Lazer na ocupação: um estudo da sociabilidade de integrantes de uma associação de moradores na periferia de belém em 1997



Introdução Temática e Metodológica

Ou como fazer etnografia em sua própria cidade

            A Antropologia é conhecida pelo público não especializado como um campo de estudo dedicado unicamente às sociedades “primitivas”, ou às sociedades com “organizações sociais simples”. Mas é sabido pelos iniciados na área que o seu papel mais geral de estudar a diversidade sócio-cultural das sociedades humanas implica no interesse por campos de pesquisa os mais variados. Uma vez que se considera a antropologia como o “estudo do outro”, é possível admitir a existência de uma série de outros mesmo em nossa própria sociedade, além do que a existência do “diferente” tem sempre um sentido relacional e situacional, variando de acordo com o contexto e com o grupo do qual se faz parte.

            Este trabalho se situa no campo da chamada Antropologia Urbana, ou seja, do trabalho antropológico que tem como campo de investigação não mais as “sociedades primitivas”, mas a cidade, o urbano[1] e todas as dimensões culturais da vida urbana. Neste campo de pesquisa, a cidade, heterogênea culturalmente, apresenta, perante nossos olhos, um universo múltiplo e complexo.

            O ponto de partida desta pesquisa foi o estudo dos movimentos sociais e, no interior destes movimentos, especificamente as chamadas organizações populares, como as comunidades de bairro ou associações de moradores. A partir de um “olhar” antropológico, procurei observar as formas de sociabilidade desenvolvidas pelos participantes de uma associação de moradores, focalizando como ponto de partida as práticas de lazer.

O foco desta pesquisa sobre lazer[2] foram os moradores de uma parte do bairro da Terra Firme e, no interior daquele bairro, os habitantes da chamada “Área do Bosquinho”. Nela, focalizei a atenção na Associação de Moradores Unidos na Luta, procurando observar dados relativos ao modo de vida[3] e às práticas de lazer dos integrantes daquela associação. Os integrantes da associação percorrem, no seu cotidiano, diversos espaços relacionados a suas atividades naquela entidade, como a Igreja Católica local, Igreja “Santa Maria” e uma organização não-governamental ligada à Unidos na Luta, chamada Associação Paraense de Apoio às Comunidades Carentes – APACC.   

A pesquisa se iniciou com um primeiro contato com um vídeo produzido sobre as condições sócio-econômicas da Área do Bosquinho, em uma aula no Curso de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal do Pará. Este vídeo foi produzido por uma Organização Não-Governamental atuante naquela área, durante a realização do Grito da Terra Firme, em 1993, que foi um movimento organizado de reivindicação pela instalação de infra-estruturas urbanas básicas (fornecimento de luz e água, aterramento de ruas e etc.) e preconizado por organizações populares daquela área da Terra Firme.

            Na verdade, já havia interesse de minha parte pelo estudo da atuação dos movimentos sociais no contexto urbano, pelo viés de uma abordagem antropológica, quer dizer, que levasse em conta os aspectos culturais como fundantes de modelos relacionais cristalizados historicamente ou em vias de elaboração. Muito deste interesse estava voltado para organizações populares que não estivessem necessariamente ligadas a partidos políticos ou sindicatos, mas que se inserissem neste universo apresentando como originalidade alguns aspectos particulares do modo de vida de atores sociais, desenvolvido em contextos urbanos específicos. Talvez este interesse defina o aspecto antropológico deste trabalho, que seria fazer o estudo de uma realidade de “cultura popular” ligada à estruturação de movimentos que ocupam espaços cativos no universo político da cidade.

            Em seguida, casualmente tive contato com uma amiga ligada a um partido político de esquerda que me indicou a Associação de Moradores Unidos na Luta, numa área periférica do da Terra Firme. Esta amiga tornou-se intermediária do processo que me levaria adentrar o universo das ruas da Área do Bosquinho, da associação de moradores e da casa de seus participantes. E foi exatamente desta maneira que as coisas ocorreram. Primeiramente, minha chegada em campo me apresentava como um completo desconhecido, que possuía como única referência a amiga em comum. Em seguida, a freqüência às reuniões e a insistência em obter informações sobre as atividades desenvolvidas na associação levaram-me a alguns pequenos testes quase imperceptíveis, que denomino “rito de passagem de campo”. Numa etapa posterior, eu já poderia ser considerado como digno de confiança para alguns membros da associação, de modo que poderia ter acesso a algumas informações consideradas confidenciais.

Neste momento, foi possível reconhecer as divergências internas entre os membros da associação, bem como as divergências e confluências com outras entidades ligadas a Unidos. Então, o colorido da vida social adentrou a etnografia que eu pretendia realizar, de modo que foi possível: 1) reconhecer e classificar em grupos diferentes os participantes daquela entidade segundo características específicas; 2) reconhecer os códigos de navegação social naquele contexto; 3) configurar os espaços ocupados pelos diversos grupos dentro do campo de poder, tendo como centro a Associação de Moradores e como periferia a Igreja Católica, a APACC e as outras associações de moradores existentes.

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Autor: Antonio Maurício Dias Da Costa


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