Responsabilidade das seguradoras junto aos segurados



CAPITULO III

RESPONSABILIDADE DAS SEGURADORAS JUNTO AOS SEGURADOS

O presente capítulo busca discutir o mérito da responsabilidade civil das seguradoras, principalmente a fim de perquirir se esta é solidária ou subsidiária, junto ao segurado nas ações judiciais em que se busca a reparação de danos causados por acidentes de trânsito, o que também exige a análise do posicionamento jurisprudencial sobre o tema.

3.1. O contrato de seguro de veículos e as coberturas

Os próximos tópicos visam diferenciar os seguros obrigatórios dos seguros privados, como também, a cobertura correspondente a estes seguros.

3.1.1. Seguro obrigatório

Na década de 1960, no governo de Juscelino Kubitschek, com as implementações de metas industriais e a grande expansão do setor automotivo, despertou nas seguradoras a possibilidade de expandir as espécies de coberturas de seguros, como o seguro de automóvel e o seguro de responsabilidade civil, que a época fazia parte do monopólio estatal. Nesta década o seguro de automóvel contava apenas com 11% do total do prêmio recolhido, ao passo que a soma do seguro de vida com o seguro em caso de incêndio atingia 51,4% das adesões.[1]

Tempos depois, ocorreu à edição da norma que regula a atividade securitária do país, conforme descreve Melisa Cunha:

Posteriormente houve a edição do Decreto- lei nº 73/66, norma que regulamenta a atividade securitária no país, vigente até os dias atuais. Foi instituído, por meio desse Decreto, o Sistema Nacional de Seguros Privados, constituído pelo ConselhoNacional de Seguros privados (CNSP), com a função de formular diretrizes e normas da política de seguros privados; pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP); pelo Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), pelos seguradores e pelos corretores.[2] 

Foi através do artigo 20 do Decreto - lei nº 73/66, que se estabeleceu seguros obrigatórios:

Art. 20. Sem prejuízo do disposto em lei especial, são obrigatórios os seguros de: a) danos pessoais a passageiros de aeronaves comerciais; b) responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de vias terrestres, fluvial, lacustre e marítima, de aeronaves e dos transportadores em geral; c)responsabilidade civil do construtor de imóveis em zonas urbanas por danos a pessoas ou coisas; d) bens dados em garantia de empréstimos de instituições financeiras públicas; e) garantia do cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis; f) garantia do pagamento a cargo de mutuário da construção civil, inclusive obrigação imobiliária; g) edifícios divididos em unidades autônomas; h) incêndio e transporte de bens pertencentes a pessoas jurídicas, situados no país ou nele transportados.[3]

Os seguros obrigatórios foram criados com finalidade de garantir a vítima reparação do dano causado pelo segurado, como nos casos de contratos de responsabilidade civil de veículos automotores e dos transportadores em geral; responsabilidade civil do construtor de imóveis em zonas urbanas por danos a pessoas ou a coisas, etc.

Em 07 de dezembro de 1967, através do decreto lei nº 61.867, estabeleceu-se o seguro obrigatório para veículos automotores, que a época recebeu o nome de RECOVAT – Responsabilidade Civil dos Proprietários de Veículos Automotores de Vias Terrestres, este previa em seu artigo 5º que

As pessoas físicas e jurídicas, de direito público ou privado, proprietário de quaisquer veículos relacionados nos arts. 52 e 63 da Lei nº 5.108, de 21/09/1966, referente ao Código Nacional de Trânsito, ficam obrigadas a segurá-los, quanto à responsabilidade civil decorrente de sua existência ou utilização.[4]

Posteriormente, houve a revogação da lei do Recovat, e com isso, a lei 6.194 de 19 de dezembro de 1974 foi editada criando um Seguro de Danos Pessoais causados por veículos automotores de Vias Terrestres, ao qual recebeu o nome de DPVAT, este seguro tem por objetivo a cobertura de morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica de danos decorrentes de acidentes automotivos, e não propriamente um seguro de responsabilidade civil.

Segundo o artigo 5º da Lei de nº 6.194/74, através desta nova legislação a vítima passa a receber a indenização independente da apuração da responsabilidade, não sendo necessária a perquirição da culpabilidade do agente por se tratar, conforme mencionado no parágrafo anterior, de seguro decorrente de acidente automotivo e não somente seguro de responsabilidade civil.[5]

Em 21 de agosto de 1996 através de emenda constitucional que colocou o fim do monopólio do resseguro no país, causou um grande impacto no respectivo setor dando uma nova redação ao artigo 192 da Constituição Federal, suprindo do respectivo texto a expressão órgão oficial ressegurador, tornando o uma atividade aberta no mercado.

3.1.2. Contrato de seguro privado

No Brasil o órgão responsável pela fiscalização e funcionamento das sociedades seguradoras é a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), criado em 1966 pelo governo com o Sistema Nacional de Seguros Privados.

Atualmente os contratos de seguros privados no âmbito automotivo, continuam sendo regularizado e fiscalizado pela SUSEP com base na Circular SUSEP Nº 269/2004. Para a comercialização e contratação do seguro é necessária a intermediação de um corretor de seguros habilitado pela SUSEP, sendo vedada a intermediação por pessoa física.

O contrato de automóveis é um contrato entre o proprietário do veículo e a companhia de seguros, intermediado por um corretor de seguros. A maioria das apólices duram entre seis (6) meses a um (1) ano, devendo ser renovado toda vez que houver a aspiração da apólice.

As principais coberturas no contrato de automóveis são: colisão: pagamento por qualquer dano no veiculo feitos em decorrência de uma colisão com outro objeto, um veículo ou objeto estático; compreensivo: reembolso de veículo devido as causas por motivos além da colisão, como roubo, por exemplo; legalidade para danos físicos: proteger o segurado por qualquer dano físico causado a terceiro e legalidade para danos materiais: a seguradora paga por outros objetos além de veículos no caso de colisão, como muros, postes, dentre outros.

São duas as modalidades de seguro de automóvel, qual seja, por valor determinado e por valor de mercado referenciado, podendo ser oferecida a contratação pela seguradora de apenas uma das modalidades como também de ambas.

Havendo a contratação e ocorrendo sinistro, na modalidade de Valor Determinado, a indenização será a quantia fixada na apólice. Se a contratação ocorreu na modalidade Valor de Mercado Referenciado, a indenização será determinada de acordo com o valor constante na tabela de referência de cotação para o automóvel na data da liquidação do sinistro (data em que o valor da indenização está disponível para o segurado), conjugado com o fator de ajuste, que é um percentual a ser aplicado sobre essa tabela e que deve estar definido na apólice e na proposta do seguro.

Tal fator de ajuste deverá ser levado em consideração as características particulares e o estado de conservação do automóvel. A aplicação do fator de ajuste tornará a indenização maior (se superior a 100%) ou menor se inferior a 100%) em relação à cotação do automóvel na tabela de referência.

Ao segurado cabe propor o valor da importância segurada do automóvel (na modalidade Valor Determinado) e o fator de ajuste (na modalidade Valor de Mercado Referenciado), podendo a seguradora optar em aceitar ou não a realização do seguro.

Não existe normas especificando a recusa, mas as seguradoras podem recusar-se a realizar um seguro por motivos como veículos de mais de 10 anos, chassi remarcado, irregularidade de pagamento do prêmio, dentre outros.

As principais garantias oferecidas nos seguros de automóvel são: compreensiva (colisão, roubo e incêndio); incêndio e roubo; colisão e incêndio; responsabilidade civil facultativa de veículos; acidentes pessoais de passageiros.

Existe a opção de contratação de garantias adicionais, que serão inclusas no prêmio (valor a ser pago a seguradora de veículos), devendo constar o adicional detalhadamente na apólice de seguro, por exemplo: Danos em acessórios (Cd players, televisores, DVD, dentre outros); Danos em blindagem; carrocerias; danos morais de terceiros, segundo sentença judicial; extensão de perímetro para os países da América do Sul, dentre outros.

Na ocorrência de sinistro, o primeiro procedimento a ser tomado e o de contatar a delegacia de policia mais próxima e solicitar que seja feito boletim de ocorrência (BO). O segundo passo é entrar em contato com a seguradora para informá-la do ocorrido, devendo após, ser preenchido o Aviso de Sinistro e juntar a documentação requerida contratualmente pelo seguro do carro.

Haverá a isenção da franquia em casos de indenização integral do veículo, danos por incêndio, explosão e raio.

A SUSEP não definiu uma forma especifica de elaboração do calculo do prêmio, existindo várias formas da qual a seguradora tem total liberdade de escolher dentre as disponíveis.

A indenização integral, também conhecida como perda total, fica caracterizada quando os danos do veículo são superiores a um percentual mínimo contratado, geralmente 70% do valor total do automóvel. Neste caso a seguradora paga o valor total, fica com o veículo e assume suas avarias.

Para avaliar o risco, as seguradoras disponibilizam um questionário de avaliação de risco aos segurados que após preenchimento e analise, definirá o perfil do usuário do seguro.

Estes formulários são base para a formação do prêmio do seguro automotivo, podendo ficar barato ou mais caro. Se caso o segurado responder de forma inadequada para manipular um possível desconto ou omitir dados, este poderá perder o direito à garantia e ainda ser obrigado ao pagamento do prêmio.

O Seguro de Acidentes Pessoais de Passageiros pode ser feito tanto no âmbito público como também privado, este tem por objetivo a indenização de acidentes ocorridos aos passageiros do veículo, e possui com principais garantias a morte e invalidez permanente; outras garantias; despesas médico-hospitalares, dentre outras.

3.2. Da ação direta da vítima contra o segurador

Esta questão enseja bastante controvérsia em vários países, no direito estrangeiro diversos são os posicionamentos sobre o assunto, as legislações se chocam ao tratar do teor de possibilidades, alguns legisladores entendem que existe sim a possibilidade de a vítima ajuizar diretamente ação em face do segurador, outros entendem que a vítima deverá impetrar ação em face do segurado e do segurador em conjunto, como também outros legisladores tem uma visão mais restrita, onde permitem a vítima inicialmente ajuizar o segurado e posteriormente o segurador ser chamado a lide.

Melisa Cunha Pimenta cita em sua obra alguns exemplos do tema abordado nas legislações do direito estrangeiro. No direito Holandês, na legislação Portuguesa e Mexicana a vítima poderá interpor ação em face diretamente do segurador e ser indenizada, na lei da Espanha fica a critério da vítima, podendo acionar o segurado ou o segurador, como também ajuizar ação contra ambos. Já no Equador existem normas que vedam a possibilidade da vítima impetrar ação direta em face do segurador.[6]

No Brasil não existem dispositivos que vedem ou permitam a interposição de ação direta da vítima em face do segurador no seguro de responsabilidade civil, mas já existem doutrinas e jurisprudências que consentem com o ajuizamento da vítima diretamente contra o segurador, como será abordado nos próximos tópicos.

Nas apólices de seguros, as seguradoras se colocam como responsável subsidiária, como descreve Melisa Cunha:

Nas apólices dos seguros de responsabilidade civil constam que os seguradores são obrigados a reembolsar os segurados pelas quantias que estes vierem a despender em razão de sentença judicial transitadas em julgado ou de acordos extrajudiciais, devidamente autorizados pelos seguradores, nos quais seja reconhecida a responsabilidade civil do segurado.[7]

Na citação acima, observa-se que pelas apólices de seguro de responsabilidade civil as seguradoras se posicionam como responsável subsidiária, devendo a vítima ajuizar o segurado e este acionar a seguradora para que seja reembolsado do valor da condenação paga.

A imposição dessa responsabilidade subsidiária nas apólices justifica-se pelo fato de que as seguradoras discordam em atuar no pólo solidário da ação de responsabilidade civil, ao argumento de que, quando a vítima ajuíza ação diretamente contra a seguradora não fica comprovada a responsabilidade do dano pelo segurado, como também as exceções a serem argüidas como, ausência de cobertura, falta de pagamento do prêmio, sinistro ocorrido após o cancelamento da apólice de seguro, dentre outros fatos relevantes.

Mas na prática, para solucionarem sinistros extrajudicialmente as seguradoras acabam se contradizendo, figurando no pólo solidário do fato gerador, ou seja, negociam diretamente com a vítima efetuando-lhe o pagamento. 

Nessa linha, Melisa Cunha cita Voltaire Giavarina para explicar a prática extrajudicial da responsabilidade de seguro, levando em consideração a teoria do reembolso, os seguradores reembolsam diretamente os terceiros lesados, mediante declaração de culpa do segurado, em processo administrativo, que após constatação pela companhia de seguro, caberá a ela efetivar, de imediato, a indenização diretamente ao terceiro prejudicado.[8]

Deve o segurado comunicar a seguradora do sinistro, e esta entra em contato diretamente com a vítima, efetua-lhe o pagamento diretamente em nome do segurado.

Mesmo mediante a insistência das seguradoras na aplicação da teoria do reembolso, a doutrina e a jurisprudência tem se voltado para novos posicionamentos, tendo em vista que, a teoria do reembolso no âmbito judicial, a vítima impetraria ação em face do segurado e este denunciaria a lide ao segurador, caso o segurado não efetuasse o pagamento da indenização a vítima, a seguradora também não teria a obrigação de reembolsar o segurado, pois a sentença que julga denunciação cria apenas um título executivo para que o segurado acione o segurador mediante o pagamento a vítima, conforme preleciona Melisa Cunha:

Em que pese a existência de um seguro de responsabilidade civil, a vítima acabaria completamente desamparada e haveria, por assim dizer, um “enriquecimento sem causa” por parte do segurador, pois, mesmo após o reconhecimento da responsabilidade do segurado, não haveria o pagamento da indenização.[9]

Neste contexto a vítima ficaria desamparada com relação à responsabilidade do seguro, pois se mesmo após comprovação da responsabilidade do segurado pelo dano causado a vítima, o mesmo não tivesse meios de indenizar, a responsabilidade do segurador ficaria limitada ao segurado, ou seja, haveria obrigação do reembolso e não ao pagamento da indenização, não havendo pagamento da indenização por parte do segurado não haveria obrigação de reembolso, o que levaria o segurador a um enriquecimento ilícito sem causa.

Mediante tais possibilidades, a doutrina e a jurisprudência estão redirecionando seus entendimentos, tomando por base princípios constitucionais como, o da solidariedade social e o da justiça, onde atribuem ao seguro de responsabilidade civil não somente a garantia ao patrimônio do segurado, mas também garantir os atos lesivos causados pelo segurado a terceiros (vítimas).

Ernesto Tzirulnik e Ayrton Pimentel, embasados no caput do artigo 787 do Código Civil entende que: “No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro”.[10] Entendem que, não há necessidade do segurado integrar o pólo passivo da ação, devendo a vítima interpor ação diretamente em face do segurador, segundo eles, a garantia prestada nos seguros de responsabilidade civil pelo segurador, é o de eliminação dos efeitos patrimoniais a imputação de responsabilidade ao segurado, assim, após comprovada a dívida, deverá o segurador efetuar o pagamento diretamente ao terceiro.[11]

Pedro Alvim sustenta o posicionamento de que o segurado deve ser demandado em conjunto com o segurador, e que após integrar a lide, poderá efetuar o pagamento diretamente a vítima, não devendo exceder o valor montante contratado pelo segurado:

Defende a possibilidade de se estabelecer um litisconsórcio passivo entre segurado e segurador, estando aquele vinculado à vítima em razão de ser o agente do ato ilícito e este vinculado em virtude de ser o garantidor da indenização, até o limite da cobertura da apólice.[12]

Para defender este posicionamento, Pedro Alvim utilizou-se da analise do caput do artigo 787 do Código Civil, para ele, interpor ação conjuntamente em face do segurado e do segurador trás o beneficio da economia processual e da presteza na solução de conflitos pela justiça, como também a realização da função social do seguro.[13]

Mas nem todos concordam com estes posicionamentos, segundo a doutrinadora Melisa Cunha Pimenta, a corrente minoritária defende a teoria do reembolso, onde a vítima deverá ajuizar ação em face do segurado e este deverá denunciar a lide ao segurador, que somente na fase de execução processual poderá proceder com o pagamento diretamente a vítima.[14]

Antônio Penteado Mendonça faz parte da corrente minoritária e justifica seu posicionamento no artigo 788 do Código Civil, o mesmo descreve que o pagamento da indenização só poderá ser feito pela seguradora diretamente ao terceiro nos casos de seguros obrigatórios, devendo a seguradora ingressar no processo se for denunciada pelo segurador ou se pedir para ingressar a lide. Antônio Penteado Mendonça reforça ainda sua tese frisando que os seguros facultativos de responsabilidade civil de veículos são expressamente seguros de reembolso do segurado, na qual consta na apólice de seguro, em seu objeto, que a seguradora reembolsa o segurado nos termos do contrato, das despesas suportadas em função do pagamento de prejuízos causados a terceiros, decorrente de riscos cobertos, por culpa do segurado.[15]

Na teoria do reembolso, cabe a vítima interpor ação em face do segurado, e este chamar o segurador a lide, versa que a seguradora se vê responsável somente do reembolso ao segurado, não podendo este indenizar a vítima não caberá a seguradora a responsabilidade do reembolso nem da obrigação de indenizar diretamente a vítima. Tendo em vista as conseqüências que esta teoria pode trazer a vítima (desamparo), como também o enriquecimento ilícito que esta teoria possa gerar ao segurador, vem formando novos posicionamentos jurisprudenciais, conforme será abordado no tópico abaixo. 

3.3. Posicionamento Jurisprudencial sobre a responsabilidade das seguradoras perante o segurado em contraponto ao direito da vítima.

A doutrina e a jurisprudência há algum tempo conferem uma atenção maior com relação ao ajuizamento de ações no âmbito do seguro no que tange a possibilidade de terceiro prejudicado, no caso em tela, a vítima de dano causado pelo segurado impetrar ação diretamente em face do segurador.

Diversos são os entendimentos nesse sentido. O Ministro Athos Gusmão Carneiro, acusa à necessidade de alteração legislativa visando à inserção de uma nova possibilidade de chamamento ao processo:

Seja inserida uma nova hipótese de chamamento ao processo, incluindo-se no artigo 77, do Código de Processo Civil, um inciso IV, prevendo o “chamamento ao processo da seguradora na ação por responsabilidade civil proposta contra o segurado”.[16]

Desta forma, a vítima deveria inicialmente impetrar ação em face do segurado que foi quem causou o dano, cabendo a este chamar o segurador ao processo, sendo assim, no entendimento do aludido ministro não caberia ação direta em face da seguradora, devendo a mesma se tornar parte no processo mediante manifestação de vontade do segurado ao chamar o segurador ao processo. Segundo o Ministro, seria uma forma indireta de reconhecer a existência da pretensão da vítima contra o segurador no plano do direito material.[17]

Nos Tribunais Estaduais existe uma corrente minoritária que também defendem a interposição de ação em face do segurado e não diretamente em face do segurador embasado no artigo 787 do NCC:

Não é possível o pagamento direto pelo segurador à vítima, nem mesmo em sede de execução de sentença, sob o fundamento de que “só é possível o pagamento da indenização diretamente ao terceiro prejudicado nos seguros obrigatórios. [...] Não sendo esta hipótese, o segurador apenas garanta o pagamento da indenização devida pelo segurado (art.787, NCC)”.[18]

No Superior Tribunal de Justiça, alguns ministros adotam o mesmo entendimento abordado anteriormente:

Diversamente do DPVAT, o seguro voluntário é contratado em favor do segurado, não de terceiro, de sorte que sem a sua presença concomitante no pólo passivo da lide não se afirma possível a demanda intentada diretamente pela vítima contra a seguradora.

A condenação da seguradora somente surgirá se comprovado que o segurado agiu com culpa ou dolo no acidente, daí a necessidade de integração do contratante, sob pena, inclusive, de cerceamento de defesa.[19]

No Superior Tribunal de Justiça, existem aqueles que formam um terceiro posicionamento, por entender ser o seguro de responsabilidade civil facultativo, sendo estimulo em favor de terceiro, podendo a vítima interpor ação direta e exclusivamente em face do segurador, tendo em vista se tratar de instituto que estabelece exceção ao princípio da relatividade dos efeitos contratuais, o que permite que o contrato atinja quem dele não fez parte originariamente:

As relações oriundas de um contrato de seguro não se encerram entre as partes contratantes, podendo atingir terceiro beneficiário, como ocorre com os seguros de vida ou de acidentes pessoais, exemplos clássicos apontados pela doutrina.

Nas estipulações em favor de terceiro, este pode ser pessoa futura e indeterminada, bastando que seja determinável, como no caso do seguro, em que se identifica o beneficiário no momento do sinistro.

O terceiro beneficiário, ainda que não tenha feito parte do contrato, tem legitimidade para ajuizar ação direta contra a seguradora, para cobrar a indenização contratual prevista em seu favor.[20]

Visando amparar as vítimas, como também evitar o enriquecimento ilícito das seguradoras a doutrina e a jurisprudência, após diversas discussões sobre a aplicação da teoria do reembolso, ao analisar as consequências que esta poderia causar vem adotando novas possibilidades, como a possibilidade de ajuizar ação direta em face do segurador, conforme mencionado na citação acima.

O Ministro Aldir Passarinho Júnior, entende que não é cabível a terceiro (vítima) impetrar ação de indenização diretamente em face do segurador, tendo em vista esta não fazer parte do evento danoso:

À parte autora, suposta vítima do acidente de trânsito, não lhe é autorizada a propositura de demanda de indenização contra a seguradora do réu – pretenso causador do dano, já que não é parte do evento danoso.[21]

 Segundo o referido Ministro, como a seguradora não participou do evento danoso, não poderá figurar no pólo passivo, na verdade esta poderá ser chamada a lide é ai então se tornar parte no processo.

Nesta mesma vertente complementa o Ministro do STJ Aldir P. Júnior o seu entendimento:

Diversamente do DPVAT, o seguro voluntário é contratado em favor do segurado, não de terceiro, de sorte que sem a sua presença concomitante no pólo passivo da lide, não se afigura possível a demanda intentada diretamente pela vítima contra a seguradora.

A condenação da seguradora somente surgirá se comprovado que o segurado agiu com culpa ou dolo no acidente, daí a necessidade de integração do contratante, sob pena, inclusive, de cerceamento de defesa.[22]

Segundo entendimento do ilustríssimo Ministro Aldir não seria possível a vítima impetrar ação diretamente em face da seguradora tendo em vista que a mesma não participou do contrato de seguro, sendo este uma obrigação entre o segurado e a seguradora. Para que haja a condenação da seguradora, haveria a necessidade de comprovação da culpa ou dolo do segurado, o que não seria possível sem que este faça parte do processo.

Desta forma, deveria a vítima ingressar com ação inicialmente em face do segurado, que foi quem participou do fato danoso, e cabendo a este a chamar o segurador a lide.

 

 


[1] PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 30.

[2] PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 31.

[3] Idem.

[4] Idem.

[5] PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 32.

[6] PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 136.

[7] Ibidem, p. 140.

[8] MARENSI, Voltaire Giavarina apud PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 136.

[9] PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 140.

[10] Brasil. Vade Mecum. Obra de coletiva autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes. 10.ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 204.

[11] TZIRULNIK, Ernesto. CAVALCANTE, Flávio de Queiroz B. PIMENTEL, Ayrton Apud PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 141.

[12] ALVIM, Pedro op cit PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 142.

[13] Ibdem, p. 143-144.

[14] PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 142.

[15] MENDONÇA, Antônio Penteado apud PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 142.

[16] CARNEIRO, Athos Gusmão apud PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 143.

[17] Idem.

[18] Julgado emanado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, op cit PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 143.

[19] Recurso Especial nº 256.424 in PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 144.

[20] Recurso Especial nº 401.718 in PIMENTA, Melisa Cunha. Seguro de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2010, p. 144.

[21]  Julgado do Superior Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento sob nº 599349891. Des. Cezar Tasso Gomes. Décima Segunda Câmara Cível do Superior Tribunal de Justiça.

[22]Julgado do Superior Tribunal de Justiça. 4ª Turma, Resp.256.424/SE, Rel. p/acórdão Min. Aldir Passarinho Júnior, DJU de 07/08/2006.


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