INTERPRETAÇÃO FREUDIANA DO FILME "A ORIGEM"





INTERPRETAÇÃO FREUDIANA DO FILME "A ORIGEM"


Ana Rita Finotti de Sousa
Camila Mesquita de Assis

INTRODUÇÃO


Este trabalho pretende analisar por meio da Teoria Psicanalítica Freudiana, questões relacionadas com a mente humana, estruturas psíquicas que envolvem o Id, do Ego e o Superego, o Consciente, o Pré-Consciente e o Inconsciente.
O fator crucial no enredo deste filme foi inicialmente analisar a importância do sonho atribuída à mente humana, baseando-nos na teoria freudiana. Descrevemos aqui um pouco da relação do Consciente, o Pré-Consciente e Inconsciente, como o personagem principal, Cobb, nos mostra, na relação que faz da vida real com a interpretação de seus sonhos.

SINOPSE DO FILME

Em um mundo onde é possível entrar na mente humana, Cobb (Leonardo DiCaprio) está entre os melhores na arte de roubar segredos valiosos do inconsciente, durante o estado de sono. Além disto, ele é um fugitivo, pois está impedido de retornar aos Estados Unidos devido à morte de Mal (Marion Cotillard). Desesperado para rever seus filhos, Cobb aceita a ousada missão proposta por Saito (Ken Watanabe), um empresário japonês: entrar na mente de Richard Fischer (Cillian Murphy), o herdeiro de um império econômico, e plantar a idéia de desmembrá-lo. Para realizar este feito ele conta com a ajuda do parceiro Arthur (Joseph Gordon-Levitt), a inexperiente arquiteta de sonhos Ariadne (Ellen Page) e Eames (Tom Hardy), que consegue se disfarçar de forma precisa no mundo dos sonhos.
Direção do filme: Christopher Nolan.
Gênero: Ficção Científica.


DESENVOLVIMENTO TEÓRICO

A análise artística foi feita sobre o filme A Origem, trata-se de um filme cujo o ator principal é um especialista em invadir a mente das pessoas e, com isto, rouba os segredos do inconsciente, especialmente durante o sono, quando a mente está mais vulnerável.
Na época em que o filme se passa existe tecnologia para que a invasão no sonho da outra pessoa aconteça. Cobb (protagonista do filme), tem a missão de implantar uma idéia na mente de outra pessoa, levando assim a pessoa a fazer o que ele quer.
O filme tem várias narrativas, além do protagonista, cinco personagens adentram o sonho da vítima do golpe, para ajudar na tarefa de semear a idéia indesejada. Atuando de forma coordenada, tentam convencer a vítima a descer mais e mais profundamente, passando de um sonho a outro, até um local em que a idéia estrangeira possa ser plantada com sucesso. Essas etapas do sonho podem ser analisadas como sendo o aparelho psíquico da teoria topográfica ? primeira tópica ? criado por Freud, seriam as camadas do consciente (cs) , pré-consciente (pcs) e inconsciente (ics). De acordo com a Teoria do Freud, o inconsciente foi em primeira instância, um termo puramente descritivo, que, por conseguinte, incluía o que é temporariamente latente, ou seja, o que é temporariamente inconsciente. Ao termo temporariamente inconsciente foi dado o nome de pré-consciente, essa camada do pré-consciente possui uma proximidade estreita com o consciente.
Estar consciente é, em primeiro lugar, um termo puramente descritivo, que repousa na percepção do caráter mais imediato e certo. No exemplo da idéia, ela não é consciente por um período prolongado, existem as alternâncias entre o consciente e pré-consciente, o que não se pensa agora está em espera no pré-consciente, cujo resgate dessa idéia é de mais fácil acesso.
O estado em que as idéias existiam antes de se tornarem conscientes é chamado por Freud de repressão, para o mesmo, o reprimido é o protótipo do inconsciente.
Cenas que entrelaçam com a teoria de Freud são vistas de formas constantes no filme, o protagonista do Filme, Cobb, tem memórias reprimidas, essas memórias são visualizadas em seus sonhos. Há um sentimento de culpa por parte de Cobb, pois o mesmo se sente culpado pela morte de sua esposa. O sonho de Cobb tenta redimir essa culpa, há o aparecimento constante de sua esposa em seus sonhos e há também uma valorização muito grande por parte de Cobb, o mesmo não quer que sua esposa deixe de ser real, que realmente tenha morrido para sempre. Todos os sonhos contém uma força dos desejos, nele conseguimos realizar uma cota dos nossos desejos, mas também existem as censuras e impedimentos.
Podemos analisar que Cobb tinha o sonho como uma válvula de escape, para conseguir ter o equilíbrio do seu psiquismo. Além dessa válvula de escape, Cobb consegue resolver alguns problemas dentro do sonho, há um momento específico em que ele consegue se livrar da imagem da esposa, dentro do sonho, ele consegue entender que ela está morta e que não tem como mudar as coisas. Podemos observar uma citação de Freud (1923) tirado do livro O Ego e o Id e outros trabalhos que está relacionado com esse trecho do filme, ele diz:

"Acostumamos como estamos a levar conosco nossa escala social ou ética de valores para onde quer que vamos, não ficamos surpresos em ouvir que a cena das atividades da paixões inferiores se acha no inconsciente, esperamos, ademais, que quanto mais alto alguma função mental se coloque em nossa escala de valores, mais facilmente encontrará acesso à consciência que lhe é assegurada. Aqui contudo, a experiência psicanalítica nos desaponta. Por um lado, temos provas de que mesmo operações intelectuais sutis e difíceis, que ordinariamente exigem reflexão vigorosa, podem igualmente ser executadas pré-conscientemente e sem chegarem à consciência. Os exemplos disso são inteiramente incontestáveis, podem ocorrer, por exemplo, durante o estado de sono, como se demonstra quando alguém descobre, imediatamente após o despertar, que sabe a solução de um difícil problema matemático ou de outro tipo com que esteve lutando em vão no dia anterior"
(FREUD, 1923)

No filme há também cenas em que ficam nítidas as interferências sensoriais, como na cena em que chove porque o dono do sono está com vontade de ir ao banheiro. Segundo Freud, os estímulos externos que temos entram no sono e são ressignificados, assim o sonho acaba protegendo o sono.

Para Freud, há duas hipóteses fundamentais da psicanálise, seria o princípio da causalidade, e a proposição de que a consciência é antes um atributo excepcional do que um atributo comum dos processos psíquicos, ou seja, nada que acontece em nossa vida é por acaso, tudo possui uma causa, mesmo que não temos conhecimento da causa ela sempre existe. E por mais que o conceito de consciência seja mais conhecido, o inconsciente ocupa maior espaço em nossa mente.
Seguindo essa mesma hipótese da causalidade, o sonho também possui um determinismo psíquico, de acordo com Brenner (1973), Freud descobriu que as manifestações comuns dos sonhos seguem o mesmo princípio, cada sonho, e mesmo cada imagem do sonho, é a conseqüência de outros eventos psíquicos e cada um mantém uma relação coerente e significativa com o restante da vida psíquica da pessoa que sonha.
Em sonhos como esse pode-se perceber que durante o sono a atividade mental inconsciente pode produzir um resultado consciente.

[...] "por meio da técnica psicanalítica, Freud pôde demonstrar que por trás de todo sonho existem pensamentos e desejos inconscientes ativos, e assim estabelecer, como regra geral, que, quando se produzem sonhos, estes são provocados por uma atividade mental que é inconsciente para a pessoa que sonha, e que assim permaneceria a menos que se empregue a técnica psicanalítica." (BRENNER, 1973)

O interessante mostrado no filme é como o personagem principal enfrenta as impossibilidades de ter certeza sobre os limites da realidade. O desejo é motor do sonho, e o sonho não cessa. Repressão de memórias e loucura se entrelaçam a todo o momento, seguindo o fio condutor das idéias de Freud.
Num dado momento em seu livro "A Interpretação dos Sonhos", Freud define o ciclo que acontece em nós que antecedem o sonho:

"O papel preponderante foi desempenhado no esquema de Freud por uma divisão hipotética dos neurônios em três classes ou sistemas, diferenciados de acordo como seus modos de funcionamento. Desses, os dois primeiros relacionavam-se, respectivamente, aos estímulos externos e às excitações internas. Ambos funcionavam numa base apenas quantitativa, isto é, suas ações eram inteiramente determinadas pela magnitude das excitações nervosas que incidiam sobre eles. O terceiro sistema estava correlacionado com as diferenças qualitativas que distinguem as sensações e sentimentos conscientes. Essa divisão dos neurônios em três sistemas constituiu a base de complexas explicações fisiológicas de coisas como o funcionamento da memória, a percepção da realidade, o processo de pensamento, e também os fenômenos dos sonhos e dos distúrbios neuróticos."
(FREUD,1900)

Logo pôde-se relacionar o filme quando em sua obra, demonstra que, à descrição do armazenamento dos traços de memória nos "sistemas mnêmicos", ao exame da natureza dos desejos e das diferentes formas de satisfazê-los, e à ênfase dada ao papel desempenhado pelos processos verbais de pensamento na adaptação às exigências da realidade, quando fica nítido a cena em que Cobb tenta voltar a seus sonhos para reencontrar a mulher Mal, que não mais existia no mundo real. Segundo sua teoria, Freud em seu livro (A Interpretação dos Sonhos) expõe:

"A visão pré-científica dos sonhos adotada pelos povos da Antigüidade estava, por certo, em completa harmonia com sua visão do universo em geral, que os levou a projetar no mundo exterior, como se fossem realidades, coisas que de fato só gozavam de realidade dentro de suas próprias mentes." (FREUD, 1900)

O mesmo paralelo acontece quando Cobb organiza sua mente e no sonho percebe que Mal já não pode mais voltar, que ele precisa se livrar dessas lembranças antigas para poder reencontrar seus filhos, de acordo com a teoria ocorre quando há incoerências entre diferentes versões do texto do mesmo sonho, ele pode presumir que há incoerências paralelas no original. Essas dificuldades verbais culminam nos exemplos bastante freqüentes em que uma interpretação depende inteiramente de um trocadilho.
Nos sonhos de Cobb podemos perceber que o termo atemporal é bem empregado, ou seja, de acordo com a teoria de Freud, o inconsciente é atemporal, não tem noção de tempo e nem de espaço, o mesmo acontece nos sonhos. Em várias cenas do filme a imagem da esposa de Cobb aparece em lugares inusitados, sem ter noção de como surgiu e nem de quando surgiu. Nos sonhos, em geral, nunca sabemos como chegamos ou onde estamos.
O filme mostra também que um objeto pequeno e leve assim chamado de Totem (artefato usado para distinguir a realidade do sonho), é a única forma de saber se o mundo em que se vive é real ou não, todos os participantes do Plano dirigido por Cobb, devem ter esse totem (objeto tocável apenas pelo dono), para que não se percam e não corram o risco de ficarem presos no sonho, que é chamado de Limbo (último nível do sonho, nesse lugar um minuto de vida normal pode simbolizar dez anos), um lugar onde tudo é possível, pois o inconsciente não consegue distinguir o real da ilusão. Para que seja feita a passagem de um sonho para outro deve-se sempre conter os mesmos especialistas, como: o extrator de sonhos, um arquiteto para projetar no subconsciente do sonhador um ambiente que seja irreconhecível, um químico, que cria sedativos diferenciados caso seja necessário viajar por 2 ou mais níveis do sonho, um profissional que pesquise o alvo e o personifique (inclusive trajetos, modo de falar, etc.), todo o processo deve ser feito com o máximo de cuidado, pois uma vez preso no limbo, não há como voltar a vida real.
No filme é possível perceber outra teoria do aparelho psíquico, além da teoria topográfica (cs, pcs e ics). A medida que Freud foi analisando a mente humana, percebeu que a primeira tópica não conseguia responder todas suas dúvidas, desenvolveu então a segunda tópica em 1923, dez anos depois de ter criado a primeira, denominou a nova teoria como sendo a Teoria Estrutural do aparelho psíquico, essa constituída pelo Id, Ego e Superego. Essa teria oferece a concepção que Freud tinha do ser humano, ele concebia o ser humano como sendo um ser bio psico social.
O Id, o Ego e o Superego são sistemas que formam nossa estrutura psíquica.
O Id é a dimensão marcada pelo fator biológico, a parte funcional do ser (pulsões). O Id pode ser considerado como sendo a parte inconsciente do nosso psique. É no Id que temos nosso princípio de prazer, fazemos algo para realizar nosso desejo sem levarmos em consideração se vai fazer bem ou mal. Pode-se ver nas cenas em que Cobb faz uma visita a seu pai, e o convida para participar de uma extração (roubar a senha do cofre do pai de Robert Fischer Jr., o Alvo, para entregar ao principal interessado), Cobb chama seu pai para participar de um crime, mas depois de executado como recompensa Cobb poderia rever seus filhos. Quando Cobb faz o convite, seu pai responde que não havia lhe ensinado a roubar e que não participaria da extração, mas indica a arquiteta que ajuda Cobb a implantar a idéia no sonho de Robert Fischer Jr., o Alvo.
E quando Cobb convida Ariadne, a arquiteta, explica como é o mundo dos sonhos, revela a ela seus segredos e medos, e diz a ela que ela precisa ter um totem, para manter o equilíbrio entre realidade e sonho.
O Superego funciona como sendo nosso agente critico ligado com a moral. É através do superego que internalizamos sobre os valores éticos, bem e mal, etc. Ele também incorpora nossos ideais, muitas vezes é através do Superego que surgem as crises de inferioridade por exemplo, quando comparamos o que queremos ser com o que realmente somos. No filme Cobb se puni, pois ele tem uma imagem maltratada de si mesmo, pela culpa que sente, ele sofre a inferioridade, ele não é aquilo que realmente queria ser. Através dessa culpa, Cobb se puni em não visita os filhos, podemos analisar isto como sendo uma ação ligada a esse Superego, em que o agente crítico de Cobb o impede de tomar certas atitudes.

REFERÊNCIAS


BRENNER, Charles. Noções básicas de psicanálise: introdução à psicologia psicanalítica. 3. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Imago; São Paulo: Ed. Da universidade de São Paulo, 1975.

FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos. Volume IV; Leipzig und Wien. Franz Deuticke, 1900.

FREUD, Sigmund. O ego e o id e outros trabalhos. Volume XIX; Leipzig und Wien. Franz Deuticke, 1923.

Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/a-ciencia-por-tras-do-filme-a-origem. Acessado dia 05 de maio de 2011.

Disponível em: http://www.adorocinema.com/filmes/a-origem/. Acessado dia 08 de maio de 2011.

Disponível em: http://fundamentosfreud.vilabol.uol.com.br/sonhos.html. Acessado dia 08 de maio de 2011.

Autor: Ana Rita Finotti


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