A Defesa da Concorrência



A DEFESA DA CONCORRÊNCIA 

Paulo Vitor de Queiros Alves[1] 

INTRODUÇÃO 

O presente artigo visa expor a cerca da defesa da concorrência, apresentando as formas possíveis para tal, uma vez que com as distorções e falhas do mercado, o que acaba por ocasionar concorrências cada vez mais desleais, há a necessidade de uma intervenção do Estado no domínio econômico a fim de atuar como agente normativo e fiscalizador, no intuito de coibir as consequências destas distorções, tais como, o abuso do poder econômico, bem como o aumento arbitrário dos lucros o que afeta diretamente os consumidores do mercado.

Para tanto o trabalho será dividido cinco capítulos. No primeiro capítulo será feito um estudo a cerca do conceito de mercado, o qual é visto como o local, em que ocorre a relação mercantil entre compradores e vendedores. No segundo capítulo estudará as estruturas do mercado, sendo que estas para grande parte da doutrina se dividem em concorrência perfeita, monopólio, concorrência monopolística, oligopólio e concorrência praticável. No terceiro capítulo será feita uma abordagem no que tange os princípios de proteção do mercado, quais sejam, o principio da livre iniciativa, bem como o principio da livre concorrência. No quarto capítulo estudará o aumento do poder econômico e o aumento arbitrário dos lucros. E por fim, no quinto capítulo será estudada a intervenção do Estado no domínio econômico, atuando como agente direto, agente fiscalizador e normativo do mercado econômico, conforme veremos.

 

 

1. MERCADO

 

A fim de se analisar a cerca da concorrência, torna-se imprescindível o estudo no que tange o propiciador de tal instituto, qual seja, o Mercado, o qual é visto como local favorável para a realização de troca de bens e serviços, ou seja, o ambiente em que compradores e vendedores estabelecem uma relação mercantil a fim de realizar transações, acordos ou trocas comerciais.

Segundo Saddi et al (2005), o mercado consiste no ambiente onde demanda e oferta, consumidores e empresas, compradores e venderes se encontram para negociar seus bens e serviços. Nada que se difere dos mercados medievais, ou dos mercados municipais, que ainda hoje podem ser encontrados em muitas cidades brasileiras.

Para o mesmo autor, a principal função do mercado é determinar os preços, ou valores dos bens, que são os principais elementos com que os agentes econômicos trabalham para tomarem suas decisões de consumo e produção dentro do mercado.

A partir de então, isto é, a partir da determinação dos preços ocorre o chamado equilíbrio, o qual é definido pelo número e pelo tamanho dos consumidores e empresas e pela forma como eles se relacionam. Para medir tal equilíbrio é necessário analisar o grau de competição existente entre os ofertantes, o qual chamamos de concorrência, instituto este que estudaremos no próximo tópico.

 

 

2. ESTRUTURA DO MERCADO

 

Após estudarmos o que é o mercado, mister se faz analisar a estrutura do mercado, a qual por grande parte da doutrina se divide em: concorrência perfeita, monopólio, concorrência monopolística e oligopólio.

 

2.1 Concorrência perfeita:

 

A concorrência perfeita é a primeira estrutura, a qual se deve estudar, uma vez que esta visa descrever o funcionamento ideal de uma economia, a fim de servir como base para o estudo das outras estruturas de mercado.

Segundo Freire Junior (2011), Trata-se de um instituto absolutamente utópico, idealizado pela doutrina econômica, sendo um modelo impossível de ser encontrado na prática.

Pois de acordo com Saddi et al:

 

Neste tipo de concorrência presumem-se a existência de muitos consumidores e de muitas empresas, todos de tamanho pequeno em relação ao mercado. Presume-se, também, que todos dispõem de informação perfeita sobre os preços cobrados por todas as empresas e que não há nenhum tipo de cooperação entre elas. Se alguma empresa cobrar um preço superior ao do mercado, esta não venderá nada. Porém, se fixar um preço inferior ao das outras empresas, ela tenderá a capturar todo o mercado, e as demais empresas terão de baixar os seus preços para se inserir no mercado. (SADDI et al, 2005, p 56)

 

Desta forma, a concorrência Perfeita, obedece a uma situação, em que nem o vendedor e nem o comprador terão o poder suficiente para influenciar o preço ou o mercado. Pois conforme vimos, para que tal aconteça, é necessária a existência de um grande número de empresas para produzir o mesmo bem; a existência de vários compradores com as mesmas informações sobre o mercado; e a existência de homogeneidade nos produtos ou serviços oferecidos no mercado;

 

2.2 Monopólio

 

O monopólio consiste em um tipo de mercado, no qual existe apenas um ofertante de determinado bem ou serviço, e por este motivo, acaba exercendo grande influência no mercado, no que tange a estipulação dos preços dos produtos.

Nesse sentido, segundo Freire Junior (2011), a palavra monopólio vem do grego momopôlium, composta por monus que significa só, e pôlein, o qual tem sentido de vender. Assim, tem-se que monopólio nada mais é do que um único vendedor de determinado produto inserido no mercado.

Nesta situação, o monopolista exerce o absoluto controle da oferta de produtos, impondo diretamente as quantidades ofertadas, bem como os preços dos produtos no mercado.

Para Saddi et al (2005), neste tipo de mercado, apenas uma empresa supre todo o mercado, uma vez que esta passa ser a única ofertante do produto.

Desta forma, pode-se observar que o monopólio acaba por desfavorecer a concorrência, haja vista que permite o aumento abusivo dos preços dos produtos. Além de gerar o desestímulo no que tange à inovação de produtos por impor pesadas barreiras à entrada de novos concorrentes no mercado, fazendo com que o detentor do mercado não tenha interesse no desenvolvimento de novas tecnologias e aperfeiçoamento dos produtos por ele comercializado.

É o que entende Filho (1998), ao estabelecer três consequências geradas pelo monopólio, quais sejam, O aumento abusivo dos preços por parte dos monopolistas; a tendência dos lucros serem convertidos em um custo social e político, já que este faturamento extra obtido não é convertido para as próprias empresas, sendo utilizadas apenas para a manutenção de sua posição privilegiada no mercado; e por fim como última consequência, o desestimulo à inovação, melhoria e eficiência dos produtos devido ao fato dos monopolistas não investirem em novas tecnologias para os produtos que estão no mercado.

Porém, apesar das externalidades negativas geradas por este tipo de mercado, existem monopólios permitidos legalmente, tais como o monopólio natural e o monopólio legal.

O monopólio legal é aquele em que existem hipóteses, as quais asseguram um monopólio a determinados agentes econômicos, por meio do regime de concessão ou permissão, ou ao próprio Estado, conforme estabelece o artigo 177 da Constituição da república de 1988:

 

Art. 177. Constituem monopólio da União:

I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos;

II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;

III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores;

IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem;

V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição Federal.

§ 1º A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV deste artigo observadas as condições estabelecidas em lei.

§ 2º A lei a que se refere o § 1º disporá sobre:

I - a garantia do fornecimento dos derivados de petróleo em todo o território nacional;

II - as condições de contratação;

III - a estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da União;

§ 3º A lei disporá sobre o transporte e a utilização de materiais radioativos no território nacional.

§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos:

I - a alíquota da contribuição poderá ser:

a) diferenciada por produto ou uso;

b)reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150,III, b;

II - os recursos arrecadados serão destinados:

a) ao pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados e derivados de petróleo;

b) ao financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás;

c) ao financiamento de programas de infra-estrutura de transportes. (BRASIL, 1988)

 

Existem outros tipos de monopólio legal, aos quais são assegurados aos agentes privados, como por exemplo, os direitos autorais e os privilégios de marcas e patentes, que autorizam seus titulares o direito de exploração exclusiva dos produtos.

No que tange ao monopólio natural, tem-se que segundo Freire Junior (2011), trata-se de situação de monopólio criada naturalmente, e não em função da ação dos agentes econômicos direcionados a sua constituição, ocorrendo naquelas hipóteses em que a competição se mostra impossível, física ou economicamente.

Em outras palavras, ocorre nas hipóteses em que uma grande empresa já existente, devido a benefícios em relação ao seu grande porte, conseguem adquirir mercadorias a custos mais baixos do que outra empresa, possibilitando, assim, que estas coloquem no mercado produtos a preços muito menores do que quaisquer outras empresas vendedoras do mesmo produto.

 

2.3 Concorrência monopolística

 

Trata-se de um tipo de mercado, em que há, ao mesmo tempo, elementos da concorrência perfeita e do monopólio, ficando entre as duas formas de organização de mercado.

Para Freire Junior (2011), neste tipo de concorrência, os ofertantes no mercado, são ao mesmo tempo monopolistas e concorrentes, uma vez que há uma similaridade e não identidade dos produtos no mercado (em razão da marca, do modo de confecção, qualidade do produto e etc..)

Ocorre o monopólio em relação à determinada marca, por exemplo, mas não um monopólio absoluto, pois os consumidores se deparam com a possibilidade de substituição da mercadoria ou serviços, que oferece por produtos ou serviços similares.

 

2.4 Oligopólio

 

Este tipo de mercado pode ser conceituado como uma estrutura em que um pequeno número de firmas controlam a oferta de determinado produto, tem-se como exemplo as empresas de bebidas, as empresas de cigarro e as empresas automobilísticas.

Segundo Santiago (2011), o oligopólio vem do grego “oligoi”, que significa poucos, e “polein”, que significa vender, significando “poucos para vender”, ou seja, são poucos os ofertantes de determinado produtos, e cada um detém uma grande parcela do mercado, o que torna sensível as mudanças de preço no mercado. Para este mesmo Autor, no oligopólio, os bens produzidos podem ser homogêneos ou possuir alguma diferenciação, mas, geralmente, a concorrência se efetuará em fatores como a qualidade, garantia, a fidelização ou a imagem, e não tanto pelo preço.

No mesmo sentido define Freire Junior ao dizer que:

 

A estrutura do mercado oligopolista prevê a existência de poucos vendedores, e todos com o mesmo poder econômico de mercado, que adotam, entre si, comportamentos paralelos em relação aos preços, na medida em que não há incentivo para que qualquer um dos membros reduzam seus preços, pois sabe que seu comportamento será prontamente acompanhado pelos outros participantes do mercado. (FREIRE JUNIOR, 2011, p. 67)

 

Com isso, uma tendência muito forte dentro deste tipo mercado consiste na formação do cartel, que se traduz como um acordo realizado entre poucos fornecedores a fim de manter o preço de seu produto em um determinado nível que proporcione lucros a todos os controladores do mercado. Originando, desta forma, uma situação bastante semelhante à do monopólio. (SANTIAGO, 2011)

Por isso, muitas vezes o oligopólio e o monopólio acaba por serem restringidos por leis, principalmente quando o produto em questão é considerado fundamental para a economia.

 

2.5 Concorrência praticável.

 

A concorrência praticável, ou workable competition é defendida pela doutrina norte americana, a qual diz que a concorrência perfeita não existe, sendo tão-somente um modelo teórico e idealizado. Assim, a concorrência praticável consiste naquela concorrência possível ou desejada. Sendo aquela que proporcionasse maior ganho social. (BRUNA, 1997)

No mesmo sentido estabelece Nascimento (2009), ao dizer que a concorrência perfeita é uma concepção mais teórica, ideal, haja vista que, em condições normais, sempre parece existir certo grau de imperfeição que distorce o funcionamento do mercado. Assim, o conceito de concorrência perfeita é usado apenas por seu valor analítico, pois não existe na prática.

Desta forma para Nunes (2007) citado por Nascimento (2009), são hipóteses de concorrência perfeita: a existência de um grande número de compradores e vendedores; produtos homogêneos, não existindo, desta forma, preços diferentes no mercado; há transparência no mercado; e por fim, não há barreiras para a entrada e saída das empresas no mercado.

 

 

3. PRINCÍPIOS DE PROTEÇÃO DO MERCADO

 

Os princípios são mandatos de otimização, os quais servem de diretrizes para o sistema normativo. A Constituição da República é considerada a Lei maior do Estado, ocupando o ponto mais alto da hierarquia das Normas Jurídicas, exatamente por isso que a violação de um princípio importa em uma afronta à própria Constituição, representando, por isso mesmo, uma inconstitucionalidade de consequências muito mais graves do que a violação de uma simples norma jurídica, e é por isso que a doutrina vem insistindo na importância dos princípios para iluminar a exegese do nosso Ordenamento. (COSTA, 2012)

Todo o Ordenamento Jurídico brasileiro está embasado no poder imperial do Estado, o qual deve buscar incessantemente o respeito aos princípios da ordem econômica. Exatamente por isso, a Constituição da República Federativa do Brasil traz alguns princípios, os quais devem ser observados a todo custo, tais como, o principio da Livre concorrência, bem como o principio da Livre Iniciativa, previstos nos artigos 1º, inciso IV e 170, caput e inciso IV da Constituição.

 

3.1 Princípio da Livre Iniciativa

 

O principio da livre iniciativa visa assegurar o ideal a liberdade para o exercício da atividade econômica, a qual prevalecerá a autonomia da vontade, ou seja, assegurando a livre escolha da atividade que queiram desenvolver para o seu sustento. Porém, tal liberdade somente poderá sofrer limitações advindas da lei.

Nos dizeres de Freire Junior (2011), o principio da livre iniciativa é vista como um desdobramento que pode ser classificada sob dois aspectos: enquanto liberdade de comércio e indústria e enquanto liberdade de concorrência, enquanto liberdade pública ou privada. Que para este autor garante aos agentes econômicos o livre acesso ao mercado concorrencial independentemente de qualquer permissão estatal.

Mas obviamente que o princípio da livre iniciativa não é absoluto não podendo ser levados às últimas consequências, de tal forma que, segundo Carvalho (2010), “o anarquismo prevalecerá sobre a segurança jurídica por retirar do Estado a função de restringir a liberdade”. Com isso, não havendo restrição, alguns indivíduos acabarão por estabelecer a ordem através do uso da força. Nesse contexto, para o Autor, a livre-iniciativa, se ilimitada, pode gerar paradoxalmente o seu próprio fim, seja através de monopólios e oligopólios, seja através de cartéis.

Desta forma, o principio da livre iniciativa, se traduz pela proteção a todos os indivíduos no tange ao direito de livremente iniciar a atividade econômica que lhe convir. Porém esta liberdade não pode ser arbitraria, havendo, assim, limitações às quais constituem organismos de proteção do mercado.

 

3.2 Princípio da Livre Concorrência

 

De acordo com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, além de haver a proteção do Estado no que se refere à garantia da livre iniciativa, deve ser haver, ainda, a proteção do princípio constitucional da livre concorrência, a qual se encontra estabelecida no artigo 170, IV CR:

 

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

IV - livre concorrência; (Brasil, 1988) (grifo próprio)

 

 

O principio da livre concorrência, como já foi dito neste trabalho, assegura a todos, várias opções no que tange os preços dos produtos, qualidade dos produtos, bom atendimento por parte dos ofertantes para com os consumidores, além de menores preços, devido ao grande número de ofertantes no mercado, os quais visam viabilizar o valor de seus produtos para, assim, conquistarem os compradores. O principio da livre concorrência possibilita, ainda, estimulo à criatividade e inovação das empresas para competirem entre si no mercado.

Porém, de acordo com Souza (2010) citado por Costa (2012), o princípio da livre concorrência visa assegurar o regime de mercado no cenário econômico, o qual possui o intuito de repelir qualquer tipo de dominação, impondo, assim, obediência a determinados padrões. Segundo ele, a imposição de limites impostos à economia parte do pressuposto de que a atuação do Estado não crie distorções ao mercado, preservando, sempre, a isonomia entre todos os concorrentes.

Conforme vimos, o principio da livre concorrência permite a todos os indivíduos o direito de competirem livre e isonomicamente no mercado. Haja vista que, o desrespeito para com este princípio acabaria por conferir às empresas uma condição favorável em relação às demais empresas que atuam de forma legal no mercado, pois com o monopólio, esta empresa passaria a ter condições de revender seus produtos a preços arbitrários.

É exatamente por isso que, apesar de a Constituição da República de 1988 assegurar a proteção do principio da livre concorrência em seu artigo 170, IV, esta liberdade não é absoluta, uma vez que a própria constituição faz uma ressalva, qual seja:

 

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. (BRASILl, 1988)

 

Assim, de acordo com Freire Junior:

 

A defesa da concorrência, para o legislador constituinte de 1988, é vista não apenas em função da eliminação dos efeitos autodestrutíveis do mercado, mas como instrumento de que dispõe o Estado para conduzir a ordem econômica, motivo pelo qual a consagração da livre iniciativa e da livre concorrência não exclui a atuação do Estado no mercado, seja agindo como elemento normativo e regulador do domínio econômico. (FREIRE JUNIOR, 2011, p 75)

 

 

4. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E AUMENTO ARBITRÁRIO DOS LUCROS

 

Antes de adentrarmos diretamente ao tema, cabe definir conceitualmente o que vem a ser o termo abuso. Segundo o dicionário da língua portuguesa, abuso significa: uso ou consumo de forma excessiva, errada ou inconveniente de algo. Assim, abuso do poder econômico, nada mais é do que o uso excessivo ou errado da condição de agente praticante da atividade econômica.

Como vimos existem várias formas de abuso de poder como, por exemplo, por meio do monopólio, o qual se resume como um tipo de mercado, no qual existe apenas um ofertante de determinado bem ou serviço, e por este motivo, acaba exercendo grande influencia no mercado, o que acaba por desfavorecer a concorrência, permitindo o aumento abusivo dos preços.

É importante salientar que a legislação antitruste brasileira não proíbe o exercício de poder dominante advindo de algum agente econômico, porém desde que esta conquista do mercado se dê em virtude de maior eficiência econômica de determinado competidor.

O que a lei veda, é o abuso deste direito de exercer a posição de domínio, inflacionando arbitrariamente os preços, por serem os únicos fornecedores de determinado produto, conforme estabelece o artigo 173, IV da Constituição da República de 1988, acima transcrito.  A vedação arbitraria dos lucros, prevista pela constituição, tem como função a proteção do consumidor, de evitar com que o abuso por parte do poder econômico no aumento dos preços dos produtos colocados a disposição do consumidor. (FREIRE JUNIOR, 2011)

 

 

5. A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

 

Com a atividade econômica cada vez mais intensa, bem como o acelerado crescimento da concentração de poder, houve a necessidade de uma ação reguladora do Estado em defesa da concorrência no mercado. Tal regulação tem sido no sentido de regular as falhas de mercado, bem como primar pela saúde e bom funcionamento deste, o qual depende diretamente da ação do Estado.

Assim, a nossa Carta Maior, dispôs a cerca da intervenção do Estado no domínio econômico, tendo como princípios básicos, os descritos nos artigos 173 e 174 da Constituição da República de 1988, a qual atribuiu ao Estado à função de agente direto da atividade econômica, a função de agente fiscalizador, bem como a função de agente normativo da atividade econômica, como se pode observar:

 

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:

I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;

II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;

III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública;

IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários;

V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.

§ 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.

§ 3º - A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade.

§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

§ 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

§ 1º - A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento.

§ 2º - A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.

§ 3º - O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros.

§ 4º - As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e naquelas fixadas de acordo com o art. 21, XXV, na forma da lei. (BRASIL, 1988)

 

Desta forma, para Freire Junior (2011), o Estado atuará por absorção, por direção e por indução. Entende a atuação por absorção, quando o Estado atua como agente, agindo em regime concorrencial com o setor privado. A atuação por direção, quando objetivar agir como agente regulador da atividade econômica, estabelecendo mecanismos e normas de comportamento, a fim de tutelar a livre concorrência e reprimindo o abuso do poder. E por fim, atuará por indução, quando tiver por objetivo manipular os instrumentos de intervenção.

Porém, seja qual for a forma de atuação do Estado, esta deve sempre objetivar a segurança nacional ou o relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei, de acordo com o que preceitua o artigo 173, caput da Constituição da República. Pois de acordo com Regis Fernandes de Oliveira:

 

A atividade econômica típica significa a produção de bens com o objetivo de obter lucro. Este é o ínsito da economia. Porém, a atuação do Estado deve ser limitado: sua principal função deve ser a de proteger nossa liberdade contra os inimigos externos e contra nossos próprios compatriotas reforçar a lei e a ordem reforçar os contratos privados, promover mercados competitivos, não por ideologia, mas de acordo com o que dispõe a o nosso texto constitucional. Desta forma o mercado não pode ingressar livremente no mercado para produzir riqueza. (OLIVEIRA, 2010, p. 51) (gripo próprio)

 

Uma vez que, a intervenção do Estado deve ter como primado a correção de eventuais imperfeições do mercado concorrencial, por meio da legislação, como, por exemplo, a utilizada politica antitruste, a qual visa preservar e garantir a concorrência leal.

Para Gasparini (2003), a política antitruste tem o intuito de coibir, por meio de ameaças e punições, as condutas empresariais a fim de restringir ou eliminar a atuação de empresas concorrentes, objetivando fundamentalmente a preservação da livre concorrência e da livre iniciativa.

Desta forma, cabe ao Estado cumprir o seu papel de agente normativo e regulador do mercado, a fim de propiciar aos consumidores, eficiência econômica, qualidade de serviço, produtos mais baratos e com melhor qualidade, por meio do estabelecimento preventivo de regras e condições de mercado que motivem tal eficiência e que evite efetivamente o abuso do poder de mercado, bem como aumento arbitrário dos lucros.

 

 

6. CONCLUSÃO

 

Conforme foi visto no presente trabalho, o mercado consiste no ambiente, em que há a realização da troca de bens e serviços, ou seja, o ambiente em que compradores e vendedores estabelecem uma relação mercantil, sendo o preço o principal elemento para se estabelecer esta relação dentro do mercado. A partir da disposição dos preços dentro do mercado, torna-se necessário analisar o grau de competição existente entre os ofertantes, o qual chamamos de concorrência.

Tais concorrências, podem se apresentar de diversas maneiras dentro do mercado, como, por exemplo: concorrência perfeita, monopólio, oligopólio, concorrência monopolística e, ainda, as chamadas concorrências praticáveis.

A partir do estudo a cerca dos tipos possíveis de concorrências dentro do mercado, verifica-se a necessidade, ou não, de politicas interventivas na esfera econômica, a fim de primar pela defesa da concorrência. Uma vez que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabelece a busca incessante pelo respeito aos princípios da ordem econômica, tais como, o principio da Livre concorrência, bem como o principio da Livre Iniciativa, previstos nos artigos 1º, inciso IV e 170, caput e inciso IV da Constituição.

Pois com as distorções e falhas do mercado, o que causa concorrências desleais, há a necessidade de uma intervenção do Estado no domínio econômico, no intuito de atuar como agente normativo e fiscalizador, objetivando coibir as consequências destas distorções, tais como, o abuso do poder econômico, bem como o aumento arbitrário dos lucros o que afeta diretamente os consumidores do mercado.

Em virtude do que foi mencionado acima, conclui-se que cabe ao Estado cumprir o seu papel de agente regulador da economia, objetivando eliminar os problemas no mercado a fim de, conforme já dito, propiciar aos consumidores, eficiência econômica, qualidade no serviço prestado, produtos com melhores preços e com melhor qualidade, por meio do estabelecimento de condições que motivem tal eficiência.

 

 

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

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FERRAZ JUNIOR. Tercio Sampaio. Da abusividade do poder econômico - Tercio Sampaio Ferraz Jr. Disponível em: http://www.terciosampaioferrazjr.com.br/?q=/publicacoes-cientificas/85, acesso em 01 de maio de 2012.

 

FILHO. Alberto. A intervenção do Estado no Domínio Econômico. Rio de Janeiro: Renovar, 1988.

 

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GASPARINI. Melissa Ferreira. A proteção e regulamentação da concorrência: Análise do caso brasileiro. Brasília a. 40 n. 158 abr/jun 2003

 

PINHEIRO. Armando Castelar. Direito, economia e mercado. Jairo Saddi. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005 – 4ª reimpressão.

 

OLIVEIRA. Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. 3 ed. rev. e atual – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

 

SANTIAGO. Emerson. Monopólio e Oligopólio, disponível em http://www.infoescola.com/economia/monopolio-e-oligopolio/, acesso em 01 de maio de 2012.

 

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[1]Estudante do 10º período de Direito, na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – unidade Praça da Liberdade, Belo Horizonte/MG

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