É conveniente o governo doar tanto dinheiro para o Corinthians construir o seu estádio?



A copa do mundo é um evento que atrai muita atenção, proporciona visibilidade e pode alterar o perfil estrutural de certas regiões onde serão disputadas as partidas de futebol. É tudo maravilhoso, lindo, mas o custo de se promover um evento dessa magnitude? Certamente envolvem muitos recursos para que determinadas áreas sejam adequadas às condições necessárias ao êxito do evento como um todo. Em um país como o Brasil, onde as deficiências de toda natureza são visíveis, os gastos serão muito altos envolvendo dispêndio de recursos para a execução de obras diretamente envolvidas com o evento como estádio ou obras que são somente indiretamente envolvidas como transporte e outros. Os custos para a copa de 2014 serão pagos pelo governo ou pela iniciativa privada? É justo tirar dinheiro da saúde, educação, segurança, etc. para ser gasto com a copa do mundo?


Em todas as cidades onde ocorrerão jogos da copa haverá uma quantidade enorme de recursos a serem aplicados com a adequação da infraestrutura, entretanto, a responsabilidade será majoritariamente do setor público. Seja nas cidades grandes, médias, ricas ou pobres é do setor público de onde sairá o dinheiro para bancar esses custos de dezenas de bilhões de reais. Existem certas estimativas que chegam a R$ 40 bilhões o valor que sairá dos cofres do governo para a realização de obras para a copa. Esse valor é composto de aporte direto de recursos, isenção de impostos e subsídios nos empréstimos bancários. Na maioria das cidades sede da copa os estádios são públicos, assim, o governo irá investir em um bem público, irá realizar gastos para construir um bem público, um ativo público.


Entretanto, não é o que ocorrerá em algumas cidades, principalmente São Paulo, em que o setor público irá doar boa parte dos recursos para construir um estádio particular. O estádio a ser construído na zona leste da cidade de São Paulo pertencerá ao Corinthians que terá um custo muito reduzido para ter o seu próprio estádio. Além de ter muitas regalias na aprovação do projeto, com isenções de impostos, subsídios e aporte direto de recursos por parte do setor púbico, ao término da copa o Corinthians terá um estádio novinho a um custo muito reduzido porque os contribuintes brasileiros que pagam os seus impostos terão pago mais de 75% de seu custo. Na engenharia financeira arquitetada entre o presidente do time, o presidente da CBF, o ex-presidente LULA, o prefeito de São Paulo e outros viabilizou recursos de R$ 820 milhões para construir um estádio de 48 mil lugares com possibilidade de ser ampliado para 68 mil expectadores.


Desses recursos, R$ 400 milhões serão emprestados pelo BNDES a juros subsidiados, ou seja, ao invés dos juros de 15% ou mais que se cobra no mercado, os juros que o time e seus parceiros irão pagar ao Banco serão em torno de 5% ao ano nesse empréstimo cujo prazo de liquidação é de 15 anos. Os R$ 420 milhões restantes serão literalmente doados pela prefeitura na forma de isenção de impostos municipais. A prefeitura irá criar certificados que irá repassar para os responsáveis pela obra (na verdade será criado um fundo que, entre outras responsabilidades, será responsável por administrar esses recursos). O fundo irá vender os certificados para os devedores de impostos municipais (IPTU, ISS). Por exemplo, um certificado de R$ 500 mil poderá ser vendido para uma empresa que tenha um débito tributário com a prefeitura nesse montante. Entretanto, o certificado será vendido com deságio, digamos de 10%, o que no exemplo o fundo fica com R$ 450 mil em dinheiro vivo e o devedor da prefeitura liquidou uma dívida de R$ 500 mil com a prefeitura. No final das contas, a prefeitura terá R$ 420 milhões a menos nos seus cofres, os devedores da prefeitura terão liquidados débitos nesse mesmo montante pagando R$ 378 milhões, na hipótese de deságio de 10% nos certificados. O dinheiro que os devedores pagarem é o que entrará nos cofres do Corinthians.


Pelos números nas linhas acima verifica-se que haverá necessidade de mais recursos além do dinheiro da prefeitura e do BNDES, porque os certificados não serão vendidos por valor de face, certamente terá deságio, embora difícil de ser quantificado a priori. Além disso, caso se confirme São Paulo com sede da abertura da copa, o governo do estado irá gastar cerca de R$ 70 milhões para construir vinte mil lugares provisórios. Além disso, ainda ocorrerão isenções de impostos federais para materiais e serviços na construção do estádio que deverá chegar a R$ 65 milhões. Tudo isso para uma obra cujo dono não é o governo, mas uma entidade particular. Evidentemente, que além de todos esses recursos, o setor público irá executar diversas outras obras na região, mas todas serão obras públicas de verdade. O setor público irá gastar cerca de R$ 540 milhões em infraestrutura na Zona Leste de São Paulo para adequar aquela região às necessidades para a copa.


Com esse dinheiro que a prefeitura de São Paulo está doando ao Timão seria suficiente para construir e equipar quatro hospitais de bom porte atendendo milhares de pessoas todos os dias. Se na cidade o serviço de saúde pública, a educação e outros serviços públicos estivessem funcionando adequadamente, essa doação poderia até ser reconsiderada, mas não é o que ocorre. A carência nos mais diversos tipos de serviços da prefeitura evidencia a total inconveniência na doação dessa magnitude. A prefeitura já doou o enorme terreno para o time, agora vai construir o estádio, é inacreditável! Os subsídios que o governo federal está dando por meio da cobrança de juros muito mais baixos do que os cobrados pelo mercado são pagos por todos os brasileiros porque o Tesouro Nacional que cobre a diferença. Ou seja, o time paga menos juros, mas os contribuintes pagarão a diferença. O povo brasileiro não deveria pagar tanto para se divertir tão pouco e deixar um time muito rico mais rico ainda.
Autor: Francisco Castro


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