Uma abordagem sobre conflitos na profissão de educador



UMA ABORDAGEM SOBRE CONFLITOS NA PROFISSÃO DE EDUCADOR1

 

 

MARA ROGELMA SOARES TORRES FRAZÃO2

 

 

RESUMO: Este artigo pretende analisar o educador, que vê-se quase regularmente repleto de exigências que, muitas vezes, ele não pode atingir senão de uma maneira muito aproximada. Veremos que o educador aparece como um ser totalmente desprovido de afetos, isento de dificuldades pessoais e consagrado exclusivamente à sua tarefa. Conflitos internos e externos serão analisados sob a óptica da realidade e da psicologia.

 

PALAVRAS-CHAVE: Educador. Psicologia. Conflitos. Profissão. Motivação.

 

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Desenvolvimento; 2.1 Conflito de autoridade; 2.2 A agressão inibida; 2.3 O homossexualismo latente; 3 Considerações finais; 4 Referências

 

1 - INTRODUÇÃO:

 

            A noção de “personalidade” faz a função de álibi das exigências e expectativas dirigidas pela sociedade a uma série de profissões dedicadas à educação e à prestações de cuidados e de serviços à humanidade. A honra de participar com o educador da sorte de uma idealização cabe sobretudo à ciência pedagógica. Esta circunstância nos aparece como particularmente perigosa numa época em que a máquina se introduz ao mesmo tempo no processo de aprendizagem.

            O fator específico, distintivo da situação psicossociológica do educador diz respeito não somente à importância de sua ação, mas ainda à do seu comportamento, consciente e inconsciente, relativamente ao presente e ao futuro. Todo indivíduo exerce uma influência sobre o grupo em que vive, e sofre outra influência do mesmo grupo. Observamos um exemplo disso estudando o relacionamento recíproco dos comportamentos de pais e filhos. A higiene do educador se apresenta, portanto, sob um duplo aspecto. Com efeito, o reconhecimento dos problemas inconscientes do educador são ao mesmo tempo meios preventivos que se referem ao desenvolvimento psíquico das crianças e dos jovens confiados a seus cuidados.

            Com o desenvolvimento dos sistemas educativos, o docente está a ganhar peso entre a população ativa, sua remuneração é o principal elemento nos custos da educação. Paralelamente, as maiores expectativas da sociedade face aos sistemas educativos ampliam as missões da Escola. Para completar o quadro, a introdução das novas tecnologias nos processos de aprendizagem tornou mais complexa a profissão docente.

            Curiosamente, no entanto, as políticas orçamentais restritivas tendem a comprimir os salários do pessoal educativo, aumentar a sua carga de trabalho e introduzir a flexibilidade e a precariedade na sua gestão; isto, ao mesmo tempo que a qualificação e as competências que lhes são exigidas não param de aumentar, considerando-o um elemento decisivo para a qualidade da educação e para a sua eficácia. Esta contradição é motivo de fortes tensões e conflitos.

            É precisamente neste sentido que desejaríamos ver interpretado o que vamos expor. Se se entender necessariamente a setores submetidos em geral a tabus, é por estrita conformidade à natureza das considerações próprias da realidade e da psicologia profunda, porque exigem um gênero muito particular de honestidade.

 

2 - DESENVOLVIMENTO:

 

            A grande variedade das profissões de educadores supõe que os motivos conscientes aplicados pelos indivíduos na escolha de sua profissão comportem uma grande diversidade. Neste campo, a professora do Infantil, dum lado, e o professor do Ensino Médio, do outro, nos parecem representativos dos dois extremos. Grande parte da atividade pedagógica da primeira se passa tomando conta das crianças e com jogos e brincadeiras. Quanto à atividade profissional do segundo, a transmissão de conhecimentos especializados e de bens culturais encontram-se muito acima de função educativa propriamente dita. É verdade que se admite geralmente a inerência de um valor pedagógico nos valores culturais como tais. No meio, separando estas profissões, se colocam o grupo considerável dos professores da segunda à quinta série e o grupo mais restrito dos educadores especializados, dos monitores e assistentes da juventude. Neste mesmo campo, igualmente, diferentes opiniões caracterizam a profissão do professor primário trabalhando com seus alunos, sobretudo na sala de aula. Educa as crianças por intermédio das matérias escolares.

            O professor monitor e o educador especializado estão com as crianças e os jovens durante o tempo de lazer. O educador especializado exerce mesmo sua atividade numa situação semelhante à situação familiar: é nesse sentido que se dá a transferência paterna e materna mais óbvia.

            A escolha do professor secundário é a que menos é marcada pelo desejo de exercer uma atividade pedagógica junto dos jovens, concentrando seu interesse em disciplinas específicas, que constituem o fator dominante da sua escolha. A própria natureza do Ensino Superior, tal qual é concebido em nosso país, favorece esta concentração de interesses nas disciplinas de ensino, em detrimento da consideração das realidades humanas.

“Art. 13º. Os docentes incumbir-se-ão de: I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; III - zelar pela aprendizagem dos alunos; IV - estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento; V - ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional; VI - colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade.” (LDB, nº 9394/96)

 

            De acordo com a citação tirada da LDB, percebemos todos os deveres cabíveis à profissão de educador, mas muitas vezes são esquecidas as inúmeras dificuldades (internas e externas) de cada indivíduo em particular, no caso dos conflitos internos, estes são os menos trabalhados por nós e pelas Instituições de Ensino.

            A pressão sobre a profissão docente tem origem fora do sistema educativo (expectativas sociais) e no seu interior.

            O saber, os conhecimentos, a inovação, a investigação, a sociedade do conhecimento e a educação aumentam a pressão social sobre os sistemas educativos e sobre os professores. O aumento do nível educativo e o acesso de todos a uma qualificação profissional e a uma certificação de qualidade transformam-se numa forte exigência social.

            A exclusão e o desemprego ameaçam àqueles que não adquiriram uma educação de base suficiente e que, por essa razão, têm dificuldades para chegar a uma educação de qualidade. Os professores acham-se obrigados à “perfeição”. Espera-se que a escola proteja esses profissionais contra o desemprego e a exclusão, e que os leve à qualificação, ao emprego e à inserção.

            O dever dos professores de assegurar o êxito a todos os jovens, aumentando a qualidade da educação para todos, torna mais complexa a profissão docente.

            A Escola tem uma função cada vez mais importante na distribuição dos papeis sociais, dando resposta a todos os problemas que a sociedade não consegue resolver, são eles: ensinar e educar, transmitir conhecimentos, desenvolver capacidades intelectuais, transmitir valores, preparar para a qualificação profissional e para a inserção social e profissional.

            Ensinar é trabalhar com alunos sobre conhecimentos que evoluam sem parar e que estão organizados em disciplinas com fronteiras mais ou menos estáveis. Os jovens, com frequência, têm que percorrer grande distância para se apropriarem de conhecimentos fundamentais; por outro lado, a sociedade exige aos professores que os seus alunos não fracassem, que todos dominem saberes elaborados e evolutivos, que desenvolvam uma atitude crítica e que sejam capazes de resolver problemas complexos.

            As práticas educativas têm que adaptar-se à diversidade da população estudantil, das suas motivações, das suas experiências, das suas expectativas e dos seus projetos.

            Segundo A página da educação, o docente tem que trabalhar os conhecimentos motivando os alunos. É necessário convencer os jovens de que é através da atividade intelectual que garantem o seu êxito, de que o verdadeiro saber não é um conjunto de conhecimentos memorizados para recitar, mas um saber crítico adaptável a situações diversas. Da parte dos professores, é indispensável um bom domínio dos conhecimentos científicos.

            Ao mesmo tempo, o professor deve conseguir que os alunos adquiram valores sociais e cívicos fundamentais para a coesão social e para a vida democrática das sociedades, contando com os problemas de todo tipo com que os alunos se deparam e procurar as soluções. Neste sentido, ensino e educação são inseparáveis do docente.

            Os professores e representantes da educação, com as dificuldades na vida familiar, são aliados nas lutas reais dos jovens (drogas, violência, doenças sexualmente transmissíveis, pobreza, discriminações). A escola deve apresentar a difícil capacidade de socialização dos seus membros.

            O professor confronta-se com a evolução acelerada dos conhecimentos e das técnicas. Por isso, deve ter em conta o desenvolvimento de todas as fontes de informação, seja televisão, internet, além das modificações na relação dos jovens com a informação, a cultura e o conhecimento.

            A profissão docente não se restringe às paredes da sala de aula, além delas, os professores têm que ajudar na construção da concepção dos programas e das práticas profissionais, participando também das atividades de investigação.

            Ao mesmo tempo que são apontadas as categorias profissionais escolhidas por cada educador e os conflitos externos, também serão enfatizados alguns conflitos relativos ao educador e à relação entre o educador e seus discentes, os chamados conflitos internos, psíquicos. Trata-se especialmente do conflito da autoridade não resolvido, da agressão e da homossexualidade.

 

2.1 – Conflito de autoridade

“Que não se evoque a este respeito o contraste entre a autoridade autêntica e a autoridade falsa, e se evite relacioná-la com a diversidade das realidades pedagógicas. No caso, a escola, enquanto conjunto psicológico, limita-se a servir de campo de ação para um indivíduo, cuja problemática com relação à autoridade não está ainda resolvida. O domínio das relações entre pequenos e grandes, entre crianças e adultos, entre sábios e ignorantes, representa ao mesmo tempo um grupo de vencedores e um grupo de vencidos.” (SCHRAML, 1996, p. 222)

 

            Segundo Walter Schraml, a personalidade que tem mais ou menos conflitos de autoridade inconsciente encontrará no seio da situação psicológica escolar os dados contemporâneos de sua infância: enquanto superioridade primária, a autoridade supõe-se adquirida automaticamente, sem que haja necessidade de conquistá-la com luta cerrada ou ganhá-la pela produtividade.   Um indivíduo que se faz educador, em virtude deste motivo inconsciente, deverá esperar as maiores dificuldades durante toda a sua vida profissional. Este professor nunca terá a segurança indispensável para consentir, em certas ocasiões, a pôr em discussão diante dos alunos sua maneira de proceder, seus conhecimentos e até sua personalidade.

            Submeter-se a tal situação significaria para ele pôr em perigo o conceito de autoritarismo usado até então, e a provocar a necessidade de estabelecer uma nova modalidade de autoridade, sob forma de autoridade autêntica. Considerada do ponto de vista do aluno, uma autoridade desta ordem se estabelece em virtude de sua fixação à pessoa do professor e de sua parcial identificação com este. O fenômeno conhecido com referência à conexão dos resultados escolares de um aluno com uma relação positiva referente à personalidade do professor deveria ser posta na mesma perspectiva.

            Todos os estímulos por ordem psicológica e todos os conselhos pedagógicos dados a este educador tornam-se vãos, se a sua problemática não está resolvida, se existe essa insegurança íntima. Em outras palavras, de nada adiantam conselhos para a prática pedagógica, se o educador mesmo se obrigar a permanecer no seu posto de poder. A rigor, estas recomendações serão mais ou menos seguidas, agirão mais ou menos na superfície da atividade, mas não resolverão de modo nenhum seu conflito inconsciente.

            Este conflito não poderá ser resolvido, a não ser com uma intuição profunda de sua problemática pessoal, portanto em virtude de uma melhor compreensão de si. Resultante de um tratamento direcionado ao problema.

            Uma tomada de consciência dessa ordem e a mudança de atitude que ela acarreta são, na maior parte das vezes, de grande valia para o trabalho pedagógico. Com efeito, acontece frequentemente que indivíduos que fizeram uma escolha profissional parcialmente neurótica deem provas de um interesse autêntico, e sejam particularmente dotados para a profissão escolhida.

            Com efeito, sempre que nos posicionamos perante um outro na qualidade de representantes hierárquicos de determinada prática social, seja com o intuito que for, estabelecemos uma relação, a rigor, violenta.

            Nesse sentido, pais e filhos são violentos entre si, da mesma forma que médicos e pacientes, sacerdotes e fiéis, personagens televisivos e espectadores, professores e alunos. É o que se poderia conceber como uma espécie de ritual dos lugares que possuem relações institucionais.

            Se a intervenção institucional visa a apropriação de determinado objeto, por meio da transformação de um determinado dado, é possível e desejável deduzir que a ação dos agentes institucionais será inevitavelmente violenta – porque transformadora.

            E como isso se processará? Dentre outros dispositivos, por meio da imagem de “autoridade” atribuída aos agentes, isto é, por meio dos poderes que a clientela (mais imediatamente) e o público (menos imediatamente, uma vez que não participa diretamente da ação institucional) delegarão à figura dos agentes institucionais à potência embutida nessa delegação. É nessa espécie de “promessa” depositada no agente, por parte da clientela/público, que residirá grande parte da eficácia operacional das instituições. Sem ela, não haveria a possibilidade de existência concreta para as práticas institucionais que tomamos como imprescindíveis.

            Vamos à definição do conceito de autoridade.

        Os significados do termo autoridade remetem a “direito, poder de comandar, de obrigar a fazer alguma coisa; domínio, jurisdição // arbítrio, vontade própria (...) // aquele que exerce autoridade (...) // crédito, consideração, influência, importância (...) // autorização, permissão” (Arendt 1992, p. 341).

 

            O sentido do termo desdobra-se em torno da idéia de exercício de poder, portanto, um exercício de direito. Mais especificamente, trata-se da delimitação de um domínio, ou até mesmo de uma espécie de arbitragem ou comando, concedida a partir da permissão de outro, que se efetiva de acordo com o crédito atribuído àquele; portanto, um exercício de direito legitimado.

            Nesse sentido, fortalecer a premissa de que a potência virtual da ação institucional dá-se via delegação de “poderes” aos agentes, pela clientela/público, abonar pela crença numa certa superioridade hierárquica daqueles.

            Na definição do termo autoridade, desponta uma evidente justaposição semântica a um dos sentidos do termo violência: o de obrigar a fazer algo.

            Pode-se concluir que não há exercício de autoridade sem o emprego de violência, e não há o emprego de violência sem exercício de autoridade. Portanto, a violência constituinte das práticas institucionais teria como um de seus dispositivos a própria noção de autoridade, permitida aos agentes pela clientela/público saberes daqueles.

            Se partirmos do pressuposto de que a educação escolar é o modo dominante por meio do qual as novas gerações são inseridas na tradição, isto é, o meio pelo qual as introduzimos no instável mundo do conhecimento sistematizado, haveremos de convir que alguns fantasmas têm rondado essa instituição. E o mais implacável deles talvez seja o que envolve a crise da autoridade docente, fato este que seria correspondente principal de grande parte dos efeitos de violência testemunhados no cenário escolar.

            Afirmamos anteriormente que a autoridade delegada aos agentes de determinada instituição é um dos dispositivos da base da estruturação e efetivação da própria intervenção institucional. Se a escola tem-se apresentado cada vez mais como um espaço de confrontos que ultrapassam aqueles relativos ao choque intelectual e cultural, é possível supor que seu espaço carece de uma certa ambiguidade por parte daqueles que a fazem no cotidiano. Trata-se de uma crise de modelo e de ética.

A crise da autoridade na educação guarda a mais estreita conexão

com a crise da tradição, ou seja, com a crise de nossa atitude

perante o âmbito do passado. É sobremodo difícil para o educador

arcar com esse aspecto da crise moderna, pois é de seu

ofício servir como mediador entre o velho e o novo, de tal modo

que sua própria profissão lhe exige um respeito extraordinário pelo

passado. (Arendt 1992, p. 243-244)

 

            Hannah Arendt, no texto intitulado A crise na educação, fala que a única estratégia oriunda do enfrentamento dessa crise de modelo e ética que assola a educação escolar é o respeito pelo passado, pela tradição no legado cultural.

            A escola é lugar do passado, no bom e imprescindível sentido do termo. E deve ser, mesmo porque não há futuro plausível sem a imersão no traçado histórico dos diferentes campos de conhecimento.

            E isso é denominado tradição. Tradição não é sinônimo de confusão de tempo, assim como autoridade não é sinônimo de poder. Muito ao contrário. É aí também que o trabalho escolar revela outro de seus paradoxos de base: é preciso conservar para transformar. Sendo assim, recria- se a cultura e inventa-se o sujeito da cultura. E esse princípio fundamental implica uma compreensão bem clara de que a função da escola é ensinar às crianças como o mundo é, e não instruí-las na arte de viver.

        Dado que o mundo é velho, sempre mais que elas mesmas, a aprendizagem volta-se inevitavelmente para o passado, não importa

o quanto a vida seja transcorrida no presente. (Arendt 1992, p 246)

 

            A essa espécie de visibilidade sobre os princípios e fins da ação docente temos denominado ética pedagógica, uma vez que ela não implica imediatamente nem a dimensão teórica da ação nem sua dimensão metodológica.

            Assim, a questão da autoridade, para além da qualificação do professor, passa a se configurar como o ponto culminante da ética docente, reguladora primordial do trabalho pedagógico, e, portanto, como o único antídoto possível contra a violência escolar.

            Novamente, Arendt aponta caminhos importantes:

“Embora certa qualificação seja indispensável para a autoridade, a qualificação, por maior que seja, nunca engendra por si só autoridade.

A qualificação do professor consiste em conhecer o mundo e ser capaz de instruir os outros acerca deste, porém, sua autoridade se assenta na responsabilidade que ele assume por este mundo. Em face da criança, é como se ele fosse um representante de todos os habitantes adultos, apontando os detalhes e dizendo à criança: – Isso é o nosso mundo.” (Arendt 1992, p. 239)

 

            Tomando como contraponto a violência de cada dia, da qual somos reféns a maior parte do tempo: Qual mundo temos apresentado a nossos alunos? Quais de seus detalhes lhes temos apontado? Qual história queremos legar para as novas gerações? Há ainda, no encontro habitual da sala de aula, responsabilidade por este mundo e esperança de um outro melhor?

            O estudo mais preciso das medidas de higiene mental a serem aplicadas nos levará posteriormente a nos perguntar como seria lícito inserir já na escolha profissional como tal e na formação dos futuros professores certos meios próprios para facilitar este reconhecimento íntimo e um conhecimento melhor de si, inspirado pela psicologia.

 

2.2 A agressão inibida

            O impulso de agressão e suas múltiplas perturbações são outra motivação inconsciente, com referência à profissão de educador. Esta constatação chocará o educador, e o fator tem fácil explicação.

 

 

 

“A imagem habitual, típica do educador no-lo apresenta como um homem isento de agressão e plenamente senhor de seus afetos, pelo menos durante suas atividades pedagógicas.” (SCHRAML, 1996, p. 223)

           

            As convenções sociais são suficientemente caracterizadas pela representação ideal do educador isento de afetos. Quanto à situação particular do domínio pedagógico, o trabalho junto das crianças põe, em geral, o educador ao abrigo de discussões com pessoas de sua idade, e, portanto, de condição igual à sua, inevitáveis em todas as outras profissões.

            Evidentemente, o educador encontra-se igualmente em luta competitiva com os adultos, seus colegas e seus superiores. Sua profissão particular lhe oferece a ocasião fatal de repercutir nos mais fracos as situações que provocam vexame, as quais ele experimenta. É claro que esta descarga de afetos num indivíduo mais fraco – na criança – não reveste caráter intencional.

        “A escola, como qualquer outra instituição, está planificada para que as pessoas sejam todas iguais. Há quem afirme: quanto mais igual, mais fácil de dirigir. A homogeneização é exercida através de mecanismos disciplinares, ou seja, de atividades que esquadrinham o tempo, o espaço, o movimento, gestos e atitudes dos alunos, dos professores, dos diretores, impondo aos seus corpos uma atitude de submissão e docilidade. Assim como a escola tem esse poder de dominação que não tolera as diferenças, ela também é recortada por formas de resistência que não se submetem às imposições das normas do dever-ser. Compreender essa situação implica aceitar a escola como um lugar que se expressa numa extrema tensão entre forças antagônicas. (...) O professor imagina que a garantia do seu lugar se dá pela manutenção da ordem, mas a diversidade dos elementos que compõem a sala de aula impede a tranqüilidade da permanência nesse lugar. Ao mesmo tempo que a ordem é necessária, o professor desempenha um papel violento e ambíguo, pois se, de um lado, ele tem a função de estabelecer os limites da realidade, das obrigações e das normas, de outro, ele desencadeia novos dispositivos para que o aluno, ao se diferenciar dele, tenha autonomia sobre o seu próprio aprendizado e sobre sua própria vida. (SCHRAML, 1996, p. 78-79)

 

            Se partirmos do pressuposto de que a intervenção escolar é estruturalmente normativa/confrontativa, nosso olhar volta-se para a relação professor-aluno, ao mesmo tempo estrutural e conjuntural da violência escolar.

            É a partir dessa natureza conflitiva que se pode derivar um certo olhar mais sobre o cotidiano escolar contemporâneo e o que os rastros de violência nele embutidos têm-nos revelado sobre ele.

            A vida cotidiana, na sala de aula e no lar, oferece ao educador múltiplas ocasiões de deixar manifestar-se a êxtase de suas agressões, sob forma de camuflagem de processos pedagógicos legítimos.

 

2.3 O homossexualismo latente

            O problema das relações da homossexualidade e da profissão de educador necessita, antes de mais nada, de uma apresentação de ordem objetiva. Tanto a literatura sobre o assunto, quanto os meios pedagógicos profissionais e a opinião pública, oscilam no caso entre a camuflagem e a reprovação de “Eros pedagógico”.

            A idealização de homo- erotismo teve seus precursores célebres na Antiguidade e assim se explicará facilmente suas afinidades com a cultura humanista, da qual é igualmente dependente a psicologia do adolescente.           Neste ponto, evidentemente, os antigos gregos eram mais honestos. Seus testemunhos literários a este respeito confessam explicitamente que a relação pedagógica de um Sócrates e de um Sólon não estava isenta de apego, nem de inclinação, nem de comércio físico. Em nossa época, procuramos muitas vezes encobrir a dificuldade, pelo recurso às noções de homo- erotismo e de homossexualidade.

 

“Qualificam-se de homo-eróticas as relações afetivas – e portanto permitidas – e os laços espirituais, mantidos entre pessoas do mesmo sexo; enquanto que as relações físicas são tachadas de homossexualismo, e portanto proibidas, severamente reprovadas, feridas de tabu pela sociedade e ameaçadas de sanções legais.” (SCHRAML, 1996, p. 226)

 

 

            Ora, esta estrita descriminação contradiz as aquisições da psicanálise. O interesse sexual, o prazer estético inspirado pela vista da harmonia corporal de um amigo do mesmo sexo, e as relações afetivas e espirituais mantidas com este amigo, provém de uma raiz idêntica.

            O apego emocional e espiritual pelo companheiro do mesmo sexo traduz ora a sublimação da compulsão homossexual, ora o sintoma de uma integração ainda incompleta do fato homossexual, na personalidade do indivíduo.

            Portanto, como já foi constatado acima, a noção homossexual pertence ao desenvolvimento normal da sexualidade humana. Ela só se torna problemática no caso em que não se manifesta nenhuma atração definitiva pelo sexo oposto na época da maturação. A este respeito os fatores determinantes da situação remontam muito longe, à infância do indivíduo, até seu relacionamento com o pai e com a mãe.

            Negligencia-se muito frequentemente o fato psicológico constado, que, tanto o homem quanto a mulher, podem ter inclinações homossexuais conscientes ou inconscientes. A subestima da homossexualidade feminina no seio de nossa civilização é provavelmente determinada pelos dois fatores seguintes: as relações sexuais entre mulheres – quer se trate de relações entre mulheres adultas, quer se trate de relações entre uma mulher adulta e uma adolescente – não são punidas por lei. A medida justifica- se do tríplice ponto-de-vista cultural, sociológico e biológico. Aliás, a homossexualidade feminina reveste frequentemente uma forma de manifestação muito diferente da homossexualidade masculina: muito mais frequente do que entre homens, com efeito, trata-se de uma relação biafelda que se caracteriza por um certo apego e uma certa duração. No homem, pelo contrário, a mudança de companheiro, assim como a relação simultânea mantida com diversos parceiros, são coisas muito freqüentes. Todas estas considerações fazem sobressair à evidência, a importância de toda relação de um adulto com jovens, como a relação de um educador com seus alunos, por exemplo.

       

“Os professores de todas as categorias – os professores do ensino fundamental e os professores do ensino médio, os educadores especializados, etc. – têm continuamente ocasião de encontrar adolescentes. Em caso de tendência homossexual latente e inconsciente, a fascinação exercida sobre o indivíduo pela frequentação profissional incessante de jovens é, pois, facilmente explicável.” (SCHRAML, 1976, p. 228)

 

            Considerados do ponto-de-vista da higiene mental dos jovens, os casos-limite, em que o educador sente desejos homossexuais manifestos (confessos) e os realiza efetivamente, estão longe de revestir o caráter de gravidade, que geralmente se lhes empresta. Com efeito, pensa-se geralmente, que desvios homossexuais desta ordem causem em prejuízo real à evolução do jovem, enquanto que, no caso de um desenvolvimento psíquico e sexual sadio, um ato desta natureza possa ficar isento de consequências notáveis.

            Entretanto, o aparecimento de uma falha na imagem ideal da pessoa adulta mostra-se muito mais perigosa que o fato da sexualidade propriamente dita, na medida em que ela se dá, na ausência de violência, portanto de toda componente sádica. Ora é um fato comprovado que jovens entusiastas, afetados com traços de homossexualidade não elaborada, se interessam por domínios culturais os mais variados e se mostram muito acessíveis ao aspecto estético da realidade, exercem um grande poder de fascinação sobre o educador atingido pela homossexualidade latente ou manifesta.

            Desde então, as relações – isentas, na maior parte das vezes, de relações físicas – se situarão numa atmosfera de homo-erotismo. Saídas comuns, visitas de museus comuns e a participação comum em manifestações artísticas e culturais, combinadas com a situação de intimidade das conversas, criarão uma forma de apego afetivo, próprio a afastar o adolescente das preocupações vitais, correspondentes à sua idade.

            Um jovem implicado em situação análoga só enfrentará com muita dificuldade a companhia dos jovens de sua idade e quase não encontrará meios de lançar-se no caminho que leva à frequentação do sexo oposto. Com estas palavras, quer-se apenas provar que a psicologia profunda fornece um relato imparcial, mais profundo e mais vasto dos problemas da homossexualidade e, sobretudo, da homossexualidade relativa à educação.           Por conseguinte, compreende-se por que foi citada uma tendência homossexual inconsciente para muitas motivações profissionais, sublinhando o perigo com o qual ela ameaça a relação pedagógica entendida no sentido mais amplo do termo.

            Por essa razão, existe uma profunda necessidade conhecer sobre as relações humanas da sociedade atual, particularmente falando da homossexualidade, esse estimulo possui respostas incompletas dadas pela ciência e pela psicanálise, respostas que mesmo incompletas ajudam na ocorrência de mudanças rápidas na consciência e na opinião das pessoas.

            Ao considerar a sexualidade como construção social, a iniciação sexual deixa de ser um ato meramente individual, psicológico ou biológico para ser um fato social. Tais questões trazem à discussão os direitos sexuais, tão importantes como os direitos civis, políticos e sociais, porém, compreendidos de forma errônea, estão baseados no reconhecimento da livre e responsável decisão, relativos à sexualidade, apoiadas nos direitos humanos, ou seja, a partir de uma perspectiva de igualdade social.

            Num passado distante, a homossexualidade era considerada como doença ou até mesmo como desvio de caráter, claro que ainda nos deparamos com esse tipo de pensamento. A atual estrutura e organização da população impõe, se não a aceitação, o respeito à livre escolha individual.

            Estamos em um momento de transição de opiniões, e que vem se tornando notório a todos, hoje é comum vermos casais homossexuais nas ruas, em bares, festas, cinemas, e a cada dia que passa essa liberdade se torna maior, mostrando que a sociedade está mudando de acordo com as aceitações das atuais relações humanas.

            Ainda não é possível falarmos de homossexualismo sem citarmos outro termo bem conhecido: o preconceito.

 

            Os preconceitos de uma sociedade são extremamente difíceis de serem erradicados, mesmo com o apoio da legislação. A integração pode levar ao rápido desaparecimento dos preconceitos.

            Existem provas de que a mistura entre membros de diferentes grupos sociais ou étnicos pode reduzir o preconceito, método que pode ser usado em diferentes esferas da sociedade, como por exemplo, nas escolas, na família, no comércio, enfim, na sociedade em geral.

            Schraml (1996, p.230) cita Freud e transcreve um pensamento do mesmo:

 “(...) na tenra infância, existem sinais de atividade corporal a que somente um antigo preconceito poderia negar o nome de sexual (...) – tais como a fixação a objetos específicos, o ciúme, e assim por diante. [...] Descobriu-se ainda, entretanto, que esses fenômenos que surgem na tenra infância fazem parte de um curso ordenado de desenvolvimento, chegando a um clímax por volta do final do quinto ano de idade, após o qual segue-se uma acalmia.”

 

            É preciso assinalar que até os cinco anos de idade a criança esta sendo pré-moldada sexualmente e psicologicamente, é nesta fase que os pais possuem a responsabilidade de evitar a contaminação pelo preconceito, algo que não pode ser disseminado, mas pode ser minimizado pela instrução dada, condução que não ocorre como deveria, por exemplo, quando os pais proíbem seus filhos de brincar com crianças do sexo oposto ou com objetos que julgam “perigosos”.

            Esse tipo de comportamento contribui para uma má formação da personalidade e do caráter da criança, que irá se refletir na escola, onde ela terá sua primeira vivencia social, encontrando assim o momento mais propício para manifestar o preconceito adquirido no início da infância.

            Aprendemos a viver em sociedade e para a sociedade na escola, é nela que o aluno conhece seus direitos e deveres, manifesta suas opiniões, aceita as diferenças do outro, e o professor mais uma vez é o mediador de todo esse conhecimento que está sendo construído, e se necessário trabalha para modificá-lo, mesmo, muitas vezes, sendo vítima dessa realidade, ato que não será fácil, pois a criança já tem sua idéia formada, herdada da criação e educação dos pais.

            Existem inúmeras dificuldades para se trabalhar em sala de aula a orientação sexual, uma delas é o constrangimento de alguns alunos diante de assuntos reprimidos pela sociedade, causando conflitos entre a escola e os pais, estes muitas vezes desinformados, julgam e descriminam precocemente a disciplina, criando obstáculos.

            A capacitação dos professores e as ações educativas nas escolas, desde a infância e principalmente na pré-adolescência e adolescência, são importantes para favorecer o fortalecimento da educação sexual, tendo como alvo principal a desmistificação de assuntos ligados ao homossexualismo e lesbianismo, não esquecendo que é fundamental o estudo e a compreensão das inter-relações dos fatores sociais, políticos, econômicos e culturais, assim, potencializando a possibilidade de relações humanas mais igualitárias.

            É preciso que questões relacionadas à orientação sexual sejam priorizadas na formação, capacitação e trabalho pessoal dos profissionais da educação, pois o preconceito e a desinformação andam juntos.

           

3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS:

            Os profissionais da educação serão cada vez mais solicitados a configurar o futuro e são chamados a evoluir num sentido que ainda não está definido e que são, muitas vezes, contraditórios.

            É urgente aprofundar o que foi apresentado ao longo do artigo, para entendermos o futuro que pretendemos construir.

            Ao analisarmos as ações docentes diante dos inúmeros conflitos encontrados ao longo da jornada profissional, chega-se a significativas conclusões. Dentre elas está o papel do professor, do Estado e da sociedade no que se refere aos fatores internos e externos ocasionado pela educação, que muitas vezes são esquecidos ou desapercebidos, mas que estão cada vez mais presentes no cenário da escola, bem como a importância da organização de um currículo flexível, globalizado e atento às demandas de cada comunidade escolar.

            Ao longo desse trabalho, buscou-se ressaltar, no desenvolvimento, a importância da docência na resolução dos conflitos estudantis através de uma prática que possibilite o aprendizado dos educandos através de ações embasadas no ser, no fazer, no conhecer e principalmente no conviver.    Também buscou-se chamar a atenção para a importância da prática pedagógica, que volta-se para todo o desenvolvimento que promova a paz e que proporcione a conscientização sobre a importância do exercício da cidadania, do diálogo e do trabalho coletivo nas atividades diárias de sala de aula. Os fatores externos, enquanto fenômenos que atingem todas as camadas sociais, vem revelando-se cada vez mais fortes no ambiente escolar, entre elas a falta de respeito à autoridade docente, criando muitos dos conflitos pessoais e profissionais dessa classe meio que esquecida nos seus conceitos internos.

            Conviver e atuar nessa realidade está fazendo com que muitos profissionais que atuam na educação escolar sintam-se acuados, desmotivados, despreparados e inclusive, com problemas de saúde.

            Notamos, através da investigação feita, que assim como a escola e seu corpo docente precisam reconhecer que o seu trabalho está seriamente comprometido com o desenvolvimento humano, e consequentemente com as questões ligadas a todos os fatores nocivos ao pleno desenvolvimento da comunidade escolar. É fundamental o Estado, através da execução qualitativa de políticas públicas, instrumentalizar os aspectos físicos e humanos na educação escolar.

 

 

 

 

 

4 - REFERÊNCIAS:

ARENDT, Hannah. “O que é autoridade?”. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Nova Perspectiva,1992b.

 

LDB – Lei nº 9394/96. Disponível em:  

http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf. Acessado em 10/11/10

 

SCHRAML, Walter J., Introdução à psicologia profunda para educadores; traduzido por Nelson Cassiano e José Fernando Marinho Nunes. São Paulo, EPU, Ed. Da Universidade de São Paulo, 1976.

 

Disponível em: http://books.google.com.br. Acessado em 17/11/10.

 

Disponível em: http://www.apagina.pt/?aba=7&cat=105&doc=8489&mid=2. Acessado em 15/11/10


Autor: Mara Rogelma Soares Torres Frazão


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