O Federalismo Brasileiro



O FEDERALISMO BRASILEIRO: AS PERSPECTIVAS E A CRISE ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS AUTOR: BRUNO EDUARDO PEREIRA DE SOUZA I ? FEDERALISMO: Breve Análise Histórica O Estado Federal é um fenômeno dos tempos modernos. O marco inicial do federalismo foi à elaboração da Constituição dos Estados Unidos da América (EUA) de 1787 - que ocorreu no final do século XVII - quando as treze colônias inglesas, unidas contratualmente sob a forma de uma confederação, decidiram se organizar com uma união mais complexa, rígida e definitiva para melhor atingir seus objetivos comuns. Assim, o advento do texto constitucional estadunidense consagrou o nascimento do Estado Federal, como uma nova forma de organização política, onde há a ocorrência de uma demarcação de certas prerrogativas de exercício de soberania em oposição à forma de estado unitária com um governo uno, em se tratando de competências e autonomias nacionais. Segundo SAHID MALUF o "Estado Federal é aquele que se divide em províncias politicamente autônomas, possuindo duas fontes paralelas de direito público, uma nacional e outra provincial" (2006, p. 167). Neste sentido, no federalismo procura-se um maior grau de descentralização política, administrativa e legislativa a ser exercida por parte dos órgãos governamentais. o que na teoria garante uma maior democracia, permitindo o Estado ter mais legitimidade nas suas decisões com a sua aproximação ao povo, fortalecendo o princípio federativo que, hodiernamente, grande parte das democracias contemplam. Consoante os ensinamentos de BONAVIDES o Estado Federal busca "institucionalizar-se por um modo mais perfeito e eficaz sob a forma de comunhão perpétua e indissolúvel, capaz de exprimir os altos valores de solidariedade, do amparo mútuo, do respeito, da colaboração e da liberdade" (1996, p. 157). Esse arranjo institucional caracteriza-se pelo pacto federativo com o estabelecimento de regras que demarcam o campo reservado à atuação da União e dos demais Entes Federados dentro de seus respectivos limites constitucionais. Por isso, as constituições que adotam este tipo de Estado são dotadas de rigidez para garantir uma maior estabilidade e segurança jurídica institucional. II ? Ascensão e Trajetória do Federalismo A federação brasileira ergueu-se pela primeira vez com a proclamação da República pelo decreto n. 1 de 15 de novembro de 1889 e, por conseguinte, se consolidou com o advento da Constituição Republicana de 1891 sob inspiração do federalismo oriundo dos EUA. As então províncias foram transformadas em Estados membros à união configurando a forma federativa dual. Porém, como afirma MALUF "o federalismo brasileiro surgiu como resultado fatal de um movimento de dentro para fora e não de fora para dentro; de força centrífuga e não centrípeta; de origem natural-histórica e não artificial" (2006, p. 172). O movimento nasceu com o projeto das elites políticas oligárquicas que dominavam o cenário nacional naquele momento com a queda da monarquia e o fim do império. O ocaso do mesmo se verifica pela forte interferência do imperador na vida política da nação através do poder moderador que o fornecia certas prerrogativas de autonomia, o que centralizava cada vez mais o poder executivo. Isso acabava por provocar as reações das elites pelo ideal federativo - para melhor atingir seus objetivos - na busca pela descentralização política com a autonomia dos poderes das regiões na república recém-inaugurada. Pode-se dizer que o Estado Unitário brasileiro se desmembrou e, em decorrência disto, houve o aparecimento da Federação. Por isso, o modelo brasileiro é caracterizado como centrífugo: nasceu no centro e se propagou para as periferias como forma de manutenção da unidade nacional. Ao proceder a uma rápida análise do sistema colonial implantado no Brasil pelos colonizadores portugueses, pode-se verificar que este se configurou como a forma embrionária das nuances do federalismo posto no país. É simples a percepção de que o modelo de organização implantado delegou uma maior autonomia aos poderes regionais, que se organizavam em conformidade com núcleos de sua ocupação e economias existentes. Dessa maneira, na região açucareira tem-se um modelo de organização estrutural diferente daquele percebido no sul do Brasil pelos produtores de charque e, posteriormente, pelos cafeicultores na região sudeste. Assim, essa descentralização na forma de administração das economias regionais foi um fator extremamente relevante ao surgimento desta forma federal de Estado no país. Destarte o Brasil ainda tivesse mantido formalmente como um estado unitário até o final do século XIX. Devido ao momento de tensão iminente entre guerras pelo qual o mundo vivenciava e pelas circunstâncias instáveis internas que o país enfrentava, pode-se dizer que houve um federalismo meramente formal no Brasil, pois o que se viu foi uma forma que se aproximava, ou se configurou, como um estado unitário com a centralização do poder muito grande à União, como ocorreu com as Constituições de 1937 e de 1967 e durante a vigência da Emenda n. 1/69, onde ocorriam medidas de exceção e intervenções federais nos entes federado, constituindo como uma verdadeira usurpação do poder por parte do executivo. Houve ainda forte supressão da autonomia estatal com governos e assembléias dissolvidos. Na Constituição de 1946 houve um abrandamento dos poderes centrais com o desenvolvimento do federalismo, mas isso não tirou o ônus do poder central, que continuava com sobrecarregada carga de diversas matérias sobre a regência de sua competência. Portanto, o federalismo brasileiro é marcado desde o seu nascimento por avanços e retrocessos e, atualmente - como será debatido posteriormente - vive uma crise entre os componentes do nosso Estado Federado. A Constituição Brasileira de 1988 marca um novo momento na tentativa de redemocratização do país, haja vista as duas décadas marcadas por um regime rígido, centralizador e na prática unitarista ao qual o país presenciou. Dessa forma, buscou-se agora um maior equilíbrio e harmonia entre os três poderes da União colocando-se alguns limites formais e materiais no texto supremo. Dispõe o artigo 1° da Constituição Federal de 1988 (CF/88) que "A República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito". Ainda prescreve o artigo 18 do mesmo diploma legal que "a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, O Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição". Desse modo, o poder de auto-organização dos entes federados se configura como uma autonomia que a Constituição os legitima que não se confunde com soberania, pois esta compete privativamente à União que possui a prerrogativa de personalidade jurídica para representar a Federação no direito internacional. Existe no Brasil, um modelo federal ? chamado por muitos doutrinadores - de federalismo cooperativo e de equilíbrio, quanto à forma de repartição de competências; de forma concorrente e coordenada, mas que grande parte destas competências continuam sob a jurisdição da União. Porém, o que será discutido a partir de então é que o federalismo no país ainda é permeado de vícios em sua forma. Um federalismo que tem muito a mudar para melhor favorecer ao desenvolvimento do país e da diminuição das discrepâncias regionais que podem ser explicadas por um processo histórico que retoma ao início da colonização do país. Mesmo o texto supremo reconhecendo alguns novos papéis dos estados-membros e dos municípios, como a possibilidade de obter seus próprios recursos através de tributos, vê-se que a União ainda centraliza grande parte de competências que hoje deveriam ser revisadas devido à nova ordem mundial, como a maior necessidade de harmonização das prerrogativas da Administração Pública. A partir de agora será feito um ensaio para melhor entender o cerne da discussão ora presente. III ? A Crise Federativa e as Novas Perspectivas do Estado Federal Brasileiro Como se pode observar, o federalismo no Brasil é marcado historicamente por incoerências e por vícios que podem justificar a tradição centralizadora do Poder Executivo. No Brasil os entes federados possuem certa autonomia no que tange a arrecadação de suas próprias receitas. Porém, percebe-se que há uma saturação da União na arrecadação fiscal. Através dos repasses aos Estados-Membros e com o Fundo de Participação Municipal (FPM) aos municípios - o que contribuiu para a criação de novos municípios - o poder central busca mitigar os desequilíbrios e as desigualdades entre os entes federativos. Estes, por sua vez, deveriam utilizar melhor das suas prerrogativas e realizar com uma melhor eficiência os serviços públicos, fato esse que contribuiria, sobremaneira, para um equilíbrio na federação. Esse problema do pacto federativo que se configura por conflitos políticos e econômicos entre os membros da federação, obriga, por conseguinte, que os mesmos se subjuguem ao império do poder federal. Como assevera BONAVIDES os entes federados, cortejam o poder central, suplicam a intervenção econômica, os investimentos, os subsídios, os incentivos, sem nenhuma consciência do sacrifício e o tributo que significa a contrapartida política dessa presença unitarista da União (...), arrasando-lhes, com o ônus da sujeição econômico-financeira, a esfrangalhada autonomia constitucional e federativa (1996, p. 160). Outra questão que evidencia a crise federativa é a edição desenfreada de Medidas Provisórias por parte do Executivo Federal sem a devida necessidade de urgência e emergência, extrapolando as suas competências, atingindo o Poder Legislativo, principalmente, o Senado Federal que possui a incumbência de representação dos Estados e do Distrito Federal. No dizer de BONAVIDES "a União é tudo, os Estados-Membros quase nada" (1996, p.161). Muitos estudiosos defendem a criação de um Estado Regional como um quarto ente federado como uma saída para a crise federativa. Esse novo tipo de Estado maior seria resultante da união entre Estados a fim de melhor realizar seus interesses comuns e efetivar suas necessidades, evidenciadas com maior força e recursos, o que poderá contribuir para o nascimento de um novo modelo federativo plural, estabelecendo uma nova ordem. O ilustre mestre ainda discute É de prever, por conseguinte, uma futura revisão das presentes bases da organização federal, bem como uma política coordenada e sistemática da Federação (...) a definir com mais precisão as linhas de seu comportamento e as relações entre unidades regionais politizadas e a União. O federalismo tetradimensional que se adotasse (União, Estado, Município e Região) seria uma federalismo de transição, reservando-se à Região o papel de verdadeiro instrumento renovador e estimulante de reacomodação política e econômica do sistema, em termos mais realistas (1996, p.162). O federalismo está cada vez mais vilipendiado e desmoralizado. Por isso, deve-se apreciar este novo modelo proposto de federalismo mais equilibrado que reconheça as peculiaridades de cada região, haja vista ser o país constituído por uma grande diversidade sócio-cultural. Portanto, destaca-se a necessidade do Poder Central ceder mais de sua autonomia aos outros membros federativos, em especial as regiões, para criarem suas próprias formas de organização respeitando os seus costumes e parâmetros locais. IV ? CONSIDERAÇÕES FINAIS O Federalismo no Brasil é um problema a ser discutido com todo cuidado a fim de se proceder a uma reforma concreta e substancial, com a apreciação de um novo modelo federativo mais sensato e que reconheça o poder de estruturação dos entes federativos, dando-lhes prerrogativas específicas para se organizarem sem se sujeitarem ao domínio autoritário e centralizado do Poder Central. Contudo, antes de reformular o novo modelo ora supramencionado, deve-se proceder a um estudo dos problemas reais e todas as contradições internas entre o meramente formal e a experiência material a fim de se conhecer os erros para que os mesmos não retomem a se suceder, pois na observação de todas as constituições passadas, que tentaram exaltar a forma federativa de Estado, verificaram-se incongruências entre a intenção do legislador e o verdadeiro espírito das leis que deram "legalidade" aos atos prepotentes de alguns que ainda abusam de suas competências. V ? REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGHER, Anne Joyce (organizadora). Vade Mecum ? Acadêmico de Direito. 7. Ed. São Paulo: Rideel, 2008. BISPO, Eluiz Antônio Ribeiro Mendes e. Uma Reflexão sobre o município brasileiro na vanguarda dos modelos autonomistas. Disponível em . Acesso em 08 de junho de 2009, às 10:20h. BONAVIDES, Paulo. A Constituição Aberta ? Temas políticos e constitucionais da atualidade, com ênfase no Federalismo das Regiões. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. GADELHA, Gustavo de Paiva. Federalismo Brasileiro: da retórica à realidade. Disponível em . Acesso em 10 de junho de 2009, às 10:19h. MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
Autor: Bruno Eduardo Pereira De Souza


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