A prisão cautelar em confronto com o princípio da presunção de inocência



A PRISÃO CAUTELAR EM CONFRONTO COM O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

          O grande impasse da prisão cautelar no Processo Penal Brasileiro torna-se o liame entre a garantia da ordem pública ou mesmo a garantia do seguimento processual e a divergência causada entre aplicação desta prisão e o acatamento do princípio da Presunção de Inocência trazido pela Constituição de 1988, tudo para não configurar como uma antecipação da pena ao acusado.

          Principio norteante da Constituição Republicana de 1988, a Presunção de Inocência, artigo 5º, LVII, rege que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Em meio a tal princípio, restada qualquer dúvida quanto ao processo, deverá o juiz absolver o réu, ainda que não esteja plenamente convencido de suas alegações, adotando-se assim o princípio do indubio pro reo, que seria a consequência da Presunção de Inocência. Neste caso, mesmo em vias de aplicação da sentença, caso o magistrado não tenha total convencimento da culpabilidade deverá optar pelo indubio pro reo, fato este que comprova o peso da opção pela prisão nas fases anteriores.

Fernando Capez conceitua prisão processual, in verbis:

“Prisão de natureza puramente processual, imposta com finalidade cautelar, destinada a assegurar o bom desempenho da investigação criminal, do processo penal ou da execução da pena, ou ainda a impedir que, solto, o sujeito continue praticando delitos. Depende do preenchimento dos requisitos do periculun in mora e do fumus boni iuris”.

             Havendo necessidade de alguma intervenção na liberdade do acusado, toda decisão deverá ser pautada em circunstâncias do caso concreto que evidenciem tal necessidade, advindas de fundamentação devidamente embasadas e que tragam em seu bojo o receio por parte do julgador de que a manutenção desta liberdade possa trazer consequências gravosas, seja ao desenvolver do processo, à integridade física das testemunhas ou mesmo à sociedade como um todo, bem como haja a existência de indício suficiente de autoria, fazendo-se configurar o chamado periculum libertatis. Nestes termos, fica afastada a admissibilidade de realização de prisões processuais de forma automática, bem como prisões apenas decorrentes de crimes de maior potencial ofensivo e sempre embasado no periculum in mora e no fumus boni iuris. Tais decisões, conforme o exposto pelo artigo 93, IX da CF/88 e artigo 315, CPP, deverão ser impostas por atos motivados do magistrado.

Nas palavras de Delmanto Junior,

“No que toca ao requisito do periculum libertatis, a decisão judicial que decreta ou mantém o encarceramento provisório deverá sempre demonstrar, com base em dados concretos, em que consiste o perigo que a liberdade do imputado acarreta à instrução ou à aplicação de eventual pena”.                                                                

               Não há que se falar em completa fuga ao princípio da Presunção de Inocência, uma vez que a própria Constituição referiu-se às prisões processuais, sejam elas as prisões em flagrante, temporária, preventiva e prisão decorrente da pronúncia e da sentença condenatória recorrível como forma de sanar as nuances do processo. Porém, na falta dos requisitos anteriormente expostos da prisão cautelar, ficaria configurado uma execução antecipada da pena privativa de liberdade, o que acarreta indiscutível constrangimento ao investigado, que ainda nem teve sua culpabilidade comprovada.

         Ensina Guilherme de Souza Nucci que:

“A prisão como regra para apelar não fere o principio da presunção de inocência estabelecer como regra o recolhimento para poder recorrer, desde que a lei indique, por meio de requisitos objetivos e subjetivos, a necessidade do recolhimento cautelar.”

          No Habeas Corpus 4.365-2 julgado pelo SJT, o Exmo. Ministro Adhemar Maciel assim proferiu:

“Nossa Constituição, por inspiração constitucional lusa (art. 32:2), consagrou o “princípio da presunção da inocência” e, por influência norte-americana (Emendas ns. XIV e XV), o “princípio do devido processo legal”. Ambos os princípios têm conexão com o princípio da liberdade provisória (art. 5º, LXVI). Assim, todo indiciado, ou acusado, se presume inocente até que seja irrecorrivelmente apenado. Desse modo, cabe ao juiz, em qualquer circunstância, fundamentar, mesmo em se tratando de “crime hediondo”, a razão de o condenado ter de ficar preso para poder apelar. A regra geral é recorrer em liberdade (CF, art. 5º, LXVI); a excepcional, recorrer preso. A Súmula 9/STJ não briga com tais princípios, pois apenas assevera que a exigência da prisão provisória para apelar não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”.

              O Superior Tribunal de Justiça se pronunciou a respeito das prisões cautelares editando a súmula 09 com os seguintes dizeres: “a exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”. Na atualidade o que se tem destacado nas decisões do STJ pauta-se na análise da gravidade do crime e na repercussão em meio à impressa, conforme exemplo do delito envolvendo o goleiro Bruno de grande vultuosidade na imprensa nacional. Também são formas de necessidade da aplicação da prisão cautelar os crimes cujo demonstrativo de periculosidade incidam no ocorrido, como o modo de execução do delito, evidenciando extrema crueldade, a quantidade de coautores e partícipes, o número lesivo de armas e conforme adotado pela Lei 11.340/2006 – Lei Maria da Penha, na qual poderá o juiz decretar prisão preventiva, com base em requerimento do Ministério Público ou representante da autoridade policial mediante receio de nova incidência de delitos, uma vez haver a possibilidade de coabitação das partes.

             Como forma de solução a estes impasses, faz-se cabível uma análise por parte do magistrado se necessário se faz o encarceramento do acusado como medida mais adequada, ao invés da aplicação de medidas alternativas capazes de garantir a presença do acusado aos atos processuais, e que, ao mesmo tempo, sejam eficazes para garantir os fins do processo e a segurança pública. São tratadas como alternativas a prisão domiciliar, proibição de ultrapassar limites territoriais da comarca entre outras restrições de direitos para evitar um mal que fosse imposto ao réu antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.

REFERÊNCIAS

DELMANTO JUNIOR, Roberto. As modalidades de prisão provisória e seu prazo de duração. 2 ed. ampl. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 86.

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 238.

BRASIL. STJ – RHC 4.365-2, 1ª Turma, Rel. Adhemar Maciel.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 4. ed. São Paulo: RT, 2005. p.914-915.

 


Download do artigo
Autor: Elton Johne Da Silva


Artigos Relacionados


PrincÍpio Do Estado De InocÊncia Na Atual Realidade Processual Penal

PrisÃo ProvisÓria: Requisitos

A Constitucionalização Da Prisão Em Flagrante

Que A Justiça Seja Feita!

Da Impossibilidade De Requerimento De Prisão Preventiva Por Parte Do Delegado De Polícia

A Prisão Cautelar

Nova Lei Do Processo Penal: Gera Mais Impunidade?