Qual a distinção, na esfera da Administração Tributária




1. Introdução
A Administração Tributária corresponde a uma parcela da Administração Pública, na parte ligada a atividade financeira do Estado, ao tratar da receita tributária. O Estado administrador que, agindo sob o império da lei criada pelo Estado legislador, exerce essa função administrativa, através das diversas pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como suas autarquias), cada qual com sua competência, seus órgãos, suas repartições e seus agentes (servidores públicos).
Porém, o Estado, através da Administração Tributária, acompanha, controla e fiscaliza o cumprimento das normas tributárias, adotando sempre que necessárias medidas coercitivas à sua observância, tudo no interesse da arrecadação e gestão das receitas tributárias. A Administração Tributária de atos administrativos voltados para o controle da receita tributária; é o procedimento destinado:
? Verificação do cumprimento das obrigações tributárias;
? Adoção de medidas necessárias (penalidades) obriga o sujeito passivo (devedor) a esse cumprimento;
? Homologação (quitação) dos créditos tributários.

2. Processo e Procedimento
Se as expressões processo e procedimento não suscitam mais quaisquer controvérsias entre os processualistas, o mesmo não ocorre quando falamos num suposto "procedimento administrativo tributário" ou num suposto " processo administrativo tributário". Eis a razão pela qual, antes de adentrarmos o campo efetivamente de nosso interesse, necessitamos imperativamente realçar algumas idéias, para que, familiarizados com lições processuais, possamos lançar luzes a fim de vencer este primeiro obstáculo que nos surge.
Ressalte-se que com tal analise não se pretende inovar ou acrescentar algo ao que já é conhecido sobre o assunto, mas apenas trazer à colação algumas informações para posteriores considerações.
Como sabemos, a lide perturba a vida em sociedade.
É em função dela que surge o direito, com objetivo precípuo de restabelecer a paz social. No dizer dos processualistas, compor a lide1 é resolver o conflito de interesses , segundo a ordem jurídica preestabelecida. A lei reguladora, abstrata e geral, aplicando-se ao fato, se manifestará através de operações e órgãos adequados, sob a forma de lei especial e concreta, resolvendo a lide. A essa soma de atos que convergem ordenada e sucessivamente, para o justo e imparcial solucionamento do litígio, denomina-se procedimento.
Como bem observa Liebman, representa o procedimento uma coordenação dos atos processuais em marcha, ligados entre si pela causa finalis do processo ou, mesmo, de uma fase deste; ostentando, destarte, índole meramente formal2.
Não se confunde processo com procedimento. Processo é o meio ou instrumento de composição da lide. Se o procedimento, como vimos, é a marcha dos atos processuais, coordenados sob formas e ritos, o processo, por seu turno, tem significado diverso, porquanto constitui uma relação de direito que se estabelece entre seus sujeitos durante a substanciação do litígio.
Segundo os ensinamentos de Alcalá-Zamora:
"(...) O processo se caracteriza por sua finalidade jurisdicional compositiva, enquanto o procedimento (que pode manifestar-se fora do campo processual, sucede no campo administrativo ou legislativo) resumindo-se numa coordenação de atos em andamento3.
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1. "Lide,portanto é o conflito de interesses qualificado pela pretensão de um dos interessados e pela resistência do outro. Ou, mais sinteticamente, lide é o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida (...), compor a lide é resolver o conflito segundo a ordem jurídica, restabelecendo ? a ". Cf. SANTOS, Moacyr Amaral.Primeiras linhas de processo civil.13. Ed. São Paulo: Saraiva,1987.v.1,p.91
2. Processo, autocomposición y autodefesa. 2. Ed. México, nº 67, p. 115-116, 1970.
3. Op.cit. p. 116.
Como nos ensina Arruda Alvim, o processo é termo designativo tanto da idéia de desenvolvimento, andamento (procedere), como da relação jurídica complexa, envolvendo autor, réu e juiz, na qual estas partes convivem com seus respectivos direitos e deveres4.
No mesmo sentido é a posição de Augustin Gordillo:
"Processo é um conceito teleológico, procedimento um conceito formal. Ao falar de processo destaca que o conjunto de atos em consideração tem por finalidade essencial chegar ao ditado de um determinado ato: no conceito que adotamos, esse ato é o jurisdicional. Ao falar de procedimento, ao contrário, se prescinde do fim que a seqüência de atos pode ter, e se indica tão-somente esse aspecto externo, de que existe uma série de atos que se desenvolvem progressivamente5."
Se não bastassem tais diferenças tais diferenças, que tornam inconfundíveis as expressões procedimento e processo, outra há, que nos sepultar de vez qualquer duvida ainda existente. No processo está sempre presente a jurisdição (entendida aqui como a extensão e limite do poder de julgar de um juiz), o que não se dá com o procedimento, no qual apenas se ordenam atos, que se sucedem, para atuação de outro órgão como, verbi gratia,uma autoridade administrativa. Tal questão se alevanta, antes de ser uma questão meramente terminológica, apresenta uma serie de conseqüências práticas, em função de uma ou outra denominação. Reside aí, indubitavelmente, uma das grandes dificuldades do tema, especialmente aquela decorrente da impugnação do particular a uma exigência do poder público, carecer ou não de uma estrutura contraditória. Ou, em outras palavras, estaria o poder tributante adstrito a manter mecanismo administrativo, pelo qual se propiciaria ampla defesa do contribuinte? Ou não haveria tal exigência? Essas e outras indagações surgem em face da relevância da discussão.
Como se vê, o que se está a buscar é o exato alcance e a natureza jurídica6 de uma atividade que, embora chamada jurisdicional, afasta-se dos moldes clássicos desta. A melhor doutrina tem se interrogado sobre tais questões, dividindo-se basicamente em três correntes: os que entendem tratar-se de um exercício judicial de uma função administrativa, os que vêem uma verdadeira jurisdição, e por fim os que jurisdicional, constituindo um tertium genus.
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4.Manual de direito processual civil. São Paulo: RT,1979.v.l, p.4.
5.Procedimento y recursos administrativos. 2. Ed. Buenos Aires : Marcchi ,1971. P. 23.
6. Natureza Jurídica assinala notadamente a essência ou atributos essenciais e que devem vir com a própria coisa.

No Direito Tributário, processo e procedimento, ainda segundo James Marins, distinguem-se :
1. Procedimento enquanto caminho para consecução do lançamento;
2. Processo como meio de solução administrativa de conflitos fiscais e processo como meio de solução judicial de conflitos fiscais.
O Prof. Romeu Felipe Bacellar Filho identifica quatro conseqüências capitais para a construção do processo administrativo:
1. Todo processo é procedimento, mas a recíproca é verdadeira, pois nem todo procedimento converte-se em processo;
2. O regime jurídico de processo não pode perder de vista as exigências do rito procedimental (também é procedimento);
3. Existe uma processualidade ampla: o processo não se encontra restrito à função jurisdicional;
4. O processo é instrumento constitucional de atuação dos poderes estatais, o que implica na formação de núcleo constitucional de processualidade ao lado do diferenciado.
James Marins observou os Princípios comuns ao Procedimento e ao Processo administrativo tributário:
? Principio da legalidade objetiva ? CF, arts. 5º,II, 37,150,I: CTN, art.3º ; Lei 9. 784/99, arts. 1º e 2º;
? Principio da vinculação, verdade material, oficialidade, dever de colaboração ? Lei 9.784/99, art. 4º;
? Principio do dever de investigação.
Princípios do Procedimento Administrativo Fiscal: Inquisitoriedade, cientificação, formalismo moderado, fundamentação, acessibilidade, celeridade e da gratuidade.
Princípios do Processo Administrativo Tributário: devido processo legal, contraditório, ampla defesa, ampla instrução probatória, duplo grau de cognição, ampla competência decisória.
3. Pareceres dos estudiosos do Direito Tributário
Os procedimentos administrativos e os processos administrativos podem ser diferenciados segundo os pareceres dos doutrinadores do Direito Tributário, que relatam a respeito do assunto abordado.
O prof. Dejalma de Campos conceitua "o procedimento administrativo tributário pode ser como todo aquele procedimento que se destina à determinação, exigência ou dispensa do credito fiscal, bem como à fixação do alcance de normas de tributação sobre casos concretos pelos órgãos competentes, ou à imposição de penalidades ao contribuinte". Aqui, são compreendidos todos os tipos de processos fiscais, como os de controle, que são os processos de lançamento e consulta, de outorga, que são os processos de isenção, e o de punição, que são os processos por infração fiscal.
A proposta do Prof. Geraldo Ataliba ao citar o Prof. Carlos Ari Sundfeld ( 1987:119) que sugere que se generalize a convenção de chamar de "processo" o que se desenvolve no âmbito do Poder Judiciário e de que é mais prático e até cientifico designar a fase administrativa por procedimento.
O Prof. Carlos Ari Sundfeld (1987: 65) vai mais além; diz de sua preferência pela expressão "procedimento administrativo" significa a sucessão de atos que encadeiam e que condicionam uma decisão final. Segundo ele, o procedimento tem função conceitual semelhante ao processo judicial, isto é, visa designar a somatória de trâmites necessários ao desenvolvimento da atividade administrativa.

4. Conclusão

Em ultimas palavras, balizados nas lições de José Frederico Marques, podemos concluir, dizendo que todos os atos reunidos, em razão do signo finalístico de composição do litígio segundo as regras do direito objetivo, exteriorizam-se sob forma de procedimento. "Forma dat esse rei"7.
Portanto o processo tem um sentido preponderantemente teleológico,como instrumento que é de paz social, de concretização da justiça. Essa é a causa finalis como já foi mencionado anteriormente. Por outro giro, tem o procedimento tem caráter formal; enquanto o processo define-se pelo fim, este pela forma.
Como diriam os exímios docentes da cadeira processual: "o processo é o trem enquanto o procedimento é o trilho sobre o qual aquele caminha até chegar o seu destino".
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7. A forma dá existência à coisa; a forma é necessária à existência da coisa.

5. Referências Bibliográficas

CAMPOS, Dejalma de. Direito Processual Tributário/ 4. ed. São Paulo: Editora Atlas,1995.
CASTRO, Alexandre Barros. Procedimento Administrativo Tributário. São Paulo: Editora Atlas: 1996.
ATALIBA, Geraldo. Princípios de Procedimento Tributário. IN: Novo Processo Tributário. São Paulo: Resenha Tributária, 1975.
MARQUES, José Frederico. A Garantia do due processo of Law no Direito Tributário. Revista de Direito Público, v.5, p. 28-33.
MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro. Administrativo e Judicial. Dialética, 3ª Ed. São Paulo,2003.
ALVIM, José Manuel de Arruda. Processo Tributário. Revista de Direito Público, São Paulo: Revista dos Tribunais, nº 16, 1971.
GORDILLO, Augustin A. La Garantia de Defesa como Principio de Eficacia en El Procedimiento Administrativo. Revista de Direito Público,São Paulo:Revista dos Tribunais,v.10,1969.







Autor: Tereza Maria Brandão Pereira


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