A Terceira Onda do Direito Processual Civil



 RESENHA.

Livro “ACESSO À JUSTIÇA”, Cappelletti, Mauro e Garth, Bryant, Sérgio Antonio Fabris Editor, 1988, reedição 2002, Porto Alegre, 168 páginas, tradução Northfleet, Ellen Gracie.

JUSTIÇA CIDADÃ.

“O resenhista Venildo Bezerra é estudante do curso de pós-graduação em Direito Processual Civil na Faculdade do Vale do Itapecuru – FAI, turma 2011.2”.

O Doutor Cappelletti na obra de sua autoria “ACESSO À JUSTIÇA”, em parceria com o Professor Garth, intitulada “Acesso à Justiça”, permite visualizar que a inafastabilidade da jurisdição ou acesso à justiça tem uma relação íntima, amiúde, umbilical, com a questão dos direitos fundamentais da pessoa humana. Os direitos fundamentais da pessoa foram conquistados paulatinamente através de lutas e sacrifícios Homéricos. Ilustres homens e mulheres empenharam suas próprias vidas em busca desse ideal.

O grande salto para garantir a dignidade humana, na ótica de Cappelletti, indiscutivelmente, foi dado pelos iluministas europeus no século XVII, mais incisivamente no século XVIII com os resultados dos revolucionários franceses, que romperam com o absolutismo e implantaram a burguesia liberal. Houve a consagração dos direitos de 1ª dimensão ou geração ou direitos individuais de liberdades, impondo à não intervenção estatal nesse particular, exigindo conduta negativa do Estado.

Apesar de o liberalismo ter por núcleo central a doutrina do “laissez faire”, onde o Estado-Poder, em tese, nenhuma intervenção deve apor nas relações privadas, com notoriedade na economia, a partir do século das luzes o acesso à justiça foi implementado em razão de a própria doutrina liberal indicar as atividades fins de Estado, incluindo a justiça junto com as demais tarefas gerenciais, ao lado da educação, saúde e segurança.

Mauro Cappelletti identificou na evolução do direito processual as ondas de acesso à justiça ou ondas de Reforma do Processo, que tem por objetivo fundamental a celeridade do andamento processual. Argumenta no livro “ACESSO À JUSTIÇA” que essas ondas se ancoram na assistência judiciária gratuita, na tutela dos interesses difusos e coletivos e na qualidade da prestação jurisdicional. A gratuidade visa superar os obstáculos econômicos do acesso à justiça. A tutela dos interesses difusos e coletivos como obrigação do Estado por não possuírem titulares específicos.  A qualidade da prestação jurisdicional, envolvendo a reforma do Poder Judiciário, a implantação de procedimentos informais e a valorização de instrumentos não-convencionais de solução dos conflitos, “verbi gratia”, a “justiça privada”.

Cappelletti foi além. Identificou novos termos na linguagem processual, a exemplo do processo sincrético; da qualidade da prestação jurisdicional; dos meios alternativos de solução de conflitos; do acesso à ordem jurídica justa. Tudo é visto como avanços e tem por objetivo a prestação jurisdicional sem barreiras econômicas, de excelente qualidade e de rapidez na resposta aos litigantes.

Essa nova terminologia processual encabeçada por Cappalletti veio enfatizar a celeridade do andamento processual, batizada pela doutrina como a terceira onda de avanço do processo civil. Na realidade são duas ondas gigantescas, quase Tussiname, a onda de acesso à justiça e a onda de avanços do processo civil. Esta trata da modernidade e àquela trata da facilidade aos litigantes.

O processo sincrético é sinônimo de processo sem barreiras norteado pela celeridade com o fim da garantia da efetividade.

Cappelletti apregoa métodos alternativos para resolução dos conflitos, merecendo especial atenção o juízo arbitral, a mediação e a conciliação.

Cappelletti conceitua que o processo é dividido em módulos onde o juiz não mais põe fim ao processo, apenas encerra um dos módulos e passa ao módulo seguinte tecendo um processo sem barreiras, que não finda com a sentença de mérito, apenas encerra o módulo de conhecimento, prosseguindo com os eventuais incidentes, como se dá hodiernamente nos processos de execução.

Os novos direitos, notadamente os relacionados com o consumo, meio ambiente e bioética, força o Estado à postura de atuação positiva com o dever de criar condições concretas e efetivas de acesso à justiça para o público em geral.

No campo dos litígios administrativo a figura do “ombudsman” garante o bem estar social, em razão do controle discricionário dos agentes contra abusos e arbitrariedades. “Ombudsman” ou ouvidor são elementos essenciais tanto na esfera pública quanto na esfera privada no sentido de otimizar as relações entre Estado-Poder e povo, bem como entre Empresa e consumidor.

O autor alerta que a proliferação de juízes e tribunais especializados. Esses setores fomentam uma barreira artificial, íngreme, de difícil acesso à justiça e, necessariamente, em razão da própria especialidade, o julgador torna-se isolado a ponto de perder de vista os problemas que não estão ao alcance de sua margem de atuação, abrindo precedentes para improvisos e risco das garantias constitucionais, entre elas a da imparcialidade e a do contraditório.

O livro foi escrito quando a América Latina e o Leste Europeu vivia sobre cerrado autoritarismo de governos fantoches a serviço do Imperialismo, quer seja imperialismo liberal do “laissez faire”, quer seja do imperialismo socialista de economia planificada pelo Estado. No entanto, a obra mostra-se atualíssima, asseverando que seus autores foram mais que contemporâneos de seu próprio tempo, foram visionários a ponto de enxergar a terceira dimensão de acesso à justiça, com conotação de jurisdição cidadã ao alcance de qualquer do povo, pessoa, cidadão e cidadã.

A obra resenhada é obrigatória aos estudiosos das Ciências Sociais, especialmente aos estudiosos do Direito, em razão de sua abordagem histórica de conteúdo contemporâneo e estilo comparativo entre vários Estados do lado ocidental do Globo, principalmente os da Europa e os da América do Norte. Problema é que a nossa cultura jurídica não quis e nunca se preocupou com a Ásia e a África, triste herança do Direito Romano e do Direito Canônico, leia-se Direito Romano/Germânico, respaldado pelo Direito Anglo Saxônico/Americano, os quais montaram uma barreira cultural isolando àqueles povos da supremacia branca européia. Até o evolucionista Charles Drawin em sua ótica nefasta e equivocada desdenhou os amarelos e os negros.

“Mauro Cappelletti, italiano de Florença, (1927–2004) foi Doutor em Direito pela Universidade de Florença, Itália, e Bryant G. Garth, norte americano de Standford,  é Professor de Direito na Universidade de Bloomington, Estados Unidos”.


Autor: Venildo Jose Bezerra Reynaldo


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