Inclusão trabalhista da pessoa com deficiência.



INCLUSÃO TRABALHISTA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

A Constituição Brasileira de 1988 nomeou a União como provedora maior dos direitos inerentes a pessoa humana, elencando os direitos fundamentais como clausulas pétreas do nosso ordenamento. A explicação para implantação de tais dispositivos foi o clamor público por direitos humanos não existentes à época, em decorrência do regime Ditatorial anteriormente vigente e sua recente queda. Dito isto, nota-se que a política em favor da pessoa com deficiência naqueles dias, era ínfima e precária, não sendo injusto dizer que fosse até de exclusão do deficiente.

Mormente a estes fatos o constituinte de 1988, promulgou normas de grande valia aos deficientes, as quais alteraram significativamente o modo de vida dessa minoria. O problema surge na visão social cotidiana, criada erroneamente por enxergar o deficiente como figura incompleta, que para tanto é carente de assistência médica e/ou psicológica, e no tratamento do mesmo como mais um ser humano que carrega uma patologia médica. Na verdade não se acreditava que a pessoa com deficiência pudesse conquistar o lugar que possui hoje na sociedade.

Em resumo, a Legislação Brasileira está pautada em leis que visa dar estrutura à inclusão social das pessoas com deficiência, mas para que isso realmente aconteça é fundamental a preservação do princípio primordial para a vida em sociedade, o “Princípio da Dignidade da Pessoa Humana”. Citado por vários autores estudados ao longo da elaboração deste trabalho. Parece ser, dentre os valores gerais do direito, aquele que se sobrepõe dentre os outros. Em discurso sobre o princípio citado a pouco, Teodosio Palomino (1993) expõe:

En toda organización o institución, cualquiera que sea, debe respetarse la dignidade de la persona humana que realiza uma actividad laboral, porque no es el hombre quien se ennoblece por el trabajo; más bien el trabajo se ennoblece y eleva cuando lo realiza el hombre, como se analizó antes, de acuerdo com varias encíclicas papales.

[ ]

Em qualquer organização ou instituição, qualquer que seja, deve-se respeitar a dignidade da pessoa humana, que realiza uma atividade de trabalho, porque não é o homem que é enobrecido pelo trabalho, mas sim o trabalho enobrece e eleva quando realizado por seres humanos, como discutido anteriormente, de acordo com várias encíclicas papais. (PALOMINO, 1993, tradução nossa).

 

POLÍTICA ASSISTENCIAL DO ESTADO BRASILEIRO

 

 

A assistência social é fato secular em se tratando de pessoa com deficiência, na Grécia existiu um sistema parecido com assistência social, como já relatado neste estudo. Contudo, a dificuldade de integração do deficiente parece ser a mesma, já que a compreensão social muitas vezes se limita na aparência, minando o preconceito nas relações, e atrelado a ele, a discriminação.

É bem verdade, que as deficiências graves, aquelas que alteram ou diminuem significativamente as funções corporais, impedindo o indivíduo do convívio social, efetivamente necessitam da assistência do Estado para a sua mantença. Porém, há uma significativa quantidade de pessoas com deficiência capazes de produzir mão-de-obra laboral de excelente qualidade. Em sábias palavras, é possível notar a veracidade desses fatos nos dizeres de Álvaro Maciel acerca do assunto:

De acordo com a Associação dos Acidentados de Trabalho do Estado de Goiás (ACITEG), em termos de competência e habilidade, uma pessoa com deficiência pode se tornar um excelente empregado. Segundo depoimentos de empregadores, os trabalhadores com deficiência apresentam maior confiabilidade, um melhor índice de frequência e menores porcentagens de afastamentos de doenças do que os colegas não deficientes. Restou comprovado que as pessoas com deficiência, por terem sido excluídas do mercado de trabalho, valorizam e preservam a condição de estar empregadas, mais do que os trabalhadores não deficientes. (MACIEL, 2011)

No entanto, não existe um grande projeto voltado ao trabalho das habilidades dessa minoria, focando cada habilidade no desempenho das funções exercidas em uma empresa. Dados publicados no ano de 2003 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) demonstravam que no ano 2000, 14,5 por cento da população brasileira é constituída de Pessoas com deficiência o que corresponde a vinte e sete milhões de pessoas. Desta porcentagem nove milhões são trabalhadores, sendo que 4,9 milhões, desse último número, ganhava até dois salários mínimos. Dados estes propostos apenas no tocante ao trabalho, pois a questão torna-se ainda mais complexa na alusão ao convívio social, no tocante a educação, do simples sinal de trânsito sonoro ao plano diretor municipal. Significando assim, que essa seria a verdadeira forma de inclusão social, mixando um laboro produtivo ao convívio social saudável, culminando na retirada desses cidadãos do ócio improdutivo para contribuírem com o Estado, e reafirmarem seu papel dentro da sociedade.

 

 FUNÇÃO SOCIAL DA INCLUSÃO TRABALHISTA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Imperioso se faz tratar sobre a função social inerente ao contrato de trabalho e seu papel perante a sociedade.

O contrato empregatício por si só, remete a preceitos relacionados primeiramente ao Direito Civil e posteriormente ao Direito do Trabalho. No artigo 422 do Código Civil, “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da propriedade e da boa-fé”.

Em observância sobre o assunto, Amauri Mascaro, em sua obra, “Curso de Direito do Trabalho”, em debate acerca da função social dos contratos trabalhistas, relata o seguinte pensamento:

Com isso, e com a função social dos contratos (CC, art. 421), o Código Civil limita a liberdade contratual, o que valoriza, na sua interpretação, o bom senso, a razoabilidade, o equilíbrio no entendimento de seus parâmetros, enfim, a instrumentalidade dos contratos, porque o contrato deve ser examinado mais em função de sua finalidade em relação ao meio que o cerca, e da valorização da pessoa humana. (NASCIMENTO, 2010)

Dito isso, e somado a função social dos contratos, artigo 421 do Código Civil, é possível construir uma equiparação entre este preceito civilista e o preceito trabalhista. Mesmo sendo contrato de trabalho, este objeto jurídico, transcende o individualismo, e quando celebrado, possui interesses sociais imperceptíveis para as partes.

A princípio da Igualdade corroborado no Ordenamento Brasileiro, é objeto indispensável para a aplicação de todos os preceitos postos à avaliação nesse estudo. Porém, a máxima tão bem proferida pelo então pensador Aristóteles, assaz de vez repetida, “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”, não supre as necessidades da sociedade atual no que tange a legislação em prol da PcD. Esse pensamento, embora impeça a discriminação odiosa, não garante efetivamente aos desiguais as oportunidades, ou seja, impede a injustiça quanto aos iguais, mas não promove a aproximação possível dos desiguais perante em face do todo. Neste diapasão, Sandro Nahmias, contribui com excelência em seus ensinamentos em “O Direito ao Trabalho da Pessoa Portadora de Deficiência”, em discurso sobre o princípio da Igualdade:

No mais, o principio da igualdade, atuando na proteção dos interesses da pessoa portadora de deficiência, deve permitir a quebra da isonomia, desde que situação assim autorize. Seria logico afirmar que a pessoa portadora de deficiência tem direito a um tratamento especial dos serviços de saúde ou à criação de uma escola especial ou, ainda, a meio ambiente de trabalho adequado. Todas representam autorização lógica para tanto. (MELO, 2004)

A função social do contrato trabalhista do deficiente vai além do simples fato de estar empregado, esse ato possui valores humanos inestimáveis, não somente para aquele que usufrui do emprego como empregado, mas também um valor interessante para o Estado, como a valorização pessoal do contratado, o retorno financeiro direto e indireto causado em detrimento do vínculo trabalhista, o crescimento de mão-de-obra nas empresas, entre outros. Na mesma vertente, leciona Álvaro dos Santos:

Em verdade, a doutrina interdisciplinar apura alguns apontamentos significativos sobre o trabalho associado a um emprego: diminui as taxas de pobreza, torna viável a diminuição do isolamento social e promove o aumento da participação política ao alocar os deficientes como agentes de transformação; bem como melhora a autoestima ao fazer os indivíduos se sentirem cidadãos com vida ativa. Nessa esteira leciona Sassaki ao enfatizar que o trabalho contribui para o desenvolvimento da autoestima e da confiança. Seu papel é de proporcionar aprendizagem, crescimento, transformação de conceitos e atitudes, aprimoramento e remuneração. (MACIEL, 2011)

Em uma mesma vertente, com muita propriedade sobre o assunto, o escritor peruano Teodosio Palamino, leciona:

El trabajo cumple siempre una función social, por lo mismo que pone las bases materiales, espirituales y morales de la vida social; la hace posible, la sostiene, la perfecciona y enriquece; construye ciudades y pueblos, crea médios de locomoción y comunicación, produce  y distribuye bienes, organiza servicios de todo tipo ... y lo que es mejor todavia, proporciona los médios de subsistência y bienestar de los trabajadores y la família de éstos. [...]

El trabajo tiene, por su misma naturaleza, una vertiente social, de la que no puede prescindirse em ningún caso. Por eso, se afirma que el trabajo prácticamente es una función social, que contribuye al bien común de la sociedade.

 

O trabalho sempre cumpriu uma função social, portanto, estabelece os fundamentos materiais, espirituais e morais da vida social; faz com que seja possível, mantê-lo, aperfeiçoa-lo e enriquece-lo, constrói cidades e povos, cria meios de transporte e comunicação, produz e distribui bens, organiza todos os tipos [...] e o que é melhor ainda, fornece os meios de subsistência e bem-estar dos trabalhadores e as famílias destes.
[...]
O trabalho, por sua própria natureza, possui um aspecto social, que não pode ser ignorado de nenhuma maneira. Então, se diz que o trabalho é praticamente uma função social, que contribui para o bem comum da Sociedade. (PALOMINO, 1993, tradução nossa)

Já para o escritor Renascentista, Baltasar Gracián (2003), que apesar de não ser jurista, mas sim um filósofo, em seu ensino nota-se a proximidade com o tema em pauta e de forma inovadora para sua época ensina: “Este é o maior equívoco e o mais fácil de cometer. [...] Não há nada que exija um olhar mais profundo do que a alma humana [...]”, ao tratar sobre “Não se enganar sobre a condição das pessoas.”, o que nos remete aos preconceitos humanos. A partir da visão compartilhada por este autor, ainda sobre seu manual de uso prático, podemos fazer um parâmetro sobre seu entendimento acerca do conhecimento sobre a natureza dos empregos. Diz:

Cada ocupação tem suas características e é necessário um conhecimento magistral para compreender essas diferenças. Alguns empregos precisam de valor e outros de perspicácia. São mais fáceis os que dependem da retidão, e mais difíceis os que precisam de cautela. No primeiro caso basta ter bom caráter, no segundo nem toda a atenção e desvelo são suficientes. Dirigir homens é uma ocupação trabalhosa, principalmente se são loucos ou tolos. [...] (GRACIÁN, 2003)

 

 CAPACITAÇÃO, REABILITAÇÃO E INCLUSÃO NO MERCADO DE TRABALHO.

A capacitação, reabilitação e inclusão profissional são nomenclaturas de técnicas para aquisição e/ou adaptação da capacidade laboral para o ingresso de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, sendo que nunca tiveram experiência trabalhista, que tiveram experiência trabalhista e por alguma razão perderam sua pratica, e/ou aqueles que estão aptos a uma vaga no mercado de trabalho. O dispositivo legal mais recente que regula essa matéria é o Decreto 3.048 de 1999, que regulamenta a Lei nº 8.213 de 1991. O art. 137 do referido Decreto diz caber aos profissionais do INSS à responsabilidade de:

a)         Realizar a avaliação e a capacidade laboral dos portadores de deficiência;

b)         Orientar e acompanhar a programação da habilitação e reabilitação;

c)         Articular o INSS com a comunidade a fim de facilitar o ingresso e o reingresso dos portadores de deficiência no mercado de trabalho;

d)         Pesquisar a oferta de vagas no mercado de trabalho e desempenho dos portadores de deficiência nos processos de inserção e reinserção.

Em abordagem sobre o assunto, Sandro Nahmias observa:

Para as pessoas que adquiriram uma deficiência mais tarde na vida, quando já em idade produtiva, é essencial a adoção de medidas públicas e privadas voltadas ao seu retorno ao trabalho, seja na mesma função, seja em novos postos, compatíveis com as suas novas condições. Muitas vezes, entretanto, isto não ocorre, uma vez que é mais fácil para o trabalhador requerer a aposentadoria que continuar trabalhando no mercado formal. Já as pessoas que portam deficiências desde o nascimento ou desde a primeira infância, geralmente passam sua vida toda em condição social de segregação. (MELO, 2004)

A reabilitação é a assistência prestada aos portadores de deficiência que adquiriram a deficiência no decorrer da vida, em geral, após um acidente. Enquanto que a habilitação é o conjunto de atividades voltadas para quem traz uma limitação de nascença e ainda para os que precisam se qualificar para desempenhar determinadas funções no mundo do trabalho.

A Lei 9.394 de 1996 também regulamenta a educação profissional. Segundo o Decreto 5.154 de 2004, as ações de educação profissional são desenvolvidas por cursos e programas de formação inicial e continuada.

A capacitação profissional trata da preparação inicial do indivíduo para o mercado de trabalho, ou seja, a pessoa com deficiência que não teve nenhum contato com a realidade do emprego será direcionada por meio de treinamento específico direcionado ao dia-a-dia de um trabalhador comum, expondo-o às dificuldades da jornada de trabalho, seus méritos, o salário, as responsabilidades, o ambiente de trabalho, o trabalho em equipe, em suma a vivência profissional. Sendo submetido ao programa, o indivíduo passa por avaliação periódica para análise de aptidão ao trabalho. Dos processos citados talvez esse seja o mais dificultoso, devido aos testes periódicos para avaliação da aptidão profissional e a futura seleção para o mercado de trabalho.

A reabilitação implica em nova habilitação para o trabalho, destinada à aquelas pessoas que por alguma razão perderam a capacidade de trabalhar, necessitando de treinamento para voltar ao mercado de trabalho.

A inclusão profissional significa a total aptidão do individuo para o mercado de trabalho, ou seja, o ingresso no mercado de trabalho e iminente bastando à oportunidade de emprego. Este programa, quando concluso, é possivelmente o mais gratificante deles, em razão dos critérios de admissão abusivos e injustos por vezes enfrentados por essa minoria, ou pela própria superação da condição precária a qual estão estagnados.


Autor: Jefter Lucio Vieira E Freitas Lourenço


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