Inventário e partilha



Inventário e Partilha

 

Inventário, segundo Eduardo Machado Rocha (2010, p. 205), é um processo no qual se desenvolve a função jurisdicional através de uma série de atos até se chegar à partilha dos bens aos herdeiros, com expedição do formal de partilha, se forem vários herdeiros; ou carta de adjudicação, se for apenas um herdeiro.

Nas palavras de Carlos Maximiliano apud Maria Berenice Dias (2011, p. 233), em sentido estrito, inventário é o rol de todos os bens e responsabilidades patrimoniais de um indivíduo; já em uma acepção mais ampla, inventário é o procedimento destinado a individualizar o patrimônio dos herdeiros e entregar os bens a seus titulares.

O inventário está legalmente previsto no artigo 1796 do Código Civil e seguintes, tendo seu procedimento especial determinado pelo art. 982 e seguintes do Código de Processo Civil.

Há a dispensa do inventário quando o de cujus deixar apenas valores elencados na Lei 6.858/80; tais como FGTS, PIS/PASEP, restituições do Imposto de Renda, e saldos bancários de contas poupança em valor inferior a 500 (quinhentas) Obrigações do Tesouro Nacional. Em tais hipóteses haverá a necessidade de expedição de alvará judicial para levantamento da quantia.

O bem de família convencional, a conta de crédito em conta bancária conjunta (jurisprudência vacilante), os bens adquiridos por usucapião, a doação entre marido e mulher, o usufruto vitalício, o recebimento de seguro de vida e previdência privada pelo beneficiário indicado na apólice e os benefícios da previdência social aos dependentes do segurado, também são dispensados de inventário.

Com o advento da Lei 11.441/2007, que alterou o art. 982 do Código de Processo Civil, a partilha pode ocorrer de forma administrativa e sem necessidade de homologação judicial nos casos em que não houver incapazes e/ou testamento.

Infelizmente por sua demora, ocorre na maioria das vezes o inventário judicial. O inventário judicial solene, previsto do art.982 ao 1030 do Código de Processo Civil deverá ser feito somente quando existir herdeiros incapazes ou quando não houver consenso na partilha. Por muitas vezes há também a confusão entre o arrolamento, seja comum (quando os bens do falecido são de pequeno valor) ou sumário (quando todos os herdeiros são capazes e não há lide acerca da partilha), com o inventário judicial solene propriamente dito.

Tratemos do inventário judicial como um todo.

Segundo Eduardo Machado Rocha (2010, p. 233), em uma frase simples e direta, o processo de inventário e partilha divide-se em duas partes: a) inventário; e b) partilha.

O Código Civil de 2002, em seu art. 1796 prevê que o prazo de abertura do inventário é de 60 (sessenta) dias, contados do falecimento do autor da herança. O art. 983 do Código de Processo Civil foi além e determinou que o mesmo deverá ser encerrado em 12 (doze) meses, sendo que este prazo poderá ser prorrogado pelo juiz a requerimento das partes ou de ofício.

Caso haja atraso por culpa do inventariante, este será punido com a remoção do cargo. Ressaltando-se que não há remoção ex officio, algum interessado deverá requerer a remoção do inventariante.

O requerimento da abertura do inventário é feita preferencialmente por quem está administrando o espólio ou na posse deste (denominado também de administrador provisório), conforme traz o art. 1.797 do Código Civil. Entretanto, o art. 988 do Código de Processo Civil traz o rol dos também legitimados concorrentemente para requerer o inventário (caso o responsável não haja). Caso haja inércia de todos os legitimados, o inventário poderá ser aberto ex officio.

Se o inventário for aberto fora do prazo estipulado, ele não é indeferido. Porém é constitucional a cada Estado encarregar-se de instituir uma multa pelo desrespeito ao prazo, como a Súmula 542 do STF reafirmou.

Verifica-se que existe a hipótese de inventário conjunto, que acontecerá quando: a) falecem ambos os cônjuges e os herdeiros são os mesmos; b) quando ocorrer o falecimento de algum herdeiro durante o processo do inventário e o mesmo não tiver outros bens além do quinhão hereditário.

Qualquer que seja o rito do inventário é necessária à nomeação de inventariante.

Segundo Washington de Barros apud Maria Helena Diniz (2012, p. 415), a inventariança é um encargo pessoal, pois gera responsabilidade própria daqueles que a exercem, e de investidura isolada, não podendo ser exercida conjuntamente por duas ou mais pessoas, mesmo que no inventário se tenha mais de um espólio.

O inventariante ficará encarregado pelo juiz de prestar as declarações pertinentes no processo; administrar os bens do de cujus e prestar conta sobre eles (ele também deverá receber e pagar as dívidas, sendo que para quitação da dívida hipotecária será necessária licença do juiz do inventário); separar as coisas alheias em poder do inventariado; requerer medidas conservatórias dos direitos dos herdeiros; relacionar e individualizar os herdeiros e legatários; dentre outras funções. Ou seja, será o inventariante que representará o espólio ativa e passivamente.

O juiz escolherá o inventariante segundo a ordem estabelecida pelo art. 990 do Código de Processo Civil. Entretanto, se não houver herdeiros em condições de assumir o cargo ou não exista o inventariante judicial, poderá ser nomeada pessoa estranha para a inventariança (inventariante dativo), sendo que esta terá direito à percepção de remuneração a ser designada pelo Juiz.

Entende-se que o cônjuge sobrevivente detém a preferencia pelo fato de além de ser meeiro e/ou herdeiro, por muitas vezes estar ciente dos negócios e da administração dos bens.

O inventário deverá ser requerido, com fulcro no art. 1.785 do Código Civil, no ultimo domicilio do falecido, ou na falta deste (art. 96, I e II do Código de Processo Civil), no foro da situação dos bens. Ressalta-se que caso existam bens em mais de uma localidade e o autor não possua domicilio certo, o inventário deverá ser aberto no local que ocorreu o óbito.

Caso o de cujus seja estrangeiro e possua bens no Brasil, a justiça brasileira é competente para o processo de inventário e partilha destes bens (art. 89 do Código de Processo Civil). Assim, se houver bens em outro local (país), existirão 2 (dois) inventários.

O pedido de abertura do inventário deverá ser obrigatoriamente instruído com a certidão de óbito do autor da herança, como consta no art. 987, Parágrafo Único, do Código de Processo Civil.

Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 499) destaca evolução do processo do inventário, firmando os atos que serão produzidos: “Ao despachar a petição inicial, o juiz nomeará inventariante, que prestará o compromisso e, em vinte dias, as primeiras declarações. Se houver testamento, determinará a referida autoridade se junte ao inventário cópia autentica (art. 1.127, Parágrafo Único)”.

Como foi dito anteriormente, o inventariante terá 20 (vinte) dias para prestar as primeiras declarações, ou seja, ele trará para o processo informações como o nome do de cujus, local de seu domicilio e de seu falecimento; qualidade e grau de parentesco dos herdeiros com o autor da herança, relacionando todos eles individualmente com seus respectivos endereços; relação completa de todos os bens e direitos que eram de propriedade do falecido, dando-lhes também um valor estimado. As primeiras declarações serão fornecidas com base no que determina o art. 993 do Código de Processo Civil.

Feitas as declarações, os herdeiros que residirem na comarca onde corre o processo de inventário serão citados por oficial de justiça e os que não forem encontrados, tiverem domicilio em outra comarca ou residirem no Exterior serão citados por edital, que restará fixado de 20 (vinte) à 60 (sessenta) dias, como reza o art. 999 § 1º do Código de Processo Civil.

Após a citação dos herdeiros (partes), como em todo processo vemos que os citados podem manifestar-se; no processo comum, temos a já conhecida contestação; no processo de inventário fala-se em impugnação, que poderá ser feita no prazo de 10 dias após o término das citações.

Vemos por exemplo, a impugnação pelos herdeiros do demonstrativo da apuração dos haveres apresentado pelo inventariante, na qual o juiz designará perito contábil para apurar qual o verdadeiro valor dos bens, como acorda o art. 1.003, Parágrafo Único, do Código de Processo Civil.

Os herdeiros e interessados também poderão impugnar às primeiras declarações. Tal impugnação, prevista no art. 1.000 do Código de Processo Civil, poderá ser feita para arguir erros; omissão de bens; como já foi dito, o valor dos bens; a nomeação do inventariante e qualidade de quem está presente no rol dos herdeiros.

O juiz, depois de receber as impugnações, intimará o inventariante para que ele, no prazo de 10 (dez) dias apresente defesa, como reza o art. 177 do Código de Processo Civil. Se o juiz der provimento à impugnação, nomeará outro inventariante.

Se for objeto da impugnação a qualidade do herdeiro e a decisão sobre esta versar matéria de alta indagação, remeterá o juiz a parte para os meios ordinários e sobrestará, até o julgamento da ação, na entrega do quinhão que na partilha couber ao herdeiro admitido, como aduz o art. 1.000, Parágrafo Único, do Código de Processo Civil. Neste último caso, o herdeiro que se discute a indicação, também será intimado para defender-se.

Nas palavras de Maria Berenice Dias (2011, p. 539), o processo de inventário necessita ser célere. Tem até prazo para acabar: 12 meses (CPC 983). Por isso os incidentes são todos autuados em autos apartados e atraídos para o mesmo juízo do inventário. Caso no inventário haja algum herdeiro menor ou incapaz, o representante do Ministério Público dará seu parecer.

O inventário não deve ser paralisado enquanto há a discussão de questões que demoram muito tempo para serem decididas.

Valendo-se da vênia, explica-se que cabe ao juiz original do inventário não só decidir acerca das questões de direito, mas também das questões de fato, como traz o art. 984 do Código de Processo Civil. Assim sendo, embora em algumas situações a solução da lide seja difícil, se ela tiver provas documentais suficientes o juiz não poderá declinar de julgar a lide nos autos do próprio inventário.

As partes só serão remetidas a outro juízo caso a lide demande alta indagação ou depender de dilação probatória.

Ressalta-se que serão atraídas para o foro do inventário as ações que contém conexão com as questões sucessórias, respeitando-se o art. 108 do Código de Processo Civil.

Saindo do liame das impugnações e matérias de alta indagação, vemos que após todo esse andamento no processo, haverá a avaliação dos bens do espólio pelo avaliador judicial. Se não houver avaliador judicial na comarca o juiz nomeará um perito.

Caio Mário da Silva Pereira apud Maria Helena Diniz (2012, p.423) notifica que a avaliação serve como escopo para perpetuar a massa partível, pois quando concluída e aprovada servirá de base a todos os atos subsequentes, como cálculo do ITCD, partilha de bens, venda judicial, etc.

Pode-se então ter a certeza de que a avaliação feita pelo avaliador representa o preço justo dos bens do espólio.

Notifica-se, porém, que a avaliação poderá ser dispensada caso todas as partes acordem; e que se ela for feita, as partes possuem 10 (dias) para manifestar-se sobre ela em cartório.

Acatada qualquer impugnação a avaliação sobre o valor dado pelo perito, o juiz determinará que o mesmo retifique a avaliação, como nos dá luz o art. 1.009,§§ 1º e 2º do Código de Processo Civil.

Aduz o art. 1.011 do Código de Processo Civil, que sendo o laudo aceito ou resolvidas todas as impugnações suscitadas, abrir-se-á prazo para o inventariante apresentar as declarações finais.

Nas declarações finais, o inventariante poderá emenda, aditar ou completar as primeiras declarações. Ele poderá incluir bens omitidos ou descobertos posteriormente; poderá declarar as despesas de funeral e os frutos e rendas que recebeu desde a morte do autor da herança; o valor das dívidas ativas e passivas processadas no inventário; a conta das despesas judiciais com o inventário até o momento das declarações finais; a importância em dinheiro pertencente ao montante da herança; o valor total dos bens e títulos da dívida pública, entre outras coisas pertinentes ao processo.

Caso o inventariante nada tenha a modificar ou acrescentar, poderá ratificar o já dito em requerimento endereçado ao juiz.

Vejamos que a liquidação dos bens possui duas fases: na primeira, tem-se a preocupação de retirar do inventário os bens e direitos alheios que estavam em posse do falecido, como já foi aludido; na segunda, necessita-se efetuar o pagamento de todos os débitos da herança (anteriores ou posteriores a abertura do inventário).

Os credores poderão requerer ao juízo inventariante o pagamento das dívidas. A ordem de pagamento a ser feito está estabelecida no art. 965 do Código Civil: 1º. Dívidas Póstumas: a) despesas com o funeral; b) as custas judiciais e as despesas com a arrecadação e liquidação da massa hereditária; c) gastos com o luto do cônjuge sobrevivente e dos filhos do de cujus; 2º. Dívidas do Falecido: a) as despesas com a doença de que padeceu o falecido, nos 6 (seis) meses anteriores a sua morte; b) os gastos necessários para manutenção do devedor e de sua família, nos 3 (três) meses anteriores a sua morte; c) o salário devido aos empregados e servidores domésticos nos 6 (seis) meses anteriores a morte do autor da herança; d) as demais dívidas do de cujus (mesmo as ainda a vencer – pois o credor não pode acionar o espólio antes do vencimento).

Ressaltando que os sucessores do devedor responderão dentro dos limites patrimoniais do espólio.

As dívidas serão pagas antes da partilha, assegurando o direito dos credores. Também deverão serem requeridas antes da liquidação do inventário, pois assim incluirão no polo passivo do espólio e serão deduzidas do cálculo do ITCD.

Caso as dividas ultrapassem o valor da herança, o inventariante ou o credor deverão requerer a declaração de insolvência do espólio.

Passadas todas estas fases, o juiz mandará o contador elaborar o cálculo do imposto causa mortis. Este imposto está disciplinado no Código Tributário Nacional nos arts. 35 a 42.

O imposto incide sobre os bens a serem transmitidos por herança aos herdeiros do falecido. Portanto, há a necessidade de se deduzir do monte mor o valor dos débitos e a meação no caso de houver cônjuge ou convivente sobrevivente.

As Súmulas 112 e 113 do STF trazem que o imposto é devido pela alíquota vigente ao tempo da abertura da sucessão e deve ser calculado sobre o valor dos bens na data da avaliação.

Quando o cálculo do imposto estiver pronto, o juiz intimará o inventariante, herdeiros e a Fazenda Pública para manifestarem no prazo de 5 (cinco) dias. Se houver impugnação ao valor, o juiz decidirá. Caso determine que a mesma é procedente, mandará os autos ao contador para correção, que sendo feita  e não sendo novamente impugnada, o juiz proferirá decisão julgando o cálculo do imposto, como reza o art. 1.013 § 2º do Código de Processo Civil.

A Súmula 114 do STF aduz que o ITCD não é exigível antes da homologação do acordo, o que não significa que não possa ser recolhido espontaneamente perante a Fazenda Pública, sem a necessidade de elaboração do cálculo judicial.

Recolhido o ITCD, inicia-se a segunda fase do Inventário e Partilha: a partilha.

Na partilha temos a identificação do acervo individualizado a cada herdeiro, cada um com seu quinhão. O inventário serve para definir o quinhão de cada herdeiro antes de transferir as respectivas partes. A partilha serve para efetuar a entrega.

O estado de comunhão que no inventário (primeira fase) era pro indiviso na partilha se torna pro diviso, agora já nota-se claramente as cotas reais.

Ressaltando-se que não há apenas a partilha judicial, como segunda fase, no final do inventário; há outras formas de partilha como a celebração do contrato de partilha, por instrumento público; o transigir fora do processo, por documento particular, para por fim em desavenças surgidas no decorrer do inventário; o transigir nos autos do inventário, por escrito particular ou por termos nos autos.

Vemos ainda a hipótese do de cujus ter feito a partilha da parte disponível dos seus bens em vida (se feita a favor dos herdeiros necessários é também denominada de sucessão antecipada). Embora os bens transferidos pela partilha em vida não entrem no inventário, necessitam ser trazidos a este para conferir se não ultrapassam o limite legal de disposição (colação). Se ultrapassarem e os que receberam em excesso forem herdeiros, é feita compensação; se forem terceiros é necessário reduzir o ato de liberdade, como diz o art. 1.967 do Código Civil.

A partilha também poderá ser amigável, desde que todos os herdeiros sejam maiores e capazes, nas formas citadas anteriormente e somente sendo homologada judicialmente.

Sendo a partilha feita extrajudicialmente não há a necessidade de homologação judicial, contudo as partes devem ser assistidas por um advogado.

Para que haja homologação judicial faz-se necessário a quitação de todos os tributos.

Por fim, vemos a partilha judicial.

A partilha judicial ocorrerá nos processos de inventário solene e no arrolamento comum, sendo facultado as partes a eleição da forma da partilha. A partilha judicial resta indispensável quando existir testamento; não houver acordo entre herdeiros; ou quando algum herdeiro for incapaz ou estiver ausente.

Verifica-se que na partilha judicial testamentária, regulada pelos arts. 2.014 e 2.018 do Código Civil; o juiz homologará a partilha testamentária e expedirá o formal de partilha.

Na partilha judicial solene, o juiz deliberará acerca da partilha, sendo concedido as partes o direito de apresentarem seus pedidos de quinhão.

Cada herdeiro ficará com sua respectiva parte, sendo que é evitado o condomínio entre os herdeiros.

Resta dizer que quando há somente um herdeiro ou um único cessionário da herança, este pedirá que lhe sejam adjudicados os bens, sem a necessidade de um longo inventário e partilha.

 

Referências Bibliográficas

 

DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 2ª Ed. – São Paulo. Ed. RT, 2011.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil. Vol. 6: Direito das Sucessões. 26ª Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. 7: Direito das Sucessões. 6ª Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.

ROCHA, Eduardo Machado. Sucessão Hereditária: Prática do Inventário e Partilha. 2ª Ed. – São Paulo: Pillares, 2010.


Autor: Aliny Aparecida Ribeiro Rodrigues


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