Fidel



Sentei no gramado com o refrigerante na mão. Eu e minha amiga, poeta por natureza.
Tem gente que nasce escrevendo. É o caso dela. Outros aprendem a pensar e a colocar no papel de maneira certinha aquilo que pensou. Não sei se nasci assim, ou aprendi com o meu velho, que escrevia muito.
Nunca pensei no assunto. Escrevo por que gosto!
Minha amiga, que por sinal chama-se Ana, recitou um poema de sua autoria e despediu-se dizendo ter um compromisso urgente. Fiquei só com meus botões.
Algo chamou-me a atenção no ponto de ônibus.
Pessoas se aglomeravam. Umas corriam em direção ao ônibus. A mocinha praguejava porque quebrara o salto do sapato, na correria.
Engraçada a cena!
Reparei num menino com um cachorro. Figurinha estranha aquela! Cabelo grudadinho na cabeça, camiseta curta e rota acompanhada de uma bermuda bem grande para o tamanho dele.
Percebi que pedia um trocado, com a mão estendida em direção às pessoas. O cachorro, magricela, grande e desajeitado acompanhava-o mecanicamente.
Fiquei torcendo pelo garoto!
As pessoas nem sequer o olhavam, acenando uma negativa, sem interromper a conversa.
Pensei em ajudá-lo, mas resolvi aguardar mais alguns minutos, apreciando a desenvoltura daquela criança em meio aos adultos. Passava das 14 horas e calculei que o pequeno estava com fome, pois, ao estender uma das mãos, passava a outra na barriga pra lá de funda!
Longos minutos se passaram antes que uma senhora, com um gesto de piedade, lhe desse uma nota. O pirralho saiu à passos largos em direção a uma lanchonete bem próxima e voltou carregando um pão.
Fiquei aliviado porque ele iria enfim, comer!
Eu seria a expectadora desse ato, planejando logo em seguida levá-lo para tomar um sorvete desses enormes que as crianças consomem em poucos segundos. Criança gosta mesmo é de sorvete.
Mas qual não foi minha surpresa quando o garoto entregou o pão ao cachorro. Inteirinho!
Espantei-me! Ele abrira mão do alimento tão duramente conseguido para dá-lo ao cão. Resolvi aproximar-me e fiz isso a passos lentos para não quebrar o encanto.
Afagando timidamente o cão, cujo nome era Fidel, disse-me que gostaria de ter um pedaço de bolo para dar-lhe ao invés do pão. Contou-me também que Fidel iria embora naquele mesmo dia.
O pai de Jânio o daria para um vizinho, porque não podia sustentá-lo já que o cachorro era grande.
Minha nossa! Isso doeu-me como uma bofetada! Deduzi que o pão era um presente de despedida.
Imediatamente fui à lanchonete e comprei 4 pedaços de bolo. Dois para Jânio e dois para Fidel.
Despedi-me do garoto deixando-lhe alguns trocados para mais tarde e saí dali apressadamente, lamentando a sorte do cão. Ou do menino? Sei lá qual dos dois sofria mais.
Nem me dei ao trabalho de olhar para trás. Sei que isso faria com que eu me sentisse pequena demais, já que o meu principal problema no momento, era a tentativa de descobrir se sou poeta de nascença ou se aprendi a escrever com o velho.
Resolvi que, chegando em casa escreveria sobre o menino e o cachorro.
Cá estou!
Passei pelo mesmo lugar nos dias seguintes e não mais vi Jânio. Muito menos Fidel.

Autor: Gracia Tristão


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