EXPLORAÇÃO SEXUAL INFANTO-JUVENIL: UM PANORAMA GERAL



A exploração sexual infanto-juvenil é um fenômeno que se apropria do corpo de crianças/adolescentes para a comercialização, ou seja, para a prostituição, ocorre em esfera mundial e é praticado, principalmente, por homens de todas as classes sociais.

O uso sexual de crianças e adolescentes no comércio do sexo consiste na exploração sexual comercial que, segundo Faleiros (2004), pode ser definido como uma relação de mercantilização (exploração/dominação) e abuso (poder) do corpo de crianças e adolescentes (oferta) por exploradores sexuais, ou por pais ou responsáveis, e por consumidores de serviços sexuais pagos (demanda).

No Brasil, a Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a apurar as responsabilidades pela exploração e prostituição infanto-juvenil, que ocorreu em 1993, desvendou uma rede de exploração sexual de crianças e adolescentes que embora atuem de diferentes formas com a organização e a economia local, está disseminada nas 27 Unidades Federativas.

A partir dos anos 90 com o desenvolvimento de inúmeros estudos sobre esse fenômeno, o termo "prostituição" passa a ser designado apenas para pessoas adultas, visto que uma criança ou um adolescente não estaria psiquicamente preparado (a) para compreender o prejuízo biopsicossocial que esse tipo de inserção pode significar a médio ou longo prazo. Nesse contexto, o termo exploração passa então a ser utilizado.

O Estatuto da Criança e Adolescente ? ECA (Lei Federal 8.089/96) ? analisa a exploração sexual comercial infanto-juvenil como um acontecimento na vida de uma criança ou adolescente que anula seus direitos fundamentais, tais como: saúde, educação, cultura, convivência familiar e lazer, impedindo assim um desenvolvimento social e psíquico saudável.

De acordo, a "Agenda de Ação" definida no I Congresso Mundial Contra Exploração Sexual Comercial que ocorreu em Estocolmo, no ano de 1996, com a presença de 122 países, a exploração para fins sexuais pode ser entendida como:

Todo tipo de atividade em que as redes, usuários e pessoas usam o corpo de um menino, menina ou adolescente para tirar vantagem ou proveito de caráter sexual com base numa relação de exploração comercial e poder e declara que a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é um crime contra a humanidade. (Leal 1999, p.10).

Faleiros (2004) complementa a definição de exploração sexual comercial:

Exploração sexual comercial definiu-se como uma violência contra crianças e adolescentes que se contextualiza em função da cultura (do uso do corpo), do padrão ético e legal, do trabalho e do mercado. A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é uma relação de poder e de sexualidade mercantilizada, que visa à obtenção de proveitos por adultos [...] Implica o envolvimento de crianças e adolescentes em práticas sexuais coercitivas ou persuasivas, o que configura uma transgressão legal e a violação de direitos à liberdade individual da população infanto-juvenil. (p.72)

Vale ressaltar que de acordo com o Artigo 1º da Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da Criança, considera-se criança "qualquer pessoa com idade abaixo de 18 anos, a menos que as leis aplicáveis a ela lhe confiram maioridade antes dessa idade". No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente designa como criança, qualquer pessoa de 0 a 12 anos incompletos e como adolescente, qualquer pessoa de 12 a 18 anos incompletos.

Comercializar o corpo de crianças/adolescentes não é o único fenômeno considerado como exploração sexual. De acordo com Leal (1999), foi estipulado pelo Instituto Interamericano Del Niño, em 1998, quatro modalidades de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes: a prostituição, o turismo sexual, a pornografia e o tráfico para fins sexuais.

Prostituição infantil: é o uso de uma criança em atividades sexuais em troca de remuneração ou outras formas de consideração; Tráfico e venda de crianças para propósitos sexuais: é o tráfico consiste em todos os atos envolvendo o recrutamento ou transporte de pessoas entre ou através de fronteiras e implicam em engano, coerção, alojamento ou fraude com o propósito de colocar as pessoas em situações de exploração, como prostituição forçada, práticas similares à escravidão, trabalhos forçados ou serviços domésticos exploradores, com o uso de extrema crueldade; Pornografia Infantil: é qualquer representação através de quaisquer meios de uma criança engajada em atividades sexuais explicitas, reais ou simuladas ou qualquer exibição impudica de seus genitais com a finalidade de oferecer gratificação sexual ao usuário, e envolve a produção, distribuição e/ou uso de tal material; Turismo Sexual: é a exploração sexual comercial de crianças por pessoas que saem de seus países para outros, geralmente países em desenvolvimento, para ter atos sexuais com crianças. (Libório e Sousa, 2004 apud End Child Prostitution, Child Pornografy and Trafficking of Children for Sexual Purpose¹ (ECPAT), 2002 p.24).

As causas da prostituição infanto-juvenil variam em inúmeros aspectos, como: a família, a cidade ou país que direcionam algumas pessoas para essa atividade. Nos países latino-americanos existe uma tendência a associar de maneira mecânica a prostituição como sendo produto da pobreza e do sistema excludente de desenvolvimento econômico adotado. Enquanto que nos países classificados como de primeiro mundo, a prostituição é considerada uma "opção" individual.

No Brasil, observa-se que as adolescentes de classes menos favorecidas praticam o tipo de prostituição famélica, prestam favores sexuais para suprir suas necessidades materiais básicas ou para se manterem protegidas dos agenciadores aos quais se submetem (o explorador, policiais).

Entretanto, verifica-se que a inserção das adolescentes da classe média brasileira na prostituição está relacionada à cultura do consumo: aquisição de roupas de "grifes", frequência de locais "badalados" ou profissionalização como modelo. Convém destacar que a cultura do consumo/a cultura de massa manipula valores e estilos de comportamento massificados e que podem gerar nos sujeitos e grupos sociais desejos de inclusão social, através dos objetos a serem consumidos.

Para Libório e Sousa (2004), quando crianças e adolescentes não querem ou não podem viver com suas famílias, ou ainda quando suas famílias não têm condições de alimentar suas necessidades básicas ou supérfluas, a venda do corpo pode se transformar numa opção ilícita de sobrevivência e realização de seus desejos de consumo.

A mercantilização do corpo de jovens com idade inferior aos 18 anos completos não se caracteriza como uma livre e espontânea oferta e procura de serviços sexuais, mas como um comércio escravo marcado pela dominação e pelas condições desumanas. O mercado do sexo infanto-juvenil viola os direitos sociais e os direitos humanos, e em virtude disso, destrói a dignidade das pessoas.

A exploração sexual infanto-juvenil é crime tipificado no artigo 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90), que prevê pena de reclusão de quatro a dez anos a quem submeter criança ou adolescente à prostituição ou exploração sexual, incorrendo nas mesmas penas o proprietário ou gerente ou responsável pelo local em que se verifique o crime tipificado.

Entretanto, o mercado consumidor dos serviços sexuais atribui ao sexo-jovem grande valor. Faz-se necessário salientar que no imaginário dos turistas europeus e norte-americanos as jovens "meninas" dos trópicos são consideradas calorosas nas suas práticas sexuais, sendo esses clientes-exploradores importantes personagens para o desenvolvimento do turismo sexual com exploração sexual infanto-juvenil. Todavia, é imprescindível considerar a existência de enfermidades mentais e psicopatias gerais entre os exploradores infanto-juvenis.

É importante compreender que uma adolescente não deve ser considerada como completamente sem autonomia quanto à sua sexualidade, uma vez que pode ter consentido, instigando ou obtido gratificação sexual no relacionamento com um adulto. Todavia, será que a relação de uma adolescente com o cliente, mesmo que consentida, deixa de ser abusiva, dada as diferenças, em inúmeros níveis?

O "consentimento" que a adolescente faz para que seu corpo seja utilizado como objeto é associado ao crime de exploração sexual, porque o adulto induz a jovem a essa prática, já que a troca dos favores sexuais por dinheiro e/ou drogas são fatores ímpares para prostituir essas jovens.

De acordo com Leal (1999, p.2), no aspecto jurídico, o crime consiste em "abusar da inexperiência, da simplicidade ou da inferioridade de outrem sabendo ou devendo saber que a operação proposta é ruinosa, ou seja, pode ser nociva e trazer prejuízos".

As ações contra os maus-tratos, abuso físico e sexual, e exploração sexual infanto-juvenil se iniciam no Brasil no ano de 1994, entretanto, desde meados do século XIX já existiam organizações da sociedade civil que atuavam somente em âmbito local.

Em 1995, a Campanha Nacional Pelo Fim da Exploração, Violência e Turismo Sexual Contra Crianças e Adolescentes, tendo como lema Exploração Sexual Infanto-Juvenil: Não dá para engolir, lançada em Salvador/BA, marca o início da organização da sociedade civil, em âmbito nacional. Nesse mesmo ano, o Governo Federal, por meio da Secretaria de Justiça e Cidadania do Ministério da Justiça, lança campanha com a mesma proposta.

O respeito e a dignidade são aspectos fundamentais para que os seres humanos se desenvolvam em sua plenitude. Toda a criança e adolescente deve ser protegido contra todas as formas de tratamento desumano, vexatório e violento, devendo a sociedade não encarar a prostituição infanto-juvenil como mais um produto intrinsicamente interligado ao processo cultural brasileiro, mas como um crime contra o futuro do Brasil.


Autor: Priscila Pereira Santos


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