O Corpo Político Feminista E Lesbiano



A política sempre esteve dinamizada por profundas transformações. 
Com efeito, compreender estas transformações levou a questionamentos para construir eixos e estabelecer elos analíticos sobre a história dos acontecimentos político-filosóficos, a exemplo o feminismo e o lesbianismo2, conduziu este trabalho a buscar o entendimento da ação política na sociedade contemporânea, permitindo apreender o sentido de pluralidade e interação entre estes corpos.

     Para Hannah, Compreender significava enfrentar sem preconceitos e com atenção a própria realidade, qualquer que fosse, e resistir a ela, em vez de negar a atrocidade ou atribuí-la a precedentes históricos (Birulés, 1997).

     Assim, compreender o conceito de feminismo e lesbianismo permite avanços na discussão sobre a questão posta. No século XX havia uma maior abertura de questões sobre a sexualidade, possibilitando uma aproximação entre estes corpos, mas surge a questão é possível a interação?

     Para tanto é preciso evitar preconceitos como afirma Hannah, e não estruturar uma veracidade incondicional, como se apenas existisse somente única leitura, afinal as verdades absolutas são rochas não se movem, e sendo assim, ao estar no mundo há uma constância do novo, não existindo algo acabado, e como afirma Navarro "quem estiver vestido no cimento de suas certezas não mergulhe nestas águas" (Navarro 2000: p. 9).

     Esta compreensão aparece como um fator revolucionário politicamente para os corpos feminista e lesbiano, pois seus conceitos se contrapõe as determinações sociais impostas as mulheres como uma onda em constante movimento.

     O feminismo aqui descrito reflete a cerca da opressão e denuncia o patriarcado para romper com a dominação secular e subalternidade das mulheres. Segundo Arendt "A partir do momento em que o grupo, do qual se originará o poder desde o começo (potestas in populo, sem um povo ou grupo não há poder), desaparece, "seu poder" também se esvanece." (Arendt, 1994:36)

     Assim, o feminismo3 é definido como um movimento político de mulheres que lutam pela eqüidade, mantendo em certo sentido a discussão sobre o poder patriarcal, questionando o patriarcado, o poder do pai.

     Este originu-se na Europa Ocidental a partir do século XVIII, rompendo com o grupo dominante. No entedimento filosofico o feminismo aparece após o fenômeno do iluminismo, com pensadoras como Mary Wortley Montagu e a Marquesa de Condorcet, lutadoras da educação feminina.

     As grandes revoluções fazem incorpar a concepção de feminismo que ganha corpo politico e reivindicatório, e é com os partidos politicos que o movimento ganha força de expressão. Com o advento do capitalismo e a Revolução Francesa surgem os partidos de esquerda onde as mulheres encontram espaço para as suas manifestações.

     O corpo feminista conseguiu uma série de avanços na sociedade ocidental: o sufrágio universal, proteção legal para trabalhadoras gestantes, criação de delegacias específicas para mulheres, abolição de algumas leis misóginas, incorporou tambem a defesa do corpo lesbiano, o que obviamente foi conquistado por este, mas levou um certo tempo para a realização da interação. Sendo assim, na atualidade o feminismo promove direitos para as mulheres, e isto independe da participação em partidos.

     O feminismo proporcionou a reconciliação das mulheres com a realidade que se reconhecem nas constantes mudanças no mundo, de maneira a sobressair a pluralidade no agir.

     A pluralidade permite o aprimoramento de reflexões, e em relação ao corpo lesbiano, o corpo feminista levou tempo para compreender a revolução deste.

     O corpo lesbiano fora então marcado por um imbricamento e oposição do corpo feminista, que desconhecia o corpo lesbiano este despolitizado, pois não estava dentro do que se instituía como verdade política e bandeira feminista no periodo, a exemplo o direito ao voto, direito das trabalhadoras e a emancipação do século XIX.

     No período de 60, 70, 80 e 90, o feminismo brasileiro se transformou, cotidianamente em cada luta, a cada derrocada, a cada enfrentamento e também nas conquista. Porem é com as contestações no período de 60, a qual tinha como bandeira a afirmativa de que o "pessoal é político", pode-se afirmar que tal afirmação torna o processo emanciapatorio denso e reflexivo sobre o que é política, possibilitando o zoon politikon, ou seja, a participação de outros atores, especificamente o corpo político lesbiano.

     Segundo Beatriz Suárez Briones

Os anos 60 foram a década da segunda onda feminista. Dentro do movimento feminista cada vez mais mulheres se sentiram livres para se intitularem feministas lésbicas; (…)As feministas lésbicas declararam que lésbica era qualquer mulher que dedicava todas as suas energias a outras mulheres. O lesbianismo passou a ser considerado a quintessência do feminismo, porque o feminismo lésbico significava pôr as mulheres primeiro no afectivo, no social, no político e no sexual, (...) ação que altera até à raiz a concepção patriarcal; significava materializar um tipo de relação revolucionária (… ).

(http://branconolilas.no.sapo.pt/suarez_briones.htm) 

     Sendo assim, as questões inerentes ao corpo lesbiano aparecem publicamente promovendo uma reflexão de questões até então abordadas como específicas do privado. O corpo lesbiano agora interagindo com o corpo feminista resignifica e compreende o pluralismo como também um novo agir.

     Para tanto é preciso compreender a concepção do termo lésbica que originalmente referia-se às habitantes da ilha de Lesbos, na Grécia. Na antiguidade , entre os séculos VI e VII a.C., morava naquela ilha a poetisa Safo, admirada por seus poemas sobre amor e beleza, em sua maioria dirigidos às mulheres. Por esta razão, o relacionamento amoroso entre mulheres passou a ser conhecido como lesbianismo ou safismo.

     O corpo político lesbiano carrega signos históricos disciplinadores e de controle, este corpo fora submetido a métodos coercitivos e punitivos adotados pelas esferas públicas e privadas.

     A desqualificação do corpo lesbiano, por vezes denominado de radical e separatista, esteve por um período excluído politicamente de ensaios discursivos, mas pautado nas reflexões feministas, pelo incomodo que causava, este corpo provocava terror e incompreensão, permeado de doxa.

     Assim para Hannah, em um mundo humano normatizador o terror consegue se instaurar, o isolamento político é a condição necessária para consagrar o regime totalitário e desta maneira, o corpo lesbiano apesar desta marca de exclusão sempre esteve interada ao corpo feminista em suas reflexões a ações, permitindo uma ruptura com a dominação binária determinista que submete os corpos a um lugar.

     Esta desqualificação, este lugar posto para o corpo lesbiano remete a centralização do poder patriarcal, a um totalitarismo, para Hannah o totalitarismo acontece quando não há laços políticos e sociais e o impedimento da livre manifestação do pensamento.

     O isolamento pode gerar tirania, esta se caracteriza por cerrar o alicerce da força dos espaços públicos existentes, conseguindo estagnar qualquer possibilidade de ação política, de diálogo e de fala sobre questões que lhes sejam comuns, o que permite o aparecimento do totalitarismo.

     Para Hannah, o poder não se resume apenas na capacidade de ação de um único indivíduo, ou na capacidade de impor uma vontade a outros, é além, o poder surgi através do acordo relacional entre os indivíduos que resolvem agir da mesma maneira.

     Deste modo, poderá surgi a interação entre o corpo feminista e lesbiano? Para Hannah não somos seres políticos por natureza, pode acontecer entre nós ou não.

     A interação entre os corpos descritos, tem como característica a pluralidade humana, e esta é possível graças à singularidade constituinte de cada qual, denotando a vontade geral, ou seja, a promoção de direitos eqüitativos entre gêneros, possibilitando uma ruptura com o tirania machista.

     Assim a interação aparece como fio condutor de uma dialogicidade política, que existe quando os corpos feminista e lesbiano agem e comunicam-se coletivamente, o que requer um espaço para a interação que acontece através da ação e da palavra.

     O não se sujeitar a outro ente hierarquicamente, por força ou poder, constitui-se uma revolução, ampliando assim o espaço político, permitindo o rompimento com o isolamento e fazendo acontecer a pluralidade.

     A partir do agir e da condição de reger o próprio fado, dar-se-á significação ao desenvolver das atividades em consonância com os outros, atribuindo-se deste modo ao corpo lesbiano o sentido político. A ação e a política só podem ser compreendidas na vontade geral. A ação política precisa da diferença, sendo a coexistência com a diversidade que torna abastado o debate público, o que dá sentido à interação entre o corpo lesbiano e feminista.

     Considerando que estes corpos se encontram, mas se distanciam durante o percurso ontológico. O diálogo permeia e permite a interação dos corpos possibilitando uma pluralidade dissociada de interesses meramente privados, permitindo assim o discurso no espaço público entre os corpos feminista e lesbiano, surgindo novas perspectivas políticas, assim para a filosofia a constatação desta pluralidade em certo sentido poderia representar o inicio de um debate dinamizado pela convivência, possibilitando a interação, e em meio a uma "(...)a vontade geral (...) mediada por um interesse universal, e não particular." (Milovic, 2002:45)

Referência: 

ARENDT, Hannah. Sobre a Violência. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1969; 1994

_____________ 1989, Entre o Passado e o Futuro. 2ª Ed., São Paulo, Perspectiva.

_____________ 1998, O que é Política. Rio de janeiro, Bertrand.

_____________1993, A Dignidade da Política, Rio de Janeiro, Relumé-Dumará

_____________1981, Origens do totalitarismo, Rio de Janeiro, Companhia das Letras

BIRULÉS, Fina. 1997. "La Pasión por Comprender". Archipiélago, 30-

BRIONES Beatriz Suárez. "La segunda ola feminista: Teorías y críticas literarias feministas", en Beatriz Suárez Briones, Ma. Belén Martín Lucas y Ma. Jesús Fariña Bustos (eds.).

Escribir en femenino. Poéticas y políticas. Icaria, Barcelona, 2001 (Mujeres y Culturas, 5), p. 27. 

MILOVIC, Míroslav. Filosofia da Comunicação, para uma critica da modernidade. Brasília: Editora Plano, 2002, p. 310.

NAVARRO-SWAIN, Tania. O que é lesbianismo. São Paulo: Brasiliense, 2000. 101p 

Informação de Internet (www):

DIALNET. Disponível em <http://dialnet.unirioja.es/servlet/listaarticulos?tipo_busqueda=EJEMPLAR&revista_busqueda=143&clave_busqueda=11689> Acesso em 02 jun de 2008;

WIKIPEDIA. Feminismos http://pt.wikipedia.org/wiki/Feminismo. Acesso em 03 jun. 2008

WIKIPEDIA. Lesbianismo http://pt.wikipedia.org/wiki/Lesbianismo. Acesso em 03 jun. 2008

Branco no Lilás. Disponível em< http://branconolilas.no.sapo.pt/suarez_briones.htm> Acesso em 03jun 2008. 

UNB. Disponível em: http://www.unb.br/ih/his/gefem/labrys7/liberdade/anaalice.htm. Acesso em 05 jun 2008 

Notas: 

2. Há uma discussão a cerca do final "ismo" que denotaria doença, então lesbianismo denotaria doença, o termo mais utilizado na atualidade é lesbianeidade. (Nota minha). A pratica homossexual não é mais considerada uma patologia sendo consenso na comunidade de psicólogos, filósofos e médicos, por fim acredito que o sufixo ismo não é utilizado apenas para designar doença, o mesmo sufixo é utilizado para indicar teorias, movimentos sociais, correntes de pensamento, por esta razão utilizo a palavra lesbianismo no artigoo como movimento social.


3. No verbete equivalente em inglês temos a definição de feminismo como uma ideologia que objetiva a igualdade - ou o que seria mais preciso - a eqüidade entre os sexos. Contudo, há autoras feministas que procuraram demonstrar como a própria concepção de sexo biológico advém de uma compreensão simbólica do mundo que é orientada pela concepção de gênero. O verbete equivalente em francês define feminismo como um conjunto de idéias políticas, filosóficas e sociais que procuram promover os direitos e interesses das mulheres na sociedade civil. No entanto, os feminismos, em suas múltiplas formas (como veremos a seguir), estão relacionados a desejos, políticas e interesses de outros grupos civis, não somente de mulheres. <http://pt.wikipedia.org/wiki/Feminismo >

Autora: Zora Yonara Torres Costa, Assistente Social, Especialista em Filosofia, Mestrado em Filosofia (aluna especial) Universidade de Brasilia. E-mail: [email protected];


Autor: Zora Costa


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