Hermenêutica e Hermenêutica Jurídica.



Hermenêutica vem de Hermes, que na mitologia grega intermediava a comunicação entre os homens e os deuses. A hermenêutica, a "arte da interpretação", era originalmente a teoria e o método de interpretação da Bíblia e de outros textos difíceis. Wilhelm Dilthey a alargou à interpretação de todas as criações e atos humanos, incluindo a história e a interpretação da vida humana. Heidegger, em Ser e Tempo (1927), esboçou uma "interpretação" do ser humano, o ser que, em si mesmo, compreende e interpreta. Sob sua influência, a hermenêutica se tornou um tema central na filosofia continental, gerando várias controvérsias. Ao interpretar algo, desenterramos os pensamentos e as intenções do autor, imaginando-nos em sua posição, ou relacionamo-lo a um todo mais amplo que lhe dá significado.
Carlos Maximiliano define Hermenêutica Jurídica como a ciência que "tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do direito".
A lei é norma abstrata, ao ser posta em relação com a diversidade dos fatos, passando do estado platônico para o positivo, pode dar ensejo à interpretação, para fixar-lhe o exato sentido e extensão. Eis aí o problema da interpretação das leis.
A interpretação das leis é ciência jurídica inteira: na frase de Demolombe, é o grande e difícil problema cujo conhecimento torna o jurista verdadeiramente digno desse nome.A necessidade da interpretação surge a todo momento no mundo jurídico, sobretudo na tela judiciária, desmentindo assim Proudhon de que "é caluniar a lei supor que ela é deficiente e obscura". Passar do texto abstrato ao caso concreto, da norma jurídica ao fato real, é tarefa do aplicador do direito, seja ele juiz, tabelião, advogado, administrador ou contratante.
A ambiguidade do texto, má redação, imperfeição e falta de técnica impõem, a todo instante, a intervenção do intérprete, a pesquisar-lhe o verdadeiro significado, o que o legislador quis editar ou estatuir.
Interpretar uma lei é determinar com exatidão seu verdadeiro sentido, descobrindo os vários elementos significativos que entram em sua compreensão e reconhecendo todos os casos a que se estende sua aplicação. Para Savigny, interpretação é a reconstrução do pensamento contido na lei. Interpretar a lei será reconstruir a mens legis, seja para entender corretamente seu sentido, seja para suprir-lhes as lacunas. Fácil a tarefa se a lei é clara, porém, difícil se a norma a ser interpretada é obscura ou formulada de modo ambíguo.
Carlos Maximiliano ensina "interpretar é determinar o sentido e o alcance das expressões do direito"; interpretação, diz Cociello, "é a investigação e explicação do sentido da lei". Cociello adverte que a clareza de um texto é algo muito relativo e subjetivo: o que parece claro a alguém pode ser obscuro para outrem.
Três elementos integram o conceito de interpretação. 1) A fixação do sentido, observa Torré, tem sua razão de ser, porque a norma jurídica possui um sentido ou finalidade. Por ex.: a lei que estabelece a exigência de férias anuais remuneradas, tem a finalidade de assegurar um descanso para a saúde física e mental do homem que trabalha. Este é o seu sentido. 2) Interpretar não é apenas esclarecer seus termos de forma abstrata, mas, principalmente, revelar o sentido apropriado para a vida real e capaz de conduzir a uma aplicação justa. Não compete ao intérprete só procurar, atrás das palavras, os conceitos possíveis, mas, entre os pensamentos possíveis, o mais apropriado, correto, jurídico. 3) Além do sentido cabe ao intérprete determinar o alcance. Duas leis com o mesmo sentido podem ter extensão ou alcance diferentes. O Estatuto dos Funcionários Públicos e a CLT, por exemplo, tem o mesmo sentido estabelecendo o descanso semanal remunerado, mas tem alcance diferente pois a primeira se estende aos servidores públicos federais e a segunda, CLT, aos empregados das empresas.
É usual no português, como em outros idiomas, o emprego de "interpretação" e "hermenêutica" como sinônimos. Esses termos se distinguem: hermenêutica, em sentido técnico, é a teoria científica da interpretação; e interpretar é fixar o verdadeiro sentido e alcance de uma norma jurídica.
A interpretação, portanto, consiste em aplicar regras que a hermenêutica perquire e ordena, para o bom entendimento dos textos legais. Na linguagem jurídica, "norma jurídica" abrange em sua acepção mais ampla desde as normas constitucionais até as normas contratuais ou testamentárias, de caráter individual.
Esse é o sentido estrito e próprio do termo "interpretação". Em sentido amplo, emprega-se, muitas vezes, o vocábulo "interpretação" para designar, não apenas a determinação do sentido e alcance de uma norma jurídica existente, mas também a investigação do princípio jurídico a ser aplicado a casos não previstos nas normas vigentes. A essa atividade dá-se a designação de "interpretação" da ordem jurídica ou preenchimento das lacunas da lei.
Autor: Narjara Weirich


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