Dificuldades do sujeito surdo no processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa nos anos iniciais



Dificuldades do Sujeito Surdo no Processo de Ensino-Aprendizagem da Língua Portuguesa nos Anos Iniciais

Ensino bilingue para surdos: libras/português escrito

Coordenador: Prof.ª Esp. Geórgia Maria Brandão Macêdo

 

                                                                    Elisângela do Nascimento Barreto*

Resumo

Estudar a educação escolar das pessoas com surdez nos reporta não só a questões referentes aos seus limites e possibilidades, como também aos preconceitos existentes nas atitudes da sociedade para com elas. Antigamente, os surdos eram considerados como seres incompetentes, pois já dizia Aristóteles; os que nasciam surdos, não tinham linguagem, portanto seriam capazes de raciocinar. Com esse pensamento, muitos surdos não tinham direito a um ensino, eram considerados como loucos dentre outros, fazendo com que eles fossem totalmente marginalizados, excluídos da sociedade. Atualmente, as pessoas com surdez, ainda enfrentam inúmeros entraves para participar da educação escolar, consequência da perda auditiva e da forma como se organizam as propostas educacionais evolvendo claro a Libras como primeira língua e o português como segunda – o Bilinguismo – focalizando assim o olhar sobre a prática pedagógica envolvendo os sujeitos surdos, podendo ter uma relação interessante, já que abre uma perspectiva de controvérsia perante certas peculiaridades do funcionamento dos sujeitos e de dinâmicas em sala de aula podendo trazer importantes contribuições. As escolas incorporativas compõem um meio favorável a construção da igualdade de oportunidades e da completa participação; mas para que esse resultado seja satisfatório é preciso um esforço comum, não somente dos professores ou do pessoal da escola, mas também dos colegas, pais, familiares, voluntários, etc. As necessidades educativas especiais reuniram os princípios já comprovados de uma educação com equilíbrio trazendo benefícios para todas as crianças.

Palavras-Chave: Surdez, Ensino-Aprendizagem, Língua Portuguesa.

 

 

Summary

Study the school education of people with deafness in reports not only issues relating to their limits and possibilities, but also to existing prejudices in the attitudes of society towards them. Formerly, deaf people were considered as incompetent beings, because Aristotle said; those who were born deaf, did not have language, therefore would be able to reason. With this thought, many deaf people were not entitled to an education, were regarded as mad among others, causing them to be completely marginalized, excluded from society. Currently, people with deafness, still face numerous obstacles to participate in school education, as a result of hearing loss and how to organize the educational proposals involving clear Pounds as a first language and English as second – bilingualism – focusing the look on the pedagogical practice involving the subject may have a deaf, interesting, since it opens the prospect of a controversy before certain peculiarities of functioning of the subject and dynamics in the classroom and bring important contributions. Incorporativas schools make up a favourable construction of equal opportunities and full participation; but for this result is satisfactory we need a joint effort, not only from teachers or school personnel, but also from colleagues, parents, family members, volunteers, etc. The special educational needs met the proven principles of a balanced education bringing benefits to all children.

Keywords: Deafness, Teaching-Learning Process, Portuguese Language.

 

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* Graduada em Letras Português pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA). Pós Graduanda em Ensino Bilingue para Surdos: LIBRAS/Português Escrito pela Faculdade Serigy.Origina*Elisângela do Nascimento Barreto

1. Introdução

O presente artigo surgiu da necessidade das dificuldades que o professor tem em aplicar o processo de ensino aprendizagem em crianças surdas. A metodologia aplicada foi de pesquisa bibliográfica em livros, revistas, artigos, publicações e na internet. É preciso analisar fatores que interferem na inclusão do aluno deficiente, para que sua integração junto aos alunos considerados “normais” seja facilitada e haja aprendizagem, o ensino deve ser de acordo com a necessidade de cada um, e consequentemente em suas diferentes dimensões. Poker (2001) afirma que: as trocas simbólicas provocam a capacidade representativa desses alunos, favorecendo o desenvolvimento do pensamento e do conhecimento, em ambientes heterogêneos de aprendizagem.”

Por outro lado, existem posições contrárias à inclusão de alunos com surdez nas turmas comuns, em decorrência da compreensão das formas de representação da surdez como incapacidade ou das propostas pedagógicas desenvolvidas tradicionalmente para atendê-las que não consideram diversidade linguística, o modelo excludente da Educação Especial está sendo substituído por outro, em nome da inclusão que não respeita a identidade surda, sua cultura, sua comunidade. Na rede escolar, tanto do lado de dentro como do lado de fora, verifica-se um emaranhado processo de discussão perto das modificações que devem ser implementadas na escola.

A inclusão de pessoas com deficiência nas escolas da rede regular de ensino coloca novos e grandes desafios para o sistema educacional; este, talvez, seja um dos temas que mais têm instigado não só os professores do ensino especial, mas também os professores das “escolas comuns”, os pais e a própria sociedade. Compreender a diferença não como algo fixo e incapacitante na pessoa, mas reconhecê-la como própria da condição humana é um desafio ainda muito complexo e um objetivo ainda muito distante da prática pedagógica diária dos professores. A grande maioria deles ainda trabalha no falso pressuposto que todos os alunos sejam iguais e que as turmas são homogêneas.

A transformação de todas as escolas em escolas inclusivas é um grande desafio que teremos de enfrentar, mas a condição para que a inclusão escolar se torne uma realidade passa pela redefinição do papel das escolas especiais, como responsáveis pelo atendimento educacional especializado, e das “escolas comuns”, como o local onde os alunos, através do conhecimento, possam questionar a realidade e, coletivamente, viver experiências que reforcem padrões sociais de cooperação e solidariedade.

Nesse sentido, é imprescindível que se redimensione o enfoque da formação cujo objetivo não deve ser simplesmente, o de adquirir conhecimento, mas sim, o de estimular a curiosidade e desenvolver a capacidade de adquirir conhecimentos. Tanto quanto seus alunos, os professores precisam sentir-se incluídos. Numa sala de aula inclusiva o aluno não é ouvinte, não é o assistente, ele realiza atividades, resolve problemas, desenvolve projetos, participa, opina, cria, analisa e não precisa decorar nada. A escola inclusiva é a escola do aluno que pensa, que faz, e que cria e não do aluno que ouve, que copia, que anota, que decora e que reproduz na prova. E pensar, fazer e criar cada um pode fazê-lo a seu modo, no seu tempo e sem moldes pré-determinados.

 

 

2. desenvolvimento

2.1. Aspectos Gerais da Surdez

Conforme Fernandes (1990) o surdo é um sujeito em que a audição não é funcional em sons e ruídos ambientais da vida, por isso, ela apresenta cinco níveis que são: a normal, leve, moderada, severa e profunda. A normal (de 0 a 25db) é quando a pessoa escuta bem; na leve (de 26 a 40db) ocorre só uma pequena perda na audição e a criança pode voltar ou não a ouvir; a moderada (de 41 a 71db) é quando pode ou não precisar de próteses auditivas; já na severa (de 71 a 90db) a perda auditiva ocorre devido a um problema físico no ouvido externo ou médio e costuma ser o resultado da fixação após a fratura do estribo – um dos três ossinhos do ouvido médio – que transmitem o som através do mesmo até o líquido do ouvido interno; a última, porém, não menos importante – a grave (mais de 91db) – acontece quando o som é passado do ouvido externo para o médio, mas o interno ou nervo auditivo não transmite normalmente o som ao cérebro – observe o gráfico abaixo e confira – dados extraídos da ANSI (American National Standards Institute) – Segundo ainda a mesma autora existem várias causas da deficiência auditiva, iremos aqui, citar algumas delas:

Pré-Natal – Parentesco; medicamentos; drogas; infecção congênita (sífilis, toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus e herpes); anomalias crânio-faciais/síndromes;

Péri-Natal – Hipóxia; anóxia; hiperbilirrubinemia; medicação ototóxica; ventilação mecânica por período maior que cinco dias; baixo peso;

Pós-Natal – Otites; meningite; caxumba; sarampo; ruído; trauma (batida).

 

 

 

Quanto ao momento em que ocorre a surdez ela pode ser: pré-lingual ou pré-linguística – ocorrida antes da aquisição da linguagem, sua característica é a total ausência da memória auditiva, ocorre de 0 a 3 anos; surdez peri-lingual – ocorre de 3 a 6 anos, surge quando o indivíduo está na fase inicial de linguagem oral e a surdez pós-lingual – ocorre a partir dos 7 anos e aparece quando o indivíduo já fala e lê.  A questão da surdez é mais um caráter de déficit do que uma comunicação isso pela falta de instrumentos capazes de preenchê-la do que uma deficiência propriamente dita como fator de exclusão. As linhas teóricas que tratam as concepções sobre linguagem e surdez são: comportamentalista, inatista, cognitivista, pragmática e interacionista.

Segundo Alcântara (2000) como resultado de aprendizado a linguagem na visão comportamentalista dá-se através da cadeia estímulo-resposta-reforço só que o reforço faz-se presente garantindo que um determinado comportamento, no caso verbal, esteja presente, isto é, conhecer uma língua quer dizer ligar sentenças, associando-as umas às outras. A preocupação maior desta linha teórica é revelar como a criança surda deve ser ensinada a falar; a função do adulto nesse contexto é fazer com que as estruturas da língua de forma gradual sejam estimuladas e os aspectos lexicais e morfossintáticos sejam priorizadas, as atividades são imitação, memorização e substituição e que devem ser generalizadas para a formação de estruturas frasais, ou seja, mostra-se claramente o uso do oralismo.

No inatismo diferentemente do comportamentalismo a tendência natural para que a linguagem seja adquirida é vista como uma capacidade inerente ao organismo humano; nesse modelo, a criança tem previamente condições para desenvolver a gramática da língua à qual está sendo exposta já que biologicamente ela encontra-se equiparada para essa aquisição, sendo que esta é decorrente de uma predisposição inerente.

Uma outra concepção de linguagem baseia-se na estrutura genética de Piaget chamada cognitivista, pois nessa concepção o foco são os aspectos do desenvolvimento cognitivo humano; a criança é capaz de construir e compreender como o mundo funciona por meio de suas ações passando por uma série de estágios que são: sensório motor – do nascimento aos 18 meses – pré-operacional – dos 18 meses aos 7 anos – operações concretas – dos 7 aos 11 anos e das operações formais – dos 11 anos em diante – nessa visão, o desenvolvimento cognitivo limita o desenvolvimento da linguagem sendo que há aspectos da linguagem que a criança só dominará após atingir um nível de controle cognitivo correspondente.

Já na visão pragmática o importante é o diálogo e o uso da linguagem na comunicação. Essa concepção surgiu na década de 70 influenciando o trabalho voltado para a criança surda e trazendo novas reflexões para área da aquisição da linguagem. Segundo Alcântara (2000) com essa concepção a criança se adequaria as regras praticando os aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos em contextos significativos e com a aquisição dessas regras elas regulariam o uso do seu conhecimento na comunicação com os outros.

Finalmente a visão interacionista que surgiu nos anos 80 onde a interação social passou a ser considerada, baseando-se nas ideias de Vygotsky. O desenvolvimento das funções cognitivas nesta perspectiva aconteceria na interação da criança com os membros mais experientes, sendo que estes seriam os mediadores entre a criança e o mundo. “A surdez constitui uma diferença a ser politicamente reconhecida; é uma experiência visual; é uma identidade múltipla ou multifacetada e, finalmente, a surdez está localizada dentro do discurso sobre a deficiência.” (SKLIAR, 1999, p.11).

 Com base nessa citação, a proposta é a adaptação das potencialidades do sujeito surdo, sendo que estes serão voltados para a análise dos debates acerca da surdez no contexto escolar inclusivista, sem, entretanto desviar da importância deste, como um todo no meio social. Essas análises mencionadas são de extrema importância para que a realidade seja compreendida desde a aquisição, ao uso da linguagem e de como ela se propaga no contexto histórico – social – escolar.

Já quando falamos do lado biológico, podemos ver que a medicina tem feito grandes avanços nas curas e descobertas de remédios para várias doenças não só no Brasil, mas também no mundo; porém, quando o assunto é deficiência auditiva, há uma prevalência do médico para que haja restituição da “normalidade”, contanto nada se pode fazer em termos clínicos. Neste caso, existe uma falta de informações à cerca de todas as deficiências desde a física, visual, mental a auditiva; temos que ver a surdez no sentido mais amplo conhecendo que a linguagem utilizada pelo surdo no caso a LIBRAS lhe dará o significado de ser surdo, ou seja, que utiliza formas diferentes de se comunicar, e quando esses grupos passam a existir temos um contexto social definido no qual a principal característica é a linguagem.

Gostaríamos de lembrar que não é correto referir-se a alguém com deficiência auditiva como “surdo mudo”, pois isso não significa que se a pessoa não ouve também seja muda, sem capacidade para falar. Para o ouvinte falar é fácil, já que nós escutamos e no começo os sons que ainda não são palavras como bá-bá, dá-dá, e mais tarde com o aprendizado os ouvintes passam a falar palavras simples; à medida que a pessoa vai crescendo, o número de palavras aumentam, mas tendo sempre a referência da audição. Já no caso da criança surda ela não possui esse tipo de referência, portanto, não aprende a falar, fazendo-se necessárias outras estratégias de comunicação, como a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS.

O diagnóstico também é fundamental, ou seja, quanto mais cedo à deficiência auditiva for descoberta as chances para que o desenvolvimento desses meios sejam intensificados no desenvolvimento cognitivo será bem maior, por isso, o teste da orelhinha que tornou-se obrigatório com a Lei n.f 12.303, aprovada em agosto de 2010 é muito importante; ele é realizado enquanto o bebê dorme e é indolor, é feito com um fone de ouvido que emite sons e as respostas produzidas pela cóclea são recolhidas, mas, infelizmente, esse teste não é feito em todas as maternidades fazendo com que a Lei não seja cumprida. Feito o diagnóstico a criança pode ser encaminhada para um atendimento precoce. Segundo Vargas (2011) “não que essa criança seja incapaz, mas, ela precisa precocemente ter acesso à sua língua, no caso a Libras”. Essa criança pode ainda ser acolhida por profissionais da área da saúde, da educação e seus pais possam compreender que seu (a) filho (a) pode ter uma vida normal como qualquer como qualquer outra criança. Segundo ainda a mesma autora ela diz que: “o mundo do ouvinte é assim, e o mundo do surdo também deveria ser, para a família conseguir projetar sensorialmente um futuro para seu filho”.

A definição da surdez como fato concreto nos faz repensar a formação do sujeito como um todo, já que a perda auditiva implica em mudanças psicológica, social e educacional; no entanto existe uma enorme desigualdade em relação às perdas auditivas, que vão desde a perda auditiva suave, moderada e profunda – já falada anteriormente – existem sujeitos surdos, mas com capacidade para ouvir e pronunciar palavras; outros a percepção de uma linguagem quase não existe ou quando há é bem pequena e finalmente outros em que não há qualquer forma de comunicação oral, mas sim gestual, usando a linguagem de sinais, caso tenham acesso a essa aprendizagem. Se partirmos do pressuposto que a falta de comunicação na vida de uma pessoa traz um significado negativo, então a consequência disso acarretará especialmente para a criança um baixo desenvolvimento cognitivo e de aprendizagem de interação; esse negativismo irá perpetuar no meio social oralista, dizendo que essa criança não aprende e não desenvolve a linguagem oral, e, portanto, terá dificuldades de integrar-se ao meio social.

As principais causas psicológicas que afetam profundamente o sujeito com limitações de comunicação são: isolamento, solidão, perda do convívio social, dentre outros; essas implicações passam do estado físico para o psicológico formando uma grande lacuna na comunicação entre o sujeito ouvinte e o surdo. Segundo Sá (1999, apud, Vygotsky, 1994) privilegiando as mediações culturais, que caracterizam sua visão do homem enquanto ser social atribui o exercício da humanidade à possibilidade de o indivíduo estabelecer trocas culturais por meio da linguagem.

Vygotsky neste contexto ressalta a importância das trocas culturais dizendo que: “a linguagem é fator não apenas linguístico, mas também cultural”, ou seja, o sujeito surdo primeiro age no plano linguístico para depois no cultural. Dessa forma, podemos dizer que o ensino oralista privou o surdo por não ter domínio de uma linguagem gestual visual como a Libras e por falta de comunicação.

“O processo de aquisição de uma língua se dá quando o sujeito assimila a estrutura, o léxico, a pragmática e a semântica da língua de modo natural e espontâneo pelo simples contato com os sujeitos proficientes nessa língua, ou seja, o sujeito imerso num determinado ambiente linguístico e, sem esforço, a adquire.” (SÁ, 1999, p.61).

 

Com base nessa citação da autora podemos dizer que a linguagem é um processo de transmissão natural e espontânea, e não imposto. É de extrema importância que a linguagem seja adquirida pelo processo de interação com outros sujeitos, processo este que se propaga em nossas escolas, grupos de convivência, associações, em nossas casas, dispondo ao surdo o acesso a língua de sinais que será uma das principais questões para serem desenvolvidas em nosso dia-a-dia.

 

 

2.2. História dos surdos

Para a educação especial, as crianças com deficiências auditivas apresentam alguns dos problemas mais difíceis e desafiantes, já que a perda auditiva interpõe tanto na recepção da linguagem quanto na sua produção; por esse fato de a linguagem interferir em quase todas as dimensões do desenvolvimento a incapacidade de ouvir e falar é uma deficiência crítica, e pode criar empecilhos ao ajustamento social e econômico.

Antigamente o deficiente auditivo era considerado como louco e possuído pelo demônio, e por isso, era excluído da sociedade; já os cegos e surdos atribuíam-se poderes e dons sobrenaturais. Essas interferências existentes geravam sentimentos opostos e atitudes que iam desde a rejeição, passando por piedade e chegando a super-proteção. Podemos citar como exemplo no Egito onde eram adorados, como se fossem deuses, serviam de mediadores entre os deuses e os faraós, eram temidos e respeitados pela população. Os chineses lançavam-nos ao mar, os gauleses sacrificavam-nos aos deuses Teutates, em Esparta eram lançados do alto dos rochedos; na Grécia eram tidos como incompetentes, não recebiam educação escolar, não tinham direitos, eram marginalizados e muitas vezes condenados à morte. O povo grego influenciou os romanos e tiveram ideias semelhantes acerca dos surdos; o imperador Justiniano, em 529 a.C., criou uma lei que os surdos eram impossibilitados de celebrar contratos, elaborar testamentos e até de possuir propriedades ou reclamar herança – exceto aos surdos que falavam. Só no final da Idade Média com o início do Renascimento, que saí da perspectiva religiosa para a da razão e a deficiência passa a ser analisada sob a ótica médica e científica procurando dar explicações para a causa das deficiências, que nesse tempo eram consideradas pelos médicos doenças hereditárias, males físicos ou mentais. (Fernandes, 1990).

Já no Brasil, os marcos fundamentais foram a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos – hoje, Instituto Benjamin Constant e do Instituto dos Surdos-Mudos – hoje, Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) – ambos na cidade do Rio de Janeiro, por iniciativa do Governo Imperial. Depois da proclamação da república a educação especial difundiu-se com o aparecimento de entidade privada, assistenciais e através da ação do poder público, embora esta última desenvolveu-se de forma mais lenta que a das primeiras, pelo menos em relação à quantidade de atendimento oferecido.

No século XVI começou-se a admitir que os surdos poderiam aprender o propósito disso era desenvolver o seu pensamento, adquirir conhecimento e se comunicar com o mundo do ouvinte, também nesse século, ensinavam-se o surdo a “falar” e a compreender a língua falada. A lei 10.436 de 24 de abril de 2002 dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – hoje a inclusão requer: Língua de Sinais, Experiências Visuais, Intérprete da Libras, Sistema de Avaliação e Forma Escrita da Língua Portuguesa. Podemos examinar através da história que o conceito para educar uma criança surda é relativamente novo e o uso atual do termo excepcional é um reflexo dessa mudança do ponto de vista da sociedade em relação àqueles que se desviam da norma.

 

 

2.3. Ensino-Aprendizagem

Quando estudamos a educação escolar das pessoas com surdez nos remete não só a questões que referem-se aos seus limites e possibilidades, como também aos preconceitos existentes nas atitudes para com elas. As pessoas com surdez enfrentam vários obstáculos para participar da educação escolar, tudo isso por causa da perda auditiva e da forma como as propostas educacionais nas escolas são estruturadas. Muitos alunos com surdez podem sentir-se prejudicados pela falta desses estímulos que terão que se adequar ao seu potencial cognitivo, sócioafetivo, linguístico e político-cultural e, desse modo, sofrerá perdas importantes no desenvolvimento e sua aprendizagem. No século XX e início do século XXI vários estudos foram feitos por diversos autores e pesquisadores oferecendo contribuições à educação de alunos com surdez na escola comum destacando a valorização das diferenças no convívio social e reconhecendo o potencial de cada ser humano; porém, existem posições adversas em incluir esses alunos com surdez nas turmas comuns, pois consideram que a surdez seja uma incapacidade ou por causa das propostas pedagógicas que são desenvolvidas tradicionalmente e não são consideradas diversidades linguísticas.

Por isso, tem-se a necessidade de maiores reflexões sobre quais são as formas mais adequadas para que um ensino de qualidade para pessoas surdas seja viabilizado, é indispensável que essa discussão traga uma visão mais crítica sobre as principais correntes metodológicas utilizadas em sala de aula, que esta focalize não apenas os procedimentos adotados, mas, também faça uma análise das vantagens e desvantagens que existe em cada uma tendo em vista as características inerentes à surdez. Opiniões dividem e subdividem as metodologias exclusiva ao ensino de surdos, entretanto, em termo pressupostos básicos existem três grandes correntes: o Oralismo, o Bimodalismo ou Comunicação Total e o Bilinguismo.

a) Oralismo

A sua característica principal é de que o surdo deve aprender a língua oral de seu país para depois poder juntar-se a comunidade ouvinte. Para que essa metodologia fosse desenvolvida utilizou-se algumas técnicas específicas às orientações orais. São elas:

- O treinamento auditivo – Estimula a audição reconhece a descriminação de ruídos, sons ambientais e sons da fala;

- O desenvolvimento da fala – Promove exercício para a mobilidade e tonicidade dos órgãos envolvidos na fonação que são os lábios, mandíbula, língua, dentre outros e propõe também exercícios de respiração e relaxamento – conhecido também como mecânica da fala;

- A leitura labial – A pessoa surda deve treinar para identificar a palavra falada decifrando os códigos orais do emissor.

 

Para que o oralismo seja aproveitado ao máximo têm-se como princípio a indicação de prótese individual tornando os sons mais amplos, e admitindo a existência de ruídos auditivos mesmo na surdez profunda, pretendendo reeducar a criança surda através da amplificação dos sons em conjunto com as técnicas específicas da oralidade.

O oralismo procura “ensinar” linguagem através de atividades estruturais sistemáticas. Segundo Quadros (2008), há uma ligação restrita dessa prática com as ideias que foram desenvolvidas pelo considerado “pai da linguística”, Ferdinand Saussure e também idealizador do estruturalismo linguístico; já que para Saussure a linguagem compõe-se de duas partes: a Língua indispensavelmente social, pois é concernente por determinada comunidade linguística; e a Fala que é secundária e individual, isto é, o veículo para que a língua usada pelos falantes seja transmitida através da fonação e da articulação vocal.

Saussure além de fazer uma clara distinção entre os aspectos sociais e individuais ele afirma que o signo linguístico é uma entidade psíquica de duas faces que é o significado e o significante. Essa constatação de que os elementos distintos existem simultaneamente no signo linguístico contribui para o aparecimento de estudos sobre um ou outro elemento fracionado a visão da linguagem. Vygotsky (1994, p.77) contesta esta visão dizendo que:

“A ruptura entre som e significado torna estéril o estudo da semântica e da fonética clássica, porque o som separado e significado torna estéril o estudo da semântica e da fonética clássica, porque o som e significado perde as propriedades específicas que o convertem em som exclusivo da linguagem humana, distinguindo-o dos demais sons existentes na natureza. Por sua vez, o significado separado do aspecto sonoro da palavra, converte-se em pura representação, em puro ato de pensamento, que, estudado isoladamente como um conceito, desenvolve-se e vive independentemente de seu portador material.

 

Segundo ainda o mesmo autor, a linguagem deve ser tomada como uma unidade que não pode ser dividida tendo assim uma relação estreita com o pensamento. Vygotsky defende, a oralização como meta central para o ensino dos surdos sendo convicto na importância da fala para o desenvolvimento do ser humano e admitindo o uso da mímica fora da escola. Acreditando que a mímica possa ser jogada fora espontaneamente pelos surdos, já que a fala foi desenvolvida o autor é favorável ao oralismo criticando os métodos de desenvolvimento da fala, tachando-os como mecânicos, artificiais e penosos para a criança.

Após muitas décadas é que acontece uma disposição de mudança no enfoque educacional, pois as escolas comuns ou especiais daquela época que eram pautadas no oralismo visavam que a pessoa com surdez fosse capacitada a utilizar a língua da comunidade ouvinte na modalidade oral, sendo essa a única possibilidade linguística só com o uso da voz e da leitura labial; desse modo, o oralismo não teve resultados satisfatórios, pois ocasionou déficits cognitivos e legitimou a manutenção do fracasso escolar, provocou dificuldades no relacionamento familiar e não aceitando o uso da Libras fazendo com que a cultura surda fosse discriminada negando ainda a diferença entre surdos e ouvintes.

A partir daí, muitos estudos foram surgindo, mas os mais significativos sobre sinais são os de Quigley e Frisina; Stuckless e Birch; Meadow, Vernon e Koh (citados por Dows e Nortern, 1989). Eles demonstram que crianças surdas filhas de pais surdos têm um nível de linguagem significativamente mais alto do que as crianças surdas filhas de pais ouvintes; mostram também que essas crianças surdas de pais surdos apresentam um desenvolvimento de “fala” – Língua de Sinais – que equivale às crianças ouvintes de pais ouvintes e ainda tem um nível mais alto nos estudos e são mais bem ajustadas do que as crianças surdas de pais ouvintes. Vários outros estudos além desses surgiram onde podemos destacar a investigação realizada por Stokoe que torna-se decisiva para a introdução dos sinais no ensino de surdos sob o olhar da Comunicação Total ou Bimodalismo.

b) Bimodalismo ou Comunicação Total

A comunicação total ganhou impulso nos anos 70 leva esse nome porque defende a utilização de qualquer recurso linguístico, podendo ser a linguagem oral, de sinais ou mímica contanto que facilite a comunicação com os surdos. Para esta modalidade o aprendizado da língua não é o objetivo maior, mas sim, privilegiar a comunicação e a interação e não apenas a língua (ou línguas).

“Essa filosofia possui uma maneira própria de entender o surdo, ou seja, longe de considerá-lo como um portador de uma patologia de ordem “médica”, entende o surdo como uma pessoa, e a surdez como uma marca, cujos efeitos adquirem, inclusive, características de um fenômeno com significações sociais.” (QUADROS, 2008, p.82).

 

A ideia contrária entre Comunicação Total e Oralismo por causa da inclusão de sinais, afirma que a primeira não está em oposição à segunda, mas apresenta-se como complementar. Segundo Damázio (2007) os resultados obtidos com a comunicação total são questionáveis, quando observamos as pessoas com surdez frente aos obstáculos do dia-a-dia. O que caracteriza a comunicação total que é a linguagem gestual visual, os textos orais, os textos escritos e as interações sociais parece não viabilizar um desenvolvimento satisfatório e esses alunos permanecem isolados, continuando agrupados pela deficiência, marginalizados, excluídos do contexto maior da sociedade. Segundo ainda a mesma autora, essa proposta não dá importância a Língua de Sinais, sendo assim, considera-se uma outra feição do oralismo.

Essa abordagem educacional – bimodalista – destaca-se nesses sistemas, as práticas são consideradas como bimodais, ou seja, envolvem combinações de uso das duas modalidades que são os sinais e a fala. Entretanto, o uso da fala codificada em sinais, é caracterizada como duas modalidades da mesma língua, já que é baseada na língua majoritária, mas essa ideia varia entre pesquisadores e educadores, pois, existe também a noção de um instrumento de comunicação em que os parâmetros de uma língua de sinais para acompanhar a fala estão inseridos; assim, o envolvimento de uma só língua não é subentendido porque os recursos que se compõem a partir de uma língua falada e de uma língua de sinais.

A língua natural das pessoas com surdez é negada tanto no oralismo como na comunicação total e isso provoca perdas consideráveis nos aspectos cognitivos, sócioafetivos, linguísticos, político culturais e na aprendizagem desses alunos. A comunicação total em prol da modalidade oral, por exemplo, usava o português sinalizado modificando a rica estrutura da Língua de Sinais. A partir dessas discussões, surge uma orientação educacional que considera a Libras na sua forma genuína, chamada Bilinguismo.

c) Bilinguismo

Surgiu no meio educacional da comunidade de surdos e especialistas da área como a última palavra em educação para muitas pessoas apareceu como se fosse uma “tábua de salvação”. Essa modalidade é definida pelo fato do sujeito usar as duas línguas. “O bilinguismo dos surdos pressupõe o acesso pleno a Língua de Sinais como primeira língua representando o elemento fonador de sua subjetividade/identidade na constituição de sentidos sobre o mundo e no acesso ao conhecimento”. (FERNANDES, 1990, p.122).

Dessa forma, podemos dizer que ser bilíngue é usar diferentes línguas em diferentes contextos e interlocutores e para que a escola seja considerada bilíngue é imprescindível ter a língua como objeto e instrumento de estudo.

Questões como essa geram controvérsias entre estudiosos, profissionais, familiares e até entre os próprios surdos, pois, quem defende a cultura, a identidade e a comunidade surda irá se apoiar nos discursos das diferenças, apresentando como prova que elas precisam ser compreendidas nas suas especificidades, porém, pode cair na armadilha da diferença, já que em nome da diferença, pode-se também separar. Diante da situação desse quadro, o indispensável é que se busquem nos conflitos promovidos na relação entre as diferenças, novas soluções para a vida em coletividade, dentro e fora das escolas atuando com alunos surdos em uma escola comum reconhecendo e valorizando suas diferenças, fazendo com que os processos curriculares e pedagógicos sejam criados para atender a essa diferença, considerando que a escola é um ambiente aberto para todos e, portanto, verdadeiramente inclusiva.

Não queremos aqui fazer uma troca da escola excludente especial por uma escola excludente comum; o que ocorre é que em alguns discursos e práticas educacionais ainda não conseguiram fazer cumprir o que foi dito anteriormente fazendo com que os processos de normalização sejam mantidos pelas pessoas com surdez. A inclusão desse aluno deve acontecer desde a educação infantil até a educação superior para que desde cedo essa criança possa utilizar os recursos de que necessita superando as barreiras dos processos educacionais e usufruindo de seus direitos escolares, desse modo, sua cidadania, será exercida de acordo com os princípios constitucionais do nosso país. A inclusão de pessoas com surdez na “escola comum” requer que se descubram meios para que sua participação e aprendizagem sejam beneficiadas tanto na sala de aula como no Atendimento Educacional Especializado.

“O aperfeiçoamento da escola comum em favor de todos os alunos é primordial. Os professores precisam conhecer e usar a Língua de Sinais, entretanto, deve-se considerar que a simples adoção dessa língua não é suficiente para escolarizar o aluno com surdez”. (DORZIAT, 1998, p. 24 – 29).

 

De acordo com essa autora podemos dizer que a “escola comum” precisa ser compartilhada com os alunos com surdez. Esses últimos precisam muito mais que uma língua, eles necessitam de ambientes educacionais estimuladores que desafiem o pensamento, explorem suas capacidades, em todos os sentidos. Se apenas o uso de uma língua fosse necessário para aprender, as pessoas que ouvem não teriam problemas de aproveitamento escolar, já que ingressam na escola com uma língua oral desenvolvida. Adquirir uma Língua de Sinais, de fato, não garante uma significativa aprendizagem, pois foi mostrado por Poker (2001) quando trabalhou com seis alunos com surdez profunda que encontravam-se matriculados na primeira etapa do Ensino Fundamental, com idade entre oito anos e nove meses e onze anos e nove meses, investigando por meio de intervenções educacionais, as trocas simbólicas e o desenvolvimento cognitivo desses alunos.

O ambiente em que a pessoa com surdez está implementada, especialmente o da escola, se este não lhe oferecer condições para que as trocas simbólicas sejam estabelecidas com o meio físico e social, a capacidade representativa dessas pessoas não é exercitada ou provocada, comprometendo o desenvolvimento do pensamento. Nesse caso, segundo a autora citada acima, (Poker – 2001), a natureza do problema cognitivo da pessoa com surdez está relacionado a:

“...deficiências de trocas simbólicas, ou seja, o meio escolar não expõe esses alunos a solicitações capazes de exigir deles coordenações mentais cada vez mais elaboradas, reflexionante e consequentemente, os avanços cognitivos”. (POKER, 2001, p.300).

 

A “escola comum” deve viabilizar em sua escolarização contemplando o ensino de Libras e da Língua Portuguesa, pois ao oferecer uma educação bilíngue a escola assume uma política linguística em duas línguas que passará a coexistir no espaço escolar. A escola vai pensar em como estas línguas estarão acessíveis às crianças, além de desenvolver as demais atividades escolares; podendo estas línguas permear atividades escolares ou serem objetos de estudo em horários específicos – isso irá depender da proposta da escola e também de como, onde e de que forma as crianças utilizam as línguas na escola. “É preciso ultrapassar a visão que reduz os problemas de escolarização das pessoas com surdez ao uso desta ou daquela língua, mas sim de ampliá-la para os campos sócio-políticos” (BUENO, 2001, p. 3 – 12).

Muitas polêmicas formaram-se em torno da educação escolar para pessoas com surdez, a proposta de educação escolar inclusiva é um desafio, que para ser efetivado é necessário considerar que os alunos com surdez têm direito de acesso ao conhecimento, à acessibilidade, bem como ao Atendimento Educacional Especializado. A educação especial diz respeito a um caminho com a participação de todos os portadores de deficiência, através de uma proposta de inclusão que não vise apenas colocá-los em “escolas normais”, mas garantir sua inserção social no meio daqueles que consideram-se “normais”

2.4. Língua Portuguesa

“Nos dias atuais tem se atribuído ao ensino da Língua Portuguesa uma série de ranços”, no dizer de QUADROS (2008, p. 39). A referida autora afirma que se torna necessário reconhecer um fracasso da escola e, no interior desta, do ensino de língua portuguesa tal como vem sendo praticado na quase totalidade de nossas aulas.

O professor, de forma geral, tem sido responsabilizado por esse fracasso, sem se considerar as condições de trabalho e vida a que ele é submetido, e, muito menos, a influência de práticas consolidadas de ensino da língua portuguesa, baseadas na metalinguagem, que resultam em desperdício de tempo e esforço, por parte de educadores e educandos, durante o processo escolar. QUADROS (2008, p. 40) complementa que “é preciso conhecer a diferença de saber língua e analisá-la, sugerindo que no Ensino Fundamental as atividades devem girar em torno do ensino da língua e apenas subsidiariamente se deverá apelar para a metalinguagem”.

Em se tratando de ensino de português para surdos, essa nova metodologia e “novo conteúdo” são ainda mais urgentes, visto que a língua portuguesa deverá ser ensinada como segunda língua a pessoas que não têm o apoio de uma língua oral, mas da língua de sinais (Libras), como primeiralíngua (L1).

Como diz PERLIN (2000, p. 54), “os surdos são surdos em relação à experiência visual e longe da experiência auditiva”. Essas culturas são multifacetadas, mas apresentam características que são específicas em relação às experiências surdas, elas são visuais, elas traduzem-se de forma visual, traduzem-se por meio da língua de sinais. As formas de organizar o pensamento e a linguagem transcendem as formas ouvintes. Elas são de outra ordem, uma ordem com base visual e por isso têm características que podem ser ininteligíveis aos ouvintes. Elas se manifestam a partir da coletividade que se constitui a partir  dos próprios surdos.

“As línguas de sinais são consideradas línguas naturais e, conseqüentemente, compartilham uma serie de características que lhes atribui caráter especifico e as distingue dos demais sistemas de comunicação, por exemplo, produtividade ilimitada (no sentido de que permitem a produção de um numero ilimitado de novas mensagens sobre um numero ilimitado de novos temas); criatividade (no sentido de serem independentes de estimulo); multiplicidade de funções (função comunicativa,social e cognitiva – no sentido de expressarem o pensamento); arbitrariedade da ligação entre significado e significante, e entre signo e referente; caráter necessário dessa ligação, e articulação desses elementos em dois planos – o do conteúdo e o da expressão. As línguas de sinais são, portanto, consideradas pela lingüística como línguas naturais ou como um sistema lingüístico legitimo, e não como um problema do surdo ou como uma patologia da linguagem. Stokoe, em 1960, percebeu e comprovou que a língua de sinais atendia a todos os critérios lingüísticos de uma língua genuína, no léxico, na sintaxe e na capacidade de gerar uma quantidade infinita de sentenças” (QUADROS, 2008, p. 30).

 

Quando se trata de ensinar o português para surdos brasileiros, essa língua é encarada como segunda língua, uma vez que estes possuem, em sua maioria, uma língua com a qual se comunicam na comunidade surda que é LIBRAS, constituindo-se em sua primeira língua. Desta forma, a língua portuguesa também deve ser ensinada aos surdos com metodologia própria de segunda língua, tendo em vista ainda a diferença de modalidades entre português e a língua de sinais, já que aquela é de modalidade oral-auditiva enquanto esta é de modalidade espaço-visual. É importante atentar para as especificidades dos indivíduos surdos, uma vez que entre estes são raros os que tiveram a possibilidade de ter uma língua materna antes de seu ingresso na escola, na maioria das vezes não tem conhecimento suficiente do português para serem alfabetizados nesta língua e nem conseguem entender o português, por faltar-lhes uma prévia compreensão do que seja uma língua, já que não possuem nenhuma.

A Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – é a língua de sinais usada pelas comunidades surdas dos centros urbanos brasileiros. Esta língua não pode ser estudada através do idioma português, porque ela tem uma gramática própria, diferente da gramática portuguesa.

Muitos profissionais que trabalham com surdos não possuem, por opção, contato com a língua de sinais. Em função disso, surgem idéias distorcidas sobre ela. Uma destas idéias diz respeito à sua universalidade. A língua de sinais não é universal; cada país tem a sua. Assim como as pessoas ouvintes em países diferentes falam diferentes línguas, também as pessoas surdas por toda parte do mundo usam línguas de sinais distintas. Existem também dialetos ou variabilidade regional dos sinais, o que alguns teóricos chamam de sotaques. A LIBRAS foi desenvolvida por surdos do Brasil para a comunicação entre si e existe há tanto tempo quanto a existência das comunidades de surdos brasileiros. A padronização da língua de sinais no Brasil começou quando foi fundado o Instituto Nacional da Educação dos Surdos (INES) em 1857, chamada, então, de mímica.

 

São consideradas línguas naturais por terem surgido espontaneamente da interação entre pessoas e por possibilitarem a expressão de qualquer conceito, as quais não se derivam das línguas orais, mas fluíram de uma necessidade natural de comunicação entre pessoas que não utilizam o canal oral-auditivo, mas o canal espaço-visual como modalidade lingüística, uma vez que se articulam espacialmente e são percebidas visualmente. Mesmo sendo uma convenção, as línguas de sinais não são universais, pois os sinais ou palavras convencionalmente utilizados para representar objetos, seres e eventos são referentes a uma determinada perspectiva. Sendo assim, podemos observar que em cada país utiliza-se uma língua de sinais própria, como por exemplo, no Brasil, a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, na China a Língua de Sinais Chinesa – CSL, nos Estados Unidos a Língua de Sinais Americana – ASL, entre outras.

O professor é considerado um profissional da comunicação, e para que os alunos tenham sucesso no seu aprendizado irá depender muito que consiga relacionar-se com os alunos falando uma linguagem que elas entendam e se interessem para que essa comunicação seja eficaz, não é fácil, não adianta gesticular para um aluno que não enxerga, da mesma forma que não adianta gritar para um aluno que não ouve. Vargas (2011) defende que a criança deficiente auditiva deve aprender Libras desde a mais recente idade, dando preferência para uma escola adequada, na qual todos, desde os professores, diretores e todos os funcionários da escola, saibam a Língua de Sinais, não esquecendo é claro dos pais, porém, a realidade é diferente.

O tempo também é um fator importante já que não escuta, a criança surda pode chegar à escola com uma deficiência de informações que crianças ouvintes recebem muitas vezes sem perceber, ouvindo conversas, assistindo televisão e essas informações não chegam às crianças deficientes. “Os conhecimentos que passam pelas relações sociais e são aprendidos no ambiente e não formal são importantes, a pessoa necessita desse background”. (VARGAS, 2011, p.05). O educador também deve estar atento que a primeira língua do aluno é a Libras e o Português é considerado como segundo idioma é por isso, que a criança surda pode encontrar alguns entraves na compreensão e na escrita como, por exemplo, o uso de artigos, pronomes e tempos verbais. Vargas (2011) explica que não há como o deficiente auditivo não ter acesso a essas dificuldades, já que a Libras é visual – espacial tornando-se um grande nó em termos de comunicação para os surdos; a autora ainda enfatiza que: “O que queremos da educação da pessoa surda é que ela sinalize e escreva bem”. (VARGAS, 2011, p.05), pois para tornar-se mais independente, ativa e cidadã a pessoa tem que comunicar-se com eficiência e informar-se sobre o mundo onde vive.

 

 

3. Considerações

A prática educacional da inclusão deve ser oferecida para alunos especiais do ensino regular, para que os mesmos sejam incluídos na sociedade; se faz necessário uma modificação em todo o sistema educacional, os professores precisam estar qualificados e as instituições equipadas para que as necessidades de cada um dos membros sejam atendidas. A classificação da educação escolar em regular, comum e especial, dos alunos como deficientes e não deficientes só irá contribuir para distorcer, desqualificar e discriminar gerando assim um sentimento de inferioridade. É importante destacar que não existe uma metodologia adequada para que o professor adote de uma forma satisfatória em sala de aula frente ao educando com necessidades educativas especiais.

Os objetivos da educação inclusiva seriam fazer com que a escola atue possibilitando a integração de crianças que dela fazem parte, atingindo seus potenciais máximo, propiciando a ampliação do acesso dos alunos portadores de necessidades especiais às classes comuns, propiciando aos professores dessas classes um suporte técnico, levando-os a estabelecer formas criativas de atuação junto a essas crianças estabelecendo novas formas de avaliação que atendam as necessidades destas e, sobretudo, dando continuidade ao desenvolvimento profissional da equipe que atua na escola inclusiva. Tem-se falado muito sobre “integração” e “        inclusão”, alguns usam os termos indistintamente, outros os distinguem radicalmente dizendo tratar-se de experiências completamente distintas enquanto a “integração” no Brasil vem sendo discutida e interpretada a pelo menos duas décadas, a “inclusão” é assunto de debate principalmente nesta última década.

Cabe aos professores assumir seu compromisso social em relação aos alunos com necessidades especiais, não basta esse papel somente a escola, o professor tem que ter capacidade de conviver com os “diferentes”, superando os preconceitos em relação à minoria, estando sempre preparado para adaptar-se as novas situações que surgirão em sua prática docente, possibilitando a essa pessoa, no mínimo, o direito ao acesso e permanência na escola e com certeza, antes de tudo o direito a uma educação.  O que podemos esperar de tudo isso, é que a inclusão, faça sentido na vida não só dos alunos portadores de necessidades especiais, mas em todos os componentes da escola, possibilitando a ressignificação da educação inclusiva.

 

 

Referências

ALCÂNTARA, L. Os Efeitos da Interpretação na Linguagem de uma Criança Surda (dissertação). São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2000.

BUENO, José Geraldo Silveira. Diversidade, Deficiência e Educação. Revista Espaço. Rio de Janeiro: INES. n.° 12, p. 3 – 12, julho – dezembro, 2001.

DAMÁZIO, Mirlene Ferreira Macedo. Atendimento Educacional Especializado: pessoa com surdez. São Paulo: MEC/SEESP, 2007.

DORZIAT, Ana. Democracia na Escola: bases para igualdade de condições para surdos – ouvintes. Revista Espaço. Rio de Janeiro: INES, n.°9, p. 24 – 29, janeiro – junho, 1998.

FERNANDES, Eulália. Problemas Linguísticos e Cognitivos do Surdo. Rio de Janeiro: Agir, 1990.

PERLIN, G. Identidade Surda e Currículo em Surdez – processos educativos e subjetividade. São Paulo: Lovise, 2000.

POKER, Rosimar Bartolini. Troca Simbólica e Desenvolvimento em Crianças Surdas: uma proposta de intervenção educacional. UNESP, 2001, 363p. Tese de Doutorado.

QUADROS, Ronice Muller de. O BI em Bilinguismo na Educação de Surdos. In. FERNANDES, Eulália (Org.) Surdez e Bilinguismo. Porto Alegre: Mediação, 2008.

SÁ, Nídia R. L. Educação de Surdos: a caminho do bilinguismo. Niterói: Eduff, 1999.

SKLIAR, Carlos (Org.). A Surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 1999.

VARGAS, Rosane. Sinalizar Conhecimento. Revista Libras/Braille, ano 6, n.°27, 2011.

VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

 

 

 

 

 

 

 

 

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Autor: Elisangela Do Nascimento Barreto


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