Efeitos jurídicos do direito civil na desapropriação indireta



RESUMO

A Desapropriação Indireta é o fato administrativo pelo qual o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia. Por se tratar de uma ação legitimada pelo artigo 33 do Decreto Lei 3.365/41, tornou-se um instituto que com diversos efeitos e de natureza dúbia, por não estar claro se é uma ação de caráter pessoal ou real. O objetivo desse estudo é realizar uma revisão de literatura sobre a natureza e os respectivos efeitos da desapropriação indireta no ordenamento jurídico. Utilizou-se a metodologia através de um estudo descritivo, realizado através da Dupla Hermenêutica (Giddens), na forma de análise jurisprudencial qualitativa.

Palavras-chave: Desapropriação Indireta, Efeitos Jurídicos, Natureza Processual.

 

ABSTRACT

The indirect expropriation is that by which the administrative state appropriates particular good without observing the requirements of the declaration and prior compensation. It is a legitimate action under Article 33 of Decree Law 3.365/41, became an institute with various effects and dubious nature because it is not clear whether it is an act of personal or real. The aim of this study is a review of literature on the nature and effects of their indirect expropriation in legal. We used the methodology through a descriptive study, conducted through the double hermeneutic (Giddens), in the form of qualitative analysis of jurisprudence.

Key words: Indirect Expropriation, Legal effects, Nature process.

 

1. INTRODUÇÃO

Segundo o professor Pablo Stolze Gagliano:

“A desapropriação é um instituto de direito público, fundado no direito constitucional e regulado pelo direito administrativo, mas com reflexo no direito civil, por determinar a perda de propriedade do imóvel, de modo unilateral, com a ressalva da prévia e justa indenização.”.

A desapropriação constitui um modo de transferência compulsória, forçada, da propriedade, do domínio particular ou do domínio de outra entidade pública de graus inferior, para a Administração Pública ou seus concessionários.

O procedimento da desapropriação realiza-se tanto por via administrativa, na qual o Poder Público declara seu interesse na desapropriação e começa a adotar as providências visando à transferência do bem, quanto por via judicial, em que não é homologado um acordo com o proprietário, concluindo em uma ação a ser movida pelo Estado contra o dono do imóvel.

A Constituição Federal estabelece a legitimação da desapropriação, classificada didaticamente como ordinária, no seu artigo 5º:

“Art. 5º: A lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.”.

 

No que tange as razões para o Poder Público transferir para si a propriedade de terceiro si dá pela fundamentada em 3 (três) pressupostos: A utilidade pública se apresenta quando a utilização de bens particulares é conveniente aos interesses administrativos, embora não sejam imprescindíveis. A necessidade pública, tal quando a Administração defronta problemas que só se podem resolver com a transferência de bens particulares para o domínio da pessoa administrativa incumbida de solucioná-los. O interesse social do Estado ocorre quando a transferência de bens particulares para o domínio público ou de delegados do poder público se impõe, como medida destinada a resolver problemas da coletividade criados pela propriedade particular de um ou de alguns indivíduos.[1]

Na legislação nacional, a primeira vez em que o instituto da desapropriação é citado, trata-se do Decreto-Lei nº 3.365 de 21/06-1941, que regula as leis gerais da desapropriação, que aborda o termo de utilidade pública, estabelecendo os casos da mesma, no artigo 5º:

“Art. 5º: Consideram-se casos de utilidade pública:

  1. Segurança nacional;
  2. A defesa do Estado;
  3. O socorro público em caso de calamidade;
  4. A salubridade pública;
  5. Criação e melhoramento de centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência;
  6. O aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia hidráulica;
  7. A assistência pública, as obras de higiene e decoração, casas de saúde, clínicas, estações de clima e fontes medicinais;
  8. A exploração e a conservação dos serviços públicos;
  9. A abertura, conservação e melhoramento de vias ou logradouros públicos; a execução de planos de urbanização; o parcelamento do solo com ou sem edificação para, sua melhor utilização econômica, higiênica ou estética; a construção ou ampliação de distritos indústrias;
  10. O funcionamento dos meios de transporte coletivo;
  11. A preservação e conservação dos monumentos históricos e artísticos, isolados ou integrados em conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou característicos e, ainda, a proteção de paisagens e locais particularmente dotados pela natureza;
  12. A preservação e a conservação adequada de arquivos, documentos e outros bens móveis de valor histórico ou artístico;
  13. A construção de edifícios públicos, monumentos comemorativos e cemitérios;
  14. A criação de estádios, aeródromos ou campos de pouso para aeronaves;
  15. A reedição ou divulgação de obra ou invento de natureza científica, artística ou literária;
  16. Os demais casos previstos por leis especiais.”.

 

Outro diploma regulamentador é a Lei nº 4.1332/62, que define os casos de desapropriação por interesse social e dispõe sobre sua aplicação. Entre as hipóteses consideradas pela norma tem-se o aproveitamento de todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e consumo dos centros populares; a manutenção de posseiros que, em terrenos urbanos, tenha construído residência, quando a posse tiver sido expressa ou tacitamente tolerada pelo proprietário; a instalação das culturas nas áreas em cuja exploração não se obedeça a plano de zoneamento agrícola.

Como citado, a desapropriação pode acontecer, essencialmente ou pelas vias administrativas ou judiciais. No caso da primeira é realizado um acordo entre o Poder Público e o proprietário, sem necessidade de recursos ao Poder Judiciário. Trata-se de negócio jurídico bilateral resultante de consenso entre as partes. Esses elementos são os que compõem o contrato de compra e venda, que efetiva a transferência da propriedade de maneira não-coercitiva. Tal procedimento é denominado desapropriação amigável e está regulado pela Lei nº 6.015/73, no artigo 167 inciso I nº 34[2], qualificado como negócio jurídico autônomo, suscetível de inscrição no Registro De Imóveis.

Não havendo tal acordo, há necessidade de ser proposta ação de desapropriação no Poder Judiciário, o qual este não deverá analisar se existe ou não a utilidade pública alegada pelo Estado, conforme artigo 9º do Decreto-Lei nº 3.365/41[3]. A respeito da norma supracitada, pode-se verificar duas possibilidades: Se a discussão versar sobre o próprio conteúdo da vontade administrativa, isto é, se ocorreu dúvida do administrador quanto à desapropriação, a matéria não pode ser dirimida na ação de desapropriação, mas em ação autônoma. Contudo, se o objetivo da declaração for atividade que não se encontre contemplada em lei, a discussão não será quanto ao conteúdo da vontade do administrador, mas sim quanto à inexistência de pressuposto considerado pela lei como passível de gerar a desapropriação, em que o juiz deve, ex officio, apreciar a questão e até mesmo extinguir o processo expropriado sem julgamento do mérito por falta de condição da ação.

O processo expropriatório judicial está regulado nos artigos 11 à 30 do Decreto-Lei nº 3.365/41. A ação será proposta no foro da situação do imóvel, salvo se a União for autora. Neste caso, a competência será do foro da Justiça Federal. Intentada pelo Estado, tramitará em vara privativa. No caso dos Municípios, será perante as comarcas que tiverem garantias de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade dos vencimentos.

A inicial observará os requisitos exigidos para qualquer ação, conforme artigo 282 do Código de Processo Civil, e conterá a oferta do preço, sendo instruída ainda com um exemplar do jornal que houver publicado o decreto de desapropriação, bem como a planta ou descrição do bem. Ao despachar na exordial, o juiz designará um perito (Lei nº 5.194/66 artigos 12 e 13) para proceder à avaliação dos bens, no qual as partes indicam também seus assistentes técnicos.

Faculta-se ao autor, ainda antes da citação do réu, alegando urgência e depositando a importância arbitrada pelo juiz, requer a imissão provisória na posse dos bens (art. 15[4]). É pacífico na jurisprudência que a quantia a ser depositada pode ser inferior ao de valor de mercado, ponderando que o pagamento integral deve ser efetuado no momento da transferência definitiva. Se o expropriado impugnar a oferta, o magistrado fixará o valor provisório do imóvel, servindo-se se necessário, de perito avaliador, devendo o expropriante complementar o depósito até metade do valor arbitrado, que não poderá ultrapassar, porém o montante de 2.300 salários mínimos (arts. 3 e 4 do Decreto-Lei nº 1.075/70).

Se o réu, citado, aceitar a ofertar, o juiz homologará o acordo por sentença. Se discordar, oferecerá contestação, na qual poderá argüir somente vícios do processos ou insuficiência da oferta, tornando-se inadmissível qualquer alegação a respeito da ausência de utilidade ou necessidade pública, seguindo o art. 20[5] do Decreto-Lei nº 3.365/41.

Em geral o debate se restringe ao montante da indenização. Apresentado o laudo e terminada a fase instrutória, o juiz proferirá a sentença, fixando o quantum da indenização. A desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária segue o procedimento sumário, conforme art. 184, § 3º da CF[6] e a Lei Complementar nº 76/93.

A desapropriação oferece a peculiaridade registral de dispensar o registro do título anterior, por se entender que é um modo originário de aquisição da propriedade, em virtude do qual o Estado chama a si o imóvel diretamente, livre de qualquer ônus. Se o registro existir, a desapropriação será inscrita na folha do imóvel desapropriado para assinalar a perda da propriedade do titular ali nomeado.

Quando o Poder Público desapossa alguém sem o processo expropriatório regular, pratica esbulho. A jurisprudência, porém, ao fundamento de que a obra pública não pode ser demolida e de que ao proprietário nada mais resta, vem convertendo os interditos possessórios em ação de indenização, denominada desapropriação indireta. Diante disso, os proprietários costumam ingressar diretamente com a ação de indenização contra o Poder Público. A sentença de procedência declarará a incorporação do imóvel ao domínio público.  

2. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA

A desapropriação indireta é o fato administrativo por meio o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia. Em tal instituto o Estado apropria-se de bem particular sem o devido processo legal, não declara o bem como interesse público e não paga a justa e prévia indenização.

Vislumbra-se a violação de princípios constitucionais, como o devido processo legal e a questão da prévia e justa indenização.

A desapropriação indireta pode ser equiparada à apropriação de bem particular esbulho e, por isso mesmo, pode ser obstada por meio de ação possessória. No entanto, se o proprietário não o impedir no momento oportuno, deixando que a Administração lhe dê uma destinação pública, não mais poderá reivindicar o imóvel, pois os bens expropriados, uma vez incorporados ao patrimônio público, não podem ser objeto de reivindicação, seguindo orientações do art. 35[7] do Decreto-Lei nº 3.365/41 e art. 21 da Lei Complementar nº 76/93.

Também ocorre a desapropriação na situação em que a Administração impõe restrições tão extensas ao bem em questão que o torna completamente esvaziado de conteúdo econômico. Ou no caso do Poder Público não se apossar diretamente do bem, mas lhe impõe limitações que impedem totalmente o proprietário de exercer os poderes inerentes ao domínio do imóvel.

Logo, verifica-se que existem dois requisitos para estar configurada a desapropriação indireta: O bem deve ser incorporado ao patrimônio do Poder Público, ou que determinada limitação imposta por este ao uso do bem resulte no completo esvaziamento do conteúdo econômico da propriedade; A situação fática seja irreversível.    

 

3. AÇÃO DO EXPROPRIADO

A lei expropriatória deixou claro que a desapropriação indireta provoca o efeito de permitir ao expropriado postular perdas e danos. O pedido a ser formulado pelo prejudicado é o de indenização, já que a perda da propriedade pela desapropriação indireta é o simples fato gerador da ação.

A decisão dessa causa não afeta o direto de propriedade da Administração, já que na qualidade de bem incorporado ao Pode Público tornou-se intangível. A sentença, caso procedente, condenará o Estado a indenizar o autor, tendo em vista os prejuízos causados em face da desapropriação indireta, verificando o conteúdo condenatório dessa.

Em tese, tal ação deve ser qualificada como ação de natureza pessoal, haja vista que tem como bojo um pedido indenizatório. Entretanto, em virtude da situação particular do litígio, no qual o pedido indenizatório se funda na perda da propriedade, a mesma deveria ser caracterizada como ação de natureza real. Dai há uma divergência tanto jurisprudencial quanto doutrinária na qual se torna ainda mais aprofundada, haja vista que existem efeitos próprios que pendem para o tangente pessoal e outros que tendem a área real.

 

4. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Na ação de desapropriação direta, apesar de haver o questionamento sobre o valor da indenização, ainda não tem acontecido a perda da propriedade, incumbindo ao representante do Ministério Público a fiscalização do atendimento aos suportes constitucionais.

Diferentemente ocorrei na desapropriação indireta, já que a circunstância de ser a pretensão do ex-proprietário de natureza indenizatória, incluído o fato da perda do bem se estar consumado, conduz ao raciocínio que seria dispensada a intervenção do Ministério Público no processo, haja vista que a hipótese não incide no art. 82 inciso III[8] do CPC, pois que a causa é intimamente fazendária, não revelando interesse público no bojo da lide ou na qualidade da parte.  

Tal posicionamento do parquet, demonstra, no caso, uma qualificação de ação de natureza pessoal, haja vista a não intervenção pois que se trata de um processo simplesmente indenizatório, com reflexos tão somente fazendários para o Poder Público.

 5. FORO DA AÇÃO

No que tange ao foro da ação, tem prevalecido na jurisprudência de que será adequada a comarca onde o local do imóvel se encontra e não o do domicílio do réu. O próprio Superior Tribunal Federal diz que: “Tal ação de indenização deve seguir o procedimento comum, ordinário ou sumário, conforme a hipótese, sendo competente o foro da situação do imóvel.” [9]

Logo, verifica-se que, in casu, está considerando a ação com um caráter real, já que essa natureza é adequada ao Princípio do Forum Rei Sitae, que expressa que o foro é determinado pela situação da coisa (Direito Real).

 

6. VÍNCULO TRIBUTÁRIO

O Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) é um imposto que tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou acessão física. A base de cálculo é o valor venal do imóvel. Contribuinte do vínculo tributário é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.

A cessação do vínculo tributário entre o ex-proprietário e o Poder Público. Desse modo, fica ele desobrigado do pagamento do IPTU a partir do momento em que se efetivou a expropriação.

O próprio Superior Tribunal de Justiça diz que: “A partir do evento configurador da desapropriação indireta, o expropriado, não está mais sujeito ao pagamento do IPTU.” [10].

Tal questão demonstra que caracteriza a ação como ordinária de natureza real, averiguando a expropriação do bem como fator principal para a geração desse efeito, o que se enquadra no Direito Civil Real.

 

7. VALOR DO BEM

No tocante ao valor do bem, é pacífico na jurisprudência que a indenização deve corresponder aos preços reais e atualizados do imóvel, ainda que se tenha valorizado em virtude de intervenção do Estado. O fundamento está em que a desapropriação não observou o procedimento legítimo para suprimir o direito de propriedade. Por conseguinte, a eventual supervalorização do bem pela expropriação deve ser compensada pela via tributária, no caso a contribuição da melhoria do local, sendo ilegítima a dedução de qualquer parcela indenizatória em virtude do benefício imobiliário.  

O mesmo Superior Tribunal de Justiça explica: “Sendo ilegal, a dedução do valor indenizatório da quantia que se entenda proveniente e relativa à referida valorização.” [11].

Observa-se que o fato da valorização ter ocorrido em questão a intervenção do Poder Público em trazer melhorias ao espaço opina que o bem também foi o fator determinante para esses efeitos, o que caracteriza a ação como ordinária de natureza real.

 

8. JUROS MORATÓRIOS

Os juros moratórios são devidos quando o Poder Público não paga a indenização prevista para o expropriado no prazo determinado no processo administrativo ou quando estabelecido por sentença.

A Medida Provisória 2.183-56/01, alterou vertentes em relação a tal sanção. No que tange ao percentual, estabeleceu a porcentagem de até 6% (seis por cento) por ano. No que reside ao termo inicial para a implementação dessa mora é o dia 1º de janeiro do ano seguinte àquele em que o pagamento deveria ser efetuado, conforme art. 15-B do Decreto-Lei nº 3.365/41[12].

A base de cálculo para os referidos juros devem incidir sobre o valor da indenização fixado na sentença condenatória. Há parte da doutrina que considera ser aplicável a Súmula 102[13] do STJ, em ordem a considerar que os juros moratórios devem incidir sobre o valor da indenização pela perda da propriedade em conjunto ao valor dos juros compensatórios.

Porém o fato do termo inicial da corrente mora a partir da efetiva ocupação do bem, faz com que o a expropriação torne-se o ato essencial para a realização do mesmo, o que o dá característica de Direito Real.

 

9. JUROS COMPENSATÓRIOS

Os juros compensatórios também são devidos na desapropriação indireta, no percentual de 12% (doze por cento), seguindo a Súmula 408[14] do STJ. Incidem os juros compensatórios, na desapropriação indireta, sobre o valor da indenização corrigido monetariamente, conforme Súmula 114[15] do STJ, fixado em sentença condenatória. O termo inicial da contagem dos juros compensatórios deve consumar-se no momento da efetiva ocupação do imóvel pelo expropriante, pois que nesse momento o bem foi efetivamente transferido, expresso na Súmula 69[16] do STJ.  

Nas ações indenizações, no caso de desapropriação indireta, o Poder Público não poderá ser onerado pelo pagamento de juros compensatórios correspondentes a período anterior à aquisição da propriedade ou posse titulada pelo autor da ação, haja vista que tal modalidade de juros tem a finalidade de compensar o expropriado, dando-lhe um caráter de direito pessoal ao instituto de juros compensatórios.

 

10. PRAZO PRESCRICIONAL

         A Súmula 119 do STJ, editada sob o Código Civil de 1916, reza que “a ação de desapropriação indireta prescreve em 20 (vinte) anos.”. Ocorre que o prazo que serviu de base a essa súmula era o previsto em lei civil pretérita para a usucapião extraordinária. No atual Código Civil, a usucapião extraordinária (usucapião independente de justo título e boa-fé) ocorre em 15 (quinze) anos.

            No caso do prazo prescricional, a doutrina e a jurisprudência entendem que a ação de desapropriação indireta é uma ação de natureza real, e, por isso, não admitem que a ela se aplique o prazo prescricional de 5 (cinco) anos estabelecido no art. 1º do Decreto-Lei 20.910/32, no qual prevê a prescrição qüinqüenal das ações judiciais contra a fazenda pública.

            Não obstante essa orientação cumpre observar que o atual Código Civil, extinguiu a diferenciação entre prazo prescricional baseada na natureza – pessoal ou real – das ações por eles alcançadas.

            Em meio a tantas normas, a Medida Provisória 2.183/01 acrescentou o parágrafo único ao art. 10[17] do Decreto-Lei nº 3.365/41, estatuindo que é extinto “em cinco anos o direito de propor ação que vise indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público.”.

            Na redação adotada em reedições anteriores dessa mesma medida provisória, estava explícito que o prazo prescricional de cinco anos sujeitaria, também, a “ação de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta.”.

            O STF, liminarmente, declarou inconstitucional especificamente essa parte do dispositivo, na ADIMC 2.260/DF, de 14.02.2001. Nas reedições posteriores da medida provisória em comento, o Poder Executivo retirou do parágrafo único do art. 10 do Decreto-Lei nº 3.365/41, que ficou assim expressa “Extingue-se em cinco anos o direito de propor ação que vise a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público.”.

            Observada tais questões, conclui-se que tal parágrafo único do art. 10 do Decreto-Lei nº 3.365/41, na visão do STF, só é aplicável nas ações contra a Administração Pública que envolva os direitos de natureza pessoal.

            Verificado essas questões, abre-se possibilidade para tuas vertentes: Considerar que o prazo de prescrição da ação de desapropriação indireta passou a ser de 15 (quinze) anos, por analogia ao prazo atual da usucapião extraordinária; Entender que o prazo é de cinco anos, tendo em conta o fato de que o vigente Código Civil não mais distingue prazos prescricionais com base na natureza – real ou pessoal – da ação a que eles de refiram, o que afastaria as objeções à utilização do art. 1º do Decreto 20.910/32 para fim de determinar o prazo de prescrição das ações de desapropriação indireta.

            Sob outro óbice, segue a decisão do ano corrente do Superior Tribunal de Justiça[18] a respeito do tema:

PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. CONTRADIÇÃO. PRAZO PRESCRICIONAL. INEXISTÊNCIA. JUROS COMPENSATÓRIOS. 6% AO ANO NO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE 11.06.1997 E 13.09.2001. SÚMULA Nº 408/STJ. 3. O período compreendido entre 1975 e 1980, apontado pelo laudo pericial como provável início das obras de expansão da via pública, não foi adotado como marco inicial da prescrição porque, consoante registrado pelo aresto recorrido, pairavam dúvidas sobre o momento em que aquelas atingiram os lotes objeto da ação indenizatória. 4. O prazo prescricional da ação por desapropriação indireta é vintenário, tendo como termo a quo a data da ocupação administrativa. Súmula 119/STJ. 5. "Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória n. 1.577, de 11/06/1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001 e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula n. 618 do Supremo Tribunal Federal"(Súmula nº 408/STJ). 6. Recurso especial conhecido em parte e provido também em parte.

            E outra do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul[19], na mesma questão:

APELAÇÃO CÍVEL. DESAPROPRIAÇÃO. USINA DONA FRANCISCA. - Prescrição: a ação desapropriatória indireta tem natureza real, sujeitando-se ao prazo prescricional próprio das ações de usucapião extraordinário, que cotejado o antigo Código Civil, ao art. 550, era de vinte anos, reduzido para quinze anos pela redação do art. 1.238 do atual Código Civil. Adoção do prazo de quinze anos na casuística, inclusive para a pretensão relativa ao dano moral, porquanto o pedido acessório deve seguir a sorte do principal. Inaplicabilidade do disposto no art. 1º do Decreto n.º 20.910/32, art. 10, § único, do Decreto-lei n.º 3.365/41, e do art. 178, § 10, inciso VI, do Código Civil de 1916. Preliminares afastadas.

 

Como observado, se mantêm a idéia de prazo prescricional para a desapropriação indireta semelhante ao por usucapião, ou seja, 15 (quinze) anos, como estabelece a regra geral prevista no art. 1.238[20] do Código Civil, utilizando a mesma lógica da edição da Súmula 119 do STJ. Porém é notória a divergência doutrinária no que tange a esse tema.

 

11. CONCLUSÃO

  Percebe-se que tal instituto está sendo valorado atualmente como uma ação real, exemplificando nas situações de foro da ação, no prazo prescricional, na não dedução da parcela de indenização em virtude das melhorias no espaço do bem, na extinção do vínculo tributário municipal – IPTU – e no que tange aos juros moratórios. Porém a não intervenção do Ministério Público, a atribuição de juros compensatórios e o fato de se trata de uma ação indenizatória, com todos os seus requisitos processuais e relativos ao mérito, revelam uma característica pessoal ao mesmo.

Observa-se que tal forma de expropriar é controversa junto a Carta Magna, que prima tanto pela declaração indicativa do interesse público quanto pela indenização prévia, disposto no artigo 182 § 3º “As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro”. Posteriormente verifica-se que tal ação é coberta de efeitos de natureza contraditória que causam a insegurança jurídica. Logo, é notória a necessidade do Estado em minimizar a ocorrência de intervenções desorganizadas nos bens alheios, realizando um planejamento básico em suas ações.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Direito Administrativo - 24ª Ed. 2011 - Pietro, Maria Sylvia Zanella Di / ATLAS

Direito Administrativo Descomplicado - Série Jurídica - 19ª Ed. - 2011 - Alexandrino, Marcelo; Paulo, Vicente / METODO

Manual de Direito Administrativo - 24ª Ed. 2011 - Carvalho Filho, José dos Santos / LUMEN JURIS

Novo Curso de Direito Civil – Direito das Coisas - Vol. V - 13ª Ed. 2011 - Pamplona Filho, Rodolfo; Gagliano, Pablo Stolze / SARAIVA

Código Civil

Constituição Federal

Leis Extravagantes


[1] Artigo 5º, inciso XXIV, da Constituição Federal

[2]  34) da desapropriação amigável e das sentenças que, em processo de desapropriação, fixarem o valor da indenização.

[3] Art. 9º Ao Poder Judiciário é vedado, no processo de desapropriação, decidir se se verificam ou  não os casos de utilidade pública.

[4] Art. 15 Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de conformidade com o artigo 685 do Código de Processo Civil, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens.

[5] A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.

[6] § 3º Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação.

[7] Art. 35 Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos.

[8] Art. 82, III nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte.

[9] RE nº 111.988, 1ª Turma, Rel. Min. Sidney Sanches.

[10] Resp nº 770.559-RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, em 17.08.2006.

[11] Resp 827.613-SC, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado em 02.10.2007.

[12] Art. 15-B Nas ações a que se refere o artigo 15-A, os juros moratórios destinam-se a recompor a perda decorrente do atraso no efetivo pagamento da indenização fixada na decisão final de mérito, e somente serão devidos à razão de até seis por cento ao ano, a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do artigo 100 da Constituição.

[13] Súmula 102. A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações expropriatórias, não constitui anatocismo vedado em lei.

[14]   Súmula 408. Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória nº 1.577, de 11.06.1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13.09.2001 e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula nº 618 do Supremo Tribunal Federal.

[15]  Súmula 114. Os juros compensatórios, na desapropriação indireta, incidem a partir da ocupação, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente.

[16] Súmula 69. Na desapropriação direta, os juros compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação do imóvel.

[17] Art. 10 Parágrafo Único. Extingue-se em cinco anos o direito de propor ação que vise a indenização por restrições decorrente de atos do Poder Público.

[18] Resp 201000262918, Castro Meira, Stj - Segunda Turma, Dje Data:10/02/2011.

[19] Apelação Cível Nº 70028313609, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em 05/08/2010.

[20] Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

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Autor: Joaquim Caldas Neto


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