Clepsidra brasileira



“(...) Barracos que se desmancham como armações de baralho e, por baixo de seus restos, mortos, mortos, mortos (...). Mas e se não fosse mobilização espontânea do povo, determinada pelo sentimento humano, à revelia do governo incitando-o à ação. Que seria desta cidade, tão rica de galas e bens supérfluos, e tão miserável em sua infraestrutura de submoradia, de subalimentação e de condições primitivas de trabalho? (...)”.

O trecho acima foi retirado do artigo “Os dias escuros”, de Carlos Drummond De Andrade, publicado no Correio da Manhã, datado de 14/01/1966.

Dizer que Drummond ultrapassa as fronteiras temporais, e permanece atual até os dias de hoje, não é nenhuma novidade, mas é peculiar descobrir que a descrição de Drummond, feita há 46 anos se enquadra perfeitamente no que vivemos atualmente. Isto apenas evidencia a estagnação que o nosso país apresenta com relação a esse assunto que nos apavora todo ano: as chuvas.

No ano de 2011, presenciamos um verdadeiro massacre na região serrana do Rio de Janeiro. Milhares de mortos, desaparecidos e desabrigados. Um ano após a tragédia, o triste cenário moribundo permanece.

Foi descoberto um esquema de desvio de verbas que seriam destinadas à região serrana, mas parte desse dinheiro foi enviada de forma ilícita às empresas proibidas de participar de licitações.

O caso corre em segredo de justiça e ao que parece nenhuma providência foi tomada, nem com relação às vítimas nem com relação aos acusados.

O fato é que entramos em mais um ano com tragédias decorrentes das chuvas e nenhuma política de prevenção foi tomada. Fica clara a falta de planejamento urbano, a falta de fiscalização da defesa civil e o esquecimento total em que os cidadãos brasileiros vivem.

E uma novidade surgiu no dia 09 de Janeiro - foi anunciada (após os rompimentos dos diques no estado do Rio e deslizamentos em Minas Gerais) a criação de uma equipe de geólogos do Serviço Geológico do Brasil e hidrólogos da Agência Nacional de Águas (ANA) que atuaram nas áreas mais atingidas pela chuva. Além disso, o governo anunciou que fará antecipação de programas sociais às famílias atingidas, e também do FGTS, disponibilizando de R$ 444 milhões para atender aos Estados e municípios atingidos (se isso de fato se concretizará, é esperar para ver).

Resta saber até quando o artigo de Drummond será atual e até quando vamos viver num país onde a palavra regencial é a corrupção.


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