Educação ambiental: uma contribuição da história ambiental aos estudos sobre o ambiente e o ambientalismo




Dentro da linha de pesquisa de Educação Ambiental Não-formal (EANF) propomos como fenômeno de pesquisa o movimento ecológico do Rio Grande do Sul. A pesquisa será desenvolvida dentro dos parâmetros da História Ambiental, na qual uma de suas funções é atuar na construção de subsídios teórico-metodológicos para a Educação Ambiental e sabendo que o movimento ecológico se institui como espaço de Educação Ambiental informal e não formal. Dessa forma, o movimento ecológico se constitui como organização
1 Projeto Pedagógico do Programa de Educação Ambiental, 2010, op. Cit.
social, como espaço de Educação Ambiental, como grupo social que atua tendo como foco de ação as questões socioambientais e influencia nos processos decisórios no manejo e conservação dos ecossistemas.
O contexto socioambiental que a pesquisa enfocará é o município do Rio Grande - Estado Rio Grande do Sul - nas décadas de 1970-80. No centro desta reflexão estará o ser humano em interação com o ambiente tendo como referência um olhar histórico.
Dessa forma, o ambiente do município do Rio Grande se apresenta como um campo vasto para projetos de pesquisa na área de Educação Ambiental, até como em decorrência da coexistência da organização sócio-econômica urbano-industrial que se situa em linha de fronteira com o riquíssimo ecossistema costeiro da Laguna dos Patos, tendo também interação com o Oceano Atlântico.
A partir do que foi exposto acima, desenvolveremos alguns tópicos de nossas referências teóricas. Serão discutidos os conceitos de Ambiente, Educação Ambiental, Ambientalismo e História Ambiental.
Nesse sentido, sabemos que ainda predomina em nossa sociedade uma concepção “ecologizada”, ou seja, conservacionista de ambiente, embora reconheçamos o avanço da visão que consideramos mais abrangente, denominada de concepção socioambiental. Conforme esta corrente, entendemos o ambiente como a interação entre a natureza e as sociedades humanas.
De acordo com a vertente socioambiental, a concepção de ambiente se amplia para uma “visão totalizadora” considerando-o a partir da dinâmica das interações histórico-ambientais entre sociedades humanas e natureza. O ambiente é compreendido como um organismo transformado e habitado pelos seres humanos e não-humanos. Dessa forma, o ambiente é percebido como um produto gerado e construído pelas sociedades em relação com a natureza ao longo do processo histórico em disputa.
Paula Brugger (1996, p: 53), diz que o conceito de “Ambiente” deve abranger uma totalidade que inclui os aspectos naturais e os resultantes das
atividades humanas. Sendo assim, se apresenta enquanto resultado da interação de fatores biológicos, sociais, físicos, econômicos e culturais2.
Marcos Reigota (1994, p. 21) expõe o conceito de Ambiente dessa maneira, dizendo que é:
Um lugar determinado e/ou percebido onde estão às relações dinâmicas e em constante interação os aspectos naturais e sociais. Essas relações acarretam processos de criação cultural e tecnológica e processos históricos e políticos de transformação da natureza e da sociedade3
A partir do conceito de “Ambiente” abordado, a Educação Ambiental aqui discutida, ao incluir a dimensão social no conceito de “Ambiente”, passa a considerar os processos sociais como aspectos fundamentais para a interpretação dos seus fenômenos de pesquisa na área ambiental. Dessa forma, com orientação de uma metodologia que visa à interação da Educação Ambiental com os conhecimentos da História, orientamos as nossas atividades interpretativas.
A EA aqui discutida é um campo do conhecimento que privilegia a construção de teorias e métodos, os quais permitem ao pesquisador discutir o seu problema de pesquisa de forma totalizante, visando o entendimento dos processos interativos entre sociedades humanas e natureza.
No que refere ao ambientalismo, os anos de 1960 aos 70 marcarão a emergência de movimentos sociais, entre estes o movimento ecológico. Pode-se, então, afirmar que, as lutas sociais eram feitas pelo movimento operário nas suas correntes: social-democrata, comunista e anarquista.
Nesse sentido, problemas cotidianos ligados a realidades específicas fazem germinar movimentos ecléticos, como a luta feminista, dos direitos civis, da luta contra a segregação racial, dos homossexuais, e dentre, o ambientalismo4.
Conforme Carlos Walter Porto Gonçalves, a crítica centrada no modo de produção legará espaços a movimentos, ligados a outros seguimentos sociais
2 BRÜGGER, 1996, op. Cit.
3 REIGOTA, 1994, op. Cit.
4GONÇALVES, 1993, op. Cit.
que ultrapassavam as barreiras da crítica ao capitalismo, elegendo bandeiras como a crítica ao modo de vida5.
Dentro do movimento ecológico, lutas diversas tais como: desmatamento de florestas, extinção de espécies, uso de agrotóxicos, urbanização desenfreada, explosão demográfica, poluição dos ecossistemas, construção de barragens, erosão dos solos, corrida armamentista, ameaça nuclear e outras farão parte das preocupações do movimento ecológico das décadas de 1970-80.
Um dos principais ícones da luta ambiental internacional é o Greeanpeace, que surgiu no início dos anos de 1970. “[...] as raízes destes movimentos já vinham sendo desenvolvidas, porém o destaque alcançado por estas manifestações sociais no cenário político é mais significativo nesta época. Fato este que permitia maior acesso à mídia, que por sua vez, encontrava nestes movimentos ganchos para demais matérias que abordavam as outras vertentes destes fenômenos sociais” 6.
Ao final da década de 1970, as vivências de exilados políticos irão se unificar com experiências brasileiras. E, a partir desse fenômeno destaca-se a entidade AGAPAN do Estado do Rio Grande do Sul. Fundada por José Lutzemberger, Nicolau Campos (discípulo de Henrique Luiz Roessler) e outros, a AGAPAN iniciou seu ativismo denunciando a degradação do Rio Guaíba na grande Porto Alegre (RS).
A seguir, a AGAPAN constituiu um núcleo na cidade do Rio Grande fundada por Luiz Felipe Pinheiro Guerra e outros ecologistas que no município se localizavam. A partir desse fato, criou-se uma frente de luta ambiental na localidade.
Nesse sentido, o movimento ecológico político, entende a crise socioambiental como resultado direto do modelo de vida urbano-industrial insustentável que se desenvolveu a partir da Modernidade e do Capitalismo. Avançando nas formulações práticas e teóricas, o movimento ecológico político unificou o discurso contra a sociedade moderna capitalista urbano-industrial, articulados as denúncias de injustiça social e a construção de um novo projeto de sociedade, ou seja, a sociedade sustentável.
5GONÇALVES, 1993, op. Cit.
6LIMA, op. Cit.
Lago e Pádua (1983) identificam quatro grandes áreas do pensamento e do movimento ecológico que são: a Ecologia Natural, a Ecologia Social, Conservacionismo e o Ecologismo. Os dois primeiros pólos do pensamento ecológico são vinculados às questões teórico-científicas e as duas últimas manifestações são voltadas à atuação social, constituindo-se no movimento ecológico político.
Dessa maneira, para perceber a existência de duas correntes no cerne do movimento ecológico é necessário identificar suas singularidades. O Conservacionismo, tem sua raiz na Ecologia Natural, e o Ecologismo, iniciou-se junto a Ecologia Social.
A linha divisória entre Conservacionismo e Ecologismo é branda e em muitos momentos participam de lutas similares. O Conservacionismo tende a criticar aspectos da estrutura que promove agressões à natureza. Já o Ecologismo, desenvolveu uma crítica, não se limitando a defesa do meio natural, questionando o modo de vida como um todo, participando de lutas de caráter social.
A partir do movimento ambientalista surgiu a Educação Ambiental que já discutimos acima. Mas convém lembrar que, a partir do ambientalismo a Educação Ambiental, assim, pode ser considerada como um campo de diálogos e contradições, de saberes e práticas, de princípios e valores que remetem a um projeto de transformação da sociedade e da cultura a partir das orientações do chamado movimento ambientalista.
Dentro das perspectivas acima citadas, inserimos na nossa discussão a proposta de trazer a luz um conceito de História Ambiental. Para Donald Worster, ...parte de um esforço revisionista para tornar a disciplina da História muito mais inclusiva nas suas narrativas do que ela tem tradicionalmente sido. Acima de tudo, a História Ambiental rejeita a premissa convencional de que a experiência humana se desenvolve sem restrições naturais, de que os humanos são uma espécie distinta e “supranatural”, de que as conseqüências ecológicas dos seus feitos passados podem ser ignoradas7. Ainda conforme
7 WORSTER, 1991, op. Cit.
Worster, a História Ambiental trata do papel e do lugar da natureza na vida humana8.
De acordo com GERHARDT e NODARI (2010), a História Ambiental também estuda as compreensões, os discursos, as explicações que as pessoas elaboram sobre a natureza e sobre as mudanças ambientais9.
Paulo Henrique Martinez também contribui para o debate acerca do conceito de História Ambiental dizendo que: ...a História Ambiental é uma abordagem das questões ambientais no tempo e que encontra no meio ambiente o seu objeto de investigação10.
De acordo com o pensamento do historiador Fernand Braudel que embasou suas concepções no geógrafo Vidal de La Blache, absorvendo os conceitos de “meio” e “espaço”, na qual o “tempo histórico” se articula com o “ambiente”. Braudel analisou as paisagens, elementos climáticos, vegetais e animais inseridos no contexto histórico.
Daniel Prado (2008), embasado em Fernand Braudel, nos diz que, a partir da compreensão do espaço, torna-se possível ao historiador à ampliação das respostas aos questionamentos da história da humanidade, tornando-se um fator adicional na explicação da interação das sociedades com a natureza, assunto inserido nas discussões atuais de Educação Ambiental.
Em fim, a contribuição da História Ambiental para a Educação Ambiental, tem o significado de abordar a interação sociedade - natureza no prisma dos fenômenos sociais, ou seja, como as sociedades humanas se relacionaram/relacionam e interagiram/interagem com o meio natural e como conceberam/concebem o ambiente. Portanto, Ambiente, História Ambiental, Educação Ambiental, Ambientalismo são dimensões profundamente relacionadas.
8 WORSTER, 1991, op. Cit.
9 GERHARDT e NODARI, 2010, op. Cit.
10 MARTINEZ, 2006, op. Cit.
BIBLIOGRAFIA
1) BRÜGGER, Paula. Educação ou Adestramento Ambiental ? Ilha de Santa Catarina: Letras contemporâneas, 1996.
2) CARNEIRO, Augusto Cunha. História do Ambientalismo. Porto Alegre: Luzzato, 2003.
3) GERHARDT, Marcos e NODARI, Eunice Sueli. Aproximações entre História Ambiental, Ensino de História e Educação Ambiental. In: BARROSO, Véra Lúcia Macial (ET. AL.) Ensino de História: Desafios Contemporâneos. Porto Alegre: Est. Exclamação: ANPUH/RS, 2010.
4) GONÇALVES, Carlos W. Porto. Os (des) caminhos do Meio Ambiente. SP: Contexto, 1993.
5) LAGO, Antônio e Pádua, José Augusto. O que é ecologia. São Paulo: Abril Cultural: Brasiliense, 1985.
6) LIMA, Aida Franco. Jornalismo e literatura como suporte à causa ambiental. Um Breve Resgate Histórico. Disponível in: www.agricoma.com.br
7) MARTINEZ, Paulo Henrique. História Ambiental no Brasil: Pesquisa e Ensino/ Paulo Henrique Martinez. – São Paulo: Cortez, 2006.
8) PRADO, Daniel Porciúncula. A figueira e o machado (Raízes históricas da Educação Ambiental no Sul do Brasil: Práticas Educativas e Militância Ambiental na Perspectiva do Cronista Henrique Luiz Roessler). Tese aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de doutor em Educação Ambiental no Programa de Pós Graduação em Educação Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande- FURG, 2008.
9) Projeto Pedagógico do Programa de Pós Graduação em Educação Ambiental: aprovado pelo Colegiado do PPGEA em 17 de dezembro de 2009/ elaboradores Elisabeth Brandão Schmidt ...[ET. AL]; colaboração Aloísio Ruscheinsky ...[ET. AL]. – Rio Grande: FURG, 2010.
10) REIGOTA, Marcos. O que é Educação Ambiental ? São Paulo: Brasiliense, 1994.
11) REIGOTA, Marcos. Meio Ambiente e Representação Social. São Paulo: Cortez, 1997.
12) SENAC. Educação Ambiental: Temas, teorias e práticas. SENAC/DN, Rio de Janeiro, 2008.
13) WORSTER, Donald. Para Fazer História Ambiental. Estudos Históricos. Rio de Janeiro: CPDOC/Fundação Getúlio Vargas, 1991.

Download do artigo
Autor: Bread Soares Estevam


Artigos Relacionados


Programa De EducaÇÃo Ambiental (pea)

Educação Ambiental

Educação Ambiental: Uma Contribuição Aos Estudos Da Relação Entre As Sociedades Humanas E A Natureza Nas Obras Dos Fundadores Do Materialismo Histórico

Os Diferentes Contextos Sociais Nos Projetos De Educação Ambiental Na Escola

Educação Ambiental E Desenvolvimento Sustentável: Educação Ambiental Em Espaço Não-formal, Instrumento Pedagógico Para O Ensino Fundamental Ii De 6º Ao 9º (5ª A 8ª Série)

A ImportÂncia Da EducaÇÃo Ambiental No Ensino Da Geografia

A InterrelaÇÃo Entre A GestÃo Ambiental E A GestÃo Educacional Na Contemporaneidade