Sofrer amado



SOFRER AMADO

 

Como flecha que em fogo rasga o coração do guerreiro

O amor a mim machuca

Não o amor. Perdoe-me! O amor não me quer

Como poderia?

Quando criança – Ó céus, pobre ingenuidade! – Acreditava ser capaz.

Sonhara com o frisson da paixão.

Nem ela, nem mesmo ela.

A ti o diabo reservas o sofrer, basta! Sê digno para recebê-lo, como noiva pura e santa.

O sofrer. Vês o quanto o ama? Tanto quanto as trevas... Essa sim, persegue-te como o lobo persegue a caça: com morte marcada nos olhos e saliva quente caindo ao chão.

Olhe para trás! Vês? Pobre alma descansa! Senta-te à beira da árvore. Aceita teu fruto.

Idiota, não corras! A morte não o quer. A angústia, a dor, a eternidade; essas sim.

Ah! A eternidade, como essa o deseja. Ainda que em teu corpo não corra o sangue dos miseráveis, nem sopre em tuas narinas o ar úmido e quente do inferno, tua alma em júbilo correrá o universo. A ela a incerteza espera. A ineptos abismos percorrerá. Fará do frio e escuridão amigos fiéis. Com seu grito silencioso exultará por socorro, ecoando no sono da luxúria e apavorando o medo.  Dormirá nas raízes da videira. Secará tua seiva e abraçará tua essência.

Como maldição lançada, e ainda, como o veneno mortal da víbora voraz, o antídoto respira. Virá a galopes rápidos, montado nos velozes cavalos de fogo da loucura.

Nos campos áridos dos trigais, descansa a tua salvação, onde sopras com majestade os ventos da misericórdia e onde as chaves das correntes que o aprisiona se escondem.

Ó criatura, sê capaz de encontrar?

No abismo de teu ser, onde o frio reina e devasta, a semente espera germinar.

É a hora, regue-a! _ Desgraça! Não, não a quero.

Com a dor fiz meu pacto de sangue. Com a angústia e ansiedade casei-me.

Da luxuria e sacrilégio fiz meus inseparáveis parceiros de noite.

Outrora, o sofrimento recusei como fêmea que sem estar pronta rejeita a cópula. No entanto, como macho sedento de desejo e fogo ardente no olhar me penetrou. Invadiu minh’alma e alojou-se. Consumiu meu ser e compensou meu espírito.

O destino que a mim o diabo e Deus disputaram por traçar, beijei a boca e disse SIM.


Autor: Altemar Felberg


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