Ato Ilícito Dos Filhos Menores: Responsabilidade Dos Pais?



1 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS

Fazendo-se uma análise acerca dos liames doutrinários que versam sobre os pressupostos da responsabilidade dos pais, verifica-se que os autores discrepam ao elencar os pressupostos para a responsabilização paterna pelos atos danosos dos filhos, apesar da grande convergência de idéias.

Sendo assim, é válido dizer que o atual Código Civil, obedecendo a orientação da Constituição Federal de 1988, a qual consagrara o princípio da isonomia, igualou o pai e a mãe nas imperativas funções de chefe de família, conferindo ao poder familiar, grande importância de um instituto que deve ser exercido primordialmente no interesse do filho, sem descurar o interesse geral da família e no próprio interesse social.

A respeito dos pressupostos em comento, é imperioso trazer à baila o que comanda Alvino Lima[1]:

Direito subjetivo ou função social, o pátrio poder confere ao chefe de família direitos e impõe deveres correlativos. Ao direito de guarda do filho menor e o de lhe impor a vida em comum, correspondem os deveres de vigilância, de educação e de direção de sua conduta, impondo-lhe correções ou castigos necessários.

Os deveres do poder familiar são graves e, se transcurados, notadamente quando, da sua transgressão, surjam violações de direitos de terceiros, ocasionando-lhes danos, advém sanções contra os titulares do poder familiar, responsabilizando-os pelos danos causados por seu filho menor.

Há contra os pais uma presunção júris tantum de responsabilidade. Quando se alude aos pais ou curadores, implicitamente se abrange àquele que, não sendo uma coisa nem outra, é, entretanto, encarregado da vigilância, como o avô, que é muitas vezes a pessoa a quem incumbe esse dever.

Essa espécie de responsabilidade, portanto, relaciona-se intimamente com o exercício do poder familiar, e deve ser julgada em função desse dever, que impõe ao seu titular obrigações de conteúdo especial, notadamente à assistência e à vigilância.

O dever de assistência, que não é só a material, é traduzido na prestação de alimentos e satisfação de necessidades econômicas, mas também moral, compreendendo a instrução e a educação, esta no seu sentido mais amplo. Inclui-se aqui, a obrigação de propiciar ao menor, ao lado da prestação de conhecimentos compatíveis com suas aptidões e situação social e com os recursos do pai, o clima necessário ao seu sadio desenvolvimento moral, inclusive pelo bom exemplo.

A vigilância é o complemento da obra educativa, e far-se-á, mais ou menos necessária, conforme se desempenhe o pai da primeira ordem de seus deveres.

Dispõe o art. 932, I, do Código Civil, que quem exercer o poder familiar responderá pelos atos do filho menor que estiver sob autoridade e em sua companhia. A disposição funda-se no fato de que, tendo os pais a obrigação de dirigir sua educação, devem também exercer vigilância.

A responsabilidade do pai pode, aliás, ser intermitente, cessando e restaurando-se, conforme a delegação de vigilância, efetiva e a título de substituição, como acontece no caso de menores que freqüentem estabelecimentos de ensino ou de aprendizagem em geral ou mesmo de trabalho.

São, pois, pressupostos para a configuração de tal responsabilidade: a menoridade do filho; o fato de o filho estar sob a autoridade e a companhia de seus pais; os pais devem estar no exercício do poder familiar e a negligência dos pais.

1.1A menoridade do filho

A menoridade decorre de expressa regulamentação legal. Com efeito, dispõe o art. 5º do Código Civil que, aos 18 (dezoito) anos completos, acaba a menoridade, ficando habilitado o indivíduo para todos os atos da vida civil. De outro lado, os arts. 3º e 4º do mesmo Código estabelece quem são os absolutamente incapazes e os relativamente incapazes.

Diz ainda o art. 3º do Estatuto Civil, que são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil, os menores de 16 (dezesseis) anos, enquanto o art. 4º estatui que são relativamente incapazes os maiores de 16 (dezesseis) e menores de 18 (dezoito) anos.

O legislador, ao arrolar entre os incapazes, referidas pessoas, separando-as por limite de idade, procura protegê-las. Partindo do pressuposto de que ao menor falta a maturidade necessária para julgar assuntos de seu próprio interesse, ao amental falta o tirocínio para decidir o que lhe convém ou não, ao pródigo ou ao silvícola falta o senso preciso para defender seu patrimônio, o legislador inclui todos esses indivíduos na classe dos incapazes, a fim de submetê-los a um regime legal privilegiado, capaz de preservar seus interesses[2].

Consoante o art. 928 do Código Civil pátrio, citado alhures, o incapaz é responsável pelos prejuízos os quais der causa, caso as pessoas que sejam por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou se não dispuserem de meios que sejam suficientes. Assim, na hipótese de os responsáveis legais do menor não puderem ou não tiverem condições de arcar com os prejuízos, estes poderão ser suportados pelo incapaz, desde que não venha a privá-lo do essencial. De todo modo, a lei indica que o juiz deverá fixar o valor de forma equânime. Portanto, o que se busca primeiro é atingir o patrimônio dos responsáveis, para só depois dirigir a pretensão em desfavor do próprio incapaz. De acordo com as disposições dos artigos 932 e 942[3] do Código Civil, limita-se, assim a responsabilidade paterna.

Na constância do Código de 1916, caso o filho possuísse menos de 16 (dezesseis) anos, a responsabilidade dos genitores era isolada e não se mencionava a questão da solidariedade.[4]

Entretanto, a redação do artigo 928 do atual Diploma Civil não menciona nada a respeito da eventual incapacidade relativa do menor e não pode o exegeta ler o que, efetivamente não está redigido. Por conseqüência, ainda que menor de 16 anos, caso o menor pratique atos lesivos a terceiros e possuir patrimônio, poderá ser chamado a responder, na hipótese de seus responsáveis não poderem.

A doutrina é uníssona no sentido de que a regra geral é a existência de capacidade, enquanto que a incapacidade se reveste de caráter excepcional. Tal exceção, vale salientar, é legalmente prevista exatamente como o fito de salvaguardar os direitos do incapaz, seja ele menor, louco, pródigo ou o que quer que seja. Enfim, o Código Civil declara serem nulos os atos jurídicos praticados por absolutamente incapaz (art. 166, I)[5] e anulável o ato jurídico por incapacidade relativa do agente. O objetivo que se tentou alcançar foi impedir que o incapaz, pelo fato de não ser suficientemente experiente e hábil para comandar sua vida sem a interferência de pais ou tutores, venha a sofrer prejuízo com ato para o qual não esteja preparado.

Com o advento da maioridade, ipso facto, extingue-se o poder familiar, e, conseqüentemente o direito de guarda, os deveres de educação e vigilância cessam e o filho passa a agir de forma livre, com a aquisição da capacidade absoluta.

O direito anterior à codificação colocava em pólos opostos os menores absolutamente incapazes e os relativamente incapazes, em menores impúberes e púberes. Aqueles, eram tidos por civilmente incapazes, não pelo fato de estarem privados de aptidão para procriar, como se expressava o direito anterior, mas sim porque o seu desenvolvimento mental era exíguo, além de sua reduzida adaptabilidade à vida em sociedade.[6]

Ainda que o filho continue a permanecer no lar paterno, os seus atos não acarretam a responsabilidade de seu genitor, salvo a hipótese de responsabilidade pessoal proveniente de culpa pessoal, regulada pelo direito comum, como no caso, por exemplo, em que o filho tenha agido como preposto do pai.[7]

O que se deve frisar, de plano, que, sendo o menor púbere ou impúbere, sendo maior ou menor de dezesseis anos, de todo modo, ocorrendo a hipótese legal prevista no artigo 932, I, do Código Civil, é plenamente cabível a indenização da vítima pelo pai do causador do dano. A diferença reside em ser possível ou não, a participação do próprio menor no pólo passivo da demanda onde venha a ser pleiteada a referida indenização.[8]

Assim, os menores de dezesseis anos, sendo absolutamente incapazes, nos termos do artigo 3º, I, do Código Civil, não podem ser demandados diretamente, no caso de virem a ocasionar danos a terceiros, mesmo que eventualmente possuam patrimônio para suportar o custo do ato lesivo.

1.2O fato de o filho estar sob a autoridade e a companhia de seus pais

De fato, ainda que haja relação de poder familiar, se, porém, o filho estiver em companhia de outrem (por exemplo, internado em colégio)[9], a responsabilidade incidirá sobre aquele a quem incumbir o dever de vigilância. Isto significa dizer que não é o bastante o menor estar sob o poder familiar, pois é necessário também que viva em sua companhia, para que exista a responsabilidade dos pais. Trata-se de mais um requisito da ocorrência in concreto, da responsabilidade civil dos pais.[10]

E o que se entende por "viver na companhia dos pais"? Significa dizer que devem morar no mesmo teto, permanecer na casa paterna, possibilitando a vigilância do pai, o que supõe, naturalmente, a capacidade do pai exercê-la. Mas, caso o menor não viva na companhia do pai porque este o abandonou, ou por qualquer motivo que mostre não ser a separação fundada em motivo legítimo, a responsabilidade do genitor não se exclui. Ao contrário, tais fatos evidenciam com mais clareza a infração dos deveres paternos.

A respeito do tema em foco, Caio Mário da Silva Pereira[11] assevera que, sem dúvida o princípio da responsabilidade pelo fato próprio já é uma conquista do mundo jurídico, mas é insuficiente. A vida em sociedade é cada vez mais complexa, e urde várias situações, em que ao anseio de justiça ideal não satisfaz proclamar tão-somente que o indivíduo responde pelo dano que ocasiona. Daí assentar-se um conjunto de preceitos, em virtude dos quais se atenta para o fato da extensão da responsabilidade além da pessoa do ofensor, seja juntamente com este, seja independentemente dele.

Diz-se, assim, que existe responsabilidade indireta quando a lei chama uma pessoa a responder pelas conseqüências do ilícito alheio. Os pais respondem pelo procedimento dos filhos menores que se acham sob seu poder e companhia. Complemento do dever de dirigir-lhes a educação e velar pelos seus atos é a responsabilidade civil pelos danos que ocasionem. É óbvio que esta cessa com a maioridade. Mas, na pendência da menoridade, têm o dever de impedir que ofendam bens jurídicos alheios, e de indenizar a vítima. Além do requisito da menoridade, compõe a etiologia desta obrigação a circunstância jurídica da submissão à autoridade paterna e a fática de estar em companhia do pai ou da mãe. Em corolário, se por decisão judicial tiver sido cessada ou suspenso o poder familiar, pela mesma razão que o pai deixa de ter autoridade, não terá obrigação de reparar o dano causado pelo filho; se este por qualquer motivo achar-se em companhia de outrem.

Portanto, se o filho justificadamente não estiver em sua companhia e sob sua guarda, sua responsabilidade não se caracterizará. Repisando, se não houver justificativas, ou seja, se o menor, por culpa do pai, se encontra alhures na guarda de terceiros e causa dano a outrem, o genitor terá que indenizar.[12]

O elemento de ligação é a guarda[13]: se a guarda é indevida, ou quem devia guardar o menor não o guarda, ligado fica quem o devia guardar e não o guardou, ou confiou, ou aquiesceu na guarda de outrem. É possível que o guardador efetivo também fique responsável.[14]

Não se pode confundir, todavia, "guarda" com "companhia", pois muito embora esta última, normalmente esteja inserida na primeira, não implica, por si só, a noção de dever, para se constituir em direito somente. Significa dizer que no rol dos deveres que se englobam no conceito de guarda, sobrelevam a direção, a educação e, sobretudo, a vigilância do menor. No complexo de direitos e deveres está a fixação do lugar da residência do menor, o consentimento para matrimônio e a representação do menor em Juízo.

De forma sintética, a vigilância do menor é inerente ao dever de guarda deste e impõe-se não apenas como forma de evitar que o mesmo cause prejuízo a terceiros por atos ilícitos, mas também para evitar que cause males a si próprio, dada sua imaturidade, sua evidente falta de discernimento.[15]

Insta observar, contudo, que a não coabitação só isentará o genitor de responsabilidade, se ele estiver impedido de fiscalizar e dirigir a conduta do filho menor; se a ausência de coabitação não impedir aquela fiscalização, o genitor que se achar no exercício do poder familiar continuará no dever de vigilância de seu filho menor, permanecendo a sua responsabilidade.

O mencionado no parágrafo precedente se dá porque a guarda tem posição de prevalência no estabelecimento da responsabilidade civil dos pais, pois decorre da guarda o dever de vigilância do guardião em relação ao filho, e esta tem de ser absoluta. Em razão de sua própria condição, de sua inexperiência, da falta de siso que a lei presume, cumpre zelar com atenção máxima para que não se envolvam em perigos, não sejam enganados por pessoas inescrupulosas e, também, não molestem terceiros. Logo, se o fizerem, por culpa ou dolo, é de se entender que falhou o guardião (ou guardiões). O dano causado é suficiente para demonstrá-lo, não havendo prova em contrário que possa apresentar esse pai (ou pais).[16]

Esta tem sido a orientação dominante conforme se depreende do julgado abaixo, emanado do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais[17]:

Reparação de Dano- ato ilícito- menor- genitor que não dispõe da guarda- responsabilidade-exclusão- inteligência do artigo 1.521, I, do CC.O pai que deixa de ter a guarda legal não terá obrigação de reparar o dano causado pelo filho, se este achar-se confiado à guarda do outro cônjuge, deslocando-se o princípio da responsabilidade para aquele a quem incumbe o dever de vigilância.

Nesse ínterim, manifesta-se Albertino Daniel de Melo[18], no sentido de que se deve analisar a natureza da convivência, ou não, entre o menor e seus pais:

[...] se o menor não mora com seus pais, ele mora sozinho ou com terceiros, ou ele é um vagabundo. Em todos os casos, o caráter legítimo ou ilegítimo da separação é procurado: quer-se saber, pelos fatos, se houve atitude culposa do titular do pátrio poder, antes anterior ao delito; ou uma circunstância deste, ou sua natureza, que faça crer em deficiência no cumprimento do dever de educação. O caráter ilegítimo aparece quando o menor mora sozinho, em circunstâncias com aquelas que permitem declarar a ilegitimidade da emancipação. Quando ele mora com terceiro, sobre quem pese uma obrigação de vigilância constante a respeito dele, então é o caráter legítimo da separação que deve ser levado em conta, pelo menos nos casos em que o internamento junto a terceiro é considerado como sendo do interesse do menor, para fins de aperfeiçoar a sua educação ou a sua instrução profissional.

Acrescente-se que a convivência surge também como decorrência inafastável do poder familiar, resultando sempre no dever de vigilância e educação. Não se deve olvidar, outrossim, que o poder familiar inclui prerrogativas que os pais devem exercer até discricionariamente caso seja necessário, algumas elencadas de forma expressa no estatuto civil, entre as quais o de ter os filhos em sua companhia, reclamá-los de quem ilegalmente os detenha e exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. Trata-se, então, não de mera faculdade ou de simples dever decorrente da paternidade, mas de norma imperativa cujo descumprimento poderá ocasionar inúmeras outras conseqüências envolvendo não só o direito de família, mas o direito comum. Como última análise, pois, a convivência de que ora se trata como pressuposto da responsabilidade civil dos pais, nada mais é do que um dever que lhes é imposto, guardadas, evidentemente circunstâncias excepcionais.[19]

1.3O exercício do poder familiar pelos pais deve ser atual

Entende-se por poder familiar toda a gama de direitos-deveres de incumbência dos genitores, no que tange às pessoas e aos bens dos filhos que não se encontram emancipados, levando-se em consideração o caráter protetivo daqueles em face destes[20].

Insta salientar que o poder familiar referido é exercido num mesmo patamar por ambos os genitores, de modo que estes possam arcar com os ônus impostos pela norma jurídica. Tal poder é embasado pelo Direito Natural, ratificado pelo Direito Positivo, com o escopo de proteger e manter o filho menor não emancipado[21].

De fato, tendo como foco central a proteção dos menores, o instituto do poder familiar referido no parágrafo precedente dá aos pais direitos e obrigações inerentes a este encargo, como por exemplo, a obrigação do dever de vigilância. Assim, os genitores têm o direito-dever de constantemente observar as atitudes dos filhos, enquanto estes forem incapazes de comandar de forma responsável seus próprios atos, tudo em consonância com os artigos 1.630 e 1.634, I do Código Civil Pátrio.

Como rol meramente exemplificativo, pode-se mencionar diversos atos que devem ser tomados pelos pais em relação aos filhos (no exercício do poder familiar), a saber: dirigir-lhes a criação e educação; conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercitar o poder familiar; administrar os bens dos filhos menores não emancipados e o usufruto sobre os bens dos filhos menores que se acham sob o seu poder; exigir-lhes que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

O poder familiar se configura como norma de ordem pública, sendo sintetizado num dever em relação aos filhos e no direito em face de terceiros.

Para que haja a incidência da hipótese do artigo 932, I do Código Civilista pátrio, é condição sine qua non que o menor esteja sob o poder familiar dos pais, ressaltando que a lei impõe aos pais obrigações de caráter especial, como o dever de vigilância.

Consoante menciona Uldorico Pires dos Santos[22], em caso de responsabilidade extracontratual, a obrigação dos genitores do menor de 18 (dezoito) anos advém do múnus imposto pelo poder familiar, uma vez que até a maioridade legal (e não aquela oriunda da emancipação) cabem-lhe a guarda, a proteção e a vigília dos atos dos filhos.

1.4 A posição negligente dos pais

A doutrina pátria diverge a respeito de haver necessidade da culpa in vigilando dos genitores, como pressuposto para a responsabilização na esfera cível por atos ilícitos dos filhos.

A presunção de culpabilidade dos genitores de forma relativa (juris tantum) é aceita pela jurisprudência, tendo por via de conseqüência, a inversão do onus probandi[23].

Deste modo, incumbiria aos pais provarem que cumpriram com o dever de guarda, vigilância, para poderem se escusar da responsabilidade.

A despeito da culpa in vigilando, Munir Karam[24] menciona que é a falta de atenção especial dos pais. Estes devem demonstrar de modo imprescindível a ausência de culpa para não serem civilmente responsabilizados por atos dos filhos.

O lesado deverá comprovar a relação parental, o elo de subordinação entre o menor que tenha ocasionado o prejuízo e o titular do dever de vigilância e a conduta considerada culposa por parte do lesante, a fim de que haja a configuração da presunção relativa da culpa in vigilando.

De acordo com a doutrinadora Maria Helena Diniz [25], caso os genitores provem que não deixaram de ser vigilantes, não há o que ressarcir no tocante aos danos ocasionados pela conduta ilícita de seus filhos menores.

Quanto à possibilidade dos pais em se livrarem da responsabilidade por meio de prova de que não houve negligência na criação e educação dos filhos, há quem sustente esse pensamento com embasamento no entendimento do STF.Tal corte interpretou o art. 1.523 do Código Civil de 1916 (já revogado) criando a Súmula nº 341[26], onde a culpa do patrão ou comitente é presumida no que concerne aos atos ilícitos dos empregados ou prepostos. Havendo presunção juris tantum, caberia aos pais (e não à vítima) provar que não violou os seus deveres.

No entanto, no que respeita a tal problemática enfocada no parágrafo anterior, há uma inclinação da doutrina e jurisprudência majoritária para admitir como objetiva a responsabilidade do patrão ou comitente por atos culposos de seus empregados e prepostos[27].

Entende Caio Mário da Silva Pereira[28], que a lei traz a presunção de culpa dos pais, deduzindo-os do dever de vigilância. Não cabe aos genitores alegar que tomaram os cuidados normais e que o filho traiu sua vigilância para que assim possa ser afastado o dever legal – deve haver um ressarcimento do dano porventura ocasionado pela culpa do filho menor. Leciona ainda o referido doutrinador que os pais somente se liberam do encargo se comprovarem a inimputabilidade genérica, ou a juridicidade do ato do filho menor.

Seguindo uma mesma linha de raciocínio, Alvino Lima assevera a imprescindibilidade no que tange à efetiva responsabilização dos pais, tomando como embasamento a presunção da ausência de educação e vigilância[29].

Ressalte-se que há a total irresponsabilidade do absolutamente incapaz, enquanto o relativamente incapaz pode arcar pessoalmente com as conseqüências dos seus atos, e, então, o fato dos genitores serem também responsáveis não exclui a do próprio filho, ficando os bens deste sujeitos à reparação do dano.

1.5Presunção de culpa

A presunção de culpa é um instrumento legal que visa proteger a vítima, pois levando-se em consideração a dificuldade enfrentada pela mesma, no que concerne à comprovação de culpa dos pais, considera então superior o seu interesse em detrimento dos responsáveis legais.

Referido instrumento jurídico justifica-se também por questões de probidade e justiça. É aceitável, como regra de experiência, que algum dano decorrente de um ato de menor se deve à incúria dos vigilantes. Por outro prisma, a vítima não deve aceitar o ocorrido como se fosse apenas uma fatalidade, daí porque foram instituídas as culpas in vigilando e in educando.

De acordo com a doutrina pátria, a presunção de culpa também tem um caráter profilático, na medida em que força os pais a serem mais vigilantes com os filhos, com o escopo de prevenir acidentes e assim evitar que haja dano a um terceiro.

1.6O momento da maioridade

Quando o assunto se trata da maioridade, há três teorias na doutrina e jurisprudência que buscam definir qual o momento preciso em que o indivíduo atinge tal estado, a saber:

A primeira leva em consideração o fato do jovem completar dezoito anos ( ou qualquer idade) no primeiro momento e na hora que consta do assento do nascimento.

A segunda teoria baseia-se na hora do nascimento, mencionando que alguém completa mais um ano no dia do nascimento e na hora que consta no assento do nascimento.

Por fim, a terceira adota o critério de que a idade é completada após o fim do dia em que se dá o aniversário, ou seja, a idade é atingida à meia-noite do dia do aniversário, quando o dia termina.

Hodiernamente, prevalece a teoria segundo a qual a responsabilidade por ilícito penal começa no primeiro momento do dia em que o indivíduo completa dezoito anos[30].

1.7A culpa na ação do menor

Com efeito, para a doutrina majoritária, não há necessidade do elemento culpa no comportamento dos pais para que estes sejam imputados como responsáveis pelos atos dos filhos. Entende-se que existindo o dano, este deve ser sempre reparado. Assim, se o menor está impossibilitado de assim proceder, os pais serão compelidos a pagarem a indenização devida.

A respeito do assunto ora analisado, Orlando Gomes[31] ensina com propriedade o seguinte:

Para alguém cometer o ilícito, precisa ter discernimento, e para responder pela reparação civil, ter praticado ato culposo. Conseqüentemente, se o menor não tem capacidade de querer e entender, não incorre em culpa, o que significa inidoneidade para praticar ato ilícito. Ora, se a responsabilidade do pai pressupõe a prática de ato ilícito pelo filho, isto é, ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, e lógico que não há responsabilidade paterna enquanto o filho não tiver capacidade de discernimento.

Só que o renomado autor arremata: "apesar de lógico, esse raciocínio não prevalece na prática".

Apesar da presunção relativa (juris tantum) de culpa dos pais operar-se em torno de grande parte das legislações atuais, ainda há doutrinadores que pugnam pela presunção absoluta de culpa dos pais em relação aos atos dos filhos.

De fato, consoante o entendimento majoritário, infere-se que os pais não serão responsáveis pelos atos dos filhos menores se provarem a efetiva guarda ou a impossibilidade de impedir o evento. Juntamente com a presunção relativa referida, fixou-se a inversão o ônus da prova, pois, "o lesado não tem que provar a culpa do pai, a este é que compete demonstrar ausência de culpa ou negligência"[32].

Ponto de grande relevância que se discute neste item é o fato da necessidade do menor agir sempre com culpa na prática de um ato para que a responsabilidade dos pais subsista. Pode-se afirmar que, mesmo o menor não agindo culposamente, mas ocorrendo o dano, os pais devem ser sempre responsáveis? A resposta para tal questionamento nos é dada por Mário Moacyr Porto[33], quando menciona que nada impede o magistrado de avaliar a atitude do menor inimputável em face das suas circunstâncias objetivas, externas, para se chegar à conclusão se o ato incriminado foi condizente com as regras jurídicas ou não. Caso fique comprovado que o ato do menor privado de discernimento, não violou nenhuma obrigação preexistente, é imperioso concluir que a ação promovida pela vítima em desfavor do pai do menor inimputável deverá ser repelida.

Do mesmo modo, não há de se falar em responsabilidade civil dos pais na hipótese do ato causador do dano não tiver sido praticado pelo seu filho menor, "pois não se atribui responsabilidade aos pais quando o acontecimento lesivo, em que se envolveu seu filho menor, não tiver sido causado e sim quando demonstrada a culpa de outrem[34]".




Autor: Gerliann Aquino


Artigos Relacionados


Ato Ilícito Dos Filhos Menores: Responsabilidade Dos Pais?

Guarda: Conceito, Deferimento E Revogabilidade

UniÃo EstÁvel - Novo CÓdigo Civil

A Inadimplência E A Suspensão Do Fornecimento De Energia Elétrica

Recentes Alterações Na Guarda

Guarda Compartilhada

A Função Da Escola E Da Educação