Relacionamento em exercício



Algo me perturbava, estava ansioso, precisando derramar  em algum lugar minhas ideias. Foi me proposto ser escritor, mas, “será que tenho talento pra isso?” – me perguntei.  Passei várias horas martelando tal desafio, até que acabei por gostar da ideia. Mas, sobre o que escreveria? Boa pergunta.

Bem, sou um apenas um rapaz, um garoto, que escreve, e que não sabe sobre oque escrever. É verdade que não estava muito empolgado para iniciar meus trabalhos, mas, a esta altura, algumas ideias já rondeavam minha mente. Eu, porém, continuava me adiando. Para aliviar um pouco essa pressão psicológica, resolvi fazer alguns exercícios matinais, e então saí pra rua pra correr um pouco, gastar um pouco essa energia em ideias.

Durante meu princípio de caminhada, não pude deixar de notar dois homens em minha frente. Um tinha seus quase cinquenta anos, enquanto o outro, um garoto com seus dezessete. Eram pai e filho, que caminhavam juntos. “Grande coisa!”, eu pensei. Qualquer um faz isso. Então, quem liga?

Apesar de todas essas conclusões, não consegui desafixar o olhar dos dois homens. Sim, alguns detalhes haviam chamado minha atenção. Foi aí que percebi que já os analisava, tirando algumas conclusões.

Primeiro, porque não é todo dia que vemos um garoto tão jovem acordando cedo para observar a paisagem, as pessoas, a si mesmo, a seu pai, enfim. É verdade que eu, apesar de ter a mesma idade, não deixo de fazer isso. Porém, eu me conheço, sei que sou um estranho, um diferente, um ser que nasceu com expectativa antecipada de ser velho, útil, realizado. Visto que não me incluo na contagem dos jovens normais, fiquei impressionado.

Pai e filho permaneciam quietos, sem citar uma única palavra. Porém, vez por outra se entreolhavam e indicavam um gesto sutil de aprovação. Não os ouvi conversar nada. O pai, apesar de sua aparência viril, tendo certa força física, já habituado a exercícios, sabia que já não tinha aquele vigor de seus vinte e poucos. Então, sempre que olhava seu filho, sempre deixava escapar um sutil sentimento de inveja, pois seu filho aparentava ter músculos já desenvolvidos, usando uma camisa apertada pra exibi-los.

De repente o pai, prevendo o gesto do filho, sussurra: “Pode fazer sua corrida meu filho, logo eu lhe acompanho”. O garoto para, ajusta seu cadarço e dispara na frente do pai. Nesse momento, o pai, observando o desempenho de sua progênie, olha fixamente, e respira fundo, com semblante orgulhoso e o olhar, sempre sutilmente invejoso.

Há quem diga que a beleza está nas coisas bonitas. Não tiro a razão destes, pois o bonito realmente nos encanta. Mas o sincero, esse sim, fascina. Pude perceber que, apesar de pai e filho não demonstrarem o amor paternal (talvez querendo passar uma informação de masculinidade), os expectadores sentem que está ali, presente, no semblante orgulhoso do pai, no gesto de aprovação do filho, em todas as pequenas coisas, que são impossíveis de ocultar, para quem sente. Essas coisas me fizeram refletir um pouco, ao ponto de meus pensamentos transbordarem ao papel. Talvez, tudo isso tenha me feito alguém mais atento, mais apegado a detalhes. Ou simplesmente um doido varrido, que enxerga coisas onde elas não existem. Mas e daí? Sei que percebo o que há de mais importante. E se amar nos faz ser melhores, enquanto ele existir, continuarei acreditando, que o que aquilo que eu enxergo, traduz-se amor.


Autor: Abel Batista De Santana Filho


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