obra-prima. Já o professor instrumental é aquele quem vem reduzindo esse conhecimento meramente a técnica, onde a teoria é exigida para explicar um determinado ponto de vista, não para dar margem a outras visões e concepções. A educação precisa ser redefinida sob a perspectiva de que esse definhamento na educação é causado em maior parte por esta redução da função do educador a um profissional técnico, que não produz conhecimento, apenas o reproduz de maneira superficial, fugindo do real papel do professor na sociedade. A problemática se encontra então na identidade profissional do professor. Qual o papel social do professor? Qual sua função primordial na sociedade? A função social dos educadores Historicamente, a relação entre o papel dos educadores e a sociedade mais ampla tem sido mediada pela imagem do professor, "como um servidor público dedicado a reproduzir a cultura dominante no interesse do bem comum, e pela concepção da comunidade universitária, como um corpo de cientistas sociais, os quais, por sua capacidade como especialistas, ?deveriam educar as massas e dar direção ao progresso moral e social? (GIROUX, 1987. p. 10) Giroux analisa a função social dos educadores em quatro categorias típico-ideais que indicam práticas sociais ou ideológicas e enfatiza que os professores podem transitar entre elas, ou simplesmente optar por uma. São elas: 1. Intelectuais transformadores Dentro da perspectiva de que conhecimento é poder e poder é política, a função primordial dessa categoria é tornar o político mais pedagógico e o pedagógico mais politico, que significa inserir a educação na esfera política, afirmando que a educação esta diretamente relacionada com o poder, tornando a escola um projeto social fundamental para o desenvolvimento social do aluno. Tornar o político pedagógico proporciona ao aluno uma emancipação crítica do conhecimento criando condições de oportunidades aos alunos de se tornarem agentes de coragem cívica. 2. Intelectuais críticos Esse tipo de intelectual esforça-se para manter o status de intelectuais socialmente críticos que pairam sobre todo tipo de classe social, mas está engajado na perspectiva critica da verdade. Sustentam a concepção de que ciência e ideologia são separadas uma da outra 3. Intelectuais adaptados Adotam, em geral, uma posição ideológica "livre de amarras", sustentando a sociedade dominante, produzindo ideias e práticas sociais que servem para reproduzir o status de intelectual em beneficio da elite. Ou seja, usa seu status de intelectual para defender certa ideologia política. Embora, de maneira bem sutil, o contrário, de se desdenhar da política em prol do profissionalismo, também ocorra nesse tipo de intelectual. 4. Intelectuais hegemônicos Os intelectuais hegemônicos vão além de simplesmente se renderem a sua função acadêmica ou política, mas fornecem às classes dominantes a homogeneidade dessas funções. Intelectuais Transformadores Segundo Paulo Freire (2000), "mudar é difícil, mas é possível." Giroux defende que o ponto de partida seria definir o papel do intelectual transformador com respeito ao que ele chama discurso da crítica e o discurso da possibilidade. Para tal, se faz necessário aos professores a contextualização em termos políticos ás suas funções na sociedade e as que vêm desempenhando. Os professores como intelectuais possuem em suas mãos poderes políticos, sociais e culturais, e sua função é muito mais ampla do que simplesmente repassar um conjunto de saberes e valores de maneira objetiva. Giroux ainda defende que: [...] É importante enfatizar que os professores devem responsabilizar-se ativamente por levantar questões sérias sobre o que ensinam, como devem ensinar e quais os objetivos mais amplos por que lutam. Isto significa que devem desempenhar papel importante na definição de propósitos e das condições de escolarização. (GIROUX, 1987 p.22) É importante considerar também o questionamento dos currículos formais e ocultos, pois o mesmo é utilizado com frequência para silenciar as pessoas. O professor, como intelectual transformador deve decidir entre simplesmente transmitir conhecimento, seguindo a técnica instrumentalista ou mostrar os passos para construir esse conhecimento através da reflexão. Obviamente o currículo não deve ser ignorado, mas o professor, enquanto educador deve transitar por ele de maneira criativa e reflexiva, promovendo a seus alunos a inquietação pelo conhecimento a partir de suas próprias experiências e reflexões. Segundo Alarcão (2010), a função do aluno é aprender a gerir informações para transformar e organizar seu conhecimento e seus saberes, pois sem essa organização, o conhecimento não se torna poder. E consequentemente a função do professor é conduzir o aluno nessa construção. Nessa perspectiva, se os professores desejam educar os alunos a fim de formar neles uma consciência crítica, reflexiva e politica, devem se tornar intelectuais transformadores. Considerações Finais O exercício da cidadania de maneira responsável exige das pessoas essa capacidade de reflexão para poder efetuar escolhas baseando-se em um conhecimento sólido e bem construído e é essa função sociopolítica do professor que deve ser levado em conta, pois é nisto que se dá a formação da cidadania. Dessa forma, a visão de professores como intelectuais transformadores ajuda a esclarecer o papel que os educadores desempenham na formação da sociedade. Devido a isso, os professores devem deixar de serem vistos como Instrumentais e passarem a ser encarados como Intelectuais capazes de promover mudanças significativas na sociedade. Referências ALARCÃO, Isabel. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 7ª ed. CORTEZ. São Paulo, 2010 FERNANDES, Hélio Clemente. A Proletarização do Magistério. Disponível em Acesso em: 06 de jul de 2011 FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação: Cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo. UNESP, 2000 DEMO, Pedro. Pobreza Política: a pobreza mais intensa da pobreza brasileira. Armazém do Ipê. Campinas, 2006 GIROUX, Henry. Pedagogia Radical e o Intelectual transformador. In: ________ . A Escola Crítica e a Política Cultural. São Paulo: Cortez, 1987 ___________. Os professores como intelectuais: Rumo a pedagogia crítica da aprendizagem. Artes médicas. Porto Alegre, 1997. Disponível em: Acesso em 13 de abril de 2011
Autor: Samara De Souza Freitas


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