MANDADO DE SEGURANÇA



levando-se em consideração a "nova" Lei nº 12.016/2009, que depois de tramitar quase oito anos no Congresso Nacional sob a égide do II Pacto Republicano, foi promulgada pelo Presidente da República, a qual iremos examinar o pouco progresso em comparação à antiga Lei nº 1.533/1951, observando também, quanto a aquelas vedações, a efetividade e a eficácia do instrumento mandamental em relação às perspectivas da Constituição Federal de 1988 e dos princípios que compõe o sistema tributário nacional.

1 INTRODUÇÃO

A expectativa foi grande quanto à espera da nova Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009). Na verdade, pensava-se que a nova lei acabaria com grande parte das questões suscitadas nos Tribunais brasileiros em relação aos problemas práticos e corriqueiros no manejo do instrumento mandamental.
O que se viu na verdade, foi a promulgação de uma nova lei que não inovou em nada com relação ao antigo regime da Lei nº 1.533/1951. Ou seja, o novo nasceu velho.
Apesar de questões antigas como a "caducidade" da medida liminar, a exigência de caução para a concessão de medida liminar, a vedação da execução provisória em mandado de segurança e dentre outras terem sido consolidadas pela nova lei, a mesma deixou de avançar sobre dois assuntos que é tema do presente estudo, que é a vedação da concessão de liminares para a compensação de créditos tributários e entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior retidos por autoridades aduaneiras.
Assim, permaneceu no âmbito dos estudos das ações constitucionais, do direito processual civil e do direito tributário o questionamento quanto à constitucionalidade das vedações de concessão de liminar em matéria tributária no mandado de segurança, principalmente aquela determinada no disposto do art. 7º, §2º da atual Lei nº 12.016/2009.
Não foi por menos, e como veremos adiante, que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil interpôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 4.296/DF), visando a declaração de todo o §2º do art. 7º da Lei nº 12.016/2009. Igualmente é o que pretende o presente, analisar concretamente a inconstitucionalidade do referido dispositivo da nova Lei que regulamenta o madamus.
A questão ora comento não é nova, mas ainda assim precisa ser aprofundada e estudada precisamente, haja vista que o Mandado de Segurança é instrumento constitucional e de suma importância para o ordenamento jurídico brasileiro, o qual está inserido no art. 5º, inciso LXIX da Carta Magna de 1988, portanto, é cláusula pétrea, que visa resguardar e garantir direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas datas, do cidadão.
Desse modo, iremos observar que qualquer que seja restrição no manejo do Mandado de Segurança, precipuamente no que concernem às vedações de concessões de liminares levantadas no presente trabalho, acaba ferindo o próprio acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, inciso XXXV da CF/1988) e, por conseqüência jurídica, maltratando o direito concreto do cidadão brasileiro, indo de encontro aos princípios que compõe o sistema tributário brasileiro e o modelo constitucional garantista.
Trata-se, pois, de pensamento arcaico e de instrumento maquiavélico - como veremos -, que em nome da coletividade o Estado usa e abusa com suas prerrogativas, sempre visando restringir o uso dos instrumentos constitucionais dispostos ao cidadão.
Enfim, com essas considerações, iremos abordar não só a duvidosa constitucionalidade do dispositivo supracitado, mas também, com as devidas vênias, a falta de um Mandado de Segurança novo, com afinidade ao modelo processualista civil efetivo e constitucionalista, o qual deveria buscar a eficiência e a eficácia na impugnação de atos ilegais ou com abuso de poder, sempre visando resguardar o direito líquido e certo do cidadão frente aos excessos cometidos pelo Estado.

2 BREVE HISTÓRICO DO MANDAMUS CONSTITUCIONAL NO BRASIL E A NOVA LEI Nº 12.016/2009

O Mandado de Segurança foi concebido no arcabouço jurídico brasileiro na Constituição 1934 de Getúlio Vargas. Inspirada em preceitos constitucionais mexicanos (Juicio de Amparo) e ingleses (Judicial Review), tal instrumento foi, para época, um marco vitorioso para a garantia dos direito inerentes ao homem. (SANTANA, 2010.)
Não podemos negar que o contexto histórico e social da época influenciou e foi decisivo para a implantação do instituto garantista no Brasil. É que buscava-se um instrumento eficaz, de tramitação sumária e de nível constitucional para impugnar atos arbitrários cometidos pelo Estado em desfavor dos cidadãos.
Assim, o primeiro registro que se tem do instrumento mandamental no Brasil é o da Constituição Republicana de 16 de julho de 1934, o qual foi inserido no art. 113 com o seguinte preceito:

dar-se-á mandado de segurança para a defesa de direito certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O processo será o mesmo do habeas corpus, devendo ser sempre ouvida a pessoa de direito público interessada. O mandado não prejudica as ações petitórias competentes.

Embora o mandado de segurança fosse um instrumento inovador e vitorioso para aquele contexto, o referido instrumento não perdurou por muito, sendo restringido com o silêncio da nova Constituição de 1937 e pelo Decreto-Lei nº 06 de novembro de 1937, quando este último prescrevia em seu art. 16 que:

Continua em vigor o remédio do mandado de segurança, nos termos da Lei n. 191, de 16 de janeiro de 1936, exceto, a partir de 10 de novembro de 1937, quanto aos atos do Presidente da República e dos ministros de Estado, Governadores e Interventores. (grifei).

Ou seja, o mandamus vigorava naquele momento, ainda que não previsto pela nova constituição de 1937, contudo, não podia ser manejado contra atos do Presidente da República, dos Ministros de Estado, Governadores e Interventores.
Não obstante as restrições e a inexistência do writ na Constituição de 1937, o mesmo voltou a vigorar plenamente com o advento da Constituição de 1946, dando nova redação em seu art. 141, § 24, ao determinar que:

para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus, conceder-se-á mandado de segurança, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.

Assim, com sua nova previsão na Constituição da República de 1946, o remédio constitucional foi regulamentado pela Lei nº 1.533 de 31 de dezembro de 1951, a qual vigeu no âmbito da Constituição de 1967 e da Emenda Constitucional nº 1 de 1969.
A referida lei também foi recepcionada pela atual Constituição de 1988 (Art. 5º, inciso LXIX) que vigorou até pouco tempo, fazendo completar quase sessenta anos de existência no ordenamento jurídico brasileiro.
Destarte, era visível a necessidade de uma nova regulamentação do instrumento, haja vista que a Lei nº 1.533/1951 não se amoldava mais ao atual modelo processualista civil e constitucional, o que acabava por dificultar a própria existência da eficácia do instrumento mandamental.
Até que em 07 de agosto de 2009, adveio a tão aguardada nova Lei do Mandado de Segurança, a qual, atualmente, regulamenta o disposto no art. 5º, inciso LXIX da Constituição Federal de 1988.
O referido diploma legal tramitou durante oito anos no Congresso Nacional sob os Projetos de Lei da Câmara nº 1.351/1999, que dispunha exclusivamente sobre o mandado de segurança coletivo, e sob o Projeto de Lei da Câmara nº 5.067/2000, que regulava o mandado de segurança "individual" e coletivo, onde posteriormente foram convertidas na PLC nº 125/2006.
Só apenas com a assinatura do II Pacto Republicano, que visava por um sistema de justiça mais acessível, ágio e efetivo, foi que deram as devidas atenções na tramitação deste último Projeto da Câmara, a qual se converteu na atual Lei Federal nº 12.016/2009.
Ainda assim, muita coisa não mudou com relação à antiga lei de 1951. Nesse sentido é que:

[...] a nova Lei do Mandado de Segurança sob exame apenas melhor sistematizou e estruturou o instituto, que estava disciplinado na antiga Lei de 1951, a qual, embora recepcionada pela Constituição de 1988, necessitava de nova regulamentação. (SANTANA, 2010. Revista Prática Jurídica)

A busca por um instrumento constitucional que assegure o direito líquido e certo do cidadão não cessou. Já é de conhecimento que o Excelentíssimo Senador Valter Pereira decidiu por reunir todas as 14 emendas, as quais foram apresentadas à época no PLC nº 125/2006 e que foram retiradas para que desse a tramitação mais célere ao evitar que o projeto voltasse a Câmara dos Deputados, para constituir um novo Projeto de Lei do Senado nº 222/2009, agora com o fito de realizar algumas modificações na atual Lei Federal nº12.016/2009 (BUENO, 2010. p. 21)
Atente-se, que dentre as 14 emendas que compõe o novo projeto de lei do senado ? PLS Nº 222/2010, existe a de nº 4 ? CCJ, que altera o art. 7º, §2º da atual Lei nº 12.016/2009, dando nova redação, ao suprimir de uma vez por todas, à restrição de concessão de liminares para a compensação de créditos tributários e entrega de mercadorias e bens retidos por autoridades aduaneiras. Assim é pertinente descrever parte da justificativa da presente emenda:

A supressão dos §2º e 5º do art. 7º do projeto primitivo justifica-se porque os dispositivos contrariam o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, segundo o qual a lei não excluirá do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Uma vez constatada pelo magistrado que a hipótese reclama a tutela liminar do direito, não há razão para postergá-la a final, independentemente de quem sejam os impetrantes. (BUENO, 2010. p. 258)

Destarte, observamos que apesar de ser atual a Lei nº 12.016/2009, já existe um novo projeto de lei tramitando no Congresso Nacional (Projeto de Lei do Senado - PLS nº 222/2010), de autoria do Senador Valter Pereira, que objetiva dar nova redação aos dispositivos considerados relevantes e que merecem ser modificados, e que dentre os quais está previsto a eliminação da restrição imposta no §2º do art. 7º, razão pela qual o mesmo é objeto do presente trabalho em que defendemos a inconstitucionalidade do referido dispositivo.

3 ASPECTOS GERAIS DO MANDADO DE SEGURANÇA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Conforme determina o art. 5º, inciso LXIX, da atual Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

Trata-se, pois, de remédio constitucional com natureza jurídica de ação judicial civil e de rito sumário especial. É utilizada, como comenta Vicente de Paulo e Marcelo Alexandrino, quando o:

[...] direito líquido e certo do indivíduo for violado por ato de autoridade governamental ou de agente de pessoa jurídica privada que esteja no exercício de atribuição do Poder Público. (PAULO e ALEXANDRINO, 2010. p. 206)

No mais, observa-se que o instrumento do mandado de segurança, que visa resguardar direito líguido e certo, a fim de impugnar atos ilegais ou com abuso de poder, tem um caráter subsidiário em relação ao habeas corpus e ao habeas datas, já que o seu manejo se dá quando não for possível o amparo do direito pelo por estes dois últimos remédios constitucionais, inclusive com possibilidade de manejo contra ato de juiz criminal, no curso do processo penal.

3.1 Conceito de "direito líquido e certo"

O mandado de segurança é um instrumento que tem por objetivo precípuo proteger o direito violado do indivíduo. Entretanto, não é todo direito que o Writ consegue resguardar. Assim, apenas o direito líquido e certo provado de plano é que protege o instrumento em comento.
Nesse sentido, Leonardo José Carneiro da Cunha, ao conceituar etimologicamente o termo "direito líquido e certo":

O direito líquido e certo, como a etimologia do termo indica, é o que se apresenta manifesto na sua existência e apto a ser exercitado. [...] é exatamente porque o direito, qualquer que seja, deve ser manifesto, isto é, deve decorrer da aplicação de uma norma, podendo já ser exercido, uma vez que já adquirido e incorporado ao patrimônio do sujeito. (CUNHA, 2007.p. 337)

Desse modo, o direito líquido e certo é pressuposto para o manejo do mandamus constitucional, haja vista que o mesmo "não abre margem a dilação probatória" (RMS 26.744, Rel. Min. Marco Aurélio, DJE de 13-11-2009.), de modo que exige-se prova pré-constituída para a análise de mérito. Em outras palavras, se a existência do direito for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver limitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda não determinados, não será cabível o mandado de segurança. (PAULO e ALEXANDRINO, 2010. p. 208)
Segue consolidado do mesmo modo o entendimento do eg. Superior Tribunal de Justiça:

Ementa: Processual Civil ? Mandado de Segurança ? Intimação via postal ? Inércia da requerente ? Pedido administrativo arquivado ? Alegado vício na intimação via postal com aviso de recebimento ? necessária dilação probatória ? Inadequação da via eleita. (grifei)

(STJ, 1ª seção, MS 14.615/DF, Rel. Min. Humberto Martins, j.un. 25.11.2009, Dje 7.12.2009)

Ressalta-se, contudo, que conforme a orientação jurisprudencial dominante do Supremo Tribunal Federal, o requisito da liquidez e da certeza do direito recai sobre os fatos alegados pelo autor-impetrante, ainda que haja controvérsia e alta complexidade na matéria de direito (Súmula nº 625 ? STF). Nesse sentido é que são os fatos que precisam de comprovação inequívoca e de plano com a petição inicial, não o direito.

3.2 Legitimidade Ativa/Passiva.

De acordo com o art. 1º da Lei nº 12.016/2009, são legitimados ativamente para o manejo do mandado de segurança qualquer pessoa física ou jurídica, nacional ou estrangeira, domiciliadas ou não no Brasil. (PAULO e ALEXANDRINO, 2010. p. 208)
Já em relação aos entes despersonalizados, como acontece, por exemplo, com a mesa das casas legislativas, a doutrina sob o manto da nova lei não tem reconhecido a legitimidade de tais entes. É nessa linha que Cássio Scarpinella Bueno, ao citar autores como Humberto Theodoro Jr., André Ramos Tavares e Tiago Asfor Rocha Lima, tem entendido. (BUENO, 2010. p. 25).
Em relação ao mandado de segurança coletivo, o art. 21 e Parágrafo único do mesmo diploma legal, ao regulamentar o art. 5º, inciso LXX da Constituição Federal de1988, reza que são legitimados para impetrar o mandamus constitucional coletivamente:

a) Partido Político com representação no Congresso Nacional, na defesa dos interesses de seus integrantes ou da finalidade partidária;

b) Organização Sindical, entidade de Classe ou Associação legalmente constituída e em funcionamento a pelo menos um ano;

c) Direitos transindividuais - A coletividade de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma ligação jurídica base (ex.: contratantes de um plano de saúde) e;

d) Direitos individuais homogêneos - O individual no interesse da coletividade decorrente de um direito de origem comum.

No que concerne à legitimidade passiva, esta também pode ser encontrada no art. 1º da Lei nº 12.016/2009, e podem ser: autoridades públicas de quaisquer entes da federação, independentemente ao Poder da República que pertença; os representantes ou órgão de partidos políticos; administradores de entidades autárquicas; e dirigentes de pessoas jurídicas de direito privado desde que estejam no exercício de atribuições do poder público.
Com efeito, aquele que estiver enquadrado legitimamente dentro das possibilidades elencadas na lei ordinária federal, diga-se Lei nº 12.016/2009, poderá impugnar ato que ache ilegal ou abusivo, sempre na defesa de seus direitos líquidos e certos, em face daqueles legitimados passivamente.

3.2 Cabimento/Descabimento do Writ Constitucional.

Como bem explícita o art. 5º, inciso LXIX da Carta Magna de 1988, bem como o art. 1º, caput, da Lei nº 12.016/2009, o mandado de segurança é cabível sempre contra o "ato de autoridade" (governamental ou de agente de pessoa jurídica privada que esteja no exercício de atribuição do Poder Público), este entendido como aquele que pratica no desempenho de suas funções manifestação do Poder Público, seja ele comissivo ou omissivo. (PAULO e ALEXANDRINO, 2010. p. 206)
Atente-se, contudo, que o ato tem que ser praticado por aqueles que se enquadram dentro do conceito de legitimidade passiva no mandado de segurança, de modo que, o "ato de autoridade" que violar direito líquido e certo, não amparados pelos remédios do habeas datas ou habeas corpus, eivado do vício de ilegalidade ou com abuso de poder, cabe o manejo do mandamus constitucional.
Por outro lado, a Lei nº 12.016/2009, traz em seu bojo as impossibilidades do manuseio do instrumento ora em comento.
A primeira está descrita no art. 1º, §2º quando registra "que não cabe mandado de segurança contra atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas estatais" (inclusive as concessionárias de serviço público). Esta hipótese de descabimento esta sendo questionada atualmente pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, através da ADI nº 4.296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, com o fundamento de que esta restrição acaba dificultando o controle, por qualquer quem seja, dos atos de gestão praticados pelas empresas estatais.
As seguintes modalidades de descabimento esta descrita no art. 5º, da Lei nº 12.016/2009:

Art. 5o Não se concederá mandado de segurança quando se tratar:
I - de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução;
II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo;
III - de decisão judicial transitada em julgado.

Há de observar que todas essas limitações foram introduzidas na Lei nº 12.016/2009, porque já tinham sido todas pacificadas através de entendimentos jurisprudenciais sumulados. Observe, o inciso I e II já eram concretizados através da Súmula nº 267 STF: "Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição". Já em relação ao inciso III já era pacificado o entendimento, através da Súmula nº 268 STF, que: "Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado."
parece-nos razoável tais limitações. Primeiramente porque as decisões, sejam elas administrativas ou judiciais, pendentes de recursos que estejam acobertadas pelo efeito suspensivo, não irão produzir nenhuma eficácia no mundo exterior, inexistindo, assim, o próprio ato decisório. É nesse sentido que a doutrina registra que onde havendo recurso da decisão sob efeito suspensivo, à parte cabe apenas esperar o julgamento do recurso, haja vista que inexiste a condição da ação do interesse de agir para o manejo do mandado de segurança.
Do mesmo modo se interpreta, logicamente, quanto à restrição do mandado de segurança, das decisões judiciais transitada em julgado. É que neste caso existe ação própria, qual seja ação rescisória, para se discutir as decisões judiciais transitadas em julgado.
Cabe ainda registrar a outra hipótese de descabimento do mandado de segurança, qual seja, a Súmula nº 226 do Supremo Tribunal Federal que diz "não caber mandado de segurança contra lei em tese".
É amplo o debate acerca desta Súmula. É que o objetivo da Súmula nº 226 do STF é evitar que se utilizem do mandado de segurança como sucedâneo recursal para que se discuta a constitucionalidade da lei impugnada no remédio constitucional. Desse modo é que Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino defendem que "não cabe mandado de segurança contra lei em tese, salvo se produtora de efeitos concretos". (PAULO e ALEXANDRINO, 2010. p. 207)
Isto implica dizer que, se a lei em seu plano abstrato não produz nenhum efeito ao caso concreto não cabe mandado de segurança, vez que existe ação própria para se discutir a validade da lei frente à Constituição Federal de 1988 (Ação Direta de Constitucionalidade ou Ação Direta de Inconstitucionalidade). Por outro lado, se a lei ao produzir efeitos concretos prejudiciais ao indivíduo cabe o manejo do mandado de segurança.
Nessa linha de raciocínio é que Eduardo Sabbag ao comentar a supra-citada Súmula do Supremo Tribunal Federal, reza que:

[...] prevalece o entendimento segundo o qual é plenamente possível o mandado de segurança contra lei tributária, sem qualquer espécie de paradoxo, uma vez que a norma tributária tem aptidão de ensejar efeitos concretos na órbita patrimonial dos contribuintes. (SABBAG, 2009)

Outrossim, é o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça:

EMENTA: Processo Civil e Tributário. MANDADO DE SEGURANÇA. Art. 1º da Lei 1.533/51. CABIMENTO.
1. é cabível mandado de segurança contra lei tributária capaz de produzir efeitos concretos na esfera patrimonial dos contribuintes, o que afasta a aplicação da súmula 266/STF.
2. recurso conhecido e provido.
(Resp. 56.096-RJ,2ª Turma. Rel. Min. Eliana Calmon,j. 15-10-2002)

Do exposto, percebe-se que além das hipóteses de descabimento que existem na Lei nº 12.016/2009, pelos motivos já expostos, é visível também, que há, através de entendimentos jurisprudenciais sumulados dos Tribunais superiores brasileiros, a limitações do manejo do instrumento mandamental em comento.

4 LIMINAR NO MANDADO DE SEGURANÇA

Vale destacar a importância do termo "liminar", antes de adentrarmos no estudo dessa concessão no âmbito do mandado de segurança. "Liminar" vem do latim liminaris, de limen (derivado de limus, limo, lodo, lama). (NEVES, 2010. p. 1063)
No Direito Processual Civil, a liminar possui dois conceitos distintos. Um para designar decisões proferidas no processo logo no início (neste caso o termo "liminar" significa: logo de entrada, soleira), "sendo aplicado a atos praticados inaudita altera parte, ou seja, antes da citação do demandado". O outro conceito é aplicado quando se concede ou não às tutelas de urgência (tutela antecipada ou tutela cautelar) no processo civil. (idem.)
Trata-se, pois, de ordem judicial proferida prontamente, "mediante um juízo sumário, porém precário, ou seja, não definitivo, de plausibilidade das alegações e de risco de dano de difícil reparação" do direito alegado. (PAULO e ALEXANDRINO, 2010. p. 210)
Já com relação às concessões de medida liminar no mandado de segurança, o art. 7º, inciso III da Lei nº 12.016/2009, reza o seguinte:

Art. 7o Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:
[...]
III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica.

Desse modo, o magistrado ao "perceber fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida" poderá conceder medida liminar no mandado de segurança.
Observa-se que, não obstante o uso dos termos serem diferentes em relação às tutelas de urgência, o pressuposto fundamento relevante equivale ao fumu boni iuris no processo cautelar (art. 804, caput do Código de Processo Civil) e à expressão "prova inequívoca da verossimilhança da alegação" na tutela antecipada (art. 273, caput do Código de Processo Civil).
Assim se parte demandante pretende buscar a liminar no mandado de segurança, esta deverá demonstrar fundamento significativo com as melhores razões, indicando de plano o ato ilegal ou abusivo a ser impugnado bem como o seu direito líquido e certo na exordial.
Do mesmo modo se aplica ao segundo requisito para a concessão de liminar no writ. A "ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida" equivale ao periculum in mora no processo cautelar e a expressão "fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação" na tutela antecipada.
Do mesmo modo que no pressuposto do fundamento relevante, o Magistrado, ao observar que a demora no provimento jurisdicional final no mandado de segurança irá prejudicar o direito do demandante a ponto deste perecer e havendo fundamento plausível, deverá conceder a liminar, a fim de que assegure o direito do individuo até o julgamento do seu mérito.
Atente-se, ainda, que os pressupostos para o manejo do remédio constitucional, elencados no art. 7º, inciso III da Lei 12.016/09, deverão coexistir na petição inicial, de modo que na falta de um desses requisitos, o Estado-Juiz não poderá conceder a liminar. Do mesmo modo tem entendido o Supremo Tribunal Federal:

nos termos do art. 7º, III, da Lei nº 12.016, 07 de agosto de 2009, a concessão de medida urgente sem a audiência da autoridade coatora exigiria a presença concomitante do fumus boni iuris, consistente na razoabilidade jurídica da pretensão, bem como o chamado periculum in mora, que se traduz na urgência da prestação jurisdicional. É que segundo a opção político-legislativa, somente na coexistência desses requisitos, isto é, diante de alegação de direito subjetivo cuja existência apareça, ao mesmo tempo, como provável e sob risco de dano grave e iminente, se legitima transgressão da cadeia procedimental ordinária, prevista na lei, para, antes ainda da cognição final, profunda e plena, da causa, conceder-se decisão definitiva provisória. (grifei)

(STF MS-MC 28.470/PE, Rel. Min. Cesar Peluso, j. 1.12.2009, Dje 9.12.2009)

O art. 7º, inciso III da Lei do mandamus constitucional prescreve também que o Juiz, ao verificar que o instrumento mandamental poderá trazer prejuízo financeiro à pessoa jurídica impugnada, poderá facultativamente exigir da parte demandante caução, fiança ou depósito, para futuro ressarcimento, caso seja indeferido o mandado de segurança.
Nessa linha de raciocínio, o art. 151, inciso IV, do Código Tributário Nacional, prescreve que a liminar no mandado de segurança, para fins tributários, é causa suficiente de suspensão do crédito tributário independentemente da exigência de caução.
E por fim, o mandado de segurança que estiver sob os efeitos de medida liminar deferida, terá prioridade no julgamento, conforme determina o §4º do art. 7º da Lei nº 12.016/09

4.1 Restrições à concessão de medida liminar no mandado de segurança

No que concerne a vedação de concessão das liminares no mandado de segurança, o §2º do art. 7º da Lei 12.016/2009 descreve as hipóteses de descabimento de medida liminar:

Art. 7o [...]
§ 2o Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. (grifei)

Verifica-se do dispositivo supra que é vedada a concessão de liminar nos casos de: compensação de créditos tributários; liberação de mercadorias e bens provenientes do exterior retidos por autoridade aduaneira; reclassificação ou equiparação de servidores públicos; concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.
Sabe-se que as hipóteses ora elencadas já eram previstas no ordenamento jurídico brasileiro através de leis espaças, cujas todas foram revogadas pelo art. 29 da atual Lei do Mandado de Segurança. Na realidade a Lei 12.016/2009 apenas organizou as restrições colocando-as apenas em um único diploma legislativo, razão pela qual não inovou quanto à concessão de liminares no mandado de segurança.
Merece destaque, também o art. 1º da Lei 8.076/1990 que veda a concessão de liminares em mandados de segurança impetrados contra atos derivados do denominado "Plano Collor". (BUENO, 2010.p. 70)
Destarte, nos cabe o nosso pesar em relação às restrições do uso de medida liminar no mandado de segurança. Seguindo a linha de raciocínio de Cassio Scarpinella Bueno, entendemos que o Writ constitucional não pode ser reduzido - principalmente por leis ordinárias federais - ao ponto de torna-lo ineficaz frente ao princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF/1988).
Nessa esteira é que a atual Lei do mandado de segurança apenas apresentou:

?didaticamente? nítidas ofensas ao ?modelo constitucional?, da mesma forma como nosso legislador tem feito ao longo de décadas em relação a questões que, quando reconhecido o direito do particular, têm aptidão para afetar as contas e o orçamento público. (BUENO, 2010.p. 71)

Não é por menos que a União tem editado, ao longo desses últimos anos, inúmeras Medidas Provisória com o único objetivo de postergar e restringir os direitos do cidadão brasileiro garantidos pela Carta Magna de 1988.

4.2 Revogabilidade e a cassação da medida liminar

O art. 7º, §3º da Lei nº 12.016/2009 ao prescrever que "os efeitos da medida liminar, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença".
Em outras palavras, o referido dispositivo quer deixar claro que enquanto não houver sentença, seja ela definitiva ou terminativa, os efeitos da medida liminar persistirão, exceto se antes da prolação da sentença a medida for revogada ou cassada.
Igualmente se interpreta quando o mandado de segurança for interposto originariamente no Tribunal, de modo que, ao ser proferido o acórdão, cessa os efeitos da liminar.
Assim, a Lei nº 12.016/2009 veio corrobora com a Súmula nº 405 do STF ao se interpretar que a sentença proferida no mandado de segurança substitui os efeitos da medida liminar concedida, ainda que haja recurso com efeito suspensivo da decisão final.
Há de observar, também, que proferida decisão interlocutória deferindo ou não a liminar no mandamus constitucional, cabe o recurso de agravo de instrumento, que de todo modo deverá ser observado subsidiariamente as regras do Código de Processo Civil (art. 7º, §1º da Lei 12.016/2009).

5 INCONSTITUCIONALIDADE DO §2º DO ART. 7º DA LEI 12.016/2009

O presente estudo tem a finalidade de demonstrar a inconstitucionalidade da restrição da concessão de medida liminar para a compensação de créditos tributários e liberação de mercadorias e bens provenientes do exterior retidos por autoridades alfandegárias.
Reza o §2º do art. 7º da Lei nº 12.016/2009:

Art. 7º [...]
§ 2º. Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.

Trata-se, pois, de duas das quatro modalidades de restrição ao uso da concessão de medida liminar em sede de mandado de segurança (vistos no item 4.1 do presente trabalho).
A presente questão é um tanto polêmica, pois não se trata de inovação no ordenamento jurídico, visto que tais restrições já eram previstas antes da nova lei do mandado de segurança.
Acontece, contudo, que tais restrições já não se amoldam a presente Constituição Republicana de 1988 e mais precisamente aos princípios que compõem o Sistema Tributário Nacional.
O dispositivo ora em comento é indiscutivelmente inconstitucional, pois confronta o art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal de 1988: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito."
Ora, é justamente o que a Lei nº 12.016/2009 faz no bojo do art. 7º, §2º ao excluir da apreciação do Poder Judiciários os casos concretos envolvendo a compensação de créditos tributários e a liberação de mercadorias provenientes do exterior.
Não podemos olvidar que o mandado de segurança visa impugnar atos ilegais ou com abuso de poder quando ferir direitos líquidos e certos. Por coerência lógica e jurídica, as leis infraconstitucionais não deveriam colocar óbices no manejo do instrumento constitucional.
No entanto, existem várias leis que restringem o uso da concessão de medidas liminares no mandado de segurança contra a Fazenda Pública, são elas: Leis nº 8.437/1992, 9.494/1997 e 8.076/1990.
Não obstante a demonstração da inconstitucionalidade no presente trabalho, o manuseio do mandado de segurança continua pleno, inclusive quando forem impetrados contra leis tributárias, que no caso concreto acaba por afetar o patrimônio privado, de modo que afasta-se a Súmula do STF nº 226 que veda a interposição do Writ contra lei em tese.
Destarte, é o que iremos abordar: a inconstitucionalidade da restrição do uso de liminares, em sede de mandado de segurança, para a compensação de créditos tributários e entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior retidos por autoridades fazendárias ? a qual fere expressamente o princípio da inafastabilidade da jurisdição.
Senão vejamos a inconstitucionalidade de cada uma.

5.1 Inconstitucionalidade - Da vedação de liminar para a compensação de crédito tributário

Primeiramente nos cabe conceituar umas das modalidades de extinção do crédito tributário que é a compensação de créditos e débitos.
Na órbita do Direito Civil, o instituto da compensação está regulamentado nos arts. 368 a 380 da Lei Substantiva Civil que diz ser modalidade de extinção da obrigação quando existem indivíduos credores e devedores concomitantemente.
No Direito Tributário, a compensação de créditos está prevista nos arts. 170 e 170-A do CTN, e segundo Eduardo Sabbag:

Trata-se de modalidade indireta (por lei) de extinção de crédito tributário, por meio do confronto entre créditos e débitos, evitando-se a desnecessária multiplicação de providências administrativas e as demandas judiciais. (SABBAG, 2009. p. 807)
Observa-se os arts. 170 e 170-A do Código Tributário Nacional:

Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública.
Parágrafo único. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará, para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, cominar redução maior que a correspondente ao juro de 1% (um por cento) ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.

Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial.


Podemos notar que o Código Tributário Nacional, de uma forma mais lógica, tenta acabar com os embaraços burocráticos criados na relação concomitante credor versus devedor, a fim de que seja dado de uma forma mais célere o pagamento dos créditos e débitos correspondentes em relações jurídicas distintas, fazendo extinguir a obrigação jurídico-tributária.
Quanto ao que reza o art. 170-A do Código Tributário Nacional, à Fazenda Pública é vedada a compensação de créditos tributários antes do trânsito em julgado da decisão judicial. Em uma análise prévia do dispositivo, chega-se a conclusão que antes do transito em julgado é vedada por qualquer meio, seja ele por medida liminar, medida cautelar ou antecipação de tutela, a compensação de créditos tributários.
Nessa linha, ratifica o art. 7º, §2º da Lei 12.016/2009 ao vedar a compensação de créditos tributários por meio de medida liminar no mandado de segurança. Do mesmo modo faz a Súmula do STJ nº 212 ao rezar que "a compensação de créditos tributários não pode ser deferida por medida liminar."
Porém, ao analisar o art. 151, inciso IV do CTN, nos deparamos com os seguintes dizeres:

Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
[...]
IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança.

Do dispositivo supra, depreende-se que a medida liminar concedida em sede de mandado de segurança é apta a ensejar a suspensão da exigibilidade do crédito em favor da Fazenda Pública.
Ora, a liminar concedida no mandado de segurança não é meio para a obtenção da compensação de créditos, entretanto, por esse meio, pode-se suspender a exigibilidade do crédito que a Fazenda Pública tem em seu favor.
O que acontece na praxe jurídica é que o magistrado, ao analisar o objeto do mandado de segurança, qual seja, a compensação de créditos tributários, já indefere de pronto a medida liminar que visa, simplesmente, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário da Fazenda Pública por entender que se trata de concessão de compensação tributária.
Em outras palavras, não é propriamente a compensação tributária que a medida liminar requer, e sim, a suspensão da exigibilidade do crédito Fazendário.
Tal entendimento, a nosso ver, é o mais correto, vez que a Súmula nº 213 do STJ corrobora rezando que "o mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária."
Nessa linha, o mandado de segurança é meio adequado para obter a declaração de que o devedor tem direito à compensação de créditos tributários, podendo pedir liminarmente suspensão da exigibilidade do crédito tributário, até que seja julgado o madamus constitucional.
Dessa maneira tem entendido, também, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o qual interpôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 4.296/DF) contra o §2º do art. 7º da Lei 12.016/2009 colacionando inúmeras jurisprudências as quais venho-me utilizar:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. DECLARAÇÃO DE DIREITO À COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA. EFEITOS PATRIMONIAIS PRETÉRITOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 271/STF.
1. O mandado de segurança é instrumento adequado à declaração do direito de compensação de tributos indevidamente pagos (Súmula 213/STJ).
2. Entrementes, a compensação, modalidade extintiva do crédito tributário elencada no artigo 156, do CTN, reclama autorização legal expressa para que o contribuinte possa lhe fazer jus, ex vi do artigo 170, do Codex Tributário.
3. Consectariamente, a declaração do direito de compensação tributária, em sede de mandado de segurança, pressupõe a existência de lei autorizativa oriunda da Pessoa Jurídica de Direito Público competente para a instituição do tributo.
[...]

(STJ AgRg REsp 1006240 / RS ? AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. Rel. Min. Luiz Fux. j. 23/04/2009 DJe 25/05/2009) (grifo nosso)

É latente a inconstitucionalidade do dispositivo, vez que o mesmo confronta expressamente o inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal de 1988, que garante a todos os cidadãos que vivem sob a égide deste diploma constitucional que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito."
Destarte, temos que aguardar o posicionamento do eg. Supremo Tribunal Federal quanto à constitucionalidade da vedação de concessão de liminares para a compensação de créditos tributários.
Assim, sem embargos ao tempo para o julgamento final da questão discutida, não podemos olvidar que continua em plena a eficácia do instrumento mandamental, haja vista que o magistrado, ao analisar o caso concreto, pode afastar a Súmula 266 do STF em caso de lesão grave ao direito, bem como declarar incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 7º, §2º da Lei do Mandado de Segurança.

5.2 Inconstitucionalidade - Da vedação de liminar para a entrega de mercadorias e bens retidos por autoridade alfandegária

Já ficou claro, excepcionalmente, que em relação à lei tributária não há nenhum óbice quanto ao manejo do remédio constitucional, vez que tais leis têm o condão de produzir efeitos concretos na órbita dos bens dos cidadãos que, de acordo com a jurisprudência pátria, não se aplica o disposto na Súmula 266 do STF.
Nessa esteira, entendemos que a vedação de concessões de medidas liminares, em sede de mandado de segurança, que visam à liberação de bens e mercadorias retidas por autoridades alfandegárias é inconstitucional. Senão vejamos.
Primeiramente, a Constituição Republicana de 1988 é bastante clara em seu art. 150, inciso V ao vedar incondicionalmente os entes da federação de estabelecer limites de tráfego de bens dentro do território nacional por meio de tributos.

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;

Do mesmo modo, o art. 5º, inciso XV do mesmo Diploma Constitucional corrobora tal idéia, ao garantir a qualquer pessoa a livre locomoção no território nacional, tendo a faculdade de permanecer ou sair, em tempo de paz, com os seus bens.
Observa-se, diante de tais dispositivos, a liquidez e a certeza no direito questionado, podendo qualquer pessoa transitar com seus bens no território nacional, de modo que nenhum ente estatal poderá limitar o tráfego de bens, inclusive os advindos do exterior, como coerção para o pagamento de tributos.
Não foi por menos que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 323, a qual reza que "é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de tributos". Em outras palavras, os órgãos fazendários não podem se utilizar da apreensão ou da retenção de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de tributos.
Logo, vê-se que o art. 7º, §2º da Lei nº 12.016/2009 fere, incontestavelmente, o princípio da não-limitação de tráfego de bens e pessoas (art. 150, inciso V da CF/88).
Trata-se, pois, de autotutela da Fazenda Pública que, em vez de garantir a ordem econômica brasileira, estabelecendo regras de acordo com a dinâmica dos mercados de importação e com a logística que este tipo de mercado requer e, com a ajuda do Poder Legislativo ao produzir normas ancestrais, veda injustificadamente a concessão de liminares para a liberação de mercadorias provenientes do exterior retidas com abuso de poder por parte das autoridades aduaneiras.
Por outro lado, observa-se ainda que tal medida vedatória dificulta o escoamento de mercadorias presas em pátios alfandegários, onerando a relação jurídica negocial e gerando burocracias desnecessárias.
Sabemos, que de modo algum, a liberação de mercadorias retidas acarretaria prejuízos financeiros para a Fazenda Pública, uma vez que ao identificar o débito existente o ente público poderia, de acordo com a Lei Federal nº 6.830/1980, ajuizar a devida execução fiscal para reaver os valores não pagos pelos devedores dos tributos.
Ademais, percebe-se que a liberação, por meio de liminar, de mercadoria apreendida poderia se dá mediante audiência de justificação prévia, conforme determina o art. 804 do Código de Processo Civil.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil condenou, também, através da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.296/DF o disposto no art. 7º, §2º da Lei nº 12.016, que veda a concessão de liminar para a liberação de mercadorias advindas do exterior retidas por autoridades aduaneiras. E diz mais:

A retenção de mercadorias ocorre em Zonas Alfandegárias Primárias (Portos e Aeroportos), locais onde as Tarifas de Armazenagem são elevadíssimas e podem, inclusive, dependendo do tempo de retenção dos bens, inviabilizar economicamente a operação de importação.
Portanto, o afastamento do imediato controle judicial dos atos administrativos, além de desestimular uma atividade que gera tributos e empregos parar o País, estimular a corrupção nas Aduanas, haja vista que os fiscais poderão utilizar a lei como moeda de troca para uma "solução" administrativa.

Enfim, tal vedação não só restringe, mas dificulta a liberdade do exercício das atividades econômicas, vez que impede a livre circulação de bens, bem como onera o particular ao ter que pagas altos valores de Taxas de Armazenagens até ver o problema ser solucionado pela morosidade da Justiça Brasileira que, a nosso ver, trata-se de hipótese inconstitucional por ferir expressamente o art. 5º, inciso XV e XXXV da Constituição Federal de 1988.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, concluímos que precisamos de uma nova regulamentação do mandado de segurança. Não de uma regulamentação amoldada à antiga Constituição de 1946 ? como acontece com a atual Lei nº 12.16/2009 ? mas de uma lei que consiga efetivamente se adequar as perspectivas da atual Constituição Federal, sendo consonante com os princípios econômicos, financeiros e tributários, bem como com os objetivos elencados na atual Carta Magna.
Assim, circundando nosso entendimento diante do que foi exposto, temos que o mandado de segurança é um instrumento de suma importância para a garantia dos direitos fundamentais de qualquer cidadão, de modo que as restrições produzidas por meio de leis ordinárias federais ferem o princípio da inafastabilidade da jurisdição, bem como impede a evolução nos entendimentos jurisprudenciais nas cortes dos Estados brasileiros.





























REFERÊNCIAS

BUENO, Cássio Scarpinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança. 2ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
DE MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 23ª. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 5ª. ed. São Paulo: Método, 2010.
DA CUNHA, Leonardo José Carneiro. A Fazenda Pública em Juízo. 4ª. ed. São Paulo: Dialética, 2007
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2ª. ed. São Paulo: Método, 2010.
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 1ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
IHERING, Rudolf Von. A Luta Pelo Direito. São Paulo: Martin Claret, 2007.

_________________. Senado Federal, 2006c. Proposta de Emenda à Constituição n. 21 de 2006, de autoria do Senador Paulo Paim. Disponível em: . Acesso em: 29 out. 2010.
_________________. Supremo Tribunal Federal. ADIN n. 3.999/DF. Rel. Min. Joaquim Barbosa. Julgamento: 12 de novembro de 2008, Diário da Justiça de 17 de abril de 2009. Disponível em: . Acesso em: 26 out. 2010.

Autor: Jorge David Silva Frazão Junior


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