Interrogatório de pessoa jurídica



Graduando em Direito

Campus: Praça da Liberdade – 7° período - noite

 

 

 

 

 

 

 

Artigo de Processo Penal

Tema: Interrogatório de Pessoas Jurídicas

 

 

 

 

 

Aluno: Thiago Carvalho Abdala

 

 

 

Belo Horizonte

2011

 

 

 

Interrogatório de pessoa jurídica

 

Introdução

 

Como advento da lei de crimes ambientais, L9605/98, ficou claro a inovação do ordenamento brasileiro ao admitir que a pessoa jurídica possa ser agente imputável frente a infrações penais. A lei ambiental veio ratificar o posicionamento do legislador que já ensejava tal cominação legal, uma vez que demonstrava a intenção na redação do §3º do artigo 225 de nossa Constituição. Entretanto, essa inovação trouxe também duvidas com relação aos procedimentos legais a serem seguidos.

A controvérsia principal sobre esta inovação, é que tanto nossa Carta Magna quanto a legislação que versa sobre crimes ambientais não trazem elementos normativos ou procedimentais capazes de dirimir a celeuma acerca do interrogatório da pessoa jurídica.

Nosso Código de Processo Penal não prevê a oitiva de pessoa jurídica, contudo, como ensina a professora Ada Pellegrini Grinover, a analogia é a possibilidade de resolver um caso não previsto em lei, mediante a utilização de regra jurídica relativa a hipótese semelhante. Neste momento é oportuno frisar que no processo penal somente é admitida a analogia in bona partem, ou seja, em benefício do agente.

Justamente pela utilização desta ferramenta, a analogia, que a proteção dada ao individuo submetido à persecução penal é também dada à pessoa jurídica que se encontre na mesma situação. E neste ponto poderemos perceber algumas dificuldades.

Primeiramente porque a denúncia, no caso da pessoa jurídica, deve preencher os requisitos estipulados no parágrafo único do artigo 3º da Lei 9.605/98, no qual se aduz que, na peça inicial acusatória deve especificar, como parte no pólo passivo da ação, não apenas a pessoa jurídica infratora, mas, também, as pessoas físicas que contribuíram para o delito ambiental. Depois, no que concerne ao interrogatório, via de regra, o ente jurídico será interrogado através da pessoa física de seu representante legal.

Sendo assim, haverá uma confusão das pessoas físicas e jurídicas, pelo fato de que a pessoa jurídica responderá pela sua atividade, através de seu representante legal, e o seu representante legal responderá também por autoria, co-autoria ou como participe do mesmo fato.  Nascendo ai o imbróglio ensejador deste estudo.

 

 

 

Interrogatório

 

Leciona os professores Nestor Távora e Rosmar Alencar acerca da definição de interrogatório: 

“O interrogatório é a fase da persecução penal que permite ao suposto autor da infração esboçar a sua versão dos fatos, exercendo, se desejar, a autodefesa.” TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual penal. 4ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 386.

 

Partindo desta definição, é pacificado nas melhores doutrinas que, o interrogatório é meio de defesa e em segundo momento meio de prova, o que é inteligível também da L10792/03, que Altera a Lei no 7.210, de 11 de junho de 1984 - Lei de Execução Penal e o Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal e dá outras providências.

Meio de defesa porque ao alterar o momento do interrogatório, sendo agora o ultimo ato da instrução oral, permite ao acusado o exercício do direito de defesa de forma ampla e plena, isto porque poderá contradizer todas as provas produzidas durante a fase investigatória.

E a posteriori, meio de prova por contribuir para o convencimento do juiz, pois insere elementos úteis para que este possa desempenhar o principio da verdade real, seja pela contradita de provas ou pelas peculiaridades das declarações prestadas pelo acusado.

Pela nova redação da L10792/03, o interrogatório, agora permite também a intervenção tanto da acusação quanto da defesa. Contudo dentre as mudanças realizadas, em momento algum versa sobre o interrogatório de pessoa jurídica.

 

Interrogatório da Pessoa Jurídica

 

A lei 9.605/98, versando sobre os crimes contra o meio ambiente, possibilitou considerar a pessoa jurídica autora de infração penal. Como qualquer réu, a pessoa jurídica tem o direito de ser interrogada, sendo este

 

 

momento do processo, já demonstrado anteriormente as razões, considerado primordialmente como meio de defesa e, secundariamente, de prova.

O código de Processo Penal não prevê em nenhum de seus dispositivos, a possibilidade da pessoa jurídica ser interrogada, pois a época de sua edição esta possibilidade não era considerada pelo Direito Processual Penal.

Contudo através do ensinamento da professora Ada Pelegrini Grinover, podemos dizer que o código de processo penal em casos de omissão ou lacunas na norma, será por analogia e “através da pesquisa e formulação da regra jurídica pertinente à situação concreta não prevista pelo legislador, dá-se o nome de integração”

Uma vez que não é codificado o procedimento legal a respeito de quem deva representar a pessoa jurídica quando esta estiver submetida ao processo penal, nascem várias teorias de como esta lacuna poderia ser suprida.

A professora Ada Pellegrini Grinover primeiramente defendeu inicialmente que se aplicaria ao interrogatório penal, analogicamente, o disposto no art. 843 da CLT:

Art.843: Na audiência de julgamento, deverão estar presentes o reclamante e o reclamado, independentemente do comparecimento de seus representantes.

Par.1º: É facultado ao empregador fazer-se substituir pelo gerente, ou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato, e cujas declarações obrigarão o preponente.

Contudo, esse posicionamento pode se tornar um tanto quanto temerário uma vez que no decorrer do interrogatório pode haver uma confissão, conflitando com o principio da individualização da pena:

Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, consagrou o princípio da pessoalidade. Esse princípio impede a punição por fato alheio.

Sendo assim, por analogia, o preposto também não pode confessar crime cometido por pessoa jurídica, uma vez que a pessoa que tem legitimidade para isso é aquela que o estatuto social da empresa indicar como seu representante legal, ou seja, o gestor, afinal, ninguém no processo penal pode confessar pelo imputado.

Entretanto, Tupinambá Pinto de Azevedo entende o seguinte:

 

 

“Não vemos impedimento a que esses representantes outorguem procuração a terceiros, para que compareçam a juízo e falem em nome da empresa ré. Há conveniência de que o representante, submetido a interrogatório, tenha ciência direta dos fatos imputados”[1]

Data vênia, pelo principio da verdade real, diferentemente do que pode acontecer em outros ramos do direito, nos quais o Estado se satisfaz com os fatos trazidos nos autos pelas partes, no processo penal (que regula o andamento processual do direito penal, orientado pelo princípio da intervenção mínima, cuidando dos bens jurídicos mais importantes), o Estado não pode se satisfazer com a realidade formal dos fatos, mas deve buscar que o ius puniendi seja concretizado com a maior eficácia possível.

Deste principio pode-se aduzir que, mesmo o preposto autorizado pela pessoa jurídica, não poderá responder por esta, e o juiz deve realizar a oitiva deste “representante” como testemunha e não na qualidade de representante legal da pessoa jurídica.

Entretanto, Eladio Lecey entende que pode existir a “admissibilidade de indicação de preposto, exigindo-se, no entanto, poderes expressos para interrogatório e exercício de defesa pessoal em nome da pessoa jurídica. A regra será então, interrogatório pelo representante legal na época do ato do interrogatório, com possibilidade de indicação de preposto com conhecimento dos fatos, explicitando-se no mandato aqueles poderes”[2]. Contudo, este posicionamento permeia novamente a questão sobre eventual confissão no ato do interrogatório, trazendo duvida quanto à validade formal deste ato.

Segundo o culto doutrinador Fernando Capez, o princípio "favor rei" consiste em que qualquer dúvida ou interpretação na seara do processo penal, deve sempre ser levada pela direção mais benéfica ao réu.

Em razão disto, concordamos com o posicionamento atual da professora Ada Pellegrini Grinover:

“com o advento da Lei n.10.792/03, que claramente configura o interrogatório como meio de defesa, reafirmo minha posição no sentido de que é o gestor da pessoa jurídica quem deve ser submetido a interrogatório, com todas as garantias previstas nos novos artigos do Código de Processo Penal.”

 

 

Conclusão

 

Embasado na teoria monista, que rege nosso ordenamento jurídico, pessoas que cometem um mesmo crime em concurso incorrem nas penas do mesmo tipo penal. Entretanto, a pena de cada um dos agentes poderá (e deverá neste caso, por se tratar de crime ambiental, onde as penas para pessoa jurídica é distinta da pena aplicada a pessoa física) ser diferente, pois será individualizada pelo juiz de acordo com as peculiaridades do caso concreto. Assim, o princípio da individualização da pena obriga o julgador a fixar pena separadamente, para cada um dos réus, em cada situação específica, observando os parâmetros fornecidos pela lei.

Como o ordenamento não é claro quanto a quem deve responder pela pessoa jurídica quando esta estiver submetida ao processo penal, e a pessoa física que a represente, via de regra, também será parte do processo penal, na qualidade de autor, co-autor ou partícipe, deve-se regulamentar o procedimento a ser aplicado.

Pois a simples aplicação de regras por analogia e integração, pode causar uma insegurança jurídica inadmissível dentro do processo penal.   

 

 

Bibliografia:

GRINOVER, Ada Pellegrini. O Interrogatório como Meio Defesa (Lei 10.792/03). Universo Jurídico, Juiz de Fora, ano XI, 08 de out. de 2004.

GRINOVER, Ada Pellegrini, Aspectos processuais da responsabilidade penal da pessoa jurídica, in A Marcha do Processo, Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2000, pp.124-127.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual penal. 4ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 386.

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 10ª Edição revista e atualizada. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 39

http://www.conamp.org.br/Lists/artigos/DispForm.aspx?ID=174

 

[1] In Revista de Direito Ambiental, ano 11, n. 42, abr./jun. 2006, p.232.

 

[2] Extraído de http://www.conamp.org.br/Lists/artigos/DispForm.aspx?ID=174

 

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Autor: Thiago Carvalho Abdala


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