Considerações sobre literatura clássica do século xvii



 

A época clássica não é o século XVII e nem o século de Luís XIV. Ela abrange um período de 20 anos (1660-1680). Aliás, anos tormentosos e confusos. Molière não destruiu o preciosismo, a tragédia não acabou com o romance realista. Não houve um triunfo do estilo clássico, mas um redemoinho no qual as obras clássicas constitui a camada de espuma.

A doutrina clássica não foi construída pelos autores clássicos. O sistema de gêneros, os preceitos da imitação dos antigos já existiam antes de Molière e Racine. Quando Boileau publica “L’Art poétique” em 1674, a época clássica já estava quase terminando.

A doutrina clássica não é essa figura de fria e pura razão tão equivocadamente destorcida pelos críticos. A arte de saber agradar amenizou esse aspecto. “Os mestres do século XVII visam principalmente a inteligência, depois o coração...” diz muito bem Bellessort.

 

Principais características da doutrina clássica:

1) Disciplina: a razão eterna – Crença em um dogma. O classicismo começa com a afirmação de que existem verdades imutáveis, autoridades incontestáveis, classes inatingíveis. No domínio político: uma lei, uma fé, um rei. No domínio religioso: fora da Igreja não há salvação; cujus regio, ejus religio. A fé é una e estável.

2) Exigência de eternidade – O classicismo quer ultrapassar seu tempo, quer realizar obra eterna e universal, monumentum aere perennius. Como existe um verum (verdadeiro) e um bonum (bem) firme, sólido, existe um belo eterno: é aquele que atinge a razão, a única de nossas potências que não morre. É a beleza do verdadeiro, é o esplendor da evidência.

3) Impessoalidade – lógica e psicologia. Para realizar obra universal é preciso: seguir regras fundamentadas não na autoridade, mas na razão: “a razão sendo a mesma em todo lugar, ela obriga todo mundo a segui-la” (d’Aubignac). Estudar não as modas passageiras, a decoração fugitiva, os estados de alma íntimos, pessoais e incomunicáveis, mas a natureza profunda e permanente, portanto psicológica, do homem, homem de sempre e de nenhum lugar. É preciso descrever o homem típico de 1660. O avarento – e não Harpagon – nos revela os tipos sociais do século XVII.

4) Técnica: os antigos e suas regras – o dogmatismo estético: seu postulado. Existe um belo eterno. Aonde devemos buscar seus princípios? Nas obras antigas consagradas pela admiração século após século, observando o seguinte postulado: as obras recentes podem ser boas ou não; mas somente uma obra-prima como Eneida ou Ifigênia, pode ter atravessado mais de mil anos sem deixar de ter recebido a admiração geral. Estas obras seguiram, portanto, as boas regras.

Esse desejo de retomar um fundo de antiguidade tem outra causa: necessidade de aprofundamento. Cada clássico confessa com La Bruyère que tudo já foi dito, mas acrescentará que quem apresentar novidades já chegou atrasado. “O paradoxo humano, diz Alain, é que tudo foi dito e nada compreendido”. É preciso que cada época repita as verdades profundas.

5) Meta: instruir e agradar – entre a pregação e arte pela arte. O classicismo não é uma escola de pregadores e menos ainda uma escola de diletantismo. É uma escola de moralistas. Preocupação em instruir: “Só devemos falar para instruir”, diz Fénelon. Contra os críticos de teatro, Racine afirma seguindo Aristóteles que a tragédia serve para purgação das paixões (catarse). Preocupação em agradar: “é a grande regra de todas as regras”, diz Molière.

Instruir e agradar. Essas duas exigências estão ligadas: o objetivo é instruir, o método consiste em agradar. “Uma moral seca provoca tédio, o conto traz também o preceito” (La Fontaine).

6) Densidade. A grande regra do estilo está em dizer o máximo possível de coisas com um mínimo de palavras. É a grande lição clássica. Uma peça clássica é longa quando ela contém dois mil versos; uma máxima, três linhas. Cada escritor tem um ou dois volumes. Escrever para dizer alguma coisa e da forma mais rápida possível. Não dizer nada que seja inútil. A literatura é de discrição. Daí vem que a medida do classicismo é o poder de insinuação. “O que interessa o combate se o brilho da espada pode nos ajudar a ver os combatentes na sombra”, dirá muito bem Alfred Musset. Isso comprova que a virtude de exemplo do classicismo seja meramente formal. É uma escola de concisão.

O essencial da fórmula clássica está no dogmatismo e mais ainda na sua densidade.

Referência bibliográfica:

La littérature française du siècle classique (1610-1715) par V. L. Saulnier – Presses Universitaires de France – Paris 1951 – resumo ps. 57 a 64.

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Autor: Luiz Antonio Moraes


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