Novo sindicalismo: pressupostos de conceituação



NOVO SINDICALISMO: PRESSUPOSTOS DE CONCEITUAÇÃO

Prof. Me. Ciro José Toaldo[1]

 

 

O novo sindicalismo, enquanto idéia e proposta, é construída e reconstruída coletivamente por vários atores socais e a partir de diferentes lugares. Assim, sindicalistas, trabalhadores, pesquisadores, governos, empresários e os meios de comunicação de massa participam, cada um a seu modo, desse processo de formação das classes trabalhadoras e da história do movimento operário e sindical brasileiro. Enquanto idéia, é elaborado em oposição às práticas desenvolvidas pelo ‘velho sindicalismo’ cuja atuação orienta-se, segundo Araújo (apud RODRIGUES, 1999:34), pela lei de sindicalização promulgada em 1931, que estabelece o sindicato único por ramo produtivo e região e garante a intervenção direta do Estado no funcionamento interno dos sindicatos e na regulação das relações entre capital e trabalho. Os sindicatos alinhados com essa concepção concentravam-se, basicamente, nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, no período compreendido entre 1943 e o golpe militar de 1964, e suas atividades ligavam-se organicamente com o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e com o Partido Comunista Brasileiro (PCB).

A proposta de um novo sindicalismo é produzida e reproduzida no eletivo acontecer dos inúmeros protestos sociais e manifestações operárias que eclodem

nas várias cidades brasileiras e nos vários setores produtivos, a partir do final dos anos 70 e no decorrer da década de 80, como elucidamos na primeira parte. Partindo de um conjunto de estratégias sindicais, onde inclui a politização do cotidiano de vida e de trabalho e a organização dos trabalhadores nas empresas no confronto direto e na interlocução política com os representantes patronais ou governamentais para a conquista de reivindicações econômicas e sociais, busca estabelecer as regras mínimas de controle e fiscalização dos acordos assinados com o objetivo de viabilizar a sua aplicação nas empresas.

O novo é, inicialmente, evocado para descrever um conjunto de práticas políticas próximas da ação direta, do confronto aberto com o patronato e o Estado. Mais tarde, segundo Leila Maria da Silva Blass:

 

 “O novo assume um caráter auto-explicativo da prática sindical, porque expressa, na visão de alguns autores, o processo de modernização por que passam os sindicatos brasileiros. Estudos e pesquisas, ao insistirem nesses aspectos, elaboram um discurso a respeito da presença de um outro modelo de sindicalismo no Brasil onde a CUT seria a sua expressão mais acabada”. (Apud RODRIGUES, 1999:36)

 

Na visão de Blass, sindicalistas, de  um lado, e pesquisadores, de outro, iluminam de tal modo às práticas sindicais que se instauram no Brasil, nas últimas décadas que acabam ofuscando as tradições políticas e culturais, além de colaborar para ocultar as experiências de lutas que fazem parte da memória histórica e do processo de formação das classes trabalhadoras do Brasil. Sem esquecer, como já afirmamos que a luta de classes é latente, permanente.

O direito de greve, a ação direta combinada às negociações, a regulamentação de direitos sociais, melhoria nas condições salariais e de trabalho, entre outros aspectos, consistem em velhas temáticas em torno das quais se debatem, há anos, as lideranças e os trabalhadores brasileiros. O fato do movimento operário e sindical apresentar maior visibilidade pública, em determinados momentos, não significa que seja portador de práticas inovadoras, pois o novo pode recriar o velho, sob outras condições históricas.

A persistência de certas práticas sindicais, apesar das descontinuidades que pontuam a trajetória de lutas operárias e sindicais na sociedade brasileira, predomina sobre as rupturas. Os principais protagonistas do novo sindicalismo, ou seja, dirigentes, militantes sindicais e trabalhadores, reinventam e recriam formas de organização e de mobilização operária e sindical, sem destruir as que lhes antecederam.

Os atores sociais – trabalhadores e seus representantes sindicais – fazem e refazem a sua história, recriando valores, instituições, idéias e ideais recuperando os fragmentos perdidos das suas ações coletivas. A ênfase excessiva no qualificativo “novo” das práticas sindicais que se espalham pelo País, a partir do final dos anos 70, de um lado, conduz, para fraseando Thompson, ao menosprezo da persistência das tradições políticas e cultuarias na formação das classes trabalhadoras no Brasil, apesar das mudanças político-institucionais recentes e da interlocução mais aberta entre os representantes sindicais, operários, patronais e governamentais. De outro, pode desconsiderar as ambigüidades e paradoxos que perpassam a proposta do novo sindicalismo.

Se os próprios trabalhadores ampliam, nos últimos anos, o âmbito da sua participação e representação política no interior das empresas e na sociedade, a estrutura sindical verticalizada, fundada nos sindicatos únicos por categorias e região, a Justiça do Trabalho, os fundos financeiros recolhidos e controlados pelo Estado permanecem quase intactos. (Boito, 1991) As práticas sindicais persistem porque se adaptam conforme as condições históricas. A desregulamentação das relações de trabalho no Brasil, um traço marcante do sistema brasileiro de relações industriais, inquieta trabalhadores e sindicalistas nos países europeus, aparecendo como um dos principais pontos nas agendas políticas.

Sob o olhar atento e informado pela longa duração da história, as propostas sindicais e operárias que surgem no cenário social brasileiro, desde o final dos anos 70 até meados dos 80, na visão de Blass:

 

 “Não apresentam um caráter tão inovador como querem fazer crer alguns sindicalistas e grande parte dos estudiosos das questões operárias e sindicais, na sociedade brasileira. O cronista que narra os acontecimentos, sem distinguir entre os grandes e os pequenos, leva em conta a verdade de que nada do que um dia aconteceu pode ser considerado perdido para a história”. (Rodrigues, 1999:46)

 

 


[1] O presente artigo é parte integrante de minha  Dissertação de Mestrado O NOVO SINDICALISMO E A MOBILIZAÇÃO DOS PROFESSORES DA REDE PÚBLICA ESTADUAL SUL-MATO-GROSSENSE:Avanços e Rupturas (1979/1992).

 

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Autor: Ciro Toaldo


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