Decisões recentes do STF acerca das cotas raciais nas universidades.



Recentemente o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu decisões acerca da constitucionalidade do sistema de cotas raciais adotado por instituições federais, trata-se do Recurso Extraordinário (RE) 597.285 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 183. O primeiro interposto por um vestibulando da Universidade Federal do Rio Grande do Sul que se sentiu lesado, pois, não foi aprovado para o curso de administração com a colocação que atingiu no vestibular, já que a universidade adota a política de cotas raciais, destinando 30% das vagas a alunos egressos de escolas públicas e negros, além de 10 vagas para a população indígena. Já a ADPF foi proposta pelo partido Democratas (DEM) contra a Universidade de Brasília, umas das primeiras instituições a adotar o sistema de cotas no país.

O Democratas (DEM) alegou que a concessão de cotas atinge preceitos fundamentais da Constituição entendendo que as políticas afirmativas “racialistas’’ não são adequadas. Em ambos os casos, questionou-se os critérios adotados para a definição de raça no Brasil, uma vez que se trata de um país com culturas miscigenadas, bem como se ponderou acerca da eficiência da verificação da situação socioeconômica dos candidatos às cotas.

O STF assegurou que as chamadas ações afirmativas são uma forma de compensar as camadas da população que se encontram em situação de desvantagem devido ao fator histórico. Os entendimentos foram embasados em princípios da Constituição Federal, que impõem ao Estado o dever de erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais, além de promover o bem da população sem preconceitos de qualquer origem. Foi mencionada ainda a competência delegada ao Estado pela Constituição para gerar ações que busquem a promoção e integração dos setores desfavorecidos.

Os ministros afirmaram que as novas gerações devem rever o que foi feito pelas gerações passadas e buscar meios para compensar o sofrimento que se dissemina ao longo do tempo em função da cor da pele ou da classe social, nesse passo o Superior Tribunal Federal entendeu pela constitucionalidade do sistema de cotas adotado pelas instituições e afirmou que a medida é proporcional e razoável.

         A implantação do sistema de cotas raciais-embora descrita por muitos como um preconceito velado- vêm com o objetivo de solucionar a questão da inclusão das camadas menos favorecidas ao ensino superior, uma vez que os vestígios históricos negativos repercutem até os dias atuais na população negra, como foi demonstrado pela pesquisa realizada pelo IBGE em 2009, que revelou que 70% da população pobre no Brasil é negra, ou seja, em sua maior parte, esse grupo de indivíduos, ainda vive na periferia da sociedade em virtude da sua herança social.

Contudo não se pode afirmar que a política de cotas isoladamente é uma solução para as questões referentes ao acesso à educação superior. Para que tenha efeitos positivos e duradouros e não seja apenas uma máscara para o descaso do Estado com a educação, a concessão de cotas deve ser aliada a um plano sólido de políticas públicas inversa ao adotado, realizando os investimentos de baixo para cima, iniciando-se no ensino fundamental e médio para chegar até ao ensino superior, investindo em ações que proporcionem ao aluno condições de buscar igualitariamente uma vaga na universidade, sob pena de assegurar a falência do ensino público.

Direcionar alunos vindos da rede pública sem estrutura educacional adequada, às instituições federais de ensino superior que exigem um alto grau de conhecimento, é contribuir para que a desigualdade se prolifere. As condições criadas pela política de cotas são somente para ingresso na universidade, depois de matriculado o estudante passa a ser avaliado com critérios de igualdade, uma vez egresso de escolas com déficit no ensino, o aluno pode não corresponder às exigências da universidade, vindo a ser ineficaz a ação adotada, razão pela qual devem ser criadas condições não só de inserção nas universidades, mas de permanência.

A Constituição Federal prevê o direito fundamental à igualdade entre todos. Porém, não menciona qualquer dispositivo que impeça o Estado de dispor sobre a promoção e avanço educacional e social das classes desfavorecidas. Entretanto a elaboração dos modelos de inserção deve ser mais profundamente analisada, já que, como dito anteriormente, o Brasil é um país com cultura homogênea, e não há um critério específico para se definir quem é negro, branco ou pardo.

A diversidade é parte de nossa herança cultural, e para se candidatar à vaga o candidato deve apenas se autodeclarar negro, fato que pode colaborar para a ocorrência de injustiças. No caso específico da Universidade de Brasília, o critério adotado é unicamente o da raça.  Considerar que a simples análise do fator racial é suficiente para beneficiar alguém com o sistema de cotas, o negro com posição social favorável possui vantagens em relação ao branco com histórico de desigualdade e pobreza. Há, contudo, universidades que adotam o critério da raça aliado à condição social do candidato, o que seria mais justo.

O Estado tem o dever de não discriminar, e o de prover meios para resgatar o cidadão marginalizado, valendo-se de políticas educacionais eficientes, de maneira que o sistema de cotas não seja um benefício que perdure ao longo do tempo, e sirva somente para educar a população e suprir essa disparidade que aflige o cidadão de origem negra e pobre.

Diante disso, as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal dizem respeito somente aos casos específicos da Faculdade do Rio Grande do Sul e de Brasília, não são, portanto vinculantes, podendo vir a serem discutidas novas ações que questionem a constitucionalidade das cotas, e enquanto essa discussão ainda dure, resta acreditar que esse sistema ao longo do tempo possa acarretar uma equiparação social e econômica entre as diversas raças e camadas sociais, com a integração das classes, colocando fim ao preconceito velado.

 

 


Autor: Pamella Karoline De Moura Vidal


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