Novos rumos e perspectivas de proteção aos animais: uma análise antropológica



NOVOS RUMOS E PERSPECTIVAS DE PROTEÇÃO AOS ANIMAIS: UMA ANÁLISE ANTROPOLÓGICA

                                                   

 

  1. 1.      INTRODUÇÃO

Sabe-se que a relação entre homem e animal vem assumindo um caráter relevante na atual sociedade, ainda mais quando se  trata de animais domésticos como cães e gatos.

A demanda desses animais é cada vez mais perceptível aos nossos olhos no que tange à sociedade vigente, pois a crescente urbanização suplanta hábitos coletivos, mas em contrapartida cria um homem cada vez mais isolado, possibilitando a ele estreitar laços com os animais domésticos, tornando-os verdadeiros entes familiares.

No entanto, esse comportamento nem sempre foi ético, moral e ambientalmente correto. Na prática, verificavam-se aniquilações e abusos tanto à dignidade desses pobres seres indefesos, como também maus-tratos, lesões e outras crueldades inesperadas pelo bom senso, levando muitas vezes ao abandono, sendo expostos a riscos, transformando-se em vítimas inocentes à mercê de doenças, afetando até mesmo a saúde pública.

Ao se tornarem vetores de doenças, o Estado intervém por meio do Centro de Zoonozes, que é o órgão competente para tratar de doenças animais. Contudo, os animais são levados e submetidos a torturas, ensejando sua morte do modo cruel

 

  1. 2.      DESENVOLVIMENTO

Atualmente, percebe-se a importância que um animal pode ter na vida de uma família. O fato de muitas famílias optarem por ter menos filhos, por conta do custo de vida, acaba estimulando a criação de animais.

De tal maneira, cães e gatos passam a integrar a família e fazer parte do orçamento da mesma, já que eles passam a ser considerados “membros” dela, tendo seu espaço próprio, lazer e até mesmo assistência médica.

Pesquisas científicas apontam que a presença de um animal no âmbito familiar traz inúmeros benefícios psicológicos (reduz estresse, depressão e ansiedade e traz sensação de bem estar), fisiológicos (reduz pressão alta, aumenta a frequência cardíaca, maior expectativa de vida) e sociais (excelente para maior interação com a sociedade, bem como com o meio-ambiente e, no caso de crianças, facilita o aprendizado e estimula um maior desempenho nas atividades escolares).

No entanto, necessário se faz abordar que muitos animais são inclusos no âmbito familiar por conta de que determinadas raças indicarem um status maior. Cães de raça ou gatos caríssimos apontam quem e como é o estilo de vida do dono, como também o alto cargo que ocupa na sociedade. Nesse sentido, deixam de ser meros animais para se tornar “objetos de consumo”.

Enquanto isso, infelizmente, vários animais, por não serem enquadrados em uma raça definida (os chamados “vira-latas”, mas que nem por isso deixam um ser digno de respeito) são abandonados em ruas, praças e até mesmo em lixeiras. Mas, ainda que pessoas com a capacidade de “esmagar” direitos assegurados por lei a esses seres portadores de necessidades, a tendência que se verifica atualmente é a solução por parte de Associações para propor políticas públicas para solucionar ou até mesmo reduzir os impactos dessa tragédia.

É justamente nesse sentido que a APROV- Associação de Proteção à Vida- atua. Localizada em Crato-CE, ela tem como missão promover a proteção da biodiversidade pelo desenvolvimento de uma relação harmônica entre a humanidade e o meio-ambiente.

Faz parte do trabalho da APROV acolher animais que foram abandonados à própria sorte, cuidar da higiene e alimentação, abrigá-los provisoriamente, controlar a crescente natalidade de cães e gatos por meio da castração, promover feira de adoção, cuidando de fiscalizar donos após a adoção, bem como o próprio Centro de Zoonoses do município quanto aos procedimentos de eutanásia (se procedem conforme padrões estipulados por leis).

Conforme entrevista feita à Diretora e Presidenta da APROV- Anna Christina Farias de Carvalho a ideia surgiu no ano de 2008 em que a Professora Dra. Maria Arlene Pessoa (URCA), a contadora Antonia Ferreira e a professora aposentada Gertrudes iniciaram conversações acerca da organização de uma associação para minimizar os problemas dos animais e sensibilizar a população sobre os direitos dos mesmos. Convidaram-na a fazer parte da diretoria, sendo eleita diretora presidente. Por sugestão da Profa. Arlene a associação passou a ser nomeada como Associação de Proteção à Vida – APROV, com CNPJ e estatuto registrado em cartório.

Segundo a Diretora, “o crescimento desordenado da população de cães e gatos traz problemas de saúde pública, principalmente com relação à transmissão de zoonoses, além de muitas vezes interferir no bem estar animal. Outro aspecto desta questão, diz respeito ao tratamento que é dado aos animais, especialmente, cães e gatos, que além do abandono, sofrem muitas vezes maus tratos, contribuindo para o agravamento da situação. Neste contexto, nosso trabalho voluntário tem como objetivo principal sensibilizar a população quanto a esterilização de animais e socialização das leis de proteção animal.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, para cada pessoa, nascem 15 cães e 45 gatos. A esterilização evita crias indesejáveis, já que não há lares para todos e, segundo pesquisas, melhora a qualidade de vida dos animais domésticos evitando a incidência de tumores (quando feita antes da idade adulta) e problemas de comportamentos inadequados ao convívio e promove a interação entre homens e animais.

Entretanto, a superpopulação de animais domésticos é uma triste realidade com riscos à saúde pública e ao meio ambiente. Mas, deve-se salientar que os grandes responsáveis por essa dura realidade são o próprio Estado, a população e, sobretudo, os profissionais da área de Vigilância (Centro de Zoonoses e Institutos de Proteção animal), que se contentam apenas em cumprir seu expediente de trabalho, não efetuando o cumprimento da lei conforme o estipulado às suas profissões, tendo como único objetivo o recebimento de seu salário.

Um relato dessa realidade do Centro de Zoonoses é que antes de a APROV existir, a forma da eutanásia praticada nesse centro não condizia com a lei, pois eram mal empregadas, submetendo os animais a torturas e maus-tratos até a morte, utilizando meios inaceitáveis, conforme a Resolução N° 714, de 20 de Junho de 2002, em seu artigo 14:

“Art. 14. São considerados métodos inaceitáveis:

  1. Embolia Gasosa;
  2. Traumatismo Craniano;
  3. Incineração in vivo;
  4. Hidrato de Cloral (para pequenos animais);
  5. Clorofórmio;
  6. Gás Cianídrico e Cianuretos;
  7. Descompressão;
  8. Afogamento;
  9. Exsanguinação (sem sedação prévia);
  10. Imersão em Formol;
  11. Bloqueadores Neuromusculares (uso isolado de nicotina, sulfato de magnésio, cloreto de potássio e todos os curatizantes);
  12. Estricnina.

Parágrafo único: A utilização dos métodos deste artigo constitui infração ética.

A resolução ainda dispõe em seu artigo 7° que se mal empregados, os procedimentos de eutanásia se sujeitam à legislação federal de crimes ambientais.

Conforme leciona o artigo 2°, “a eutanásia deve ser indicada quando o bem-estar do animal estiver ameaçado, sendo um meio de eliminar a dor, o distresse ou o sofrimento dos animais, os quais não podem ser aliviados por meio de analgésicos, de sedativos ou de outros tratamentos, ou, ainda, quando o animal constituir ameaça à saúde pública ou animal, ou for objeto de ensino ou pesquisa”.

Importante ressaltar que conforme o parágrafo único deste mesmo artigo, a participação do Médico Veterinário como responsável pela eutanásia em todas as pesquisas que envolvam animais.

Ainda no âmbito da legislação, o art. 32 da Lei Federal n° 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais) aduz que “É considerado crime praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, doméstico  ou domesticados, nativos ou exóticos. Pena- Detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa”.  Os parágrafos seguintes ainda afirmam que incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animais vivos, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos, havendo aumento de pena de um terço a um sexto, se ocorrer a morte dos animais.

Importante salientar que se consideram maus-tratos abandono, manter animal preso por muito tempo sem comida e contato com seus donos/responsáveis, deixar animal em lugar impróprio e anti-higiênico, envenenamento, agressão física, covarde e exagerada, mutilação, utilizar animal em shows, apresentações ou trabalhos que possa lhes causar pânico e sofrimento, como também não procurar veterinário se o animal estiver doente.

 Na opinião da entrevistada, a eutanásia é indicada também não somente a animais com doenças irreversíveis, a exemplo do calazar, podendo ser aplicável também a animais os quais as dores não podem ser aliviadas por meio de analgésicos.

Seu respaldo é dado de acordo com o artigo 3° da Declaração Universal dos Direitos do Animal, pois se o animal não tem condições de cura a eutanásia, como preconizada pelo Conselho Federal de Veterinária, é aplicada (a morte do animal, se necessária, deve ser instantânea, indolor e não geradora de angústia).

 Mas, com a criação da APROV em 2008, essa realidade vem sendo modificada graças ao trabalho incessante das protetoras e de populares que se tornam associados, tomando consciência de que os animais também são dignos de condições adequadas ao mínimo para a sua sobrevivência.

  Na prática, a APROV atua no resgate de animais de rua, abrigando-os provisoriamente até que se consiga arrumar um lar para eles. No mesmo sentido, essa Associação promove feiras de adoção de cães e gatos, que ocorrem a cada seis meses no município do Crato, mais especificadamente na Praça da Sé. Esses animaizinhos são cuidados carinhosamente e higienizados adequadamente a fim de que se possa conseguir uma família que os trate com carinho e respeito.

              Entretanto, a APROV não é responsável somente por entregá-los à adoção, pois além de providenciar uma morada para os animais, eles fiscalizam os adotantes, visitando regularmente suas residências, bem como analisando o estado que os animais se encontram após tal intento.

               A competência da APROV reside ainda em resgatar animais desamparados do Centro de Zoonoses (grande parte é sacrificada) e possibilitar uma segunda chance a eles, encaminhando-os a um lugar em que se sintam mais seguros e amparados, como também conseguir um lugar definitivo de morada.

    A APROV trabalha com recursos parcos, escassos, provenientes de uma mensalidade de R$ 5,00 dos sócios (a maioria inadimplente), doações da diretoria e doações esporádicas, feiras de objetos usados.

Tem ainda parceria com a Universidade Regional do Cariri- URCA, mas esta se dá não em pecúnia e sim em apoio a alguns eventos, como divulgação, bem como as adoções supracitadas.

 Necessário se faz enfatizar que embora exista lei, há inúmeras dificuldades na sua aplicação, pois a falta de divulgação em escolas de ensino fundamental e médio, juntamente com a sensibilização das pessoas em relação aos animais, constitui, na opinião da Diretora, a maior dificuldade, mas não a única.

Outro grande empecilho provém dos próprios profissionais veterinários em razão de descumprirem seu próprio Código de Ética  e diretrizes do Conselho de Medicina Veterinária.

Contudo, apesar de todas as dificuldades, Anna Christina Farias de Carvalho afirma ser gratificante o seu trabalho, não pelo aspecto financeiro, até porque ela trabalha voluntariamente, mas sim uma recompensa emocional, pois ver seu trabalho

            Difundido  e conseguir “salvar” animais e, principalmente, sensibilidade à causa animal

                                                                                                            

2 - CONCLUSÃO

Assim, tem-se percebido que o interesse no que diz respeito à proteção do animal vem se estendendo, seja por meio de leis ou por meio de pessoas que, mesmo sem o devido amparo por parte do Estado, se dispõem a ajudar esses animais com o pouco que elas têm, muitas vezes chegando se arriscar de alguma forma em razão de lidar com pessoas “poderosas”.

A relação entre homem e animal vem se transformando com o passar do tempo, visto a importância que se dá à proteção dos animais nos atuais dias. Isso se deve ao fato de que houve uma mudança comportamental da sociedade em que as pessoas optam por ter menos filhos, possuem atualmente mais recursos, conferindo ao animal uma maior participação como ente familiar, assim como também no trabalho (a exemplo de policiais que laboram com cachorros) e no caso de deficientes visuais , que utilizam cachorros como seus guias, possuindo um papel fundamental, além de se mostrarem grandes companheiros.

Nesse aspecto, verifica-se que a cultura vem se adaptando à nova realidade da família brasileira, pois antigamente esses animais eram vistos apenas como seres irracionais- realidade que vem se modificando ao longo do tempo.

Esse trabalho se mostrou importante porque a partir das experiências demonstradas, a visita à APROV, os conhecimentos adquiridos e a constante luta diária de pessoas que se sensibilizam com os maus-tratos e abandono aos animais.

            Para nossa maior surpresa, as pessoas que mais contribuem com essa Associação são as de menor poder aquisitivo, que embora aquela pequena quantia lhe faça falta, eles doam “de coração”, enquanto muitos que realmente poderiam ajudar fazendo “a diferença”, nem sequer sabem que a instituição existe.

            As informações conosco compartilhadas possibilitou percebermos que embora haja tanto desprezo e crueldade para com os animais de rua, muitos outros agem de modo diverso, fazendo “pouco”, mas o suficiente para salvar algumas vidas- fato que gera grande satisfação para quem o faz.

            Vimos também um grande contraste, que podemos relacionar com o meio social humano, em que se tem que ter raça (no mundo animal, enquanto que na sociedade se trata de “classe”) ou até mesmo “sorte” para nascer e viver em uma condição privilegiada, em que pessoas da alta sociedade se utilizam de animais de raças raras, a fim de se destacar no meio social, ostentando luxo, comprando até mesmo coleiras de diamantes, enquanto muitos outros mendigam na rua em busca de um grão de comida que seja, e nem isso encontram por serem chutados, tidos como “disseminadores de doenças”, quando na realidade estão apenas lutando para sobreviver mais um dia de luta.

            De tal maneira, o que se conclui é que na realidade, o animal apenas quer amor, carinho e respeito (e um pouco de comida) e não ser tratado como um objeto qualquer ou um “saco de pancadas” para com seu dono ou qualquer um que passe na rua.

 

 

 

 

 

        BIBLIOGRAFIA

 

  • COETZEE, J. M. A vida dos animais, São Paulo: Companhia das Letras: 2002;
  • http://souprotetor.blogspot.com/
  • OLIVEIRA, Samantha Brasil Calmon de. Sobre Homens e Cães: Um estudo antropológico sobre afetividade, consumo e distinção. Rio de Janeiro, 2006

http://www.ifcs.ufrj.br/~ppgsa/mestrado/Texto_completo_248.prn.pdf

  • OLIVEIRA, Thiago Pires; SANTANA, Luciano Rocha, Guarda Responsável e Dignidade dos Animais.

<http://www.abolicionismoanimal.org.br/artigos/guardaresponsveledignidadedosanimais.pdf


Autor: Carlos Alberto De Oliveira Brito


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