Testando Remédios



Já havia quase duas semanas que Migrantino estava desempregado, e isto lhe deixava preocupado, pois tinha que pagar suas despesas. Em Londres as oportunidades de emprego eram bem diversas, algumas até arriscadas e até bizarras. Uma vez, ficou sabendo, através de um conhecido de seu serviço anterior que existia um trabalho que pagava muito bem. Mas, evidentemente, se eles pagavam bem, não seria uma serviço qualquer. Miguel, lhe informara que era para testar remédios. Migrantino não era muito de tomar remédios, até mesmo quando adoecia, pois achava que alguns, além de não curar, muitas vezes tinham efeitos colaterais imprevisíveis.

Neste novo serviço serviria como cobaia de remédios que estavam ainda em fase de testes, mas que ainda não fora aprovado e liberado pelo órgão de controle da inglaterra. O risco era médio, pois os medicamentos já haviam passado por centenas de análises até que estivessem prontos para serem testados em seres humanos. Caso aprovado, ou seja, se a cobaia não morresse ou apresentasse efeitos colaterais sérios), o remédio seria liberado para ser vendido à população.

Ele sempre falava que este seria o último serviço no mundo que teria coragem de fazer. Mas com o tempo fora assimilando a idéia. Afinal, estava em um país de primeiro mundo, que levava tudo à sério. Portanto o risco não seria tão grande assim. E a remuneração era irrecusável. Depedendo do tipo de medicamento, pagavam muito bem. Se o risco fosse quase zero, não pagavam muito, mas caso contrário, aumentariam a oferta. Nao demorou muito tempo até que ele vai ao hospital preencher uma ficha, e posteriormente assinar um contrato (de risco).

O primeiro dia, consiste em fazer exames de rotina, para analisar a saúde do indivíduo, checar se tudo está no devido lugar, para só depois começar os procedimentos de testes. Nas semanas que se passaram tudo corria normalmente. Migrantino não sentia nenhuma alteração em seu corpo. Ao contrário. As vezes se sentia até muito bem. Se esquecia até dos possíveis riscos que corria. Até que um dia encontra Ana no centro da cidade em um cafe brasileiro. Depois de conversarem sobre diversos assuntos, ele lhe fala de seu novo serviço (um de seus problemas também era falar demais). Esquecera que ela tinha o hábito de amedrontar as pessoas sobre os riscos que ronda os trabalhos londrinos.

Quando Migrantino finalmente lhe fala de seu serviço, ela lhe adverte: "nao estou te querendo assustar, mas este serviço é muito perigoso. Conheci vários casos de pessoas que tiveram diversos tipos de efeitos colaterais horríveis. alguns muito graves, como por exemplo de um rapaz, chamado willian que teve um aumento em seu crânio. Sua cabeca foi crescendo aos poucos, foi um horror!! O pior era que ele trabalhava como motoboy. Tem também um outro que eu não me lembro bem seu nome agora. Teve que amputar parte de sua perna, depois de ter submetido a estes testes. Mas não precisa ficar assustado, só estou te alertando".

Nesta altura ele já estava completamente apavorado, imaginando as possíveis consequências. Já imaginava sua cabeça crescendo, andando de muletas. Podia até sentir ela começar a latejar. Coceiras pelo corpo, ardência na ponta do nariz. Suas orelhas esquentando. Enfim todo tipo de alerta que possivelmente seu corpo estivesse lhe dando em consequência de alguma alteração provocada pelo efeito das drogas. Sempre quando chegava em casa e antes de sair para o trabalho ele costumava medir o tamanho de todos os seus membros para conferir se estavam dentro do padrão. Pois uns poderiam crescer e outros diminuirem, mas como achava que sempre fora azarado, o que ele desejaria que crescesse com toda a certeza diminuiria.

Apalpava seu corpo regularmente, procurando uma possível anomalia. Sua vida ia se tornando em um verdadeiro inferno. Chegou a comprar uma pequena caixa de ferramentas com todo tipo de aparelhos de medições, internas e externas, como trenas, réguas, paquímetro para medições internas, micrômetro para medições mais precisas. Conferindo assim todos os orifícios, volumes e áreas de seu corpo. Gastava horas nas suas conferências. Às vezes precisava ficar em posições desconfortáveis pra fazer o serviço. Acordava quase todas as noites, pressentindo alguma alteração e já ia em disparada pra frente do espelho. Como tinha diculdade para medir o diâmetro de sua cabeça, teve que comprar um capacete de motoqueiro, apesar de não ter nenhuma intimidade com motocicletas. O que lhe causou muito constragimento para explicar as pessoas porque tinha um capacete sem nuca ter tido uma moto.

Quando estava em lugares públicos, como na rua ou metrô, se notasse alguma olhada em sua direção, já imaginava que seria ele o alvo. Talvez tivesse surgido alguma alteração em seu corpo que não notara, mas que as pessoas ja estavam percebendo. Uma vez sentou em frente a um carrinho em um ônibus e o bebê começou a encará-lo. Ficou logo desconfiado, pois a criança o olhava assustada e fazia umas caretas de vez em quando, ameaçando chorar, o que lhe obrigou a desembarcar às pressas à procura de algum banheiro ou algo parecido para se certificar de que seu corpo estava normal, ou os remédios já estariam mostrando seus efeitos colaterais. Seu mêdo foi chegando ao extremo. Já pensava na possibilidade de ser pego em algum lugar público fazendo suas medições. Seu cérebro lhe mostrava frequentemente imagens daquelas reportagens horríveis nos jornais sensacionalistas de Londres: "IMIGRANTE ILEGAL É ENCONTRADO EM BANHEIRO DE SHOPPING MEDINDO O PRÓPRIO NARIZ E OUTRAS PARTES DO CORPO COM UM PAQUÍMETRO". E as caras das pessoas balançando suas cabeças, num gesto de reprovação e indignação. Desta vez dando umas risadinhas discretas. (se comportando como se nunca tivessem medido nada em seus corpos em todas suas vidas). Até que finalmente desistira desse emprego, caso contrário, não teria mais condiçõe nem de sair em público temendo ser alvo de alguma chacota, caso parte se seu corpo resolvesse se manifestar em protesto as drogas ingeridas desnescessariamente.
Autor: Sérgio Martins


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