Amarália e o Velho
(homenagem póstuma ao meu avô)
Sou Amarália,
Não sou poeta,
Não tenho vontade de ser
Me sai do coração,
O que tenho prá lhe dizer
Desculpe, não sou letrada,
De português não entendo muito
Venho dos campos e dos matos
Da alma, o vale profundo.
Não existe uma escola
Que ensine sentimentos
Aprendi com as pessoas,
Com o mundo e animais
Com as flores, com os livros
Lidos junto aos cafezais.
Sentada no pé do morro
Conheci um ancião
Com o seu chapéu de palha
E um lápis em sua mão
Eu não sabia escrever
Nem tampouco o que é poema
Ele escrevia sem travessão
E não sabia o que é fonema
Perguntei-lhe o que fazia
Disse-me que namorava o mundo
Falou-me sobre as árvores
E sobre abismos sem fundo
Com o velho aprendi a sentir
Aprendi a ter direção
Acabei aprendendo a escrever
Guiada por suas mãos.
Falávamos sobre as folhas,
Sobre as águas, sobre o ar
Viajei pelos espaços
No céu, na terra, a passear
Nos campos e florestas
Fui às profundezas do mar
Com ele desnudei a vida
E aprendi a amar.
Alguns anos se passaram
Olhando o nada eu estava
Quando vi as folhas soltas
Que o próprio vento levava
Em meus pés caiu um lápis
Ziguezagueando pelo chão
Meu coração me contou....
Fora-se embora o velho João!
Autor: Gracia Tristão
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