Parceria público-privada (PPP)



Alice de Carvalho Neves 

Com a notícia que a Copa do Mundo de 2014 será realizada no Brasil, a Parceria Público-Privada (PPP) passou a ser o assunto em evidência no âmbito da Administração Pública em todo o país.

Isso porque a Administração Pública não possui recursos suficientes para implantar obrar de modernização e segurança nos Estádios de futebol que sediarão os jogos da Copa. Ademais, inexiste a possibilidade de maior arrecadação de capital privado por parte do Governo através de recursos tributários, o que torna fundamental o estudo e o emprego das Parcerias Público-Privadas como forma de capitação de recursos para investimento em infra-estrutura e serviços públicos.

Até dezembro de 2004, não havia lei federal específica que regulamentava as licitações e contratos de Parceria Público-Privada. No entanto, o art. 24, §3º, da Constituição Federal, permitia a criação de leis estaduais específicas nos casos de inexistência de lei federal sobre normas gerais.

Assim, amparados pela norma constitucional, vários Estados já eram regidos por normas próprias que regulamentavam as Parcerias Público-Privadas. Os Estados de Minas Gerais, com a Lei. 14.868/03, de Santa Catarina, com a Lei 12.930/04, e de São Paulo, com a Lei 11.688/04, são exemplos de Estados que possuem lei estadual com regras específicas sobre o tema.

Após um ano de tramitação legislativa e intenso debate público entre o Governo, os parlamentares e a sociedade em geral, em 30 de dezembro de 2004, foi aprovada a Lei 11.079 que normatizou negócio jurídico entre setores público e privado em cooperação e parceria na prestação de atividades públicas (Parcerias Público-Privadas).

O texto da Lei incorporou conceitos aplaudidos pela experiência internacional e garantiu que as Parcerias Público-Privadas sejam um instrumento efetivo na viabilização de projetos fundamentais ao crescimento do país, tais como investimentos em portos, rodovias e ferrovias necessários para impulsionar e garantir o crescimento da economia brasileira, suprindo a ausência de conceito concreto do que seria Parceria Público-Privada, delineando um sentido restrito para o termo, limitando as parcerias às modalidades de patrocinada e administrada.

Contudo, outras normas legais também disciplinam matéria de contratação, licitação e orçamento (Lei 8.666/93 – contratos e licitações públicas, Lei 8.987/95 – concessões, e Lei de Responsabilidade Fiscal), estabelecendo diversos limites à Administração Pública, devendo, por tanto, serem analisada de forma conjunta.

Aplicam-se às Parcerias Público-Privadas os princípios amplamente contemplados na Constituição, tais como a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Não obstante, a Lei 11.079/04 estabelece, em seu art. 4º, outros princípios norteadores, quais sejam: a eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade; o respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução; a indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; a responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias; a transparência dos procedimentos e das decisões; a repartição objetiva de riscos entre as partes; e, por fim, a sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de parceria.

Podemos conceituar a Parceria Público-Privada como um contrato de prestação de serviços de médio e longo prazo, formado por qualquer ente da Administração Pública com a iniciativa privada, por um determinado período em que será explorado pelo ente privado a título de remuneração.

Nas palavras de Marçal Justen Filho,

“parceria público-privada é um contrato organizacional, de longo prazo de duração, por meio do qual se atribui a um sujeito privado o dever de executar obra pública e (ou) prestar serviço público, com ou sem direito à remuneração, por meio da exploração da infra-estrutura, mas mediante uma garantia especial e reforçada prestada pelo Poder Público, utilizável para a obtenção de recursos no mercado financeiro.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 549)

O art. 2º da Lei 11.079/04 define a PPP como um contrato administrativo de concessão, que se dá através da modalidade patrocinada ou administrativa. Aquela é o contrato de prestação de serviços ou obras públicas de que trata a Lei 8.987/95, onde a remuneração do parceiro privado envolve, adicionalmente, à tarifa cobrada dos usuários, contraprestação pecuniária do parceiro público. Já concessão administrativa, por sua vez, envolve tão somente contraprestação pública, pois se aplica nos casos em que não houver possibilidade de cobrança de tarifa dos usuários.

Desta forma, nota-se que a investidora privada arcará com o ônus do financiamento de 100% do serviço, incluindo todas as obras e serviços necessários para execução do contrato. Somente após a finalização das obras é que as empresas privadas contratadas poderão receber a remuneração pactuada, seja diretamente através dos recursos do Poder Público somente ou combinada com cobrança de tarifa do usuário, como acontece com a forma tradicional da remuneração das concessões. A amortização do investimento, como se vê, somente se inicia quando o serviço ou a utilidade já está disponível, conforme os objetivos traçados no projeto inicial.

Assim, quando findado o contrato de Parceria Público-Privada todos os bens móveis e imóveis necessários para a continuação da execução dos serviços serão revertidos para a Administração Pública, sem direito à indenização.

Importante destacar que o art. 9º da Lei 11.079/04 impõe uma exigência para que a iniciativa privada realize um contrato de Parceria Público-Privada com a Administração Pública. Segundo o artigo supracitado, antes da celebração do contrato, deverá ser constituída uma Sociedade de Propósito Específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria.

Uma vez constituída a Sociedade de Propósito Específico, ela adquirirá personalidade jurídica própria. Assim, possuindo personalidade jurídica própria passa a responder pelos direitos e obrigações decorrentes da realização do empreendimento para qual foi constituída, podendo até ser acionada judicialmente.

Frisa-se que a Administração Pública pode assumir o controle do capital votante da Sociedade de Propósito Específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público em caso de inadimplemento de contratos de financiamento.

A Lei 11.079/94 estabelece algumas cláusulas que são essenciais no contrato de PPP, inovando em algumas partes. Exemplo dessa inovação é a previsão legal da repartição objetiva dos riscos entre as partes, observando a capacidade do contratado, em casos de força maior, caso fortuito, fato do príncipe e álea econômica extraordinária do contrato.

Outras cláusulas essenciais nos contratos de PPP são:

  • a fixação do prazo de vigência, que deverá ter prazo mínimo de 5 anos e máximo de 35 anos;
  • as formas de remuneração da Administração Pública para com o investidor privado, estabelecendo previamente o valor das taxas a serem cobradas aos beneficiários do serviço;
  • as penalidades aplicáveis em casos de descumprimento do pactuado;
  • a indicação dos fatos que poderão ser enquadrados como inadimplência pecuniária da Administração Pública;
  • os critérios objetivos para avaliação do desempenho do invertidos privado;
  • os mecanismos para preservação da atualidade da prestação dos serviços;
  • a prestação pelo parceiro privado, das garantias necessárias, observado o limite do art. 56, da Lei 8.66/93, isto é, de até 10% do valor do contrato, acrescido do valor dos bens entregues pela Administração, quando for o caso, nas concessões patrocinadas (quando há na prestação dos serviços precedência da execução de obra pública, deve-se observar o disposto no art. 18, XV, da Lei 8.987/95, ou seja, o limite do valor da obra).

Importante ressaltar que o art. 2º, § 4º, da Lei 11.079/04, estabelece algumas hipóteses em que não será permitida a realização de contrato de Parceria Público-Privado. Conforme o artigo supracitado, só é permitida a celebração de contratos de PPP nos casos cujo valor seja superior a 20 milhões de reais; cujo o período de prestação de serviço seja superior a 5 anos, visando a amortização do investimento, sendo vedada a celebração de contrato que tenha como objeto único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública.

A lei previu a criação de um órgão gestor das Parcerias Público-Privadas federais, que será integrado por um representante dos Ministérios do Planejamento, da Fazenda e da Casa Civil, com competência para definir os serviços prioritários para execução em PPP; disciplinar os procedimentos para celebração dos contratos; autorizar a abertura da licitação; e apreciar os relatórios de execução dos contratos.

Segundo o art. 22 da lei 11.079/04, “a União somente poderá contratar parceria público-privada quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente líquida do exercício, e as despesas anuais dos contratos vigentes, nos 10 (dez) anos subseqüentes, não excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios”.

Esse limite de 1% também deverá ser respeitado pelos Estados, Distrito Federal e pelos Municípios, devendo estes encaminhar ao Senado Federal e à Secretaria do Tesouro Nacional as informações necessárias para o cumprimento do limite estabelecido, conforme prevê o art. 28 da lei supramencionada.

Importante ressaltar que a Administração Pública deverá fazer o controle interno acompanhando a execução da obra. Caso este controle não seja eficiente, poderá o Poder Legislativo fazer o controle externo, auxiliado pelo Tribunal de Contas. Desta análise, poderão ser sustadas as decisões do Executivo, se o projeto não condizer com os princípios da oportunidade e economia, por exemplo.

Ademais, a própria população e o Ministério Público poderão fazer o controle externo popular, fiscalizando a realização das obras, através da ação civil pública, em relação ao Ministério Público, e ação popular, quanto à população.

Concluindo, entende-se como parceria público-privada um contrato de prestação de serviços de médio e longo prazo (de 5 a 35 anos) firmado pela Administração Pública, cujo valor não seja inferior a vinte milhões de reais, sendo vedada a celebração de contratos que tenham por objeto único o fornecimento de mão-de-obra, equipamentos ou execução de obra pública. Na PPP, a implantação da infra-estrutura necessária para a prestação do serviço contratado pela Administração dependerá de iniciativas de financiamento do setor privado e a remuneração do particular será fixada com base em padrões de performance e será devida somente quando o serviço estiver à disposição do Estado ou dos usuários.

Portanto, as Parcerias Público-Privada é um modo inovador de garantir a prestação de serviços público essenciais à população, sendo um inegável avanço em matéria de contratação pública, pois a legislação pátria somada aos princípios e diretrizes da Lei de PPPs formam um instrumento eficaz de controle e fiscalização, coibindo possíveis abusos e ingerências.

Bibliografia:

1 - JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.

2 - JURUÁ, Ceci Vieira. PPP – Os contratos de parceria público-privada. ADUFRJ – Seção Sindical. Edição de 12 de abril de 2004.

3 – CAMACHO, Bruno Sanna, Parcerias Público-Privadas. Conceito, princípios e situações práticas. http://jusvi.com/artigos/34139. Acessado em 02.05.2012.

4 – Barbosa, Marcondes Dias. Parceria Público´Privada (PPP). http://jus.com.br/revista/texto/7448/parcerias-publico-privadas-ppp. Acessado em 03.05.2012.

5 – Não foi possível identificar o autor. http://www.planejamento.gov.br/hotsites/ppp/conteudo/apresentacao.html. Acessado em 03.05.2012.

6 – Lei 11.079 de 30 de dezembro de 2004.

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