Biotecnologia e a biologia



BIOTECNOLOGIA E A BIOLOGIA

 

CÂMARA, CLÉA MÁRCIA PEREIRA[1]

 

INTRODUÇÃO

 

A Biologia tem tido grandes avanços nos últimos anos, muito se ouve falar de alimentos transgênicos ( leia-se soja) , clonagens ( leia-se Dolly ), alimentos geneticamente modificados, etc.,  e isso está relacionado com a Biotecnologia.

           

A Biotecnologia pode ser entendida como qualquer técnica que utilize organismos vivos ( ou partes deles) para produzir ou modificar produtos, para melhorar plantas e animais ou desenvolver microorganismos para uso específicos. Portanto, pode se concluir que a humanidade vem utilizando a biotecnologia há milhares de anos. O uso de microorganismos na fabricação do pão, de bebidas fermentadas e do queijo que é exemplo das atividades biotecnológicas. Várias foram as descobertas que ajudaram a consolidar a biotecnologia, dentre elas a dos organismos vivos que são formados por unidades estruturais, hoje denominadas células, a do desenvolvimentos das primeiras vacinas, a dos antibióticos e da elucidação de como as características genéticas são herdadas. O reconhecimento do DNA como material genético, o entendimento da sua estrutura e funcionamento, a elucidação do código genético e a possibilidade da manipulação consciente do DNA por meio da Engenharia genética deram impulso à Biotecnologia.

           

A pesquisa foi desenvolvida sob forma de revisão literária com objetivos entre conceituar o que é Biotecnologia, fazer um breve levantamento histórico dos avanços da Biologia através da Biotecnologia,  sem deixar de  observar  a revolução gênica,  melhoramento genético,   os transgênicos,  e os recursos da Biotecnologia, uma vez que  informação é a melhor maneira de nos posicionarmos perante essa nova face da biotecnologia que, certamente,  já está presente em nossas vidas.           

1 O QUE É BIOTECNOLOGIA

 

Biotecnologia é daqueles jargões que, de tanto ser utilizados, acaba perdendo o seu significado original. O termo foi inicialmente usado pelo engenheiro húngaro Karl Ereky, em 1919, para referir a “todas as linhas de trabalhos, cujos produtos eram produzidos a partir de matéria bruta com o auxílio de organismos vivos”.

 

Nos dia atuais, pode-se definir biotecnologia de dois modos : um mais amplo e outro mais restrito. De um modo mais amplo, a biotecnologia refere-se a qualquer técnica que utilize organismos vidos ( ou parte deles), para produzir ou modificar produtos, para melhorar plantas e animais ou para desenvolver microorganismos para uso específicos. Nesse sentido o homem vem utilizando a biotecnologia desde os primórdios da humanidade. A partir do momento que começou a domesticar animais e plantas, a utilizar plantas medicinais para curar seus males, microorganismos para fabricar bebidas e alimentos e a produzir vacinas para se imunizar contra doenças, o homem estava desta forma praticando a biotecnologia. Há evidências arqueológicas de que o uso  consciente de organismos vivos pelo homem data de 5.000 a 10.000 anos a.C. Portanto, a biotecnologia é tão antiga quanto a própria humanidade.

 

De um modo mais restrito, o termo biotecnologia vem sendo mais recentemente utilizado para designar as técnicas advindas da Bioquímica e Biologia molecular que podem trazer benefícios aos seres humanos. Os grandes avanços na área da Biologia molecular a partir da década de 70, com a capacidade de manipulação e transferência de informação genética entre seres vivos de espécies diferentes por vias não sexuais, abriram novas possibilidades na área de Biotecnologia, culminando no desenvolvimento de organismos geneticamente modificados (OGMs) ou organismos transgênicos. O termo “Engenharia Genética” que se refere a essas técnicas de manipulação genética tem sido utilizado por muitas pessoas como sinônimo de biotecnologia. Mesmo no sentido restrito, biotecnologia é bem mais do que simplesmente Engenharia genética. Há nesse caso uma simplificação exagerada do que vem a ser biotecnologia. Os avanços da Genética, Biologia Molecular, Bioquímica e Microbiologia colocaram uma série de ferramentas à disposição do homem, permitindo o desenvolvimento de metodologias que têm um impacto direto no bem–estar da humanidade, mesmo não envolvendo a manipulação direta do material genético,  isso é a Engenharia genética. São exemplos desses avanços : as vacinas, os antibióticos, como a penicilina, a cultura de tecidos e, até mesmo, a clonagem de plantas e de animais. Nenhum desses exemplos depende diretamente da Engenharia Genética e nem por isso deixam de ser avanços biotecnológicos.

 

 2 MARCOS HISTÓRICOS DA BIOTECNOLOGIA

 

Há, aproximadamente, 10.000 anos os nossos ancestrais já utilizavam o processo de fermentação microbiana para produção de vinho, cerveja e pão. Na fermentação, microorganismos como bactérias e fungos digerem os alimentos e produzem dois subprodutos de interesse para o homem – o gás carbônico e o álcool. Na  fabricação da cerveja, leveduras quebram o amido e açucares presentes em cereais como a cevada, e produzem energia para a sua sobrevivência e também o álcool e o gás carbônico como subprodutos. O álcool é um dos responsáveis pelo aroma da bebida e o gás carbônico, pela espuma que ela forma. Na fabricação do pão, o processo é semelhante. No entanto, neste caso, normalmente utiliza-se o trigo como fonte de amido e açucares. O álcool é responsável pelo aroma do pão, o gás carbônico promove o aumento do volume da massa pela formação de ar no seu interior.  

 

No campo da Biologia celular, Robert Hooke, em 1665, observou pela primeira vez, em um microscópio, a estrutura celular da cortiça. Percebeu que esse tecido vegetal é formado por estruturas regulares parecidas com as células presentes em um favo de mel. No entanto, somente quase 200 anos mais tarde foi que outros cientistas, utilizando melhores microscópios, concluíram que todos nós somos divididos nesses pequenos compartimentos que hoje denominamos “células”. Anton van  Leeuwenhoek ( 1632 – 1723 ), um mercante holandês que tinha como hobby polir as suas próprias lentes de vidro, fez várias descobertas em Microbiologia. Foi o primeiro cientista a descrever seres unicelulares como protozoários e bactérias, e a reconhecer que esses microorganismos poderiam desempenhar algum papel no processo de fermentação.

 

No campo da Microbiologia e Imunologia, Giocomo Pylarini , em Constantinopla em 1701, praticava a “inoculação” , que consistia  na exposição intencional de crianças à varíola para evitar problemas mais sérios na fase adulta. Em 1798, Edward Janner publicou um livro comparando vacinação com inoculação. Na vacinação as pessoas eram expostas  à varíola bovina para induzir a resistência à varíola humana.

 

Louis Pasteur (1822 – 1985) afirmou que os micróbios eram responsáveis pelo processo de fermentação. Em 1863, inventou o processo de pasteurização, que consistia, inicialmente, em  aquecer o vinho suficiente para alterar a seu aroma. Em 1880, estudando a cólera em aves, concluiu que cepas atenuadas ou enfraquecidas de microorganismos não conseguiam causar doenças, mas protegiam contra formas severas dessa mesma doença. Em 1881, usou  a atenuação para desenvolver vacinas contra a cólera em aves, e antraz . Esse foi um marco expressivo na área de Imunologia, abrindo novas fronteiras no campo da Medicina preventiva.

 

Entre 1873 e 1876, Robert Koch desenvolveu técnicas para visualizar, crescer e corar microorganismos. Em 1881 descreveu colônias de bactérias crescendo em uma fatia de batata, em meio contendo gelatina e em ágar. Este último tornou-se um meio padrão para obtenção e crescimento de culturas puras e a identificação de microorganismos mutantes. Alguns consideram ter sido   esta a principal descoberta que alavancou o desenvolvimento da Microbiologia. Robert Koch, em 1882, usando o porquinho-da-índia como hospedeiro alternativo descreveu a bactéria que causa a tuberculose em humanos. Ele foi o primeiro a desvendar a causa de uma doença humana de origem microbiana.

 

Ronald Ross, no ano de 1896,  descobriu o protozoário Plasmodium, que  causa a malária  em humanos. Demonstrou também que o mosquito Anopheles transmite a doença  para outra pessoa. Em 1909, Carlos Chagas, identificou o agente causador da doença de chagas, o protozoário Trypanosoma cruzi. Na  realidade, seu trabalho abrangeu todos os aspectos da  doença : anatomia patológica, epidemiolgia, formas clinicas, meios de transmissão, patogenia, profilaxia e sintomatologia.

 

Alexandre Fleming observou a formação de um halo em uma  placa de Petri, onde havia bactérias em crescimento no ano de 1928. Nesse halo, as bactérias não cresciam. No centro dele constatou a presença de um fungo que produzia uma substância, mais tarde denominada de penicilina, que matavam as bactérias. Decorreram quase 15 anos para que o antibiótico penicilina, em plena Segunda Guerra Mundial, se tornasse disponível à comunidade para o uso médico, salvando inúmeras vidas.

 

No campo da Genética e Biologia molecular, em 1865, o monge agostiniano Gregor Mendel ( 1822 – 1884 ), com base nos seus trabalhos com ervilhas, apresentou à Sociedade da Ciência Natural da Áustria, suas leis da hereditariedade. Mendel propôs que unidades internas invisíveis eram responsáveis pelas características observáveis e que esses “fatores”, o qual denominou hoje de genes, eram passados de uma geração para outra. Os achados de Mendel, no entanto, não foram  devidamente apreciados até 1900, quando Hugo de Vries, Erich von Tschermak e Carl Correns publicaram os resultados de suas pesquisas que confirmaram os mecanismos da hereditariedade proposto por Mendel. Hoje ele é considerado o “pai da Genética” e  o seu trabalho é a base desta ciência e de outras áreas do conhecimento que dela derivaram, como é o caso da Biologia molecular.

 

Em 1902, Walter Stamborogh Sutton afirmou que os cromossomos ocorrem aos pares e sugeriu  que os fatores de Mendel estavam localizados nos cromossomos. Após observar os movimentos dos cromossomos durante a meiose, Sutton desenvolveu a teoria da hereditariedade, a qual ia de encontro as idéias de Mendel a respeito da segregação dos fatores genéticos.

 

Thomas Hunt Morgam  em 1907, iniciou seus trabalhos com as mosca-das-frutas Drosophila e demostrou que os cromossomos têm um papel definitivo na hereditariedade. Formulou a teoria da mutação e estabeleceu as bases para o entendimento dos mecanismos da hereditariedade.

 

Hermann Muller descobriu no ano de 1926 que os raios X poderiam induzir mutações na mosca-das-frutas cerca de 1.500 vezes mais rápido do que em condições normais. Essa descoberta forneceu uma ferramenta poderosa aos pesquisadores para introduzir mutações e, dessa forma, determinar as funções específicas de diversos genes.

Frederick Griffith observou em 1928 que bactérias com paredes celulares rugosas podiam ser transformadas em células com paredes lisas, quando estas eram mortas pelo calor e depois misturadas às primeiras. Ou seja, um princípio transformante, proveniente das bactérias com paredes lisas, era capaz de modificar o aspecto daquelas com paredes rugosas.      

 

Em 1944, Oswald Theodore Avery, Colin Macleod e Maclyn McCarty determinaram que o princípio transformante, primeiramente observado por Griffith era na realidade o DNA (ácido desoxirribonucléico). Portanto, o DNA, que está contido nos cromossomos, seria o material genético da célula, o responsável pela transmissão dos caracteres hereditários. Inicialmente, uma boa parte da comunidade cientifica da época não acreditou que o DNA, uma molécula de composição tão simples e aparentemente, monótona, pudesse ser o material genético. Seria mais lógico que as proteínas, com sua composição e estrutura mais complexas, contivessem a informação genética. Aos poucos essa dúvida foi sendo  dissipada. Em 1952, Alfred Hershey e Martha Chase, utilizando um tipo de vírus que infecta bactéria (Bateriófagos), marcaram radioativamente o DNA do vírus e confirmaram que era o DNA que era injetado na bactéria, promovendo o aparecimento de novas partículas virais. Esse resultado confirmou o papel do DNA como material genético e refutou a idéia de que as proteínas  teriam essa função.

 

Janes Watson e Francis Crick, no ano de 1953, com bases em dados de seus antecessores e de seus contemporâneos como Maurice Wikens e Rosalind Francklin, propuseram o modelo que explicava a estrutura da molécula de DNA. E esse foi um verdadeiro marco na história da Genética e Biologia molecular, pois reuniu de um modo inteligente uma série de conceitos que havia sido desenvolvida ao longo de vários anos. De acordo com o modelo, a molécula de DNA seria formada por duas fitas de nucleotídeos ( unidades estruturais ), que se completariam e se enrolariam na forma de uma escada em espiral . O modelo não só explicou a estrutura da molécula mas também sugeriu o modo pelo qual ela seria capaz de se auto-duplicar e de transferir a informação genética nela contida.

 

Em 1957, Mathew Meselson e Franck Stahl demostraram o mecanismo de replicação de do DNA, ou seja, como c células pode produzir duas novas moléculas de DNA a parir de uma nova molécula de DNA preexistente. Na década de 60, Nirenberg, Leder e Khorana elucidaram o código genético, isto é, a correspondência precisa entre a sequência de nucleotídeos do DNA e a de aminoácidos nas proteínas. Sabemos hoje que as proteínas são codificadas por genes específicos que determinam as seqüências dos seus aminoácidos. Essas seqüências irão contribuir diretamente para  a determinação das estruturas e consequentemente funções de proteínas.

 

Paul Berg em 1972, isolou e empregou em enzima de restrição para cortar uma molécula de DNA ligase para ligar fragmentos de DNA, produzindo uma molécula circular híbrida, a primeira molécula de DNA recombinante.  Nesse mesmo ano, os primeiros experimentos bem sucedidos sobre clonagem de fragmentos de DNA em bactérias foram feitos na Califórnia (EUA).  Neste caso, a clonagem envolve o isolamento de um fragmento de DNA, sua ligação a uma molécula circular denominada plasmídeo e a sua inserção (transformação) e multiplicação na bactéria.

 

No ano seguinte, em 1973, Stanley Cohen, Anni Chang e Hebert Boyer produziram um plasmídeo recombinante que continha pedaços de DNA de bactéria e de vírus e o introduziram em uma bactéria, produzindo o primeiro organismo recombinante feito, de modo consciente, pelo homem. Em 1976, Hebert Boyer e Robert Swanson fundaram a Genentech, primeira empresa de biotecnologia dedicada a desenvolver e a comercializar produtos com base na tecnologia do DNA recombinante recém-desenvolvida. Em 1977, a Genentch anunciou a primeira proteína humana a ser fabricada por bactérias, a somatostatina. Muitos consideram esse advento da era da moderna biotecnologia. Em 1978, foi anunciada a produção, em laboratório, da insulina humana obtida pela técnica do DNA recombinante.

 

Nesse mesmo ano, David Botstein  e colaboradores descobriram que, quando o DNA de diferentes pessoas era cortado com enzimas de restrição, os fragmentos obtidos, quando separados por ordem  de tamanho, geravam padrões que diferiam de pessoa para pessoa. Esses padrões podem ser utilizados para identificar, de modo preciso, pessoas,  animais, plantas, microorganismos. Têm sido utilizados, por exemplo, nos testes de paternidade, tão comuns nos dias atuais. Os fragmentos obtidos também podem ser utilizados como marcadores moleculares, ou seja, marcadores de características de interesse, como resistência a doenças, como produtividade, desde que seja demonstrada a sua associação com essas características. Nesse caso, passa a Ter uma importância muito grande como ferramenta auxiliar no processo de melhoramento de planas e animais na seleção de indivíduos.

 

Em 1980, a Corte Suprema dos Estados Unidos admitiu que os OGMs poderiam ser patenteados, quando autorizou a empresa de petróleo Exon a patentear uma bactéria especialmente desenvolvida para degradar petróleo. Essa decisão foi o aval necessário para que as grandes corporações iniciassem a grande corrida que vemos hoje em busca do desenvolvimento e patenteamento dos OGMs.

 

Nesse mesmo ano, Kary Mullis e colaboradores inventaram uma técnica molecular revolucionária que permite produzir milhões de cópias de fragmentos de DNA em um pequeno tubo no laboratório. Essa técnica, denominada Reação em cadeia da Polimerase (PCR), é atualmente utilizada em várias aplicações em Biologia molecular, desde a amplificação de fragmentos de DNA de múmias de 4.000 anos de idade, até os testes de paternidade.

 

Em 1981, pesquisadores da universidade de Ohio, nos Estados Unidos, produziram os primeiros animais transgênicos, transferindo genes de outros animais para óvulos de fêmeas de camundongos.

 

A  Agência de Controle de Alimentos e Drogas (FDA), norte-americana, em 1982, autorizou a comercialização do primeiro produto farmacêutico para consumo humano derivado da Engenharia genética, uma forma de insulina humana produzida por bactérias. Em 1986, a Agência de Proteção ao Ambiente (EPA), norte-americana, liberou a primeira planta geneticamente modificada, o tabaco. Em 1990, a empresa Calgene Inc. conduziu em campos experimentais os primeiros ensaios  bem-sucedidos de variedades de algodoeiros geneticamente modificadas para tolerar herbicida bromoxinil.

 

Também no ano 1990, o pesquisador Michael Fromm comunicou que havia transformado o milho de modo estável, introduzindo em sua células fragmentos de DNA de outra espécie por meio da técnica de biobalística. Esse método consiste no bombardeamento de células com fragmentos de DNA embebidos em partículas de metais como ouro ou tungstênio. O bombardeamento é feito sob alta pressão, com ar comprimido, e permite que o DNA a travesse o sistema de membranas da células, indo se alojar no núcleo, onde pode, eventualmente, integrar –se ao material genético da célula. Esse método tornou-se rotineiro para a obtenção de organismo transgênicos.  

 

Ainda nesse mesmo ano, foi iniciado o projeto do genoma humano, com o objetivo de sequenciar todo o material genético humano, isto é, desvendar a ordem dos aproximadamente três bilhões de nucleotídeos que constituem a base estrutural do DNA humano. Uma vez conhecida a ordem dos nucleotídeos do DNA, é possível deduzir as seqüências dos aminoácidos que compõem as nossas proteínas e, eventualmente, as funções.

 

Em 1993, o FDA norte-americano declarou que os alimentos feitos a partir de OGMs não são perigosos em si e que, portanto, não necessitam de regulamentação especial. Em 1994, o FDA aprovou o primeiro alimento derivado de OGMs, o tomate Flavr Savr. Nesse tomate havia sido introduzido um seguimento de DNA que inibia a expressão de enzimas que normalmente promovem o amolecimento do fruto, de tal forma que o tomate transgênico apresentava uma “vida de prateleira” mais longa que o tomate normal.

 

Nesse mesmo ano, foram identificado vários genes ( segmentos de DNA) relacionados com diversas anomalias e outras características de interesse para o homem, tais como o câncer  de mama, câncer da tireóide, câncer de próstata, melanoma, surdez, dislexia, predisposição à obesidade, morte celular programada, diferenciação celular, reprodução de vírus que causa a AIDS, entre outras.

 

Em 1995, foi anunciada a conclusão do primeiro sequenciamento completo do genoma de uma bactéria, a Haemophilus influenzae. Em 1996, um grupo de cientistas anunciou a conclusão do sequenciamento do genoma de um organismo complexo, a levedura Saccharomyces Cereviae. Em 1997, pesquisadores escoceses anunciaram a clonagem da ovelha Dolly. O processo consistiu na remoção do núcleo  ( que contém DNA ) de um óvulo e a introdução, no seu lugar do núcleo de uma célula adulta. O óvulo foi então implantado no útero de uma outra ovelha, uma mãe de aluguel, e a ovelha Dolly foi concebida, com toda a bagagem genética da ovelha – mãe que forneceu o núcleo. Esse experimento abriu a possibilidade da clonagem de animais. No entanto, deve–se salientar que, na época, a clonagem de plantas já era um conceito consolidado na área vegetal .

 

Todos esses eventos e outros ajudaram a consolidar a biotecnologia. As pesquisas continuam. Atualmente, existem mais de 1.200 companhias de biotecnologia somente nos Estados Unidos. Centenas de novos remédios, Kits – diagnósticos, biopesticidas, plantas transgênicas e vacinas estão em testes e muitos já estão sendo comercializados.

 

3 BIOTECNOLOGIA NA AGRICULTURA

 

3.1  Crescimento Populacional versus Demanda por Alimentos  e  Fibras

 

Em 1998, ocorreu o bicentenário da famosa publicação de Malthus An Essay   on the Principle of Population que argumentava não ser a agricultura capaz de aumentar a produção de alimentos de forma suficientemente rápida para atender às necessidades do crescimento populacional do planeta e que, portanto, os seres humanos seriam condenados à pobreza, à fome, e a vários tipos de pestes e de vícios. As preocupações Malthusianas têm sido avaliadas por muitos cientistas de várias áreas do conhecimento desde aquela época. Atualmente, as discussões a respeito do crescimento da população mundial e do suprimento de alimentos estão recheadas de preocupações, cada vez mais crescentes, a respeito das conseqüências ecológicas e ambientais provocadas pela expansão da produção de alimentos, que visa alimentar um número cada vez maior de seres humanos.

 

Em 1968, um biólogo da Universidade de Stanford chamado Paul Elrich publicou um pequeno livro denominado The Population Bomb. Esta publicação enfatiza os perigos do rápido e contínuo crescimento da população mundial, especialmente nos países menos desenvolvidos. Naquele mesmo ano, J. George Harrar, presidente da Fundação Rockfeller, proferiu uma palestra no Primeiro Encontro Internacional de Fitopatologia, ocorrido em Londres, em que enfatizou a necessidade de os cientistas auxiliarem na solução dos problemas persistentes na humanidade, tais como guerras, fome, pobreza, doenças, ignorância, diferenças sócio – culturais, e a superpopulação . Harrar mencionou que havia naquele ano 3,5 bilhões de pessoas no planeta e antecipou que esse número seria de 6 bilhões no ano de 2000 ( marca essa registrada no dia 12 de outubro de 1999). Harrar também apontou para urgente necessidade de aplicação das novas descobertas das Biologias molecular e celular para a produção de alimentos.

 

Desde 1968, grandes mudanças ocorreram no complexo de variedades cultivadas, dentre elas a educação do fazendeiro, as técnicas de manejo e uso do solo, o sistema de crédito agrícola, a extensão agrícola, os sistemas de irrigação, e o uso de agrotóxicos e fertilizantes. Dessa forma, a produção, distribuição e acesso a alimentos têm reduzido a porcentagem estimada da população cronicamente desnutrida em várias regiões do mundo, exceto ainda em algumas regiões da África. No entanto, mesmo com toda tecnologia, estima-se que cerca de um bilhão de pessoas ainda sofra de desnutrição no mundo atual.

 

Atualmente, a população mundial é de 6 bilhões de pessoas e está aumentando em aproximadamente, 80 milhões ao ano. Se este crescimento anual continuar com uma taxa de cerca de 1,4%, a população dobrará em 50 anos.  Contudo, a maioria dos demógrafos não acredita nessa predição, tendo em vista que a taxa e crescimento da população tem caído nos últimos anos. Mesmo assim, é plausível predizer uma população entre nove a dez bilhões de pessoas no ano 2050.

 

Vários estudos e simpósios internacionais têm sido realizados para discutir questões relacionadas com a produção de alimentos de forma sustentável no mundo . No entanto, muitas questões permanecem sem respostas satisfatórias, tais como:

a)    Veracidade das estatísticas sobre a extensão da fome no mundo;

b)    Extensão da desertificação e da quantidade de terra que é usada para a agricultura;

c)    Tamanho do efeito da erosão do solo na agricultura em várias partes do mundo;

d)    Quantidades de carbono e nitrogênio que devem ser restituídas ao solo para manter sua fertilidade;

e)    Tempo de persistência e eficiência de proteínas pesticidas, tais como a endotoxina do Bacillus thuringiensis, no controle de inseto – praga;

f)      Uso de direitos de propriedades intelectual, de forma que venha o otimizar os interesses das grandes firmas de  biotecnologia dos países desenvolvidos com as necessidades dos pequenos agricultores dos países em desenvolvimento;

g)    Eficácia no fluxo de informações a respeito de novas práticas agrícolas e de distribuição de sementes melhoradas aos agricultores, em países com diferentes níveis de educação e de sofisticação tecnológica.

 

3.2 Biotecnologia na Produção de Alimentos e Fibras

 

A biotecnologia vegetal apresenta direções otimistas a respeito de vários aspectos da produção e distribuição de alimentos no mundo. Entre estas predições têm sido ciadas : melhoria genética da qualidade dos alimentos, a fim de atingir os requerimentos nutricionais do homem e de animais domésticos,  e criação de variedades tolerantes a deficiência de nutrientes e a estresses do ambiente.

 

Tem sido apontado que uma das principais vantagens da biotecnologia de plantas é que ela pode gerar estratégias de melhoramentos que são aplicáveis a diferentes culturas. Nesse sentido, as estratégias da engenharia genética que conferem resistência a vírus, proteção contra insetos e amadurecimentos retardado de frutos são bons exemplos, que podem beneficiar diferentes culturas. Plantas transgênicas de mais de 20 espécies já foram produzidas com resistência a mais de 30 diferentes viroses. Variedade de plantas protegidas contra insetos, com o uso da endotoxina de Bacillus thuringiensis já foi produzida para diversas espécies vegetais de importância, incluindo tabaco, tomate, batata, algodão, milho, cana-de-açúcar e arroz. Destas, as culturas de milho, de algodão e de batata transgênica, protegidas contra insetos, já estão sendo comercializadas. Essas estratégias podem ser usadas para muitas outras plantas de importância para países em desenvolvimento. Em particular, a estratégia de Engenharia genética que promove o amadurecimento retardado de frutos apresenta enorme potencial para uso em frutos tropicais, que estão sujeitos a perda considerável em virtude de sue amadurecimento rápido e da falta de condições apropriadas de armazenamento e transporte que permitam distribuição e comercialização eficientes.

 

Até o momento, a maioria das tecnologias de transferência de genes em plantas e as diferentes estratégias usadas para produzir variedades de plantas transgênicas têm sido direcionadas pelo valor econômico das espécies e das características. O valor econômico é por sua vez determinado pela importância da espécie  e da característica para a agricultura do mundo desenvolvido, isto é Estados Unidos e países da Europa Ocidental. A ênfase econômica é entendida, uma vez que investimentos vultuosos são necessários para desenvolver, testar em campo experimentais e comercializar as novas variedades de plantas transgênicas. No entanto, em termos de produção global de alimentos, é necessário assegurar que essas tecnologias sejam efetivamente transferidas para o mundo em desenvolvimento e introduzidas em outras culturas e variedades locais. Os dados do quadro  I mostram que as características comerciais de interesse estão mudando rapidamente da primeira para a Segunda geração de plantas transgênicas. Na primeira geração, a maioria das características envolvia um único gene, tais como tolerância a herbicida e proteção a insetos – praga. Na Segunda geração de plantas transgênicas, a grande ênfase tem sido dada para a característica de qualidade do produto, o que implica na transferência simultânea de mais de um gene.

 

A fim de atender às necessidades da crescente população mundial, sem destruir, cada vez mais a frágil ecologia do nosso planeta, temos que encontrar meios e métodos mais eficientes para aumentarmos a produção de alimentos e fibras.

 

As metodologias do melhoramento tradicional foram e ainda continuarão a ser usadas com este propósito, mesmo com o advento de planas transgênicas. As variedades transgênicas terão de ser adaptadas aos seus ambientes de cultivo por métodos tradicionais de melhoramento. Porém, a fim de criar um nível de produção requerido para alimentarmos um número cada vez maior de pessoas, teremos que utilizar ferramentas da biotecnologia moderna, tais como a Engenharia genética de plantas.                

 

 

QUADRO I – Histórico de dados de solicitações para realização de testes de      

                      Campo  nos  Estados  Unidos,  em  intervalos  de três anos, no     

                      No período 1987-1999, subdividido  de acordo com a categoria  

                        Do material transgênico ( valores expressos em porcentagens).

 

                                                                                                Ano

Categoria

                                                                       1987     1990      1993   1996   1999

Tolerância a herbicida                               67           22          33        24       24

Proteção  contra insetos                           22           21          22        23         9

Resistência contra a vírus                        11          29           16        16         -

Resistência a bactérias                             -                5             2          1         -

Resistência a fungos                                -                4             4          8        6

Características agronômicas                    -              3              2         3        6

Qualidade do produto                                -              8            18       17      52

Genes marcadores                                                -              3              1         3         -

Resistência a nematóides                                    -              -             <1         -         -

Outros                                                           -              6              2         5        3

FONTE: Dunwell (1999).

 

3.3 Tipos de Plantas Transgênicas já Existentes

 

Um dos primeiros caracteres introduzidos em plantas por Engenharia genética foi a resistência a insetos, utilizando o gene que codifica a toxina de Bacillus thurungiensis (Bt). O gene Bt, que foi transferido para o milho, confere a resistência ao “European com borer” ( importante praga do milho nos Estados Unidos)

 

Outra característica introduzida no milho e na soja foi a tolerância ao herbicida glifosato, criando as cultivares Round-up Ready. O uso  dessa tecnologia tem mostrado ser altamente eficiente no controle de plantas daninhas. Além disso, criou-se a oportunidade de intensificar o uso das técnicas de plantio direto na agricultura, com todos os seus já conhecidos benefícios ( controle da erosão do solo, melhoria da qualidade do solo e da água, e menor perda de matéria orgânica).

 

Os genes de Bt. E de tolerância ao glifosato foram  também introduzidos em algodão. Nos Estados Unidos, as variedades de algodão Bt. e Bt/Round-up Reaady têm-se mostrado mais produtivas e de menor custo de produção. No entanto, a fim de tirar o máximo proveito destes genes, a cultura deve ser bem manuseada. Por exemplo, a aplicação do herbicida  glifosato em algodão deve ser antes do quarto estádio foliar. Se aplicado depois, promove uma redução drástica no número de maçãs florais.

 

Outra característica que tem demostrado ser de grande valia é a transformação genética de plantas, visando à macho - esterilidade, o que viabiliza a obtenção de sementes híbridas. Por exemplo, já estão disponíveis linhagens de canola com gene indutor da macho – esterilidade ( gene barnase) e restaurador da fertilidade ( gene barstar ) e, ao mesmo tempo, tolerantes ao herbicida glufosinato. Os híbridos transgênicos produzem de 10% a 20% a mais que os controles.

 

Existem muitos genes sendo testados para transformação de plantas que condicionam:

a)    Resistência a doença causada por vírus, fungos, bactérias e nematóides;

b)    Mudanças na composição do amido, de proteínas e de óleos;

c)    Produção de anticorpos e de produtos farmacológicos.

 

A grande utilidade da tecnologia de plantas transgênicas, ainda em desenvolvimento, consiste em transformar plantas com genes que controlam caracteres complexos, como aqueles que afetam a adaptação de uma determinada cultura a diversos ambientes, o desenvolvimento e a morfogênese, a regulação do florescimento e, por último produtividade como um todo.

 

4 TRANSGÊNICOS  - NOVA ERA DE SOLUÇÕES

 

Os alimentos que consumimos as roupas que usamos e o ar que respiramos dependem do reino vegetal – as plantas. A Biotecnologia vegetal é uma extensão do melhoramento convencional de plantas. Ela pode ser considerada como uma nova maneira fazer, de forma mais precisa, uma atividade que o homem iniciou há, aproximadamente, 10 mil anos  - selecionar tipos com características superiores (Borém, 1998) .

 

Na década de 80 foi marcada por debates sobre possíveis benefícios da Biotecnologia para a agricultura . O entusiasmo  com o assunto, naquela época, levou tanto leigos quanto letrados a discorrerem sobre o assunto na mídia. O resultado foi a forma da expectativa de que a Biotecnologia resolveria todos os problemas da agricultura, como um toque de mágica. O tempo passou e as frustrações marcaram o início da década de 90. Hoje já mostra os seus resultados iniciais. Os primeiros produtos comerciais gerados pela Engenharia genética chegaram às prateleiras dos supermercados em 1996, nos Estados Unidos ( Borém et al, 1999) . Desde então, vêm sendo colocados no mercado organismos ( produtos) geneticamente modificados ( OGMs) de várias espécies, como soja, batata, milho, cana-de-açúcar, algodão, mamão, canola, fumo, dentre outros.

 

Hoje o que se observa, na mídia nacional,  é o debate e o questionamento dos riscos de utilização dos alimentos transgênicos para a saúde humana e animal e para o meio ambiente. A celeuma atual é se os transgênicos são a solução ou a ameaça.

 

Inicialmente, precisa entender o que são as variedades transgênicas. Os transgênicos como são freqüentemente chamados, são variedades desenvolvidas pela introdução de genes de outras espécies, por meio das técnicas da Engenharia genética. Por exemplo, uma variedade transgenica de milho pode ser obtida pela introdução de genes de bactérias, fungos, ou de outras espécies, como arroz ou feijão, visando ao desenvolvimento de uma variedade com maior valor nutricional, ou,  ainda, mais resistente a uma praga.

 

A questão dos transgênicos deve ser analisada sob uma ótica não tendenciosa, isto é, sob uma perspectiva holística e de interesse do país, conforme se segue:

a)    Soberania tecnológica: durante muitos anos, sob a fachada de que a reserva de mercado na área da Informática era estratégica para o Brasil, nossos melhores cientistas foram privados de equipamentos que viabilizassem o desenvolvimento de sftwares–área em que o país é reconhecido. Foram feitos pesados investimentos no treinamento de pessoal e em infra – estrutura em Biotecnologia, durante os últimos 20 anos. O Brasil não deve fechar as portas para uma tecnologia que pode aumentar a competitividade de seus produtos agrícolas, podendo torná-los de melhor valor nutritivo, ou mesmo contribuir para a redução da poluição ambiental. Embora as variedades transgênicas, que estão em fase de discussão quanto ao plantio no Brasil, tenha sido desenvolvidas no exterior, no caso das espécies de importância teriam que ser desenvolvidas aqui. Todos estes possíveis benefícios devem, entretanto, ser avaliados à luz da biossegurança;

b)    Moral: muitas críticas feitas aos transgênicos baseiam-se apenas em aspectos morais. Alguns simplesmente acham imoral remover fragmentos de DNA de um organismo e introduzi-lo em outro organismo. Não se pode ignorar os benefícios da biotecnologia  para o bem – estar do homem. Na área da saúde humana, são as bactérias transgênicas que produzem a insulina utilizada por diabéticos, tanto no Brasil quanto em outros países; 

c)    Interesses econômicos : o comércio internacional encontra-se segmentado em dois mercados. Em um, o mercado está disposto a pagar ágio pelos produtos não-transgênicos, em outro, não faz acepção quanto a este aspecto. Alguns importadores europeus não compraram soja de países que plantam variedades transgênicas. Sob alegação de estratégia comercial, alguns advogam que o Brasil deveria banir os transgênicos, para conquistar os clientes dispostos pagar ágio pela soja não-transgênica. Esta estratégia deve ser cuidadosamente analisada uma vez que o custo de produção da soja não-transgênica é maior, o que pode significar menor lucratividade para o agricultor brasileiro;

d)    Rotulagem: a Food and Agriculture Organization (FAO), organismo da ONU que se dedica à agricultura de rotulagem apenas para os produtos transgênicos que não forem similares aos convencionais. Mais importante do que a discriminação dos alimentos transgênicos por meio da rotulagem, é a questão da sua biossegurança para o consumidor.  Há mais de 20 anos o brasileiro consome, sem saber queijo produzido com bactérias (coalho9 transgênicos, que produzem uma enzima típica de bovinos. Como o queijo bovino não oferece riscos a saúde humana, sua rotulagem tornou-se dispensável;

e)    Biossegurança: ela avalia os riscos de um produto para a saúde humana e animal, e para o meio ambiente. Criada em 1995 no Ministério da Ciência e Tecnologia, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança ( CTNBio ) tem o propósito de avaliar os riscos da utilização de transgênicos no Brasil ( Borém et al.,1998 ). Constituída por vários representantes da sociedade, a CTNBio possui cientistas brasileiros de renome internacional, altamente comprometidos com uma postura ética e voltada para os interesses do país. O rigor e a completa independência da CTNBio resulta no adiamento, para 1998, da recomendação de autorização de comercialização e plantio de variedades transgênicas de soja Round-up Ready© , tolerante ao herbicida Roundup. Entretanto, a justiça concedeu liminar suspendendo o seu plantio comercial no país. O momento pelo qual o Brasil passa é de certa forma semelhante ao de outros países, quando os primeiros OGMs foram lançados. A experiência destes países sugere que, vencida a resistência inicial, os transgênicos logo estarão fazendo parte da mesa do consumidor brasileiro. A CTNBio está cientificamente qualificada para avaliar os riscos dos transgênicos para a nossa sociedade.

 

A Biotecnologia abre novas perspectivas para tornar as espécies vegetais mais úteis ao homem. Dentro de várias potencialidades criadas por ela, a primeira vislumbrada pelos cientistas foi a alteração  genética, visando ao aumento à estabilização da produção. Nesta linha surgiram as variedades resistentes aos insetos, a exemplo do algodão Bollgard© , da batata New Leef©  , e do milho Bt.. Estas variedades, por ser menos atacada por insetos, apresentam maior estabilidade de produção e maior produtividade em situações de intenso ataque de lagartas. Não obstante, estas variedades transgênicas apresentam menor custo de produção, uma vez que a aplicação de inseticidas, dentro do manejo de pragas, é reduzidas. Surgiram também as variedades tolerantes a herbicidas como a soja, a canola, o algodão, o milho, e a beterraba Round-up Ready© ,. No caso destas variedades, o custo de produção é menor, decorrente da possibilidade de uso de um único produto de ação global, e de menor custo ( Callow, 1997 e Kubicek, 1997 ).

 

As principais culturas para as quais variedades transgênicas estão disponíveis no mundo incluem soja, milho, algodão, batata, cana–de–açúcar, tomate, dentre outras. Estas variedades normalmente apresentam uma ou mais das seguintes características introduzidas pela Engenharia  genética: tolerância a herbicida, resistência a insetos, e maior vida de prateleira. O interesse dos agricultores em plantar estas variedades decorre do seu menor custo de produção, uma vez que a aplicação de herbicida e fungicida é menor.

 

Uma Segunda perspectiva aberta pela Engenharia genética é a melhoria da qualidade do produto ou introdução de características que facilitem seu processamento.  Neste sentido, algumas pesquisas encontram-se em andamento, com o objetivo de desenvolver variedades de soja com baixos teores de ácidos graxos saturados e elevados teores de insaturados, importantes especialmente em dietas para cardíacos. No caso de produtos com maior facilidade de processamento, pode-se citar o caso das variedades de batata com maior conteúdo de sólidos solúveis. Estas variedades absorvem menor quantidade de óleo durante a fritura, resultando em um alimento mais saudável sob o ponto de vista cardiovascular.

 

A terceira potencialidade das variedades transgênicas é a produção de fármaco. Estas  variedades funcionarão como biorreatores na produção destas substâncias. Estas possibilidades trazem uma perspectiva muito grande para a obtenção destas substâncias, de forma renovável e não comprometedora, com a biodiversidade do planeta.

 

Pesquisas preliminares sobre a produção de proteínas exóticas, vacinas e fámacos em plantas estão em andamento. Nestas circunstâncias, plantas transgênicas poderiam assumir uma nova e importante função no bem estar da sociedade.

 

A quarta potencialidade vislumbrada de uso das variedades transgênicas deve-se mais no final da primeira década com o primeiro milênio. Acredita-se que as plantas serão transformadas com genes para produzir monômeros e polímeros, que poderão substituir derivados de petróleo.

 

O futuro desponta-se otimista com as atuais contribuições da Biotecnologia. Acredita-se que ela dará importante contribuição aos melhoristas, no seu propósito de suprir a demanda de alimento, fibras, etc. da população mundial.

 

A Genética, por meio do melhoramento de plantas tem contribuído, até o presente momento, para afastar as nefastas previsões de Thomas Malthus, de que o crescimento da produção mundial de alimentos não acompanharia o aumento da população. Atualmente a Biotecnologia vegetal começa a dar sua contribuição para o bem estar da humanidade. Com ela será mais fácil operar o milagre da multiplicação dos grãos.

 

5 TRANSGÊNICOS  - AMEAÇA ?

 

Existe uma ansiedade muito grande da sociedade brasileira sobre os riscos dos alimentos transgênicos para a saúde humana. O tema tem sido foco de debates e questionamento na mídia nacional, nos últimos tempos, de forma bastante intensa. É importante que a população conheça todos aspectos inerentes à produção e ao consumo dos produtos geneticamente modificados. Um alimento é seguro à saúde humana se não causa nenhum mal aos que o ingere em quantidades consideradas normais e após o seu devido processamento. Os alimentos têm sido considerados seguros à saúde humana, com base na experiência do seu consumo a longo prazo. A perspectiva de segurança alimentar é, entretanto, um aspecto dinâmico. Por exemplo, alimentos com elevado teor de gordura não eram considerados nocivos à saúde. Todavia, hoje, alimentos ricos em gorduras saturadas são comprovadamente prejudiciais à saúde humana. Mesmo assim, muitos ainda utilizam sem qualquer restrição.

Normalmente, os seguintes aspectos são considerados, quando se pensa em segurança alimentar: potencial alergênico, digestibilidade, toxidade, risco teratogênico, dentre outros.

 

A Engenharia Genética permitiu expandir as alterações genéticas no desenvolvimento das novas variedades, viabilizando a introdução de características específicas, muitas das quais impossíveis de ser incorporadas pelos procedimentos tradicionais do melhoramento de pantas. A avaliação de produtos derivados da moderna Biotecnologia não requer mudanças substantivas nos princípios de segurança alimentar para os produtos convencionais. As variedades não - geneticamente modificadas que hoje cultivamos, e cujos produtos consumimos, são resultado de um trabalho de seleção, realizado ao longo de milhares de anos, pela ação da natureza e pelo homem. A seleção artificial conduzida pelos melhoristas possibilitou o desenvolvimento de variedades com maior produtividade, e resistentes a pragas, além de várias outras características agronômicas importantes. Nestes casos, quando o melhorista introduz, em uma variedade, novos genes de resistência a uma doença, por exemplo, vários outros genes ligados aos primeiros são incorporados à nova variedade, sem maior controle. No caso das variedades transgênicas, a introdução de gene é a mais precisa, e é possível controlar a incorporação de outros genes além dos de interesse, pois o processo é praticamente pontual.

 

O novo e o incompreendido geram desconforto e desconfiança, principalmente para os leigos. A História pode nos ensinar grandes lições. Vale a pena relembrar os tempos da descoberta da vacina contra a varíola, em 1778, por Edward Janner. Esta vacina só passou a ser utilizada pela sociedade mais de 50 anos depois de sua descoberta, após a quebra de tabus éticos e de biossegurança no seu uso. Este atraso resultou  em muitas mortes que poderiam ter sido evitadas, se esta tecnologia tivesse sido adotada mais cedo. Com a adoção da vacina de Jenner, a varíola foi eliminada do mundo.

 

Os transgênicos já são plantados nos Estados Unidos, Canadá, China, e Argentina, além de vários outros países. Não se podem excluir os agricultores brasileiros do acesso às tecnologias, que lhes permitiram produzir alimentos mais nutritivos  e com preços mais competitivos para o mercado nacional e internacional.

 

Alguns pesquisadores questionam se os genes para a resistência a antibióticos inseridos em variedades transgênicas, como marcadores, poderiam ser naturalmente transferidos para as bactérias causadoras de doenças nos homens, nas quais eles poderiam ser ativados a produzir enzimas que as protegessem dos antibióticos. Esta transferência poderia ter conseqüências indesejáveis, como a bactéria resistente não  ser mais combatida  por aquele anti – biótico específico. Até a presente data, não foi encontrada nenhuma evidência de troca de material genético das plantas com as bactérias do ar ou aquelas em contato com o sistema radicular . embora a troca de genes tenha sido observada, isto não quer dizer que ela seja possível, mas sim que provavelmente não ocorra. O mesmo se aplica às bactérias do trato digestivo dos indivíduos que ingerem alimentos geneticamente modificados.

 

Mesmo que a transferência ocorresse e a bactéria do solo ou do intestino adquirisse resistência, isto não representaria riscos à saúde do homem. Muitas bactérias já apresentam resistência a antibióticos como a ampicilina.

 

A própria história da relação inseto – inseticida é corrida contra o tempo, em que os inseticidas são cada vez mais poderosos e os insetos mais resistentes. Para contornar o problema, o manejo integrado de pragas preconiza a utilização de uma série de medidas de controle. As variedades transgênicas resistentes a insetos são  mais uma das estratégias a serem incorporadas ao manejo de pragas.

Outra preocupação, às vezes levantadas por ambientalistas, é a de que variedades transgênicas tolerantes a herbicidas poderiam resultar em plantas daninhas tolerantes a herbicidas, ou seja, superplantas daninhas . Vargas et al. (1999) discorrem sobre a resistência de plantas daninhas a herbicidas e concluem que uma população delas pode ter, naturalmente, diferentes níveis de tolerância a diferentes herbicidas. O risco de um gene específico de um OGM tolerante à herbicida ser transferido para uma planta daninha é extremamente remoto, em muitos casos, como já observado por Conner& Dale (1996). O fluxo gênico entre diferentes espécies é extremamente complexo e requer a quebra de várias barreiras de isolamento reprodutivo ( Klinger et. al. 1991). Algumas das mais freqüentes barreiras são:

a)    Espécie com habitats distintos;

b)    Espécies com maturidade sexual em épocas distintas;

c)    Incompatibilidade genética;

d)    Fraqueza do híbrido;

e)    Esterilidade híbrida;

f)     Dreno metabólico.

 

No caso específico da soja transgênica tolerante ao Roundup, o risco de escape do transgene para espécies silvestres no Brasil é extremamente pequeno. As principais barreiras a este fluxo gênico são as baixas taxas de cruzamento natural na soja, por causa da cleistogamia, fenômeno que se caracteriza pela ocorrência da fecundação antes da abertura do botão floral. A  taxa de fecundação cruzada entre plantas de soja da mesma espécie (Glycine max) e com ciclo vegetativo de mesma duração é inferior a 1 %.

 

Outro fator que contribui para a reduzida chance de escape gênico é a ausência de parentes silvestres sexualmente compatíveis com a soja no Brasil. A soja pertence a classe Dicotyledoneae, à sub classe Archichlamydae, à ordem Rosales, à sub ordem  Leguminosinae, à família Leguminosae, à subfamília Papilionaceae, à tribo Phaseoleae, ao gênero Glycine L.., ao subgênero Glycine subg. soja ( Moench) e à espécie GlycIne max ( L)  Merrill ( Gazzoni, 1994).

 

A espécie Glycine soja possuem o número de cromossomo diplóide igual a 40. Pode –se efetuar o cruzamento entre estas duas espécies com relativa facilidade, uma vez que os híbridos F1 são férteis. Entretanto G. soja não ocorre naturalmente no Brasil ( Hymowitz  & Singh, 1987).

 

O germoplasma de Glycine max contém grande tipos morfológicos de plantas. Com exceção da Glycine tomentella, o número de cromossomos diplóides para espécie dentro do subgênero Glycine pode ser de 40 ou 80 (Gazzoni, 1994).

 

A alergia é um distúrbio do sistema imunológico, normalmente causado por alguns tipos de proteínas. Por exemplo, alguns indivíduos são alérgicos ao leite de vaca, gema de ovo, glúten, peixe, mariscos, etc., podendo esta alergia manifestar –se com irritação da pele, tosse, distúrbio gastro – intestinal etc.. Cerca de 5%  das crianças e 2% dos adultos da população mundial sofrem de alguma forma de alergia a alimentos.

 

Como os OGMs apresentam genes de outra espécie,  um dos receios do público é que a ingestão de alimentos destes organismos possa resultar em aumento das reações alérgicas. Um exemplo freqüentemente utilizado para justificar este receio é o caso da introdução de um gene de peixe em morango, visando à resistência ao frio. Se porventura um indivíduo alérgico a peixe ingerir este morango transgênico, ele poderia manifestar esta reação alérgica.

 

Nutricionistas e cientistas da área da saúde catalogaram um grande número de substâncias alérgicas. Uma comparação destas substâncias evidenciou grande grau de similaridade entre elas, o que tem permitido estabelecer padrões típicas substâncias alérgicas.

 

A Organização Mundial de Saúde (OMS) desenvolveu testes e padrões internacionais para detectar substâncias com potencial alérgico . Estes testes são bastante rigorosos e os OMS são submetidos a eles antes de ser liberados no mercado.

 

A Engenharia Genética eventualmente contribuirá para a eliminação de substâncias que ocorrem naturalmente nos alimentos não – geneticamente modificados. Pôr exemplo, os cientistas conseguiram desativar um gene no arroz que codifica a produção de uma proteína que causa alergia em uma parcela da população

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A credita-se que o mundo esteja adentrando a era da revolução gênica, quando o melhoramento genético será realizado de forma mais precisa e pontual com os recursos da biotecnologia. Acredita-se também que a resistência aos organismos geneticamente modificados vá diminuir; à medida que a segunda onda de variedades transgênicos atingirem o mercado. Esta segunda onda será pautada pela incorporação de características de qualidade nutricional ou de  processamento dos alimentos, a exemplo das variedades de soja com maior teor de ácido oléicos, com grandes benefícios para a saúde humana, especialmente para as pessoas com propensão cardiovasculares. As variedades transgênicas em breve contribuirão para melhorar o nível de vida e bem estar da humanidade.

 

A Biotecnologia, ao decorrer de toda a história da humanidade esteve contribuindo para o desenvolvimento, desta. O  futuro desponta –se mais otimista com as atuais contribuições da Biotecnologia. Acredita-se que ela dará importante contribuição aos melhoristas, no seu propósito de suprir a demanda de alimentos , fibras, etc., da população mundial, estimada  em 8,7 bilhões para 2010.             A genética, por meio do melhoramento de plantas, tem contribuído , até o momento, para afastar as nefastas previsões de  Thomas Malthus.

 

A Engenharia genética tem sido estudada nos últimos  26 anos sem ser detectado qualquer  efeito prejudicial a saúde humana, animal ou ao meio ambiente. As pesquisas têm sido conduzidas segundo critérios rígidos de controle de qualidade. Entretanto, novas tecnologias envolvem certos riscos. Se estes riscos são aceitáveis ou não vai depender de uma avaliação global  dos benefícios destas tecnologias.

 

Finalmente, os cientistas acreditam que os riscos de alergias com os transgênicos não é maior do que com aqueles desenvolvidos pelo melhoramento convencional.

 

Mesmo que as variedades transgênicas apresentem algum risco, elas devem ser consideradas como parte da solução dos problemas que desafiam os cientistas na questão da alimentação e do vestuário para a humanidade.       

         

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[1] Mestre em Educação,  Bióloga, Professora da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes.


Autor: Cléa Márcia Pereira Câmara


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