A mulher frente à violência de origem religiosa



Conhecida como “mulheres sem rosto”, a burca é vista em todo mundo como traço marcante da cultura muçulmana. Sua exigência não esta disposta de forma expressa no Alcorão e no Hadith, sendo defendida como costume que aproxima a mulher do seu papel social e religioso: a modesta guardiã do lar e da família. Divergências existem no que concerne a obrigatoriedade de cobrir todo o corpo, existindo correntes que permitem a exibição, utilizando-se do véu, de parte do rosto, pés e mãos. Em 2000, foi imposta pelo regime Talibã no Afeganistão e, proibida por lei no território francês em 2010. Apesar das diferenças entre as famílias jurídicas (Como Law, Civil Law e Islâmica) assim consideradas pelos ensinamentos do Prof. Dr. Maurizio Oliviero, em um ponto encontram um núcleo comum: a discriminação e invisibilidade a qual situaram (ou situam) a mulher. A sociedade de origem cristã não foge à regra, observando-se na Bíblia ensinamentos da mesma natureza: “E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a dor da tua conceição; em dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará” (Gênesis 03:16). No âmbito jurídico, cita-se como exemplo, a incapacidade relativa da mulher casada no pretérito Código Civil de 1916, a qual necessitava da assistência do marido para os atos da vida e civil e de sua outorga para trabalhar. No que pese as discussões religiosas sobre a condição da mulher, fato é que seu papel na aldeia global mudou, tratando-se agora de sujeito transformador de sua realidade, presente tanto na igualdade adquirida pelo movimento feminista na sociedade ocidental, quanto na sua atuação em movimentos libertadores como a Primavera Árabe. Respeitar a cultura de um povo encontra seu limite no desrespeito a direitos humanos fundamentais, que ultrapassam a barreira da nacionalidade e assumem caráter transnacional. Permitir que atrocidades sejam cometidas à mulheres, sob justificativa religiosa, para legitimar a própria violência doméstica, e outros atos da mesma natureza, consiste em retrocesso social. Como sociedade, também evoluímos, seja na tolerância religiosa entre povos, como também no respeito a cada ser humano, homem ou mulher. Não se coloca em pauta a discussão de que a vestimenta burca é algo que degrina a imagem da mulher, como salientado na polêmica decisão francesa, ou se a coloca em consonância com os seus mais profundos preceitos religiosos, mas sim, o desrespeito a liberdade de expressão, punido com pena física em várias partes do mundo. Não conceder à mulher o direito a criticar sua própria condição, inibe mudanças de caráter social e cultural, pois é ela quem mais tem legitimidade para apontar a realidade discriminatória da qual é vítima. Neste sentido, destaca-se a condenação da atriz iraniana Marzieh Vafamehr, à pena de prisão e noventa chibatadas, por ter atuado em um filme sem o uso do véu e com a cabeça raspada, em crítica ao regime dos aiatolás. A comunidade internacional não pode ficar inerte a tais situações, sob a bandeira de que o uso de qualquer dos meios aceitos em direito internacional teriam relexos nos ares da crise econômica mundial que pairam atualmente. Permitir que atos de violência contra mulher ainda existam no mundo globalizado, não encontra nenhuma justificativa plausível, sendo apenas forma de submetê-la à condição de controle, submissão e violência de regimes machistas e discriminantes.
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Autor: Raphael Fernando Pinheiro


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