Uma breve reflexão sobre intenção, ideologia e psique na literatura



     Após uma breve série de leituras teóricas sobre as principais abordagens críticas à literatura, passei a ver a crítica literária muito mais como uma espécie de labirinto do que um campo aberto.

    Primeiramente, o crítico literário corre um constante perigo de reducionismo, interpretando uma obra embasado numa única corrente de pensamento, que pode acabar despindo a literatura do seu elemento ficcional intrínseco. Depois, temos que considerar o fato de que não há inteira originalidade em qualquer teoria crítica que seja, uma vez que toda nova teoria é dependente de um trabalho crítico que a antecedeu, e na maioria das vezes as teorias parecem se contradizer e muito. Apresento nas linhas abaixo uma brevíssima reflexão sobre a crítica literária psicanalítica e marxista com o intuito de reforçar o que menciono acima.

   No meu entendimento, a Crítica Marxista vê a literatura como um fenômeno social em que a ideologia 1 do autor tem um papel proeminente. Depois de ler o artigo “The Intentional Fallacy”, de Wimsatt Jr e Beardsley, e discuti-lo na minha aula de Teorias Críticas no Mestrado em Literaturas de Expressão Inglesa da Universidade Federal de Minas Gerais, cheguei a pensar que esse seria um assunto já esgotado: a obra literária está muito além das intenções do seu autor, ponto. Contudo, a Crítica Marxista parece não apenas levar em conta a intenção do escritor, como também depender desta para alcançar sua própria expressão.

   De acordo com Rivkin e Ryan, “o Marxismo considera literatura e cultura como sendo inseparáveis da política de relação de classes ” (p. 232, tradução minha). Ser inseparável da política de relação de classes, ao meu ver, significa que a literatura só pode ser entendida em termos da ideologia e intencionalidade do seu criador, o autor da obra. Pergunta-se: o que fazer, então, com o conceito da falácia intencional? Seria este também uma falácia?

   Já a Crítica Psicanalítica considera a literatura como uma obra de sonho, que deve ser revertida a fim de se alcançar os pensamentos latentes em sua base. E novamente vem à baila o assunto da intenção do autor, uma vez que não faz sentido falar em pensamentos latentes sem levar em conta aquele que pensou e criou a obra.

   O que parece ocorrer no campo, ou melhor, no labirinto da crítica literária é uma mera mudança de nomenclatura. O que os neocríticos consideram intenção, os marxistas consideram ideologia e os críticos psicanalistas entendem como psique.  Três palavras diferentes com um significado praticamente igual. Duas teorias diferentes, porém cúmplices uma da outra, uma vez que ambas parecem recorrer bastante ao autor para legitimar o que afirmam.

 

1  Tomo “ideologia” no sentido de uma consciência imposta, um conjunto de crenças determinadas pelos membros dominantes de uma sociedade.

 

Referências

Murfin, Ross, ed. Joseph Conrad Heart of Darkness: A Case Study in Contemporary Criticism.New York:St. Martin’s Press, 1989.

Rivkin, Julie, and Michael Ryan, eds. “Starting With Zero: Basic Marxism”. Literary Theory: An Anthology. GB: Blackwell Publishers Ltd., 1998. 231-240.

 

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Autor: Osvando De Melo Marques


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