Escola: palco de representações sociais e conduta moral
Escola: palco de representações sociais e conduta moral
Deina Anunciação
RESUMO
Discutir conduta moral e a representação social é um assunto um tanto polêmico e complexo, pois se relaciona com a ética e envolve o comportamento de cada um que, muitas vezes, não é declarado, assumido pelo indivíduo.Pensando nisso, este artigo tem como tema “Escola: palco de representações sociais e conduta moral”, cujo objetivo é investigar como a conduta moral pode ser percebida através das representações sociais. Para alcançar tal objetivo, adotou-se como metodologia o estudo de caso de natureza qualitativa. Os instrumentos de busca de dados foram observação, entrevista aberta, depoimentos, conversas. Ao seguir esse percurso metodológico, os resultados apontaram que os estudantes ampliam seu repertório moral também na escola; vivenciam tensão entre representações à medida que a representação de si vai de encontro com o modo pelo qual é representado a partir da conduta moral; as representações sociais são traduzidas pela conduta moral através de fala e ação; e a repercussão da representação social da conduta moral se evidencia por intermédio de reprodução e transgressão de regras morais da escola/sociedade. Concluiu-se que os estudantes acionam sua moral no jogo relacional através de atitudes por intermédio de sua conduta e representações.
PALAVRAS-CHAVES: Moral, Conduta moral, Representação social.
ABSTRACT
Discuss the moral conduct and social representation is a matter somewhat controversial and complex, as it relates to ethics and involves the behavior of each one that often is not stated, assumed by the individual. Thinking about it, this article's theme is "School: stage representations of social and moral conduct", whose goal is to investigate how moral conduct may be realized through social representations. To achieve this goal, we adopted the methodology as a case study of qualitative nature. The tools for finding data were participant observation, open interviews, depositions, conversations. By following this methodological approach, the results indicated that students expand their repertoire also moral in school, they experience tension between representations as the representation of themselves to go against it is represented from the moral conduct, social representations are translated moral conduct by speech and action, and the impact of social representation of moral conduct is evidenced through breeding and transgression of moral rules of the school / society. It was concluded that students trigger their morale in the game through relational attitudes through its conduct and representations.
KEYWORDS: moral, moral conduct, social representation.
Discutir conduta moral e representação social é um assunto instigante e complexo, pois se relaciona com a ética e envolve costumes de cada um que, muitas vezes, não são assumidos pelo indivíduo. Em outros casos, este é expresso com uma representação que passa a ter devido também à forma em que é visto na sociedade. Todavia, isso depende da sua conduta moral e de outras pessoas, considerando que “conduta” é o comportamento simbolizado, algo característico do ser humano.
Nesse contexto, pesquisa-se sobre “as representações sociais elaboradas pelos estudantes do segundo ano do ensino fundamental da rede pública, a partir da conduta moral veiculada na escola e constituída na sala de aula”;o que originou o tema “Escola: palco de representações sociais e conduta moral”.
A discussão sobre conduta moral e representação social parece tornar-se mais complexa e polêmica à medida que o indivíduo precisa repensar o próprio comportamento por diversas questões, como condenar em outros aquilo que faz, temer assumir sua conduta não apenas diante si e deturpar o semelhante (também diferente) por perversão[1]. Trata-se, no entanto, de uma reflexão para criar várias articulações pertinentes a esta pesquisa, contribuindo para compreensão do leitor. Vale salientar que, em alguns momentos da escrita, sai-se da impessoalidade para a descrição da interação entre pesquisadora e sujeitos pesquisados.
No que concerne ao tema deste trabalho, entende-se “sala de aula” como um lugar o qual não se limita a quatro paredes, mas como um espaço que se estende à escola, um espaço de aprendizado. Ainda no que tange à temática em questão, acredita-se que a representação social possa ser expressa como imagem, e esta é construída a partir de como a pessoa se vê e de como é vista por outrem. Desse modo, o indivíduo pode ser representado de uma forma na/pela sociedade que não coincida com o como se representa.
É relevante, de maneira educacional, política e social, portanto, rever os próprios conceitos sobre os valores morais de modo a não atribuir a outrem estereótipos, a fim de não criar uma representação social deturpada, isto é, uma interpretação distorcida da conduta “real” que o indivíduo tem de si e na sociedade. É pertinente ainda que ele se conscientize disso porque
A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem ação-reflexão. Esta unidade dialética constitui de maneira permanente o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. Por isso mesmo, a conscientização é um compromisso histórico. É também consciência histórica: é inserção crítica na história, implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo. [...] A conscientização, como atitude crítica dos homens na história, não terminará jamais (FREIRE, 1980, p. 26-27).
Portanto, este trabalho pode ser uma contribuição para a conscientização do indivíduo, que precisa refletir criticamente sobre seu mundo e o mundo à sua volta, de modo a construir um posicionamento autônomo de respeito para consigo e com o outro. Vale ressaltar que se entende aqui o “outro”, de acordo com Gregório (2005, s/p)[2], como originado “do latimalteru (outro entre dois) que significa diverso do primeiro, diferente de pessoa ou coisa especificada. Para Sartre, "o outro é o eu que não sou eu””. É, então, uma construção identitária, constituindo um grupo de valores, representaçõese sentidos em um grupo social.
A representação social permite que o indivíduo se sinta inserido na sociedade, pois quando é representado como parte dela, percebe a si mesmo dessaforma, lembrando que ele já chega à escola com uma representação social articulada, através das relações sociais que fazem parte de sua formação pessoal. Por outro lado, a representação social pode expressar-se como vestígio de exclusão social, ao servir de estigma para deixar o indivíduo à margem de seu grupo.
Então, a representação influencia bastante o indivíduo, e a conduta moral do estudante na escola pode ser reflexo de sua conduta na sociedade, havendo a possibilidade de ocorrero contrário também. Desse modo, percebe-se que a pessoa é representada socialmente pela conduta moral que tem ou, ao menos, é o que pode acontecerporque, em alguns casos, o indivíduo tem uma conduta moral, mas é interpretado como se tivesse outra. Assim, afirma-se que um ser humano pode ter diversas representações: criança, menino, estudante, indivíduo e pessoa, entre outras.
Nesse sentido, este trabalho[3] preocupou-se em responder às perguntas: “Como o estudante vai construir/ampliar noção de moral na escola se transita em espaços diferentes que exigem representações diferentes?”; “Como é a tensão, na conduta moral, entre a representação social do estudante diante da sociedade e a que ele tem de si?”; “Como a conduta moral do estudante em sala de aula traduz suas representações sociais sobre o jogo da conviviabilidade/sociabilidade?”; e “Qual a repercussão das representações sociais elaboradas pelos estudantes a partir da conduta moral constituída na sala de aula?”.
Tais questões configuram minhas inquietações e norteiam o desenvolvimento deste trabalho e, sobre isso, vale ressaltar que, muitas vezes, parece ser um problema responder. Porém este, em diversas situações, está não apenas em fazer perguntas, as quais movem uma pesquisa, mas em refletir sobre elas.
Com essa preocupação, têm-se os seguintes objetivos: pesquisar sobre como os estudantes vão construir/ampliar moral se transitam em espaços diferentes que exigem representações diferentes, através de papel, ação e conduta; perceber como é a tensão entre a representação social de si e como é representado socialmente, observando discurso e comportamento dos estudantes; investigar como as representações sociais são percebidas a partir da conduta moral do estudante no jogo relacional/social, analisando fala e ação; e investigar como é a repercussão das representações sociais elaboradas pelos estudantes a partir da conduta moral constituída na sala de aula.
Para tanto, em articulação aos dados observados em campo, houve uma busca a autores, como Freitag (2005), La Taille (2004), Jovchelovitch (1995), Guareschi (1995), Da Matta (1997), Vázquez (2003) e Nietzsche (2006). Bárbara Freitag (2005) é referência neste trabalho porque é uma autora que, em sua obra “Itinerários de Antígona: a questão da moralidade”, interrelaciona filosofia moral, sociologia moral e psicologia moral, tratando de diversas ideias de outros autores.
Yves de La Taille (2004) tem sua relevância em falar, entre tantos assuntos, sobre a moral da criança, ao mencionar Piaget, respaldando este trabalho que se refere a uma turma de estudantes entre sete e nove anos. Quanto a Sandra Jovchelovitch (1995) e Pedrinho Guareschi (1995), ambos discutem representações sociais, através de uma abordagem à psicologia social com referência à obra “Textos em representações sociais”. Já Roberto Da Matta (1997) fala de diversas questões de comportamentos diferentes em esferas diferentes, em sua obra “A casa e a rua”, o que também se observou no campo de pesquisa.
Em se tratando de Adolfo Sánchez Vázquez (2003), é um autor que abre discussões de diversos aspectos no campo da moral e da ética, sintetizados em sua obra “Ética” que serve, além de outros fins, para mostrar diferenças entre esses dois conceitos, contribuindo para a compreensão acerca do universo da moral.
No que tange a Friedrich Wilhelm Nietzsche (2006), em sua obra “Genealogia da moral: Uma Polêmica”, trata de valores morais não especificamente na sala de aula, contudo, sua percepção sobre a moral e seus valores está imbricada na temática as representações sociais elaboradas pelos estudantes do segundo ano do ensino fundamental da rede pública a partir da conduta moral veiculada na escola e constituída na sala de aula. É, pois, impossível limitar essa discussão ao espaço em questão, embora se tenha uma delimitação de tema, porque os valores morais estão em diversos contextos. A sala de aula é um deles.
Nietzsche também é pertinente por expressar em suas obras as desconstrução das “coisas”, pois para rever os próprios conceitos, como o já mencionado, realmente é necessária uma reflexão que desconstrua a concepção do indivíduo, muitas vezes, distorcida e estereotipada dos valores morais de outrem. Geralmente, ao que parece, o ser humano nem sempre estigmatiza a si mesmo ou outras pessoas pelos valores morais que tem, quer sejam estes bons, quer sejam ruins, mas pode fazê-lo.
Os teóricos citados até então são os principais, porém é importante mencionar que outros autores serão abordados neste trabalho, para a ampliação do conhecimento sobre o mesmo.
Nesta perspectiva, a metodologia é de fundamental importância para a elaboração de uma pesquisa, pois
[...] é o anúncio dos caminhos a serem percorridos para que se possa responder à pergunta elaborada no problema ou é a forma como se imagina abordar o objeto da pesquisa para reconhecê-lo naquilo que é de particular interesse ao pesquisador (GROPPO; MARTINS, 2007, p. 40).
Então, a metodologia se faz presente na definição acerca das técnicas de pesquisa e no referencial teórico, a partir do qual se pretende analisar os dados obtidos. E, para a elaboração deste trabalho, adotou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica e de campo, de natureza qualitativa, tendo como técnicas: a observação, os registros e a entrevista aberta sem estruturação, já que esta “é um diálogo que o pesquisador estabelece com uma ou mais pessoas que guardam informações sobre o tema e problema de pesquisa” (GROPPO; MARTINS, 2007, p. 51).
Utilizou-se ainda como metodologia o estudo de caso que, de acordo com Vianna (2001, p. 140),
Objetiva um estudo detalhado, profundo e exaustivo de um objeto ou situação, contexto ou indivíduo, uma única fonte de documentos, acontecimentos específicos e outras situações, sempre de forma a permitir o entendimento da sua totalidade. Através desse método, pode-se centrar seu estudo no todo da realidade a ser estudada ou em parte dela ou uma de suas atividades específicas.
Desse modo, é possível evidenciar dados, os quais não aparecem de forma tão concisa nas observações, por intermédio de diálogos entre a autora deste trabalho e pessoas que fazem parte do cenário “sala de aula”: professora e estudantes da instituição.
Vale ressaltar que pesquisa de natureza qualitativa, segundo Vianna (2001), é uma abordagem descritiva, buscando identificar relações, causas, efeitos, consequências, opiniões, significados, categorias, entre outros aspectos necessários à compreensão da realidade estudada e que, de modo geral, envolve múltiplos aspectos.
Optou-se por tal natureza, particularmente nesta produção textual, a fim de saber “as representações sociais elaboradas pelos estudantes do segundo ano do ensino fundamental da rede pública a partir da conduta moral veiculada na escola e constituída na sala de aula”, objeto de pesquisa cuja inspiração veio do relatório de estágio de observação[4], a partir do qual foi feito um projeto e se iniciou a construção deste trabalho.
O CASO EM ESTUDO[5]: A turma do segundo ano vespertino do ensino fundamental da escola pesquisada
Há mais de três anos, havia uma instituição de ensino A funcionando em um bairro da Orla de Salvador, porém, mais tarde, devido à demanda por vagas, passou a existir a escola pesquisada nas proximidades, fundada em 2006. Contudo, a instituição A não se fechou, permanecendo no mesmo lugar, para atender melhor aos moradores do local. No novo endereço, ainda na Orla, a escola pesquisada tem como diretora uma profissional que tinha gestado na instituição A, da qual muitos estudantes são transferidos à escola pesquisada.
Esta tem como público alvo estudantes do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental, que moram no bairro da Boca do Rio e adjacências, e tem projetos que promovem aos estudantes um ambiente de letramento através de diversos trabalhos, incluindo práticas de leitura e escrita na sala de aula.
Diretoras, coordenadoras e professores são responsáveis pelos projetos e, a partir de seus resultados e da demanda dos estudantes, criou-se mais uma etapa do trabalho para leitores e escritores em 2008 e pode haver outra, porém, por enquanto, está sem data prevista, entretanto, há cogitação de novos projetos.
Uma questão muito importante nos projetos e na sala de aula da escola pesquisada é a avaliação, a qual é feita através de atividades de “classe” (na sala de aula) e casa, nas turmas do primeiro ao quarto ano e por meio de prova, no quinto ano. Com essas avaliações, o professor precisa colaborar para o aprendizado dos estudantes, orientando-os em relaçãoao conhecimento, como uma das profissionais da escola chegou a afirmar.Então, para a referida Instituição de ensino, ele tem o papel de colaborador.
Para organizar a discussão sobre as representações sociais, a moral e conduta na rede de interações sociais da escola e tantas outras questões percebidas no campo de pesquisa, o trabalho foi dividido basicamente em partes especificadas por títulos e os chamados subtítulos. Na parte nomeada como “o caso em estudo”, apresentam-se um breve histórico da escola pesquisada e alguns trabalhos desenvolvidos por ela. Em seguida, há uma breve discussão sobre possíveis comportamentos de um professor no texto intitulado “a moral como elemento estruturante nas relações pedagógicas”. Na escrita nomeada “a construção/ampliação da moral pelos estudantes mediada por escola e sociedade”, articulam-se realidades imbricadas nas primeiras questões de investigações, através da interface papel e ação, de reflexões sobre desvio de conduta, referência e estereótipos, objetivando, assim, mostrar como tal ampliação da moral pode ocorrer.
Já no texto “representações sociais traduzidas pela conduta moral dos estudantes no jogo da conviviabilidade/sociabilidade”, abre-se uma discussão, para a terceira questão de investigação, que envolve atitude, fala e ação, buscando analisar as relações, por vezes, conflituosas entre representações sociais e conduta moral. Enfim, no texto, cujo título é “a repercussão das representações sociais elaboradas pelos estudantes a partir da conduta moral constituída na sala de aula”, objetiva-se tratar das reproduções e transgressões de regras desenroladas na escola, fazendo alusão à quarta questão de investigação, por intermédio de observações ao comportamento dos estudantes, conforme será possível visualizar na construção textual que se segue.
A MORAL COMO ELEMENTO ESTRUTURANTE DAS RELAÇÕES PEDAGÓGICAS
Em relação ao papel, o professor é realmente um colaborador e pode ser para o bem ou para o mal, pois depende do que ele e o estudante entendem por “bom”. Ele, na sala de aula, pode influenciar bastante os alunos, deixando claro, por exemplo, que não se deve usar o próprio conhecimento para inferiorizar o outro, através de ações, atitudes durante a convivência escolar.
Se os estudantes comungarem dessa ideia, podem tomar o professor como referência positiva e realmente não inferiorizar alguém. Entretanto, se os alunos se considerarem melhores porque apreenderam muito na escola, os professores podem até ter colaborado para o respeito humano (valor moral na sociedade), que também é conhecimento, mas, no entanto, os estudantes fazem o “mau” em relação ao “bom”.
Em outro caso, se o professor tiver um comportamento desrespeitoso aos alunos, ele colabora para o aprendizado de algo ruim, considerando como “bom” atribuir importância ao outro (isso é respeito), o que não impede um estudante de tomar essa situação como exemplo que não deve ser seguido, representando socialmente sua moral através de sua conduta.
Nesse contexto, falar de representações sociais da conduta moral na sala de aula tem pertinência à medida que a escola, de acordo com Maia e Mazzotti (2006), “[...] é uma instituição psicossocial permeada por valores ou representações de todo tipo” (p. 120). É impossível discutir conduta moral na sala de aula sem falar da interface educação e moral, considerando que escola e sociedade têm relação estreita ou dialogam valores imbricados. A sala de aula é um espaço relacional em que a categoria social “estudante” aciona e vivencia representações sociais impregnadas de valores nas relações pedagógicas, o que, por sua vez, media uma conduta e amplia seu repertório moral.
Através de “as representações sociais elaboradas a partir dos estudantes do segundo ano do ensino fundamental da rede pública sobre a conduta moral veiculada na escola e constituída na sala de aula”, busca-se investigar como eles vão construir/ampliar noção de moral na escola se transitam em espaços diferentes que exigem representações diferentes e pesquisar acerca de como é a tensão, na conduta moral, entre a representação social que o estudante tem diante da sociedade e a que ele tem de si mesmo.
Considera-se, nesta pesquisa, o conceito de conduta tal qual apresentado por Abbagnano (1998, p. 173), como:
Toda resposta do organismo vivo a um estímulo que seja objetivamente observável, ainda que não tenha caráter de uniformidade no sentido de que varia ou pode variar diante de determinada situação. Por essa falta de uniformidade, a conduta diferencia-se do comportamento.
Pode-se afirmar que a conduta é uma “coisa” com diversas outras (comportamentos) incutidas ou com várias formas de ser representada, pois se trata de configurar comportamentos, simbolizando até outro comportamento (conduta) que os engloba, porque varia mediante a atribuição de símbolosdiferentes aos olhos de quem o analisa.
Além disso, conduta, que vem do latimconductus, conducere, cujo significado é conduzir juntamente, é um “valor moral de uma ação, apreciado segundo certas normas de bem e de mal [...]” (JAPIASSÚ; MARCONDES, 1996, p. 51). A conduta vai se construindo por meio de aprendizagens sobre a moral que, segundo La Taille(2004), é essencial ser trabalhada para a cidadania, a qual apresenta dimensões morais e éticas, sendo necessária a capacidade de identificar tais dimensões, pensar suas implicações e tomar decisões.
No que diz respeito à moral, o diálogo com Almeida (2007) esclarece que vem do latimmores e são valores que a sociedade define para si mesma, o que julga ser o mal e o vicioso e, em contrapartida, o que considera ser o bem e a virtude. O referido autor afirma que as pessoas são formadas pelos costumes da sociedade, a qual as educa para respeitarem e reproduzirem os valores propostos por ela como bons e, portanto, como obrigações e deveres.
Para Almeida (2007), moral diz respeito ao conjunto de costumes tradicionais de uma sociedade, os quais são considerados valores e obrigações à conduta de seus membros e, por serem anteriores os costumes ao seu nascimento e formarem o tecido da sociedade em que vivem, são considerados inquestionáveis e quase sagrados. Assim, pode-se compreender a moral como valores instituídos pela sociedade.
Contudo, na discussão entre a representação e a conduta na interface educação e moral, é pertinente mencionar que esses valores podem ser revistos e, para Jovchelovitch (1995, p. 65):
As representações sociais se articulam com a vida coletiva de uma sociedade e com os processos de constituição simbólica, nos quais sujeitos sociais lutam para dar sentido, entendê-lo e nele encontrar seu lugar, através de uma identidade social.
Então, essa vida coletiva inclui a conduta, e as representações sociais são também o que permitem o indivíduo sentir-se inserido na sociedade, pois quando é representado como parte dela, percebe a si mesmo com o significado de pertença, inclusão. Desse modo, pode-se afirmar que o estudante já chega à escola com uma representação social agenciada nas relações sociais cotidianas que fazem parte de sua formação social.
Por outro lado, a representação social pode ser geradora de exclusão social, ao servir de estigma para deixar o indivíduo à margem de seu grupo, em que:
As representações sociais são um sistema ou sistemas de interpretação da realidade, que organiza as relações, o indivíduo com o mundo e orienta suas condutas e comportamento no meio social, permitindo-lhe interiorizar as experiências, as práticas sociais e os modelos de conduta de objetos socializados (XAVIER, 2002, p. 22-23).
Então, tal representação influencia bastante o indivíduo e pode-se observar, perceber, confirmar isso a partir da conduta moral constituída na sala de aula, por intermédio das relações entre estudantes e professores através de atitudes, linguagens e valores morais que são transgredidos, ou seja, não seguidos, ignorados, enquanto outros são reproduzidos. Nesse sentido,
Os valores são representações sociais, originadas de conversações (imediatas ou mediatas), diante de problemas percebidos como tais pelos membros de um grupo social. Estas conversações visam resolver o ‘problema’ como assim o grupo o perceba (MAIA; MAZZOTTI, 2006, p. 120).
Nesse contexto, é pertinente mencionar que não seguir as regras na/da escola se configura como um problema, a transgressão, quando as normas consideradas corretas pelo grupo social no qual a pessoa está não são reproduzidas na sala de aula. Vale ressaltar que a escola é um espaço privado e é público como um lugar de alteridade que, de acordo com Jovchelovitch (1995), se configura como um ambiente propício a serem cultivadas e estabelecidas as representações sociais, sendo a alteridade “[...] a condição necessária para o desenvolvimento simbólico e para o desenvolvimento do Eu” (p. 65).
Ao considerar essa necessidade, há de convir que a transgressão não impede o desenvolvimento em questão, porém existe a possibilidade de enveredar por representações que podem contribuir para o rompimento da ordem social, com o fato de não seguir regras, ponderando que a categoria social “escola” assemelha-se à sociedade pelo aspecto público.
A CONSTRUÇÃO/AMPLIAÇÃO DA MORAL PELOS ESTUDANTES MEDIADA POR ESCOLA E SOCIEDADE
Durante esse processo, o estudante transita em um mundo cheio de regras morais de seu grupo social que, a rigor devem ser seguidas, porém nem todo indivíduo as reproduzem e, dessa maneira, há uma transgressão. Nesse caso, é o comportamento da pessoa, acompanhado do que seu grupo considera regra, que “diz” se ela está agindo moralmente certo ou errado. Ao investigar a construção/ampliação da moral dos estudantes da instituição pesquisada, considerando que é mediada por escola e sociedade, observou-se que os estudantes não acionam apenas a moral que lhes é transmitida pela escola, mas a que é ampliada em suas relações na sociedade, como pode se notar na situação 1:
Nos corredores dessa escola, um aluno do 3º ano disse que não gostava de jogar futebol porque era muito violento; as pessoas empurravam-no. Então, ele preferia correr, já que queria natação, mas a escola não tinha piscina. Em seguida, falou que conhecia os meninos que queriam bater em um “pequeno” do 1º ano e que isso era covardia, dizendo, em seguida: “Quatro para bater em um!” e acrescentou:
- [...] Quando dois brigam, mas um não sabe brigar, alguém tem que ajudar. Mas quando os dois sabem, não precisa porque está se defendendo[6].
Nesse sentido, “quem briga precisa defender-se”, e “quem não sabe brigar precisa de ajuda” são máximas que fazem parte da concepção do menino que, através de suas experiências, se confronta com as regras da escola de modo intenso. A situação 2 que se segue demonstra essa questão:
Ele ainda disse: