Um estudo sobre a língua escrita na rede social Facebook: vale apena curtir?



Resumo

            Este trabalho visa compreender e estudar sobre as instáveis grafias da língua escrita na rede social Facebook. Haja vista que esta comunidade vem crescendo de forma bastante proporcional e pelo fato de se abordar a escrita em movimento e suas variantes essenciais para a compreensão e desenvolvimento pedagógico acerca do tema. Não é minha intensão aprofundar uma discussão sobre a utilização desta rede nas salas de aulas, nem propagar uma possível ameaça à existência da língua portuguesa. 

Palavras-chave: escrita, texto eletrônico, língua padrão, ensino. 

Abstract

This work aims to understand and study on unstable spellings of written language in social network Facebook. Considering that this community has grown quite proportional and because of approaching the writing on de the move and its variants essential to understanding and developing teaching on the subject. It is not my intention to deepen a discussion on the use of this network in the classroom, or transmit a possible threat to the existence of the Portuguese language. 

Keywords: writing, electronic text, standard language, teaching. 

1. Introdução

            A revista “Veja”, edição especial do mês de outubro de 2011, forneceu dados estatísticos que mostram uma vertiginosa propagação da rede social Facebook, não só entre os brasileiros, mas no mundo todo. De acordo com esta renomada revista, “a geração ‘f’ já ultrapassa os 800 milhões de usuários”. Só no Brasil já somamos 28,6 milhões usufrutuários, que dedicam ao Facebook aproximadamente 2h24 diárias.

            A facilidade de acesso aos meios tecnológicos, digitais e sociais, de fato devem contribuir para esta massificação de assinantes, gerando desta forma práticas interativas, que são ‘compartilhadas’ e ‘curtidas’ a cada click do mouse. Deste modo, cabe à afirmação de Marcuschi (2004), quando se refere aos chats, de acordo o linguista está sendo criadas “novas formas de organizar e administrar os relacionamentos interpessoais [com um] novo enquadre participativo” (p. 17).

            Por isso, cremos que a escrita partilhada neste circulo de pessoas deve ser analisada, não somente sob a ótica do preconceito linguístico, mas pelo fator que Bakhtin (1987, p. 109) já preconizada, quando afirmou que a verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas, mas pelo fenômeno social da interação verbal, que se realiza através da enunciação e dos enunciadores.

            Desta forma, acreditamos que pelo fato da linguagem ser vista como uma ferramenta de interação social e formadora de conhecimento, este conceito perpassa a compreensão da língua como sistema pré-estabelecido, estagnado e centrado apenas em códigos.

            Sendo assim, concordamos com a estudiosa Janice Theodoro (2007, p. 49), quando diz que tudo muda, a cada momento, no mundo contemporâneo e que, portanto, o conceito com o qual precisamos trabalhar, atualmente, com muita desenvoltura, é o de mudança.

 

2. O Facebook e o Diálogo Virtual

            Citamos Bakhtin (1992), ao narrarmos que toda palavra serve de expressão de um em relação a outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de ponte lançada entre nós e os outros. E a esta ponte nos mencionaremos como Facebook, já que por meio dele, as narrativas e as discursividades vêm ganhando dinâmicas novas que, sob certo ângulo, aguardam estudos elucidativos das noções de gênero, tipos e modalizações textuais em transito na rede mundial de computadores, “A Internet”.

            Por meio do advento de novas formas de interação social, a escrita padrão vem sendo reconfigurada para atender uma necessidade de expressão que foge as normas cultas que são pregoadas nas escolas, nos livros, na academia etc. A quebra dessas palavras, mobiliza neologismos grupais, já que as palavras se fragmentam, acentos gráficos desaparecem, números tornam-se letras e constantemente vão sendo compartilhados e curtidos ao longo dos comentários.

            De fato, este comportamento não é exclusivo desta rede social, no entanto entendemos que como os diálogos ocorrem de maneira cíclica, isto é, acabam voltando ao seu ponto de partida, faz-se necessário orquestrar sobre tal ocorrência.

           

3. O Dualismo Existente no Espaço Cibernético do Facebook

            Pierre Lévy (1993) define o ambiente cibernético como um terreno onde a humanidade esta trabalhando hoje. Para o autor é um novo espaço de interação social que abrange outros meios de comunicação, como o da oralidade, da escrita e da informática. Para o estudioso está gestão social do conhecimento não se dá por simples substituição, mas antes de tudo por exemplificação e deslocamentos do centro de gravidade.

            Em outras palavras, Lévy (1996) aponta que antes era o leitor que se deslocava diante do texto, hoje é o texto que se desloca diante do leitor, um exemplo deste deslocamento é a presença do hipertexto, que serve como um auxílio para exploração do conteúdo estudado. Pensando desta forma, tanto a escrita quanto a leitura estão transformando os seus papeis, pois o próprio leitor diante destas circunstâncias participa mais da sua redação, uma vez que ele tem diante de si não um texto estático, mas uma ramificação de textos dentro do seu próprio texto. 

            Com base nestes parágrafos percebi que a maneira de interação no Facebook sucede estas premissas. Haja vista que, ao digitar um comentário que você gostaria de compartilhar não apenas no seu próprio mural ou no mural de outro amigo, você pode utilizar hiperlinks que tem um papel análogo com o do hipertexto de ramificar as conversas sem a necessidade de digitá-las posteriormente em outras páginas.

            A leitura e a escrita, portanto tornam-se cíclicas, e é este movimento rotatório que nos chamou atenção acerca da língua escrita no Facebook. Pois se esta rede social for percebida como um ambiente virtual onde os usuários trafegam informações sobre si e sobre o seu próprio mundo, por que a existências de duas faces em uma mesma ferramenta?

            Entendam que quando ponderamos sobre as duas faces existentes neste grupo social, estamos nos referindo aos dois meios de interação da língua escrita existente nesta rede: os comentários escritos e expostos do mural (página principal do assinante) onde todos os usuários participantes desta rede têm acesso e as conversas digitadas no bate-papo (estilo chat) onde a troca de informações é mais reservada. Esta diferenciação sobre o escrito padrão e o temido internetês denominamos como o “x” da questão.

            Constituindo que exista um motivo para o mesmo usuário utilizar duas versões de uma mesma língua para interagir nesta comunidade e se a fala é uma só, por que a preocupação com a escrita no mural e o desleixo com a grafia no bate-papo?

            Há quem diga que este cuidado com a grafia na página principal dá-se pelo fato da exposição, afinal se o que eu digito no mural for permutado para os outros assinantes, a analise sobre a minha escrita será negativa ou não, enquanto que no bate-papo, por conta da privacidade e da velocidade da comunicação, a minha escrita já não tem a necessidade de manter-se de acordo com a norma padrão.

            No entanto, se pensarmos sob a ótica de Bakhtin (1992), este comportamento a priori dá-se pelo fator da enunciação e dos enunciadores, mas e a escrita, será que os usuários aderem os termos exposto através de Levy (1993) sobre a exemplificação e deslocamentos do centro de gravidade?

            Do mesmo modo essas paragens devem permear os estudos acerca da língua. Pois se há uma preocupação com a escrita, está inquietação deve suscitar tais estudos, sendo assim, como apontou Marcuschi (2004), este tipo de espaço cibernético está a tornar-se um lugar essencial, um futuro próximo de comunicação humana e de pensamento humano.

 

4. O “Livro da Internet”³ Para a Sala de Aula

            É fato que a maioria dos professores de língua portuguesa reclamam sobre a falta de escrita dos alunos. Este fator é interessante se pensarmos na quantidade de escrita que esses alunos em potencial produzem em suas páginas sociais.

            Concordamos com Sírio Possenti (2006), quando diz que o domínio de uma língua é o resultado de práticas efetivas, significativas e contextualizadas, logo por que não utilizar o livro da internet nas tarefas intra e extraclasse?

           

 

 

_____________

³ Entendam que quando mencionamos sobre o livro da internet, estamos nos referindo ao Facebook.   

            Talvez esse impasse se dê por conta da cegueira contemporânea, em outras palavras, a falsa propaganda do ensino rotineiro da gramática nas escolas, ainda serve como alicerce pedagógico em várias instituições de ensino. O que nos leva a discordar de Koch (2010, p. 32), quando a estudiosa expõe que:

(...) houve um tempo em que era comum recomendar aos alunos baterias e mais baterias de exercícios sobre o uso de sinais de pontuação, concordância, regência, colocação pronominal, dentre outros tópicos, esperando que o aluno exercitasse em frases as regras gramaticais e depois transferisse esse conhecimento para a produção de textos.

 

                Discordamos por acreditarmos que esta premissa ainda esta presente no dia-a-dia dos alunos, há ainda quem siga ao pé da letra este tipo de atividade, mesmo sabendo que este tipo de ensino não é mais recomendado. Pois conforme rege o PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) de língua portuguesa, os alunos devem saber utilizar diferentes fontes de informações e recursos tecnológicos para adquirir e construir conhecimentos.

            Por isso, compreendemos que a utilização desse cyber book, serviria de auxilio nas tarefas pedagógicas acerca da língua, pois segundo Geraldi (2006), a língua só tem existência no jogo que se joga na sociedade, na interlocução. E é somente no interior de seu funcionamento que se pode procurar estabelecer as regras de tal jogo.    

     

5. Considerações Finais

            Do que aqui se expôs, após um levantamento bibliográfico e sobre a relação do texto escrito no facebook, pode-se concluir que por se tratar de um tema bastante complexo em relação à construção da língua escrita padrão e da incorporação deste recurso digital em atividades de cunho pedagógico, faz-se necessário uma investigação mais profunda, que utilize de corpus para análise textual e que minimamente dialogue sobre o papel da escola em tempos de Internet e de ramificadas redes sociais.

            Finalizamos este estudo, ressaltando que não podemos repetir modelos, temos que partir da premissa que a repetição de uma determinada estrutura pode atrofiar o próprio conhecimento linguístico, neste sentido identificar e pesquisar sobre esses fatos é um trabalho bastante importante que deve ser desenvolvido sem desprendimento ou preconceito.

           

 

Fontes Bibliográficas

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

________. Marxismo e filosofia da linguagem. 2ª ed. São Paulo: Hucitec / Petrópolis: Vozes, 1987. p. 109. 

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: língua portuguesa. Secretária de Educação Fundamental. Brasília: 1997. p. 48-53.

GERALDI, João Wanderley (org.). Concepções de linguagem e ensino de português. In:______. O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2006. p. 39-46.

JELIN, Daniel; GOULART, Nathalia; REBERVEL, Paula. O que quer o senhor das redes. Revista Veja. Edição 2.237, Ano 44, Nº 40. São Paulo: 05 out. 2011. Especial, p.90-97.

KOCH, Ingedore Vilaça & ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de produção textual. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2010. p. 32-35.

LÉVY, Pierre. As tecnologias da Inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. São Paulo: Editora 34. 1993.

________. O que é virtual? São Paulo: Editora 34. 1996.

MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais emergentes no contexto da tecnologia digital. In:

MARCUSCHI, L. A. & XAVIER, A. C. (orgs.). Hipertexto & Gêneros digitais: novas formas de construção do sentido. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004. p. 13-67.

POSSENTI, Sírio. Sobre o ensino de português na escola. In: GERALDI, João Wanderley (org.). O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2006. p. 32-38.

THEODORO, Janice. Educação para um mundo em transformação. In: KARNAL, Leandro (org.). História da sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2007. p. 49-56.

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Autor: Jaqueline Do Socorro Costa Silva


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