Direito econômico e a ordem econômica constitucional



RESUMO

     A Ordem Econômica Constitucional é matéria regulada pela Constituição Federal de 1988 em seu Título VII entre os artigos170 a192. Os princípios da atividade econômica são baseados na forma capitalista, ou seja, na apropriação privada dos meios de produção e na iniciativa privada. Apesar de consagrar essa economia de mercado, existe ênfase na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, visando assegurar a todos a existência digna conforme os ditames da justiça social.

 PALAVRAS CHAVE:  CONSTITUIÇÃO FEDERAL – ORDEM ECONÔMICA CONSTITUCIONAL – DIREITO ECONÔMICO - PRINCÍPIOS 

INTRODUÇÃO

     Este artigo tem como proposta uma análise geral sobre os princípios da Ordem Econômica Constitucional brasileira sob a luz e fundamentos constitucionais, analisando objetivos assim como um breve histórico acerca do tema, com o objetivo de salientar a importância da atividade econômica para a promoção do Estado Democrático de Direito.

 

BREVE HISTÓRICO

     Pode-se dizer, que os ideais liberais, com a consagração das obras de Adam Smith (1776), durante a Revolução Francesa (1789-1799), promoveram o afastamento da intervenção do Estado na economia, principalmente no que diz respeito à segurança da sociedade, a proteção quanto a injustiça e opressão de qualquer outro membro e, principalmente, a promoção de políticas públicas essenciais.

     Mesmo com a adoção do sistema liberal, é importante lembrar que o Estado jamais deixou, em nenhum momento, de se abster por completo da função de intervir na economia, seja em menor ou maior grau.

     Karl Marx no século XIX, através de seu manifesto comunista, fundamentou teoricamente a necessidade do movimento dos trabalhadores que mais tarde, iriam enfraquecer as fortes bases do Estado Liberalista.

     A Constituição de Weimar (1919), foi de grande influência para a criação de muitas outras constituições da época e, mesmo sendo essencialmente uma carta baseada em uma democracia liberal, ela consagrava em seu texto os direitos sociais que promoviam a constitucionalização do Estado Social de Direito. Essa inovação da constitucionalização do Estado Social foi um marco importante para a conversão, em direito positivo, das várias aspirações sociais que seriam então consagradas como princípios constitucionais protegidos pelas garantias do Estado de Direito.

     Nascia o Estado Liberal de Direito que, pelas pressões das Assembléias Constituintes, gerou a existência de previsões expressas nas mais diversas constituições, criando assim a denominada Constituição Econômica. O Estado Liberal de Direito passa a garantir o constitucionalismo de normas relativas a direitos econômicos e sociais.Nas palavras de Vital Moreira, “o conjunto de preceitos e instituições jurídicas, garantidos os elementos definidores de um determinado sistema econômico, instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia e constituem, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica.”

     No Direito Constitucional moderno nos ensina José Alfredo de Oliveira Baracho, que a “relação entre Constituição e Sistema Econômico ou mesmo Regime Econômico, é freqüente nas constituições modernas, que completam pautas fundamentais em matéria econômica. Chega-se a falar que ao lado de uma constituição política, reconhece-se a existência de uma Constituição econômica.


ORDEM ECONÔMICA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

     Pra André Ramos Tavares, a “ordem econômica constitucional seria um conjunto de normas que realizam uma determinada ordem econômica no sentido concreto, dispondo acerca da forma econômica adotada”.

     Em nosso atual sistema econômico brasileiro, a Constituição de 88 adotou o sistema capitalista de produção baseado na livre iniciativa, que também é denominado de economia de mercado conforme disposto no art.219 do referido dispositivo. Nosso sistema econômico se apóia na apropriação privada dos meios de produção assim como na possibilidade de intervenção econômica. Vejamos o disposto no artigo 170 da Carta Cidadã de 88:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII - busca do pleno emprego;

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”

     O caput do artigo em tela dispõe acerca dos princípios da ordem econômica, são eles: a valorização do trabalho humano e a busca do pleno emprego, a livre iniciativa, existência digna, conformidade com os ditames da Justiça Social. Segundo Raul Machado Horta o texto constitucional na ordem econômica está “impregnado de princípios e soluções contraditórias. Ora reflete um rumo do capitalismo liberal, consagrando os valores fundamentais desse sistema ora avança no sentido do intervencionismo sistemático e do dirigismo planificador, com elementos socializadores.” É uma economia descentralizada de mercado, que está sujeita a atuação estatal no âmbito normativo e regulador, possibilitando que o próprio Estado explore de forma direta a atividade econômica sempre que necessário aos imperativos da segurança nacional e ao interesse coletivo.

     A Constituição de 88 permite a intervenção estatal no domínio econômico como agente normativo e regulador a fim de fiscalizar, incentivar e planejar o setor privado. Como assevera Miguel Reale Júnior, a “atuação do Estado como agente normativo ou regulador é de ser concretizada com respeito aos princípios que regem a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, visando a assegurar a todos uma existência digna, conforme os titames da justiça social (art. 170 da CF)”.

     A valorização do trabalho humano, além de principio da ordem econômica constitucional, é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil como pode ser visto no artigo 1°, inciso I da CF 88. O trabalho humano, é um fator social, considerado uma necessidade inerente à natureza do homem e ao progresso social.

     O princípio da livre iniciativa está diretamente relacionado ao princípio da liberdade e pode ser entendido como meio de se evitar qualquer restrição, ou sujeição estatal, que não esteja prevista em lei.  Por ser um princípio básico do sistema capitalista, a livre iniciativa é uma forma de se consagrar a economia de mercado e incentivar não só a liberdade de empresa, como as mais variadas formas de produção, seja individual ou coletiva.

     Por fim, tanto a livre iniciativa como a valorização do trabalho humano são considerados meios de se garantir a todos uma existência digna de acordo com os ditames da Justiça Social. O artigo 1°, inciso III da CF 88 dispõe que a dignidade da pessoa humana é princípio fundamental da República Federativa do Brasil. Como nos ensina José Afonso da Silva: “Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. “Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido de dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invoca-la para construir ‘teoria do núcleo da personalidade’ individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação o desenvolvimento da pessoa e o seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana”.

     Por mais, aliado aos princípios supra mencionados, estão os princípios gerais da ordem da atividade econômica, que como nos salienta Raul Horta Machado “no enunciado constitucional, há princípios – valores: soberania nacional, propriedade privada, livre concorrência. Há princípios que se confundem com intenções: reduções das desigualdades regionais, busca do pleno emprego; tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte (alterado pela EC n°6/95); função social da propriedade. Há princípios de ação política: defesa do consumidor, defesa do meio ambiente”.

Temos então os princípios gerais da atividade econômica como corolários dos princípios constitucionais:

  • A propriedade privada art. 5°, XXII, XXIV, XXV,XXVI da CF.
  • A soberania nacional (arts. 1°,I e 4° da CF) como ênfase no princípio geral da soberania na área econômica.
  • A função social da propriedade com previsão nos artigos 5°, XXIII, e 186 da CF.
  • A livre concorrência como livre manifestação da liberdade de iniciativa, que permite a lei reprimir o abuso do poder econômico (eliminação de concorrência, aumento arbitrário dos lucros e a dominação de mercados) conforme o artigo 173, parágrafo 4°.
  • A defesa do consumidor
  • A busca do pleno emprego.
  • O tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte. A defesa do meio ambiente com amplo tratamento pela Constituição federal Título VIII Da ordem social capitulo VI.
  • A redução das desigualdades regionais e sociais como um dos objetivos a ser alcançado pela República Federativa do Brasil.

 

CONCLUSÃO

     Um dos objetivos do Direito Econômico é o desenvolvimento do país, por meio de normas jurídicas que regulam a atividade econômica. A carta constitucional de 88 inovou ao tratar do tema no Título VII da Ordem Econômica e Financeira estabelecendo normas e princípios gerais, possibilitando a intervenção do Estado para se atingir os seus fins e fazer jus ao Estado Democrático de Direito, estabelecendo assim um equilíbrio entre a liberdade e a intervenção na atividade econômica do país.

REFERÊNCIAS

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio de subsidiariedade: conceito e evolução.

 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 19. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2001.

 MORAES. Alexandre de. Direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

 MOREIRA, Vital. Economia e constituição. Coimbra, 1974

 HORTA, Raul Machado.  A constituição brasileira de 1988 – Interpretações

 REALE JÚNIOR, Miguel. Casos de direito Constitucional.  São Paulo: Revista dos Tribunais 1992.

 TAVARES, André Ramos. Direito constitucional econômico. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2006

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Autor: Breno Carvalho De Oliveira


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