Deus: Homem e Mulher. Uma visão sócio-filosófica-teológica do estudo do Sagrado na perspectiva Feminina.



ABSTRACT ? This text is a vision of the universe theology of the woman about concepts philosiphcs and theologics presents, where a woman and her reflection, will be religious or not, is the center of the reflection theology, introducing so inumerables possibilities of comprehension of the
"Sacred" at the society present.
Key-Words: God/Mam/Womam/Theology/Paganism/Christianism

Palavras-Chaves: Deus/Homem/Teologia/Paganismo/Cristianismo


As mulheres, ao longo do tempo, conquistaram o direito de queimar sutiãs, vestir calças compridas, fumar em público, dirigir (até ônibus e caminhão), votar, disputar com os homens altos cargos executivos/políticos e transar com mais de um parceiro, desde o advento da pílula anticoncepcional. São firmes em suas decisões, um tanto menos vaidosas e mais praticas, usam sua inteligência e, em alguns casos até suprimem e começam a deixar os homens loucos, não de paixão, mas de medo... A sedução dá lugar à negociação nas mesmas bases, o casamento é um contrato firmado em termos igualitários e elas são capazes de criar muito mais do que filhos. O que está acontecendo? Mudaram as mulheres ou o mundo mudou?
O modelo andrógino, presente em várias culturas, sempre sintetizou a necessidade de complemento entre masculino e feminino. Perpetuado através do mito de Hermafrodito, filho do Deus grego Hermes, o mensageiro, e da bela e sensual Afrodite, Deusa do amor, representa o ser auto-suficiente, que traz em si os dois sexos. Narra a Mitologia que Dotado de imensa beleza, Hermafrodito foi abordado às margens de um lago pela ninfa Sálmacis, que o desejava ardentemente. Recusando a ceder a suas propostas, ele despiu-se, seduzido pelas águas límpidas, na intenção de banhar-se. Ao mergulhar na água, foi abraçado pela impetuosa ninfa, que nesse instante pediu aos deuses que juntassem os dois corpos, de maneira a nunca se separarem. Assim foi feito, e Hermafrodito passou a ter os dois sexos; em troca, recebeu o Dom de tirar a virilidade de todo aquele que se banhasse no lago tentador.
Todos nós temos um certo grau de androginia. Produzimos hormônios masculinos e femininos, em maior ou em menor grau, segundo os comandos do nosso sexo. e também possuímos características e desenvolvemos atitudes tanto masculinas como femininas, pessoal e socialmente. Assim, para nosso pleno desenvolvimento psicológico, é útil integrarmos essas duas metades.
A porção masculina da mulher foi traduzida pela expressão animus e o lado feminino do homem foi traduzido pela expressão anima pelo psiquiatra suíço Carl G. Jung. Quando não cultivamos adequadamente esses aspectos da nossa personalidade, tendemos a criar uma imagem exterior que não corresponde ao nosso modelo interior. Um homem visivelmente viril na aparência pode ser internamente fragilizado pelo fato de não saber lidar com seus sentimentos e emoções. A mulher essencialmente preocupada em exalar feminilidade através de sua aparência pode tomar-se rude e obstinada intimamente, características consideradas masculinas.
A natureza é cíclica e, como bem apregoa a sabedoria oriental, a vida é um processo em constante movimento; tudo o que sobe é yang, princípio masculino, impetuoso; tudo o que desce é yin, princípio feminino, acolhedor, carinhoso. Tudo o que sobe tem de descer, e o que esta embaixo tornará a subir. Nos movimentos que impulsionam a diante a humanidade não ocorre de modo diferente. O que se preocupa alcançar é o ponto intermediário entre s forças, que representaria o nosso próprio equilíbrio. Ali se encerra toda a sabedoria e, por conseguinte, toda a felicidade.
Vivemos ciclos sucessivos de luta pelo poder. O contrário do que se vê hoje, nem sempre a força predominante foi masculina.
Nos primórdios da humanidade, a mulher representava a dominação. O divino ato da criação era atribuído a ela individualmente, uma vez que a vida se renova em suas entranhas. Os homens não tinham noção de que através de um parceiro se dava a concepção. Mais tarde, a necessidade de subsistir enfrentando os perigos da natureza como animais de grande porte e guerreiros das tribos vizinhas expôs o macho e conferiu-lhe lugar de destaque. Ele passou a dominar não apenas os inimigos, mas também a companheira, que antes protegia e idolatrava.
No advento da divindade, o princípio era personificado por uma Deusa: esse simbolismo foi traduzido para o ocidente na figura da Géia, a terra, que sozinha, sem, o auxílio da contraparte masculina, deu origem a Urano. Unindo-se a este, gerou mais tarde toda a linguagem do panteão grego. Géia pode ser identificada como a própria Mãe Natureza, reserva inesgotável de fecundidade. Mais adiante, o mito de Deméter, Deusa da Colheita, reforça o sentido de que a divindade era relacionada ao feminino, principalmente por suas características de provedora da vida e dos recursos para mantê-la.
Deméter, porém, tal como a Mãe-Natureza, quando irada era capaz de por fim a tudo através de seu incontrolável poder de destruição. Assim, era temida e respeitada. Por ocasião do rapto de sua filha, a virginal Perséfone, a Deusa entristecida tornou a terra estéril, perturbando a ordem do mundo, tamanho era o seu poder. Descobrindo o paradeiro da filha, pediu a Zeus, o Deus Supremo, que ordenasse ao raptor que a pusesse em liberdade. Atendendo à determinação de Zeus, Hades, o Senhor dos infernos, teve de devolver a Deméter a filha roubada. A ingênua Perséfone, porém, tendo conhecido o reino das profundezas e provado uma semente de romã, tornara-se esposa de Hades e, por isso, só poderia permanecer em companhia da mãe durante dois terços do ano. Nessa época, que inclui a primavera, a vida sobre a terra se renova e tudo floresce; fora dela, o solo permanece improdutivo pela maldição de Deméter.
O rapto de Perséfone remete-nos também à iniciação sexual da mulher, aqui frágil, presa seduzida pelo habilidoso e experiente Hades. Carregada para as profundezas do inferno (numa alusão aos mistérios do inconsciente), a inocente donzela entra em contato com os valores do mundo masculino, representados por seu impetuoso marido. Hades aparece desejoso por conquistar e subjugar a natureza virgem, usando como armas sua força viril e inteligência, características atribuídas à masculinidade.
Com o passar dos tempos, o homem foi se tornando o Senhor de todos os reinos. Na Antigüidade, as mulheres passaram afigurar como meros acessórios do mundo masculino; gregos e romanos, via de regra apaixonaram-se entre si e a paixão se fundamentava na grande admiração que sentiam uns pelos outros nem tanto física, mas intelectualmente. O homossexualismo era prática comum nessa época por conta desse amor sem limites. Somente o macho era digno de apreço. O raciocínio, a ciência, o progresso eram atributos masculinos. A procriação, antes divinizada, era agora banalizada e colocada a mulher em condição de inferioridade à mercê do homem, seu amo e senhor. Essa era, aliás, a única razão para que os homens copulassem com suas respectivas mulheres.
A partir do desenvolvimento da civilização ocidental, a sociedade machista se firmou, reservando à mulher apenas submissão e servidão. A idéia de um Deus Pai Criador colocou o homem em igualdade de condições com a Deusa no que se refere à geração da vida. De acordo com características masculinas, esse Deus é mais razão que emoção, capaz de castigar suas crias e até mesmo de enviar seu filho único para ser imolado.
No livro Wisdom`s Feast: Sophia in Study and Celebration, as autoras Susan Candy, Marian Ronan e Hal Taussing refletem sobre esse dilema:
"Uma mulher cujo único símbolo de Deus é masculino pode estar apta a orar para Ele ou ser confortada e protegida por Ele, mas há um ponto além do seu alcance: ela nunca pode se identificar com Ele. Ela pode acreditar que foi criada à sua imagem e semelhança, mas qual o significado de ser igual a alguém que é chamado de "Pai"? Somente negando a sua própria sexualidade ou se transferindo para uma esfera totalmente fora de seu alcance, além da identificação sexual, ela pode ser relacionada a alguém criado à imagem de um Deus masculino".
Nas religiões patriarcais, Deus existe para criar regras a serem obedecidas e castigar os infratores. Ele é, a um tempo, forte e autoritário. O mito da separação é reforçado, ao contrário das religiões matriarcais, onde ocorre a integração do ser humano comum com a divindade, através da exploração da própria natureza. Os rituais femininos transmitem princípios de amor e bondade, e cada participante aprende a experimentar suas influencias, conectando-se com os quatro elementos primordiais - água, terra, fogo e ar -, enquanto o patriarcado insiste na idéia de pecado e culpa, impondo a seus seguidores a sua verdade única.
Apesar do seu grande poder econômico, o cristianismo nunca conseguiu extinguir totalmente as religiões consagradas à Deusa. Mesmo com os horrores da inquisição, muitas seguidoras da Wicca - conhecida também como a Arte ou a Bruxaria tradicional persistiram na divulgação de seus ensinamentos que se tornaram ocultos desde então, por força da perseguição. O movimento emergente na recuperação dessas informações demonstra a busca legítima do ressurgimento do feminino.
Cultuando a Lua (princípio feminino) e não o sol (princípio masculino), muitas vezes as bruxas (witches) foram consideradas adeptas da magia negra, e sob essa acusação foram perseguidas e dizimadas. Hoje, porém, sabe-se que seus ritos prestam se basicamente a conduzir seus adeptos à perfeita integração com a natureza.
Neste 3º milênio, o retorno à Deusa é inevitável. O mundo masculino, com seus valores materiais, individualismo, racionalíssimo exacerbado, competitividade e domínio da natureza, não proporcionou a homens e mulheres a qualidade de vida esperada. O progresso ilusório não tornou a humanidade feliz. O jugo da mulher não resultou numa sociedade organizada e produtiva que tem o ser humano como centro de suas atenções.
Por outro lado, combatemos fogo com fogo, a mulher se perdeu no feminismo, que pregava igualdade mas acabou gerando uma verdadeira guerra entre os sexos. Mas usando atributos masculinos como a razão e a organização, ela fez emergir a discussão sobre o poder feminino e sua contribuição na atualidade para a criação de um mundo melhor. O resgate do feminismo na sociedade atual se deve não apenas à força da mulher, mas a uma busca interior do próprio homem por valores mais consistentes e produtivos, como bondade, compaixão e amor. É dessa busca comum que o movimento ressurge fortalecido e consistente.
Masculino, feminino. Duas metades complementares, em perfeita sintonia e integração. Agora, este é o sonho dos homens e das mulheres da boa vontade. Como nos belos versos de Gilberto Gil em "super-homem - A Canção".
" Um dia, senti a ilusão de que ser homem bastaria
que o mundo masculino tudo me daria
o que eu quisesse ter.
Que nada,
minha porção mulher, que até então se resguardava
é a porção melhor que trago em mim agora
é que me faz viver Quem dera, Pudesse todo homem compreender, Ó Mãe,
quem dera.
Ser o verão o apogeu da primavera
E só por ela ser.
Quem sabe
O super-homem venha nos restituir a glória,
Mudando, como Deus, o curso da história
Por causa da mulher... "
É dentro desse universo que hora vislumbramos, que surge a Teologia de cunho feminino.
Pode-se até dizer que a reflexão Teológica feminina se compara a passagem bíblica citada no evangelho de Lucas 15,8-10: " A alegria de Deus se assemelha a uma mulher que, ao perder uma dracma, acende a lâmpada, põe-se a varrer toda a casa e procura cuidadosa mente até encontrá-la, e então chama todas as suas amigas e vizinhas para festejar com alegria por tê-la encontrado. "
A dracma simboliza o encontro e a descoberta da mulher a partir da sua vivência de Deus e do trabalho teológico que as mulheres experienciem no dia-a-dia e vai ganhando sempre mais espaço até se tornar festa em praça pública, onde toda mulher é convidada a dançar e exprimir-se com alegria em uma linguagem compreensiva para todos.
Faz-se mister aqui, mostrar que atividade teológica da mulher procura ser:
- Integradora das diversas dimensões humanas, força e ternura, alegria e choro, intuição e razão.
- Comunitária e relacional: recolhe grande número de experiências que exprimem algo vivido e sentido, de maneira que as pessoas se reconhecem, e se sentem interpeladas pela reflexão.
- Contextual e concreta: parte da realidade geográfica, social, e cultural, percebendo as perguntas vitais da comunidade. Trata-se de uma atividade teológica marcada pelo cotidiano da vida como um lugar de manifestação de Deus.
- Militante: no sentido de participar no conjunto das lutas de libertação dos povos a nível específico e global, ação, virtudes que garantem a certeza da fé no Deus que está conosco.
- Marcada pelo bom humor, alegria e celebração, virtudes que garantem a certeza da fé no Deus que está conosco.
- Impregnada de uma espiritualidade de esperança que parte da condição de mulher e exprime força, sofrimento e ação de graças.
- Livre: com a liberdade de quem não tem nada a perder, e aberta, com a capacidade de acolher diversas interpretações da realidade.
- Reconstrutora da mulher tanto nos textos bíblicos, como na figura de mulher que, a partir de sua própria realidade, são símbolos de luta resistência, sabedoria e liderança, solidariedade e fidelidade, justiça e paz. "
Segundo as pistas acima sobre a atividade teológica da mulher atual, podemos encontrar um caminho que conduz à revelação do feminino em Deus a fim de sermos capazes desde dentro da Igreja e fiéis à Boa Nova traduzida por Jesus Cristo, crer e inovar a Deus também no feminino.
Creio que existe um princípio feminino em nossa criação à imagem de Deus, em nossa salvação possibilitada pela Encarnação, Paixão e Ressurreição de Deus, tanto no universo feminino quanto no universo masculino. É preciso, portanto, que esse princípio feminino seja retirado da obscuridade onde tem se mantido ao longo de todos esses séculos de cultura patriarcal judaico-cristã e venha à tona para ocupar o lugar que lhe cabe. A fé num Deus identificado puramente com o masculino é incompatível com a Revelação cristã e sua proposta de amor totalizante e universal.
Já se tornou bastante evidente em nosso tempo que a linguagem, as imagens e os símbolos que se usaram para expressar a Deus foram cunhados perpetuados pela mente masculina, sua racionalidade lógica. Edificou-se um sistema de filosofia, teologia, ciências, técnicas e ideologias de acordo com essa mentalidade, essas imagens e símbolos. Em seguida foi transmitida por meio de um sistema de ensinamentos e aprendizagem que aponta para o êxito solidário e a hierarquização das pessoas numa pirâmide do saber. Este sistema erigiu e erige a umas poucas pessoas como donos da vida e da morte da grande maioria. Mudar este sistema através da sensibilidade teológica feminina e os pontos de vista teológicos masculinos são necessários para uma maior compreensão do ser Divino e do próprio ser humano.
Seria um caminho de renovação onde se associam as várias faces da Renovação: Homem e Mulher criados igualitariamente à imagem e semelhança de Deus, portanto, aptos a caminharem junto na construção do conhecimento e do entendimento teológico e humano.
Se a imagem divina se encontra tanto na mulher como no homem, se o Deus em que cremos tem traços e modos de atuação tanto masculino como femininos, será preciso de agora em diante, para descrever Deus, utilizar palavras e imagens masculinas e femininas. Se tanto a mulher quanto o homem foram imagem de Deus é necessário que esse Deus de quem são imagem não seja descrito e pensado simplesmente do ponto de vista masculino, mas como também do ponto de vista feminino. Sabe-se que esta mudança é difícil, pois temos que lidar com a pobreza de nossa linguagem humana, limitada para expressar a Majestade e a Inefabilidade do divino. No entanto, a combinação dos dois símbolos, das linguagens, a masculina e a feminina, têm mais condições de viabilizar a totalidade do divino, uma vez que são modeladas sobre a totalidade do humano.
Sob este prisma, já afirmava Clemente de Alexandria, por volta do ano 180 d.C., "Homens e Mulheres partilham igualmente a perfeição e estão aptos para receber a mesma instrução e a mesma disciplina. Pois o nome humanidade é comum a ambos, homens e mulheres, e, para nos em Cristo não macho e fêmea. É necessário aprofundar, na ótica de feminino, alguns temas como a imagem de Deus, a encarnação, a vivência de Deus, a Trindade, a comunidade, o corpo, o sofrimento e a alegria, conflito e o silêncio, o lúcido e o político, a ternura e a beleza.
Buscar esta visão de Deus, nesta perspectiva teológica, trilhando tanto o universo feminino quanto o masculino, ajuda-nos a perceber a força e a ternura presente na tarefa conjunta de gerar e nutrir a vida do homem novo e da nova sociedade.
A alegria da mulher que encontrou sua dracma atingiu a plenitude só quando, pode compartilhá-la. É no sentido da partilha que podemos resgatar a dignidade da mulher e, a partir dai construir o novo ser humano onde está presente a imagem de Deus, Cristo ressuscitado. Só assim, meus amigos, poderemos vislumbrar um novo céu e uma nova terra, poderemos cantar e dançar, pois teremos a certeza de que homens e mulheres são uma só vida diante da força geradora da vida: Deus.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BINGEMER, Maria Clara. "O Mistério de Deus na Mulher". Rio de Janeiro: ISER,
1998 p. 70-80.

BOFF, Leonardo. "O Rosto Materno de Deus". 5ª ed. Petrópolis. Vozes, 1995 p.160-
170.

DELEMEAU, Jean. "História do Medo no Ocidente". São Paulo: Círculo do Livro
S.A., 1987 p.20-40


Autor: André Luiz Baeta Neves


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