Da Existência a Legalização da Pena de Morte no Brasil



Para a legislação brasileira, o direito à vida é garantia pétrea, determinado no
caput do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Título II, Dos Direitos e Garantias Fundamentais, Capítulo I, Dos direitos e Deveres Individuais e Coletivos.

"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade. (BRASIL, 2007a, p. 21)".

Proteção também constante no Novo Código Civil Brasileiro de 2002, artigo
2º, "a personalidade da pessoa civil começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro" (BRASIL, 2007b, p.135).

Ao apreciar os citados textos, torna-se convicta a afirmação de que, o direito a vida é o maior de todos os direitos do indivíduo, adquirindo-o desde sua concepção não podendo ser admitido ofensa à este princípio fundamental nem mesmo modificação que venha a abolir o direito à vida como determina a Constituição Federal no artigo 60, § 4ª, inciso IV, "não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir [...] os direitos e garantias individuais". (BRASIL, 2007a, p.39).

No entanto, fato curioso surge quando o texto da Constituição Federal declara a possibilidade de pena de morte, no mesmo artigo 5º, inciso XLVII, "não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada nos termos do artigo 84 XLX, da Constituição Federal" (BRASIL, 2007a, p. 24).

A Constituição Federal de 1988, não conseguiu por fim ao Decreto-Lei 1.001, de 21 de outubro de 1969, que trata do Código Penal Militar, que institui a pena de morte como mais uma entre tantas baseadas na coação, repressão, julgamento e punição.

O Código Penal Militar traz o seguinte texto:

"Artigo 55. As penas principais são: a) morte.
[...]
Artigo 56. A pena de morte é executada por fuzilamento.
Artigo 57. A sentença definitiva de condenação à morte é comunicada logo
que passe em julgado, ao Presidente da República, e não pode ser
executado senão depois de sete dias após a comunicação.
Parágrafo único. Se a pena é imposta em zona de operações de guerra,
pode ser imediatamente executada, quando exigir o interesse da ordem e
da disciplina militares (BRASIL, 1969, p. 481-482)".

O direito à vida é colocado de lado sempre que houver interesse da ordem e da disciplina militar, defeso por lei e a aplicação da Lei Penal Militar é prevalecente inclusive a regras internacionais, como se observa no artigo 7º do Código Penal Militar de 1969:

"Aplica-se a lei penal militar sem prejuízo de convenções, tratados e regras
de direito internacional, ao crime cometido, no todo ou em parte, no território
nacional, ou fora dele, ainda que, neste caso, o agente esteja sendo
processado ou tenha sido julgado por justiça estrangeira (BRASIL, 1969, p.
474)".

Em meio a guerras urbanas, mortes desmedidas, sem respostas aparentes, tornam-se vencedores os que utilizam da criminalidade para adquirir o tão almejado poder.

Batista (1990, p. 18-19) leciona que:

"Sempre que ocorre uma onda de violência, ou um crime particularmente
cruel, aparecem políticos oportunistas pregando a pena de morte. Quase
sempre são políticos que nada fazem para mudar a situação de miséria,
promiscuidade e medo que é a mãe da criminalidade. Quase sempre são
políticos ligados aos maiores criminosos do país, que, no entanto, praticam
uma delinquência dourada e impune, sem se preocupar com a policia ou a
justiça. Mas algumas pessoas de boa-fé acabam acreditando que a pena de morte pode ajudá-las, que a pena de morte pode diminuir os assaltos, os estupros, os homicídios, etc. Não acreditem nisso. A pena de morte não
ajuda a reduzir a criminalidade. Como é que se sabe? È que em muitos
países a pena de morte foi abolida, e em alguns outros introduzida. Isto
aconteceu principalmente na Europa, na metade do século. E as estatísticas de antes e depois da pena de morte puderam ser
comparadas. A ONU fez um relatório sobre isso. Não há nenhuma diferença a favor da pena de morte. Também nos Estados Unidos, um professor fez uma pesquisa em Estados com e sem pena de morte, para um mesmo crime: matar um policial em serviço. Ele pensava que ia encontrar menos desses homicídios nos Estados sem pena de morte. Pois os resultados provaram que não havia qualquer diferença. Mas se não existissem provas de que a pena de morte reduza a criminalidade, existem provas de que ela a aumenta. Antigamente, quando as execuções eram públicas, percebeu-se um aumento de violência na área em que os condenados eram mortos. Pior do que isto, foram os inúmeros casos de pessoas que cometeram um crime punido com uma pena de morte só para "suicidar-se", através do carrasco.
[...] O pior da pena de morte, com tudo, não é sua ineficácia para reduzir a
criminalidade, e sua propensão a incentivá-la. O pior é que ela é aplicada
discriminatória mente. São os pobres, os negros, os inadaptados que vão
para os corredores da morte: ricos e poderosos nunca põem os pés lá".

Vários Juristas relataram suas opiniões no que concerne a pena de morte.
Hungria apud Garcia (1993, p. 50):

"Toda a evolução do Direito Penal subverte-se de chofre, com a adoção da
pena de morte. Todo o acurado esforço da política penal no sentido da reassimilação social do delinquente é renegado, e substituído por um sinistro espetáculo na matança. Ao invés da plástica da alma humana ou da refinada técnica de regeneração, uma triste magarefada, uma repulsiva
cena de sangue ou um lúgubre método de matar. Ao invés de processos
ortopisíquicos que tornem possíveis ainda que um minimum, de adaptação
social nos mais endurecidos criminosos, a guilhotina, a cadeira elétrica, a
forca, o fuzilamento, o machado do carnífice, os gases tóxicos nas câmaras
de morte. a pena capital é tudo quanto á de mais anti estético. Por outro
lado, não se pode dizer que a criminosos incorrigíveis. O que há são
criminosos incorrigidos, isto é, irredutíveis aos meios de correção até agora
conhecidos, é o que já acentuava há 50 anos, Concepcion Arenal, no
congresso penitenciário de São Petesburgo. A persistente inafeissoabilidade social de alguns delinquentes é apenas o atestado da
insuficiência dos vigentes processos correicionais. Não se pode jamais
perder a esperança de transformar um criminoso inveterado num elemento
útil a sociedade... Dentre todas as objeções que formulam a pena de morte,
uma é, positivamente, intransponível: é a que concerne ao seu caráter
absoluto, tornando impossível a reparação de um possível erro judiciário".

Para Mirabete (2007, p. 248), "a difusão do pensamento humanista faz a
opinião pública considerar a pena de morte como inútil e odiosa. O caráter inviolável da vida humana se opõe a ela". Beccaria (1995, p. 45), é ainda mais veemente em sua crítica, "a pena de morte, pois, não se apoia em nenhum direito. É guerra que se apoia em nenhum direito. É guerra que se declara a um cidadão pelo país, que considera necessária ou útil a eliminação desse cidadão".

O esforço para a reabilitação social não é reconhecido e se torna inválido ao ser substituído sumariamente por um show, um espetáculo, uma reprise com cenas explícitas de sangue e destruição, que lotam as ruas de curiosos dispostos a pagar para ver.

Retirar do convívio social, tirar sua liberdade e procurar verdadeiramente sua reabilitação, é o melhor e o mais digno a ser feito, uma vez que traz uma paz momentânea à população, dor ao criminoso que procura a liberdade e não teme a morte, abrindo brechas para a reabilitação.
Autor: Ermones Oliveira Garcia Junior


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