Artigo: Será o fim dos políticos sujos?



Artigo: Será o fim dos políticos sujos?

Roberto Ramalho é advogado, jornalista, relações públicas, blogueiro, e articulista de diversos sites

Com o placar final de sete votos a favor e quatro contra pela vigência da Lei da Ficha Limpa a partir das eleições de 2012, o Brasil deu um grande passo para afastar políticos que tenham praticado improbidade administrativa, peculato, corrupção, desvio de verbas públicas, entre tantos outros crimes.

Em entrevista concedida ao jornal O GLOBO do último dia 12.02.12, o Coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), o juiz eleitoral do Maranhão Marlon Reis afirmou taxativamente que, desta vez, "não tem choro nem vela": os candidatos não poderão provocar uma avalanche de recursos na Justiça para tentar se esquivar da Lei da Ficha Limpa. Para Marlon, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) foi clara e deu segurança jurídica ao processo eleitoral. Para o juiz, haverá uma renovação nos quadros da política nacional a partir desta eleição, e a Ficha Limpa levará os políticos a zelarem pelo "maior patrimônio que é a honra".

Os ministros do STF decidiram definitivamente por 7 votos a 4, julgar constitucional e barrar candidatos condenados por órgãos colegiados. O presidente da Corte, Cezar Peluso,  Gilmar Mendes, Celso de Mello, Dias Toffoli consideraram que a Lei da Ficha Limpa viola o princípio da presunção da inocência, segundo o qual ninguém será considerado culpado antes de condenação definitiva.

Por 6 votos a 5, os ministros chegaram a conclusão não ser exagerado o prazo fixado na lei para que permaneça inelegível o político condenado por órgão colegiado, ou seja, oito anos a contar do fim do cumprimento da pena. Cinco ministros defendiam que o prazo começasse a contar da condenação pelo órgão colegiado. Assim, quando a pena fosse cumprida, o político poderia se candidatar.

Depois de quase dois anos e 11 sessões de julgamento, isto é, desde 2010, o STF tentava concluir o julgamento da aplicação e da constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa.

Em 2011, com a posse de Luiz Fux, foi decidido que a norma só teria valor a partir das eleições de 2012. A chegada de Rosa Weber no fim do ano passado deixou o STF novamente com 11 ministros e, dessa forma, permitiu a conclusão do julgamento de constitucionalidade da lei.

Assim se pronunciaram alguns ministros do STF sobre a Lei da Ficha Limpa em plenário, durante o julgamento:

O fato de o STF julgar uma lei com ampla aceitação popular também gerou polêmica na Corte. "Essa lei recebeu mais de dois milhões de assinaturas, teve apoio unânime do Congresso Nacional e foi sancionada sem vetos pelo presidente da República", disse Lewandowski.

"Não cabe a essa Corte fazer relativizações de princípios constitucionais visando atender a anseios populares", rebateu Gilmar Mendes. "Essa vontade do povo é a mesma que elege os candidatos "ficha suja"", completou.

Outros ministros que ficaram vencidos também protestaram bastante. "Estamos fazendo tábula rasa da responsabilidade ética", disse o presidente da Corte, Cezar Peluso. Para ele, é inconcebível uma lei que imponha restrições para pessoas sobre condutas passadas para as quais não havia qualquer punição quando elas aconteceram.

"A lei não pode afetar situações pretéritas", completou Celso de Mello. "Nós sabemos que o Congresso não pode transgredir direitos e garantias fundamentais", continuou, referindo-se à garantia de alguém só ser considerado culpado após sentença final da Justiça.

Como a Lei da Ficha Limpa permite a proibição da candidatura a partir de decisão tomada em segunda instância, Celso considerou-a inconstitucional. Essa, no entanto, não foi a posição da maioria.

"O elogio que eu faço não é apenas à lei, mas à Constituição", afirmou Ayres Britto. "Está dito na Constituição que lei complementar estabelecerá os casos de inelegibilidade", completou, referindo-se à Ficha Limpa. "A nossa tradição é péssima em matéria de respeito ao erário", disse Ayres Britto. "Essa lei é fruto do cansaço, da saturação do povo com os maus tratos infligidos à coisa pública.

Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que foi autora da ação a favor da Lei Ficha Limpa, o próximo passo será o STF acabar com o financiamento privado das campanhas eleitorais.

"A lei é um passo importante para evitar que carreiristas ingressem na política com a intenção de fazer do mandato uma extensão de interesses privados", afirmou Ophir Cavalcante, presidente da entidade. "Mas, a Lei Ficha Limpa não será capaz de acabar com todos os males da política brasileira", completou.

Decidida definitivamente sua constitucionalidade, assim ficou estabelecida sua abrangência

  1. O STF definiu que a Lei da Ficha Limpa atinge casos anteriores à publicação da norma, em junho de 2010. Confira o que a lei estabelece e quem fica impedido de se candidatar;

2. Condenados por órgão colegiado: a inelegibilidade será de oito anos contados a partir do término do cumprimento da pena;

3. Aqueles que renunciaram ao mandato eletivo para escapar da cassação do cargo, a inelegibilidade será de oito anos contados da data em que terminaria o mandato;

4. Os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargo público rejeitadas a penalidade será de oito anos de inelegibilidade

5. Trabalhadores excluídos do exercício da profissão, por decisão doórgão profissional competente, como a OAB, por exemplo, ficará oito anos inelegível;

6. Os que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo administrativo ou judicial a inelegibilidade será de oito anos após a decisão;

7. Pessoas físicas e dirigentes de pessoas jurídicas responsáveis por doações eleitorais consideradas ilegais por órgão colegiado da Justiça Eleitoral a pena prevista será de oito anos de inelegibilidade após a decisão;

Magistrados e integrantes do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente a inelegibilidade será de oito anos.

Concluindo esse artigo, cito o fantástico e primeiro cientista político da idade moderna: Nicolau Maquiavel.  Afirmou ele: "Há uma dúvida se é melhor sermos amados do que temidos, ou vice-versa. Deve-se responder que gostaríamos de ter ambas as coisas, sendo amados e temidos; mas, como é difícil juntar as duas coisas, se tivermos que renunciar a uma delas, é muito mais seguro sermos temidos do que amados... pois dois homens, em geral, podemos dizer o seguinte: eles são ingratos, volúveis, simuladores e desestimuladores; eles furtam-se aos perigos e são ávidos  de lucrar. Enquanto você fizer o bem para eles, são todos teus, oferecem- te seu próprio sangue, suas posses, suas vidas, seus filhos. Isso tudo até o momento que você não tem necessidade. Mas, quando você precisar, eles viram as costas”.

A teoria do Estado de Thomas Hobbes se fundamenta da seguinte forma: quando os homens primitivos vivem no estado natural, como animais, eles se jogam uns contra os outros pelo desejo de poder, de riquezas, de propriedades. É o impulso à propriedade burguesa que se desenvolve na Inglaterra: "homo homini lupus", cada homem é um lobo para o seu próximo. Mas como, dessa forma, os homens destroem-se uns aos outros, eles percebem a necessidade de se estabelecerem entre eles um acordo, um contrato. Um contrato para constituírem um Estado que refreie os lobos, que impeça o desencadear-se dos egoísmos e a destruição mútua. Esse contrato cria um estado absoluto, de poder absoluto (Hobbes apresenta nesse texto nuanças que lembram Maquiavel).

Agora só nos resta torcer para que a lei da Ficha Limpa pegue, no bom sentido da palavra, assim como pegaram o Código de Defesa do Consumidor e a lei Maria da Penha.

 

 


Autor: Roberto Jorge Ramalho Cavalcanti


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